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Processo nº. 601/05
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
  
 Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 A – Relatório
 
  
 
             1 – A. requer a aclaração do Acórdão n.º 140/2006, proferido nos 
 autos, nos termos seguintes:
 
  
 
   “[…] ao abrigo do disposto nos art.ºs 69.º da Lei n.º 28/82, de 15.11, 716.º e 
 
 669.º do CPC, requerer o esclarecimento do Acórdão nos termos e com os seguintes 
 fundamentos:
 
  
 O ora requerente interpôs recurso para este Tribunal, afirmando pretender “ver 
 apreciada a questão da constitucionalidade da norma constante da alínea e) do 
 n.º 1 do art. 400.º do CPP, ratio decidendi da decisão recorrida, quando 
 interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o STJ nos casos em 
 que o Tribunal da Relação profere decisão de rejeição do recurso interposto pelo 
 arguido da decisão da 1ª instância, não apreciando o mérito do recurso que lhe 
 foi submetido à apreciação, por falta de concisão das conclusões.”
 
  
 Concluiu o requerente que “deve ser julgada inconstitucional a norma constante 
 da alínea e) do n.º 1 do art. 400.º do Código de Processo Penal, quando 
 interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o Supremo Tribunal 
 de Justiça nos casos em que o Tribunal da Relação profere decisão de rejeição do 
 recurso interposto pelo Arguido da decisão condenatória da 1.ª instância, não 
 apreciando o mérito da causa que lhe foi submetida com fundamento na falta de 
 concisão das conclusões [..]”.
 
  
 O Tribunal Constitucional, sem unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, 
 fundamentando, no essencial, a sua decisão do seguinte modo: “…a questão tem de 
 ver com a inadmissibilidade de recurso da decisão que rejeitou o recurso, não 
 conhecendo do seu mérito, pelo não cumprimento “capaz” de ónus processuais que 
 impendem sobre o recorrente –, o certo é que, aqui, a inadmissibilidade do 
 recurso para o STJ respeita a uma decisão da Relação cujo não conhecimento do 
 mérito do recurso para ela interposto se baseia num incumprimento do ónus de 
 concisão das conclusões da motivação do recorrente, apesar de convidado a 
 fazê-lo”.
 
  
 Salvo melhor opinião, o Tribunal é ambíguo quando usa a expressão “não 
 cumprimento “capaz” de ónus processuais” a fls. 18 da fundamentação do Acórdão.
 
  
 Sendo certo que sobre o recorrente recaía o ónus de concisão das conclusões da 
 motivação do recurso, não podemos deixar de reconhecer que ele lhe deu 
 cumprimento quando reduziu as suas conclusões de 237 para 214.
 
  
 A solução apresentada no Acórdão parece partir do pressuposto que o recorrente, 
 tendo sido convidado a apresentar nova motivação do recurso, suprindo a 
 prolixidade das conclusões que inicialmente formulara, não o fez, ignorando o 
 
 ónus que sobre ele recaía.
 
  
 Todavia, aceitando o convite, o então recorrente, sintetizou as suas conclusões.
 
  
 O Tribunal da Relação de Coimbra manteve acerca delas o seu juízo de 
 prolixidade, manteve a sua perspectiva, conforme o Acórdão a fls. 18 reconhece.
 
  
 Onde o Acórdão é ambíguo é na sua perspectiva sobre a capacidade do recorrente 
 em cumprir com o convite formulado para reduzir as suas conclusões.
 
  
 Dir-se-á que não competirá ao TC saber se houve ou não efectiva concisão.
 
  
 Mas certamente competirá ao STJ, como já aconteceu (Ac. Do STJ de 15/01/2004, 
 proferido no Pº 03P3472, relatado pelo Juiz Conselheiro Rodrigues da Costa).
 
  
 Só não houve recurso para o STJ, neste caso, em obediência a uma norma que 
 limita o recurso para o STJ em função da moldura penal.
 
  
 Não se pode, contudo, ignorar que o Juiz, ao ajuizar sobre a prolixidade recorre 
 a critérios estritamente subjectivos, sem qualquer concretização legal.
 
  
 E seria igualmente nessa medida, na medida em que o juízo sobre prolixidade está 
 na completa discricionariedade do Juiz que deveria ser julgada inconstitucional 
 a norma constante da alínea e) do n.º 1 do art. 400.º do Código de Processo 
 Penal, quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o 
 Supremo Tribunal de Justiça nos casos em que o Tribunal da Relação profere 
 decisão de rejeição do recurso interposto pelo Arguido da decisão condenatória 
 da 1.ª instância, não apreciando o mérito da causa que lhe foi submetida com 
 fundamento na falta de concisão das conclusões.
 
  
 Essa discricionariedade, levada ao limite, poderá levar ao absurdo, que por mera 
 hipótese lógica se tem de colocar.
 
  
 Ao absurdo de um Juiz rejeitar um recurso por considerar prolixa 1 única 
 conclusão apresentada por um recorrente que antes de cumprir com o convite para 
 ser mais conciso, tinha sintetizadas 20 conclusões na motivação do seu recurso.
 
  
 Este Tribunal manteria a mesma ambiguidade que tem no caso concreto quando usa a 
 expressão “não cumprimento “capaz” de ónus processuais” a fls. 18 da 
 fundamentação do Acórdão?
 
  
 Por outro lado, o Acórdão faz um ambíguo paralelismo ente o regime das nulidades 
 processuais imputadas à decisão condenatória e o caso dos autos em que o 
 Tribunal da Relação rejeita o recurso por falta de concisão das conclusões
 
  
 Salvo sempre o devido respeito, a decisão de rejeição do recurso não é nula, 
 tendo inclusivamente cumprido com o dever de especificar sumariamente os 
 fundamentos da decisão.
 
  
 A questão está em que tais fundamentos – prolixidade do recurso – não existem na 
 Lei.
 
  
 Tendo sido vedado ao recorrente sindicar tais fundamentos em função do estatuído 
 na alínea e) do n.º 1 do art. 400º do Código de Processo Penal.
 
  
 E assim o recorrente viu-se impedido de ter uma reapreciação material do seu 
 caso. Injustiça!
 
  
 Termos em que se requer o esclarecimento das ambiguidades contidas no Acórdão”.
 
  
 
             
 
             2 – O Procurador-Geral Adjunto, no Tribunal Constitucional, 
 respondeu ao pedido de aclaração, dizendo:
 
  
 
             “1 – O pedido de aclaração deduzido é manifestamente improcedente, 
 já que a decisão recorrida é perfeitamente clara e insusceptível de dúvida 
 objectiva sobre o que nela se decidiu acerca da questão de constitucionalidade 
 suscitada.
 
             2 – Termos em que deverá rejeitar-se liminarmente tal pretensão”.
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
  
 
             3 - A aclaração justifica-se quando uma decisão é obscura ou ambígua 
 
 [art. 669.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Civil, aplicável ao processo 
 constitucional por mor do disposto no art. 69.º da Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro]. E a decisão é obscura quando o seu texto não consegue dar a entender 
 o pensamento do julgador. E é ambígua quando a decisão comporta mais de um 
 sentido.
 
  Repetindo o ensinamento de Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, 
 vol. V, págs. 151), “n[N]um caso, não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro 
 hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos”.
 
             
 
              4 – Ora, no caso em apreço, constata-se que o discurso do Acórdão é 
 perfeitamente claro quer no tocante à enunciação da questão de 
 constitucionalidade a decidir quer aos fundamentos nela convocados como ratio 
 decidendi quer ao sentido da decisão.
 
             O Acórdão aclarando explicita bem, ao contrário do que o requerente 
 alega, que este apresentou, em resposta ao convite feito pelo relator na 
 relação, novas conclusões da motivação do recurso interposto da decisão de 1.ª 
 instância para o Tribunal da Relação e que o mesmo Tribunal entendeu que tais 
 novas conclusões não davam cumprimento ao ónus de concisão. Por outro lado, o 
 Acórdão cuja aclaração se pede é também preciso no equacionar da questão de 
 constitucionalidade do artigo 400º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo 
 Penal, em função exactamente da compreensão normativa que o tribunal a quo lhe 
 emprestou, no quadro da actuação processual efectivamente acontecida.
 
             A expressão «não cumprimento “capaz”», que o requerente converte em 
 elemento preponderante da fundamentação do seu pedido de aclaração, outra coisa 
 não traduz que o sentido do juízo que foi feito pelo Tribunal da Relação 
 relativamente ao não cumprimento do ónus legal de concisão nas novas conclusões 
 apresentadas. Trata-se de uma formulação verbal que foi utilizada com tal 
 sentido, e por isso foi referida entre comas, já no discurso do despacho 
 recorrido. Não obstante isso, o certo é que o requerente não levantou 
 anteriormente quaisquer objecções quanto à sua inteligibilidade, denotando bem 
 ter apreendido o seu sentido.
 
             Em boa verdade, o que o recorrente pretende, a partir da 
 configuração de meras hipóteses “teste”, mas referentes a questão de 
 constitucionalidade diversa (porque atinente ao critério normativo a seguir no 
 cumprimento do ónus de síntese ou de concisão), é questionar a bondade dos 
 fundamentos aduzidos no Acórdão para concluir, como concluiu, pela 
 constitucionalidade da norma sindicada.
 
             Ora, tal desiderato está, todavia, fora do âmbito do instrumento 
 jurídico de aclaração da decisão judicial.
 
  
 
             5 – Pretexta, ainda, o reclamante que o “Acórdão faz um ambíguo 
 paralelismo ente o regime das nulidades processuais imputadas à decisão 
 condenatória e o caso dos autos em que o Tribunal da Relação rejeita o recurso 
 por falta de concisão das conclusões”. 
 
             Para que o discurso fundamentador possa ser considerado ambíguo é 
 necessário, como já se disse, que o mesmo seja susceptível de vários sentidos. 
 Nesta perspectiva, e atento o ónus de alegação decorrente dos princípios da 
 autonomia e autoresponsabilidade processuais, caberia, antes de mais, ao 
 requerente hipotizar quais esses sentidos e interrogar o Tribunal sobre qual 
 deles corresponderia ao seu pensamento pretendido externar. Nada disso o 
 requerente fez.
 
             Por outro lado, o discurso do Acórdão aclarando é bem esclarecedor 
 quanto ao ponto a que cinge a existência da homologia jurídica que toma como 
 relevante para considerar transponível a doutrina antes expendida para o caso 
 dos autos: em ambas as situações está em causa uma “dimensão normativa do 
 direito ao recurso que se mostra afectada de elementos processuais que não dizem 
 directamente respeito ao mérito da decisão recorrida”.
 
             Ora, também aqui, o que o recorrente acaba por fazer é controverter 
 a correcção desse juízo de homologia, com base na acentuação das diferenças de 
 regime que as situações processuais postas em presença evidenciam em outros 
 aspectos.
 
             O pedido de aclaração não está, porém, legalmente conformado para 
 este fim.
 
             
 
             Temos, pois, de concluir pelo indeferimento do pedido.
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide indeferir o pedido de aclaração e condenar o requerente nas custas, 
 fixando a taxa de justiça em 15 Ucs.
 
             
 Lisboa, 23 de Março de 2006
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos