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Processo n.º 655/07
 
 3ª Secção
 Relator: Carlos Fernandes Cadilha
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
 1.Relatório
 
   
 A. impugnou perante o juiz de instrução criminal de Évora a decisão dos serviços 
 de Segurança Social que lhe indeferiu um pedido de apoio judiciário.
 
  
 Tendo sido julgada improcedente a impugnação, o interessado recorreu para o 
 Tribunal da Relação de Évora, e da decisão que, nesta instância, rejeitou o 
 recurso, por legalmente inadmissível, reclamou ainda para o Presidente do 
 Tribunal da Relação de Évora, ao abrigo do disposto no artigo 405º do Código de 
 Processo Penal, arguindo de inconstitucionais as normas dos artigos 26º, n.º 2, 
 
 27º e 28º, n.º 1, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, 399º do Código de Processo 
 Penal e 9º, n.º 2, do Código Civil, por violação do disposto nos artigos 20º, 
 n.º s 1, 4 e 5, 32º, n.º 1 e 7, 202º, n.º s 1 e 2, e 203º, in fine, da 
 Constituição da República.
 
  
 Por despacho de 26 de Abril de 2007, o Presidente do Tribunal da Relação de 
 
 Évora indeferiu a reclamação, referindo, na parte que agora releva, o seguinte:
 
  
 Quanto à invocada inconstitucionalidade, dir-se-á que o princípio do direito a 
 recurso das decisões dos tribunais, por forma a que haja um duplo grau de 
 jurisdição consagrado nos artigos 20º, n° 1, e 32°, n° 1 (este em matéria penal) 
 da Lei Fundamental, não é absoluto, mesmo em matéria penal, dispondo o 
 legislador de uma ampla liberdade de conformação no estabelecimento de 
 requisitos de admissibilidade e graus de recursos Como pode ler-se no Acórdão do 
 TC n.° 31/87, de 28 de Janeiro de 1987 (publicado no DR, 2ª série, de 9 de 
 Fevereiro de 1987 e BMJ, 363-191), há-de admitir-se que “essa faculdade de 
 recorrer seja restringida ou limitada em certas fases do processo e que, 
 relativamente a certos actos do juiz, possa mesmo não existir, desde que, dessa 
 forma, se não atinja o conteúdo essencial dessa mesma faculdade, ou seja, o 
 direito de defesa do arguido”.
 E as normas da Convenção Europeia dos Direitos do Homem não consagram, em 
 matéria de acesso à justiça, direitos e princípios que não estejam já contidos 
 nos artigos 13ºe 20º da CRP (cfr. Acórdãos do TC, n°s 163/90, 210/92, 346/92, 
 
 275/94, 403/94 e 739/98 e Carlos Lopes do Rego, Acesso ao Direito e aos 
 Tribunais, in Estudos sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, 1993, 
 p. 83). 
 
  
 A. interpôs então recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) 
 do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, “para apreciação da 
 inconstitucionalidade interpretativa das normas contidas no artigo 399º do 
 Código de Processo Penal, e nos artigos 26º, n.º 2, 27º e 28º, n.º 1, da Lei n.º 
 
 34/2004, de 29 de Julho, conjugada concomitantemente com o artigo 9º do Código 
 Civil, na interpretação emergente da douta decisão recorrida no sentido de que 
 não é admissível recurso da decisão judicial tirada sobre impugnação da decisão 
 administrativa que indefere o requerimento de protecção jurídica”, por violação 
 dos princípios do acesso ao direito e aos tribunais e do direito ao recurso. 
 Adiantou ainda que a interpretação que considera ser a mais correcta é a de que 
 o referido recurso é admissível segundo a regra geral do artigo 399º do Código 
 de Processo Penal.
 
  
 No Tribunal Constitucional, o relator proferiu decisão sumária, ao abrigo do 
 disposto no artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional, com os seguintes 
 fundamentos:
 
  
 
 (…)
 
 2. Tendo o presente recurso sido interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, constitui seu pressuposto 
 processual a aplicação, na decisão recorrida, da norma ou interpretação 
 normativa cuja conformidade constitucional se pretende que este Tribunal 
 aprecie.
 Ora, percorrendo a decisão recorrida, facilmente se conclui que, dos preceitos 
 legais indicados pelo recorrente no requerimento de interposição do presente 
 recurso de constitucionalidade, os únicos que podem ter sido aplicados para 
 resolver a questão de saber se era ou não admissível o recurso que este 
 pretendera interpor – o recurso para a Relação de um despacho judicial que 
 julgara improcedente a impugnação, por si deduzida, da decisão dos serviços da 
 segurança social que lhe indeferiu um pedido de apoio judiciário - são os dos 
 artigos 26º, n.º 2, 27º e 28º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, pois que a 
 decisão recorrida nenhuma alusão contém aos artigos 399º do Código de Processo 
 Penal e 9º do Código Civil.
 Assim sendo, não pode conhecer-se da conformidade constitucional destes dois 
 
 últimos preceitos, por, em relação aos mesmos, não estar preenchido um dos 
 pressupostos processuais do presente recurso. 
 
  
 
 3. Como decorre ainda da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional – e, aliás, também das outras alíneas do mesmo dispositivo legal 
 
 -, o Tribunal Constitucional não possui competência para verificar se o tribunal 
 recorrido perfilhou ou não a melhor interpretação da lei, à luz dos princípios 
 legais que a norteiam: possui, apenas, competência para aferir a 
 constitucionalidade (e, em certos casos, a legalidade) da interpretação 
 concretamente perfilhada pelo tribunal recorrido.
 Deste modo, não pode o Tribunal Constitucional apreciar o pedido que vem 
 formulado no último parágrafo do requerimento de interposição do presente 
 recurso de constitucionalidade, e que se reporta à aplicabilidade, ao caso 
 concreto, da regra geral do artigo 399º do Código de Processo Penal (a qual 
 traduziria a melhor interpretação da lei, do ponto de vista do recorrente). 
 
  
 
 4. Em suma, cabe apenas apreciar a conformidade constitucional das normas dos 
 artigos 26º, n.º 2, 27º e 28º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, na 
 interpretação segundo a qual – para usar as palavras do recorrente – “não é 
 admissível recurso da decisão judicial tirada sobre impugnação da decisão 
 administrativa que indefere o requerimento de protecção jurídica”. Este o 
 objecto possível do recurso.
 Sucede, porém, que quanto a este específico objecto, é patente a manifesta falta 
 de fundamento da questão de constitucionalidade colocada, à luz da 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre o direito ao recurso.
 Na verdade, o Tribunal Constitucional tem repetidamente afirmado que do artigo 
 
 20º da Constituição não decorre o direito ao recurso relativamente a toda e 
 qualquer decisão judicial (cfr. Acórdãos n.º s 125/98, 72/99 e 431/02) e, bem 
 assim, que mesmo em matéria penal (cfr. o artigo 32º, n.º 1, da Constituição), 
 tal direito só em relação a algumas decisões se acha constitucionalmente 
 consagrado (cfr. Acórdãos n.º s 353/91, 373/99, 387/99, 459/00, 417/03, 390/04, 
 
 610/04, 104/05, 616/05, 2/06, 36/07 e 313/07).   
 Assim sendo, de nenhuma norma constitucional se retira o direito a um duplo grau 
 de jurisdição relativamente à matéria dos autos - uma decisão administrativa que 
 indeferiu um pedido de apoio judiciário -, pelo que o presente recurso de 
 constitucionalidade improcede pelos fundamentos constantes da anterior 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional
 
  
 Discordando deste entendimento, a recorrente deduziu reclamação para a 
 conferência nos seguintes termos:
 
  
 Vem o presente recurso rejeitado sem conhecimento da matéria em que assenta por, 
 em suma e basicamente, se considerar não ter existido na douta decisão recorrida 
 qualquer alusão às normas dos artigos 399.° do Código de Processo Penal e artigo 
 
 9º do Código Civil invocadas também pelo ora recorrente no requerimento de 
 interposição do recurso sumariamente apreciado e a restantes invocadas não 
 estarem tuteladas por qualquer imperativo constitucional que imponha duplo grau 
 de jurisdição. 
 Ora, uma tal decisão enferma, salvo o devido respeito, que muito é, de uma grave 
 deficiência de leitura e percepção dos termos do recurso onde se evidencia no 
 parágrafo 1 .°: “Para apreciação da inconstitucionalidade interpretativa das 
 normas contidas no artigo 399.° do Código de Processo Penal, e nos artigos 26.º, 
 
 27.º, n.º 2, e 28º, n° 1, da Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho, conjugada 
 concomitantemente com o artigo 9.° do Código Civil (...)“. 
 Por outro lado no parágrafo 3.° especifica-se que “A questão da 
 inconstitucionalidade foi suscitada expressa e cautelarmente na conclusão 8.ª da 
 Reclamação para o Venerando Presidente do Tribunal a quo, onde devidamente se 
 sumariaram as razões porque merecia admissão.” 
 A aludida conclusão 8.ª fazia saber “A interpretação das normas contidas nos 
 artigos 26.º, n.°2, 27.° e 28.°, n.° 1, da Lei n.°34/2004, de 29 de Julho, no 
 artigo 399.° do Código de Processo Penal e no n.° 2 do artigo 9.° do Código 
 Civil, que subjazem à douta decisão recorrida e se acautela numa eventual 
 interpretação nesta sede(…) 
 Como correcta tese interpretativa indica-se, no parágrafo 4.° do requerimento 
 recursivo para este Tribunal Constitucional a vertida nas conclusões 2ª e 5ª a 
 
 7ª da reclamação para a Relação de Évora e, da simples leitura do seu texto se 
 retira que na conclusão 5ª se faz referência à norma do n.° 2 do artigo 9ºdo 
 Código Civil para se sustentar a falta da necessária correspondência de tal tese 
 interpretativa na letra das regras legais que ancoram a decisão recorrida, 
 coroando-se com a conclusão 7ª inevitável sentido da admissibilidade do recurso 
 emergente do estipulado peremptoriamente em sede do artigo 399º do Código de 
 Processo Penal. 
 Esta a vexata quaestio colocado ao Tribunal da Relação de Évora que foi 
 escamoteada, olvidada, culminando numa resposta conclusiva em sentido contrário 
 sem citar estas duas últimas normas, mas sem que isso não signifique que elas 
 não estejam implícitas na decisão. 
 Porque a interpretação correcta das normas da Lei de Protecção Jurídica também 
 depende, directamente, da sua conexão com a regra do artigo 9°, n.° 2, da lei 
 substantiva civil, pela que, na franca ausência de especificada alusão à 
 inadmissibilidade de recurso da decisão judicial, se tem sempre que entender a 
 aplicabilidade da lei geral, o artigo 399.° da lei adjectiva penal, porque em 
 processo penal se pretendia litigar e para ele se requeria o instituto. 
 Tão pouco se coloca a hipótese de se estar ante um segundo grau de recurso pois 
 que a impugnação judicial da decisão administrativa, em bom rigor, não reveste 
 nesta Lei n.° 34/2004, ao contrário da que a antecedeu, o formal carácter de 
 recurso em primeiro grau, apenas e só aquilo que está expressa na norma: 
 impugnação judicial. 
 Muito menos se está sindicando em sede constitucional a mera aplicação concreta 
 de normas jurídicas mas a interpretação genérica a dar a tais regras legais 
 segundo os critérios definidos no edifício jurídico a ter em conta. 
 De resto, assim o entenderam nesta mesma secção deste Tribunal, no âmbito do 
 processo n.° 454/07, e outro tanto na 2.ª secção, processo n°s 651/07 e 656/07, 
 onde recursos em tudo semelhantes foram recebidos para as subsequentes 
 alegações. 
 Como também o próprio Tribunal a quo, através do seu Venerando Presidente, 
 retrocedeu na interpretação que, no caso dos presentes autos, fez sobre a 
 matéria sindicada, dando provimento nas reclamações n°5 148/07-1 e 1054/07-1, 
 para além de outros da Relação de Lisboa, dividindo-se a jurisprudência quanto a 
 esta fundamental questão jurídica, e por isso carecida de superior interpretação 
 e adequação à Constituição. 
 Em suma se aduzirá apenas que é claro e evidente que o recorrente acautelou uma 
 possível interpretação diversa das normas da lei que regula o acesso à protecção 
 jurídica, na necessária conjugação com a norma substantiva auxiliar quanto à 
 interpretação que conduz à aplicação da regra geral do artigo 399.° do CPP, não 
 podendo suscitar-se dúvidas quanto à dimensão genérica do recurso ainda que, 
 para aferição liminar da sua utilidade, sustentada na concreta decisão onde 
 surge a tese Interpretativa considerada violadora do princípio geral de acesso 
 ao recurso sempre que ele não esteja especificadamente previsto. 
 Nada obstando, pois, na modesta perspectiva do Reclamante, à apreciação do 
 mérito do presente recurso, sob pena de, em concretização de summum jus, se 
 estar violando direitos fundamentais de acesso ao direito e aos tribunais e de 
 recurso, reconhecidos ao cidadão português, segundo os tratados e convenções 
 internacionais ratificados pelo Estado Português, mormente os artigos 6°, n.° 1, 
 
 13° e 14.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das 
 Liberdades Fundamentais que saem, também eles, violados. 
 
  
 
  
 O Exmo. representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional 
 emitiu parecer em que se pronuncia pela manifesta improcedência da reclamação.
 
  
 
  
 
 2. Fundamentação 
 
  
 Na decisão sumária entendeu-se ser de não conhecer do objecto do recurso no que 
 se refere às disposições dos artigos 399º do Código de Processo Penal e 9º do 
 Código Civil por se considerar que a decisão não fez uma qualquer aplicação 
 concreta desses preceitos que se tornasse passível de arguição de 
 inconstitucionalidade. Por outro lado, igualmente se excluiu que o Tribunal 
 Constitucional pudesse pronunciar-se sobre a validade da interpretação feita, na 
 decisão recorrida, quanto ao princípio estabelecido no artigo 399º do Código de 
 Processo Penal, tendo em conta que o recurso de constitucionalidade apenas pode 
 incidir sobre a conformidade constitucional da interpretação que concretamente 
 tenha sido perfilhada pelo tribunal recorrido.
 
  
 Através da presente reclamação para a conferência, o recorrente insurge-se 
 contra este entendimento, alegando que, no requerimento de interposição de 
 recurso para o Tribunal Constitucional, formulou o pedido de «apreciação da 
 inconstitucionalidade interpretativa das normas contidas nos artigo 399.° do 
 Código de Processo Penal, e nos artigos 26.º, 27.º, n.º 2, e 28º, n° 1, da Lei 
 n.° 34/2004, de 29 de Julho, conjugada concomitantemente com o artigo 9.° do 
 Código Civil» e que essa mesma questão de constitucionalidade havia sido 
 suscitada na conclusão 8ª da reclamação para o Presidente do Tribunal da 
 Relação.
 
  
 O reclamante parece, todavia, confundir o objecto do recurso de 
 constitucionalidade tal como é delimitado no requerimento de interposição de 
 recurso (por exigência do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional), e a 
 necessidade de suscitação da questão de constitucionalidade no decurso do 
 processo (que resulta do artigo 72º, n.º 2, da mesma Lei), com um outro 
 pressuposto processual que é o da aplicação, pela decisão recorrida, da norma ou 
 interpretação normativa cuja inconstitucionalidade se pretende ver discutida 
 
 (que decorre do artigo 70º, n.º 1, alínea b)) e que foi, em primeira linha, o 
 fundamento do não conhecimento do recurso no tocante àquelas referidas 
 disposições.
 
  
 Com efeito, o artigo 70º, n.º 1, alínea b), da LTC admite recurso para o 
 Tribunal Constitucional de decisões dos tribunais que apliquem norma cuja 
 inconstitucionalidade haja sido suscitada no processo, o que naturalmente se não 
 compagina com a mera invocação, pelo recorrente, de uma interpretação normativa 
 que não se encontre minimamente referenciada, ainda que de forma implícita, na 
 decisão recorrida.
 
  
 O despacho recorrido, após ter efectuado uma análise interpretativa do artigo 
 
 28º, n.º 1, da Lei n.º 34/2004, mormente no confronto com a correspondente norma 
 da Lei n.º 30-E/2000, que continha o precedente regime de concessão de apoio 
 judiciário, acaba por concluir, no que estritamente se refere à matéria de 
 constitucionalidade, que não está garantido no texto constitucional um duplo 
 grau de jurisdição (permitindo entrever que a sobredita norma do artigo 28º, n.º 
 
 1, não viola o princípio do acesso ao direito), e não faz qualquer alusão aos 
 artigos 9º do Código Civil e 399.° do Código de Processo Penal. Por outro lado, 
 estas últimas disposições  (estabelecendo, num caso, os critérios gerais de 
 interpretação da lei, e, noutro, um princípio geral de recurso em processo 
 penal), apenas indirectamente poderiam interferir na resolução jurídica do caso 
 concreto, que se prende com a questão central de saber se é admissível recurso 
 da decisão que, em sede de impugnação judicial, tenha confirmado o indeferimento 
 do pedido de apoio judiciário, e que, por isso, convoca apenas a aplicação das 
 normas do regime de protecção jurídica que regulam especialmente essa matéria.
 
  
 Ou seja, um recurso de constitucionalidade que tivesse por objecto as referidas 
 disposições da lei geral (civil ou processual penal) pressupunha que a decisão 
 recorrida tivesse formulado quaisquer considerações que, tendo relevância para a 
 decisão do caso, permitissem autonomizar um certo sentido interpretativo desses 
 mesmos preceitos legais.
 
  
 Sucede que o despacho recorrido não faz qualquer referência aos artigos 9º do 
 Código Civil e 399.° do Código de Processo Penal e a pronúncia que é feita 
 quanto à inexistência de um direito constitucionalmente garantido de um duplo 
 grau de jurisdição não permite extrair qualquer ilação de valor jurídico quanto 
 ao âmbito de aplicação das aludidas disposições, pelo que não teria qualquer 
 justificação o prosseguimento do recurso nessa parte.
 
  
 
 É ponto assente, por outro lado, que o Tribunal Constitucional não possui 
 competência, nem para apreciar as decisões judiciais, em si mesmas consideradas 
 
 – e integra ainda a decisão o processo interpretativo seguido pelo tribunal 
 recorrido -, nem para proceder à interpretação do direito ordinário, sendo que, 
 nos termos do citado artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal 
 Constitucional, os seus poderes de cognição se circunscrevem à apreciação de 
 normas ou interpretações normativas (note-se: interpretações normativas, 
 enquanto resultados interpretativos, e não processos interpretativos, enquanto 
 meios destinados ao apuramento do sentido da lei), tal como foram acolhidas pelo 
 tribunal recorrido (o que pressupõe que não pode o recurso de 
 constitucionalidade servir para obter uma declaração sobre a melhor 
 interpretação do direito ordinário).
 
  
 Por isso não releva que a decisão recorrida possa ter representado uma errónea 
 aplicação da lei (ou que solução diversa tenha já sido seguida noutros casos), 
 quando o que está em causa é apenas a possível inconstitucionalidade da 
 interpretação que tenha sido concretamente aplicada.
 
  
 Afigura-se, pois, ser de manter a decisão reclamada nesta parte.
 
  
 Acresce que não há também motivo para alterar o julgado quanto ao não  
 provimento do recurso, no que se refere às normas dos artigos 26º, n.º 2, 27º e 
 
 28º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, segmento decisório que a reclamante 
 parece, aliás, não ter posto sequer em causa.
 
  
 
  Na verdade, como é entendimento jurisprudencial corrente, o legislador 
 ordinário não está vinculado a admitir em todos os casos um duplo grau de 
 jurisdição e essa orientação mantém plena validade quando se reporta à decisão 
 judicial tirada sobre impugnação da decisão administrativa que indefere o 
 requerimento de protecção jurídica.
 
  
 
 3. Decisão
 Nestes termos, acordam em indeferir a reclamação e confirmar a decisão 
 reclamada.
 
  
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
 
 Lisboa, 9 de Outubro de 2007
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão