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Processo n.º 767/07
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I – RELATÓRIO
 
  
 
  
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é 
 recorrente A. e recorridos o MINISTÉRIO PÚBLICO e B., a Relatora proferiu a 
 seguinte decisão sumária:
 
  
 
 «I – RELATÓRIO
 
  
 
  
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é 
 recorrente A. e recorridos o MINISTÉRIO PÚBLICO e B., a primeira interpôs 
 recurso para este Tribunal, em 1 de Julho de 2007, “da douta decisão de 17 de 
 Junho de 2007” (fls. 66), através da qual o Presidente do Tribunal da Relação do 
 Porto, então em exercício, indeferiu a reclamação “do despacho que não admitiu o 
 recurso do despacho que a Condenou na taxa de Justiça de 3 Ucs, em despacho que 
 INDEFERIU a ACLARAÇÃO da REFORMA quanto a CUSTAS de 3 Ucs e da respectiva 
 CONDENAÇÃO em CUSTAS com Taxa de Justiça de 4 ucs” (fls. 59).
 
  
 Com o recurso agora interposto, ao abrigo da alínea b) do art. 70º da LTC, 
 pretende a recorrente que este Tribunal Constitucional aprecie a 
 
 “inconstitucionalidade da norma do art. 678º, nº 1 do C.P.Civil quando entendida 
 como aplicável aos recursos interpostos de decisões que, proferidas ao abrigo do 
 disposto no art. 16º, n.º 1 do Código das Custas Judiciais, condenem as partes 
 em custas entre 1 UC e 20 UC., por violação do disposto no art. 13º da 
 Constituição” (fls. 66). 
 
  
 II – INADMISSIBILIDADE DO RECURSO
 
  
 
 2. Apesar de o n.º 1 do artigo 76º da LTC conferir ao tribunal recorrido – in 
 casu, o Tribunal da Relação do Porto – o poder de apreciar a admissibilidade do 
 recurso, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do 
 n.º 3 do mesmo preceito legal. Assim, antes de mais, cumpre apreciar se estão 
 preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos 
 artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
 
  
 
 3. No sistema português de fiscalização sucessiva concreta da 
 constitucionalidade, o Tribunal Constitucional só é órgão de recurso de decisões 
 sobre a constitucionalidade de normas, proferidas a título incidental, no âmbito 
 de processos jurisdicionais. Tal significa que este Tribunal apenas pode julgar, 
 em sede de recurso, da bondade das decisões dos tribunais comuns, quando estes 
 
 últimos tenham sido colocados perante uma precisa questão de 
 inconstitucionalidade que os tenha obrigado a decidir sobre ela.
 
  
 Ora, nos presentes autos, a recorrente, em sede de reclamação da decisão que não 
 lhe admitiu o recurso de agravo por si interposto, vem argumentar do seguinte 
 modo:
 
  
 
 “O entendimento segundo o qual o disposto no art. 678º, n.º 1 do C.P.Civil se 
 aplica às condenações fundadas em manifesta improcedência das pretensões 
 deduzidas, na medida em que contradiz o disposto no art. 456º, nº 3 do C.P.Civil 
 
 é inconstitucional, pois viola o princípio da igualdade consagrado no art. 13º 
 da Constituição da República, segundo o qual, as situações da vida que, de um 
 ponto de vista substancial, sejam iguais, devem ser igualmente tratadas pela 
 lei, para além de violar o disposto no art. 20º do mesmo Texto Fundamental 
 quando consagra o acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva.” 
 
 (fls. 12).
 
  
 Ou seja, todo o esforço argumentativo da recorrente, em sede de reclamação para 
 o Presidente do Tribunal da Relação do Porto, incide na tentativa de 
 demonstração da aplicabilidade da norma prevista no n.º 3 do artigo 456º do CPC 
 ao caso em apreço, de modo a que a norma contida no n.º 1 do artigo 678º do CPC 
 pudesse ser interpretada de modo a permitir o direito de recurso quando a 
 decisão sobre fixação de custas judiciais não excedesse a alçada do tribunal de 
 primeira instância.
 
  
 
 4. Assim, o que a recorrente apelidou de inconstitucional, em sede de reclamação 
 para o Presidente do Tribunal da Relação do Porto, foi uma interpretação da 
 norma contida no n.º 1 do artigo 678º do CPC que considerasse que não haveria 
 direito a recurso de “condenações em manifesta improcedência das pretensões 
 deduzidas” (cfr. fls. 12). Mas a verdade é que, em parte alguma, a recorrente 
 suscitou a questão de saber se a norma do n.º 1 do artigo 678º do CPC poderia 
 ser configurada como inconstitucional por não permitir o recurso de decisões que 
 incidissem sobre questões cujo valor de custas oscile “entre 1 UC e 20 UC” (fls. 
 
 66).
 
  
 Tanto assim é que o fundamento da decisão recorrida versa exclusivamente sobre 
 se a condenação da recorrente em custas processuais equivaleu a uma condenação 
 por litigância de má fé e não sobre a irrecorribilidade de decisões cujo valor 
 de custas oscile entre 1 e 20 UC´s. Aliás, a própria decisão recorrida afirma 
 expressamente que a condenação em custas não resultou do facto de ter dado por 
 verificada uma ostensiva e manifesta improcedência do pedido:
 
  
 
 “Só que o Tribunal não as considerou assim tão gravosas. E, se tal acontecesse, 
 talvez o sujeito processual não fosse a parte, mas quem a representa.” (fls. 
 
 58).
 
  
 Em suma, a decisão ora recorrida não aplicou efectivamente a interpretação do 
 n.º 1 do artigo 678º do CPC que a recorrente lhe imputa, simplesmente porque 
 esta, conforme lhe competia, não suscitou adequadamente a questão da 
 inconstitucionalidade que serve de objecto ao presente recurso, em momento 
 prévio ao da decisão tomada pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto. 
 Como tal, por força do n.º 2 do artigo 72º da LTC, a recorrente não pode vir 
 agora interpor recurso para o Tribunal Constitucional com este fundamento.
 
  
 
 5. Por fim, refira-se ainda que, mesmo que estes obstáculos processuais não se 
 dessem por verificados, deveria ter-se presente que uma hipotética decisão 
 favorável à recorrente permaneceria sempre privada de qualquer utilidade 
 processual. É que a decisão recorrida considerou ainda, a título subsidiário, 
 que – mesmo que os seus argumentos procedessem – a recorrente já havia deixado 
 expirar o prazo legal para impugnar a decisão sobre as custas. Assim, veja-se:
 
  
 
 “Aliás, se o que está em jogo é a condenação propriamente dita, a apreciação das 
 custas deveria processar-se nos termos dos arts. 666.º, nºs 1 e 2 e 669.º n.º 1, 
 b), do CPC. No que se deixou, no mínimo, ultrapassar o respectivo e competente 
 prazo.” (fls. 59).
 
  
 Como tal, ainda que se ultrapassasse a circunstância de a recorrente não ter 
 suscitado de modo processualmente adequado a norma cuja inconstitucionalidade se 
 pretende ver apreciada e a circunstância de a decisão recorrida não ter aplicado 
 efectivamente a interpretação referida no requerimento de recurso, sempre seria 
 manifesto que uma hipotética decisão favorável à recorrente, nesta sede de 
 fiscalização da inconstitucionalidade, nunca seria apta a alterar o sentido da 
 decisão recorrida. Acresce, portanto, mais esta razão para não se conhecer do 
 objecto do presente recurso.
 
  
 
  
 
             III. DECISÃO
 
  
 
  
 
             Nestes termos, e ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da 
 Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 
 
 13-A/98, de 26 de Fevereiro, e pelos fundamentos supra expostos, decide-se não 
 conhecer do objecto do recurso.
 
  
 
             Custas devidas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 
 UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de 
 Outubro.»
 
  
 
 2. Inconformada com esta decisão, vem a recorrente reclamar, para a conferência, 
 contra a não admissão do recurso, com os seguintes fundamentos: 
 
  
 
  
 
 «1.       Realça-se desde já — e para que não seja perdido tempo a duvidar-se — 
 que a questão que a recorrente tão penosamente vem arrastando por diversas 
 instâncias não tem quaisquer intuitos dilatórios, nem decorre, com a devida 
 vénia, de qualquer fundamentalismo conflitual. Não!
 
  
 Destina-se ela apenas a tentar repor — e pela última via possível — a legalidade 
 constitucional e pôr termo a uma prática judiciária que, por ser absolutamente 
 intimidatória, iníqua e arbitrária, condiciona e vinca de forma deficiente e 
 insalubre o diálogo entre os cidadãos e a Justiça, que é o mesmo que dizer, o 
 efectivo direito de acesso aos tribunais, assim como o direito a um processo 
 equitativo. Com efeito,
 
  
 O que está em causa na questão de fundo trazida até este Tribunal Constitucional 
 não é a de saber se um juiz pode ou não, ao longo de um processo judicial, 
 condenar as partes em penas pecuniárias, ainda que eufemisticamente chamadas de 
 custas, por aquilo que ele mesmo considere ser incidente anómalo estranho ao 
 normal desenvolvimento da lide. Não. É evidente que se aceita o princípio de que 
 todos os incidentes anómalos estranhos ao normal desenvolvimento da lide devem 
 ser sancionados com custas. O que unicamente se pretende questionar é se essa 
 prerrogativa legal é ou não susceptível de recurso ordinário.
 
  
 Na opinião do Mmo. Juiz da 1ª instância e do Exmo. Presidente do Tribunal da 
 Relação, louvando-se ambos no disposto no art. 678°, n°1 do C.P.Civil, a decisão 
 de condenação nas custas dos incidentes anómalos só é passível de recurso 
 ordinário se o valor dessas custas por si fixadas for superior a metade da 
 alçada do seu tribunal, isto é, se for superior a 1.870,49 €. Donde se segue, em 
 tal entendimento, que até 19 UC, ou seja, até 1.814,00 €, um juiz de 1ª 
 Instância poderá condenar qualquer uma das partes, sem apelo nem agravo, por 
 uma, duas, cinco, dez ou cem vezes ao longo do mesmo processo, sempre que ele, 
 só ele e mais ninguém, entenda que a parte, ao requerer a prática de qualquer 
 acto, suscitou incidente anómalo estranho ao normal desenvolvimento da lide.
 
  
 
 É certo que uma interpretação estritamente literal do art. 678°, n°1 do 
 C.P.Civil permite sustentar essa opinião.
 
  
 Porém, numa interpretação conforme à Constituição que nos rege, nunca e 
 nenhures, adianta-se desde já, tal entendimento poderá ser acolhido.
 
  
 
 2.         Mas a questão que agora nos ocupa não é essa, mas sim uma outra e 
 prévia, suscitada pela Exma. Senhora Juiz Conselheira deste Tribunal, quando 
 afirma que o presente recurso é inadmissível porque: 
 
  
 a.         todo o esforço argumentativo da recorrente, em sede de reclamação 
 para o Presidente do Tribunal da Relação do Porto, incide na tentativa de 
 demonstração da aplicabilidade da norma prevista no nº 3 do artigo 456° do CPC 
 ao caso em apreço, de modo a que a norma contida no n°1 do artigo 678° do CPC 
 pudesse ser interpretada de modo a permitir o direito de recurso quando a 
 decisão sobre fixação de custas judiciais não excedesse a alçada do tribunal de 
 primeira instância. (sic, fls. 3, linhas 3 a 8 da decisão sumária sob 
 reclamação).
 
  
 b.         mas a verdade é que, em parte alguma, a recorrente suscitou a questão 
 de saber se a norma do n°1 do art. 678° do CPC poderia ser configurada como 
 inconstitucional por não permitir o recurso de decisões que incidissem sobre 
 questões cujo valor de custas oscile “entre 1 UC e 20 UC «is. 66) (sic, fls. 3, 
 linhas 12 a 15 da decisão sumária sob reclamação).
 
  
 c.         tanto assim é que o fundamento da decisão recorrida versa 
 exclusivamente sobre se a condenação da recorrente em custas processuais 
 equivaleu a uma condenação por litigância de má fé e não sobre a 
 irrecorribilidade de decisões cujo valor oscile entre 1 e 20 UC’s. (sic, fls. 3, 
 linhas 16 a 19 da decisão sumária sob reclamação).
 
  
 d.         a decisão ora recorrida não aplicou efectivamente a interpretação do 
 n°1 do artigo 678° do CPC que a recorrente lhe imputa, simplesmente porque esta, 
 conforme lhe competia, não suscitou adequadamente a questão da 
 inconstitucionalidade que serve de objecto ao presente recurso, em momento 
 prévio ao da decisão tomada pelo Presidente do Tribunal da Relação do Porto. 
 
 (sic, fls. 4, linhas 1 a 5 da decisão sumária sob reclamação).
 
  
 e.         a recorrente já havia deixado expirar o prazo legal para impugnar a 
 decisão sobre custas. (sic, fls. 4, linhas 10 e 11 da decisão sumária sob 
 reclamação). 
 
  
 Mas, salvo o devido respeito, nada disso é sequer verdade de um ponto de vista 
 factual. Senão vejamos, 
 
  
 Não é verdade o que acima se transcreveu sob a letra a. Com efeito, 
 
  
 O esforço argumentativo da recorrente, na sua reclamação para o Presidente da 
 Relação, centrou-se em dois aspectos: 
 
  
 a.         em primeiro lugar, na afirmação de que o disposto no art. 456°, n°3 
 se aplica às condenações em custas em quantia variável quando a causa seja, como 
 foi invocado pelo Mmo. Juiz no caso em apreço, por manifesta improcedência da 
 pretensão deduzida;
 b.         em segundo lugar na afirmação de que o entendimento segundo o qual o 
 disposto no art. 678°, n°1 do C.P. Civil se aplica às condenações fundadas em 
 manifesta improcedência das pretensões deduzida. na medida em que contradiz o 
 disposto no art. 456°, n°3 do C.P. Civil é inconstitucional, pois viola o 
 princípio da igualdade consagrado no art. 13° da Constituição da República, 
 segundo o qual, as situações da vida que, de um ponto de vista substancial, seja 
 iguais, devem ser igualmente tratadas pela lei, para além de violar o disposto 
 no art. 20º do mesmo Texto Fundamental quando consagra o acesso ao direito e a 
 uma tutela jurisdicional efectiva. (Leia-se, por favor, o que a ora reclamante 
 escreveu, a fls. 8 da sua reclamação para o Presidente do Tribunal da Relação).
 
  
 Desta simples leitura decorre, sem margem para quaisquer dúvidas, que a ora 
 reclamante suscitou, durante o processo, a inconstitucionalidade da norma do 
 art. 678°, nº 1 do CPC, ao contrário do que a Exma. Senhora Juiz Conselheira se 
 permitiu afirmar na decisão sumária ora sob reclamação. Pois afirmar-se que o 
 entendimento de uma determinada norma é inconstitucional é o mesmo que 
 afirmar-se que uma norma é inconstitucional quando entendida ou interpretada de 
 certa forma. 
 
  
 
 É certo e claro que o Presidente da Relação do Porto não conheceu da questão. 
 Mas tal circunstância não tem qualquer relevo visto que, não sendo a sua decisão 
 passível de recurso ordinário, basta, com a devida vénia, que a questão tenha 
 sido suscitada, como foi, perante a última instância judicial — art. 70º, n°2 da 
 LTC. 
 
  
 Pelo que, e salvo o devido respeito, são absolutamente inconcludentes as quatro 
 conclusões acima transcritas sob as letras a., b., c. e d. da decisão sumária 
 ora sob reclamação - A RECORRENTE SUSCITOU A QUESTÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE DA 
 NORMA DO N°1 DO ART. 678° DO CPC.
 
  
 Errada é também, com a devida vénia, a conclusão acima transcrita sob a letra 
 e). Com efeito, 
 
  
 Onde e quando é que a recorrente deixou expirar o prazo legal para impugnar a 
 decisão sobre custas?
 
  
 Quando a recorrente foi condenada a pagar 3 UC, na sequência do indeferimento do 
 pedido de reforma da decisão que não ordenou a notificação do BPN para juntar 
 aos autos a certidão por ela pretendida, requereu ela, no prazo legal de 10 dias 
 a reforma dessa decisão ao abrigo do disposto no art. 669°, nº 1, alínea b) do 
 C.P.Civil, o que, nos termos do disposto no art. 686°, nº 1 do C.P.Civil, 
 determinou que o prazo para recorrer da decisão que a condenou nas referidas 3 
 UC só tenha começado a correr depois da notificação da decisão proferida sobre o 
 requerimento de reforma. 
 
  
 E o certo é que a recorrente interpôs recurso da decisão que a condenou a pagar 
 as 3 UC no prazo legal de 10 dias contados após a decisão que lhe negou a 
 reforma da decisão condenatória, ou seja, no prazo legal. 
 
  
 Sendo certo que nesse mesmo acto interpôs recurso da decisão que a condenou em 4 
 UC, portanto, igualmente em prazo.
 
  
 Os argumentos constantes das decisões recorridas nunca devem ser aceites 
 acriticamente pelos tribunais de recurso..., pois correm o risco de estar 
 errados, como foi e é o caso.
 
  
 De concluir é, pois, que ao contrário do que foi afirmado na decisão sumária ora 
 sob reclamação, a questão da inconstitucionalidade da norma do art. 678°, n°1 do 
 C.P.Civil foi suscitada durante o processo, logo na reclamação para o Presidente 
 da Relação, imediatamente após ter sido invocada pelo Mmo. Juiz da 1a Instância 
 como fundamento legal da não admissão dos recursos.
 
  
 De concluir é também que o facto de o Presidente da Relação não se ter 
 pronunciado sobre tal questão não tem qualquer relevo nesta sede porquanto a sua 
 decisão não admitia recurso ordinário.
 
  
 De concluir é, por fim, que ao contrário do que igualmente foi afirmado na 
 decisão sumária sob reclamação, a ora reclamante não deixou expirar qualquer 
 prazo legal de recurso, ao contrário do que erradamente foi afirmado pelo 
 Presidente da Relação e acriticamente sufragado na referida decisão sumária.
 
  
 Impondo-se por isso e com a devida vénia, determinar-se a admissão do recurso 
 interposto, como acto de elementar Justiça Constitucional.
 
  
 Para além disto,
 
  
 Incerta da sua leitura por quem de Direito, não pode no entanto a ora reclamante 
 deixar de sumariar seguidamente os factos que reputa de mais relevantes da 
 questão em apreço, para que este Tribunal aquilate e pondere se a mesma tem ou 
 não dignidade para ser apreciada em sede de constitucionalidade das leis e da 
 sua aplicação pelos tribunais judiciais. Para que das decisões constitucionais 
 nunca se diga, como das judiciais antigamente se dizia, fundamentá-las para quê 
 se de nós só para Deus...
 
  
 Assim:
 
  
 Numa acção em que a ora reclamante é autora e cujo valor processual é muito 
 superior ao de qualquer imaginável alçada judicial, requereu ela, durante o 
 desenvolvimento do processo, que determinada entidade fosse notificada para 
 juntar aos autos determinado documento que ela confessadamente tinha em seu 
 poder. O que constitui, em qualquer latitude, o mais simples e comezinho acto de 
 normal desenvolvimento da lide.
 
  
 O Mmo. Juiz da causa, manifestamente sem sequer pensar na razão que invocou para 
 indeferir tal pretensão, deu como fundamento um argumento totalmente absurdo não 
 apenas de um ponto de vista lógico-jurídico, mas até de um ponto de vista da 
 lógica tout court, afirmação que aqui agora se reitera com o conforto da decisão 
 da Relação do Porto, já transitada em julgado que, revogando tal despacho, 
 inequivocamente o reconheceu.
 
  
 A ora reclamante, apesar de saber que podia recorrer desse despacho, como aliás 
 veio a fazê-lo, visto que felizmente a sua acção tinha valor superior à alçada 
 do tribunal, entendeu todavia apresentar apenas — atenta a evidência e dimensão 
 do absurdo do fundamento nele invocado e em nome do princípio da economia 
 processual — um singelo pedido de reforma do despacho, ao abrigo do disposto no 
 art. 669° do C.P.Civil, com vista a que o Mmo Juiz, já perante a evidência de se 
 tratar de um manifesto lapso na qualificação jurídica dos factos, já perante a 
 imperiosa constatação de que do processo constavam elementos que, só por si, 
 implicavam necessariamente decisão diversa da proferida, eventualmente 
 modificasse a sua decisão ou, no mínimo, a elucidasse e esclarecesse quanto à 
 lógica, ostensivamente oculta, da sua ratio decidendi, ou seja, da sua 
 fundamentação. 
 
  
 O Mmo. Juiz, porém, em acto de auto-análise, sentenciou nos termos seguintes:
 
  
 Sem necessidade de qualquer ponderação suplementar, é meu entendimento que o 
 despacho em causa é absolutamente linear, claro e inteligível, pelo que não 
 necessita de qualquer aclaração.
 Na eventualidade de não concordar com o teor do mesmo — que é o que aparenta 
 suceder — então deve o Autor reagir em conformidade. 
 Pelo exposto indefiro a aclaração requerida.
 Custas do incidente pela Autora, com taxa de justiça que fixo em 3 UC.
 
  
 
 (Dir-se-á aqui, e a título de parêntesis, que o Tribunal da Relação do Porto, em 
 douto acórdão de 10 de Julho de 2007, já transitado em julgado, naturalmente 
 revogou o despacho que motivara o pedido de reforma (doc. que se anexa).
 
  
 Retornando, temos que a autora, perante esta decisão, tomou duas atitudes 
 processuais distintas: 
 
  
 a.         recorreu, como era seu direito, da decisão cuja reforma pretendera, 
 recurso esse que culminou com a decisão acima anexada; 
 b.         requereu, como igualmente era seu direito, e igualmente ao abrigo do 
 disposto no art. 669° do C.P.Civil, a reforma da decisão que a condenou nas 
 custas.
 
  
 Neste pedido de reforma da decisão que a condenou em custas, a autora tentou 
 sensibilizar o Mmo. Juiz para a circunstância de o seu pedido de reforma do 
 primitivo despacho não ser nem manifestamente impertinente, nem ostensivamente 
 dilatório, pugnando portanto pela supressão, mediante reforma, da decisão que o 
 condenara em custas, citando até, em abono da sua pretensão, uma anotação 
 concorde do Exmo. Juiz Conselheiro Salvador da Costa.
 
  
 O Mmo. Juiz, porém, relembrando a autora que o seu despacho era “absolutamente 
 linear, claro e inteligível, pelo que não necessita de qualquer aclaração “, e 
 afirmando estar-se perante um caso de manifesta improcedência do pedido de 
 aclaração, não apenas entendeu que a decisão de condenação em custas não merecia 
 qualquer reforma, como entendeu, apesar da simplicidade, para ele, da questão, 
 de tão manifestamente improcedente que ela era, condenar de novo a autora 
 noutras custas, do segundo incidente de reforma, desta feita em 4 UC.
 
  
 Foi então e só então — e porque a lei não impunha nem impõe antecedência diversa 
 
 (art. 686°, nº1 do C.P.Civil), que a autora interpôs recurso de agravo, tanto da 
 decisão que a condenou nas custas de 3 UC, como da decisão que a condenou nas 
 custas de 4 UC.
 
  
 E foi então — e só então (a fls. 720) — que o Mmo. Juiz, apesar de reconhecer 
 que a acção tinha um valor superior ao da alçada da 1ª instância, veio afirmar, 
 lançando mão do disposto no art. 678º, n°1 do C.P.Civil, que a sucumbência da 
 Autora no que concerne às custas do incidente não é superior a metade dessa 
 mesma alçada. Como tal, logo por aí não pode o agravo ser admitido. O mesmo 
 sucede no que toca à condenação em custas decretada no despacho de fls. 694 (4 
 Uc), também ele de valor inferior a metade da alçada do Tribunal de 1ª Instância 
 Permitindo-se, em raciocínio aritmético que caso levasse a conclusão diversa 
 nunca empregaria, esclarecer que mesmo somando as duas condenações em custas, o 
 valor das mesmas (7Uc) não atinge o limite legal de que depende a 
 admissibilidade do recurso. Concluindo pela inadmissibilidade do recurso, dessa 
 vez sem custas, apesar da aparente linearidade da solução encontrada. 
 
  
 Perante esta decisão judicial, em que o Mmo. Juiz decidiu não admitir o recurso 
 ou os recursos com fundamento no disposto no art. 678°, n°1 do C.P.Civil, à 
 autora só lhe restava uma única via, que usou, de reclamar para o Presidente da 
 Relação do Porto, no sentido de ver admitidos os recursos que pretendera 
 interpor. 
 
  
 Nessa sua reclamação para o Presidente da Relação do Porto a autora suscitou 
 logo então — visto que antes não o podia ter feito — a questão da 
 inconstitucionalidade da norma do art. 678°, n°1 do C.P.Civil quando entendida 
 como aplicável às decisões que condenassem as partes processuais nas custas de 
 incidentes suscitados ao longo do processo.
 
  
 Daí que, reitera-se, ao contrário do que foi agora sentenciado pela Exma. 
 Senhora Juiz Conselheira deste Tribunal Constitucional, a autora, aqui 
 reclamante, não haja omitido a observância de qualquer ónus de que legalmente 
 dependesse o conhecimento do presente recurso de fiscalização sucessiva de 
 constitucionalidade.
 
  
 Devendo, por isso, o processo prosseguir com notificação para alegações.»
 
  
 
 3. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal, notificado da 
 referida reclamação, veio responder-lhe nos termos seguintes: 
 
  
 
  
 
 «O representante do Ministério Público, neste Tribunal, notificado nos autos à 
 margem referenciados, do teor da reclamação apresentada, vem dizer que a mesma 
 não põe em causa a múltipla fundamentação constante da decisão sumária, que não 
 conheceu do objecto do recurso, motivo pelo qual deverá aquela ser indeferida»
 
  
 
             4. Notificado para o efeito, o recorrido B. não apresentou resposta 
 dentro do prazo legalmente fixado.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar e decidir. 
 
  
 
  
 II – FUNDAMENTAÇÃO 
 
  
 
 5. A reclamante não logra demonstrar a suscitação das questões de 
 inconstitucionalidade de forma processualmente adequada, perante o tribunal “a 
 quo”, de modo a que este delas estivesse obrigado a conhecer.
 
  
 A jurisprudência consolidada deste Tribunal tem sempre considerado não ser 
 bastante aos recorrentes afirmarem, perante os tribunais recorridos, que 
 determinada norma (ou interpretação normativa) padece de inconstitucionalidade. 
 Mais do que isso, os recorrentes devem suscitar um incidente de 
 inconstitucionalidade através do qual coloquem em crise uma precisa 
 interpretação normativa reputada de inconstitucional. Só quando a 
 inconstitucionalidade da interpretação normativa suscitada perante o tribunal 
 recorrido corresponde àquela colocada em sede de requerimento de recurso para o 
 Tribunal Constitucional poderá este dela conhecer, sob pena de subversão do 
 sistema português de fiscalização sucessiva concreta, que nega o modelo de 
 
 “recurso de amparo” e apenas atribui poderes a este órgão jurisdicional de 
 fiscalização concentrada para conhecer de questões de inconstitucionalidade 
 colocadas por particulares por via de recurso.
 
  
 Ora, conforme admitido pela reclamante na sua reclamação, o único momento 
 processual em que a mesma suscitou uma questão de inconstitucionalidade 
 normativa foi precisamente na reclamação para o Presidente do Tribunal da 
 Relação do Porto, tendo-o feito nos seguintes termos:
 
  
 
             “O entendimento segundo o qual o disposto no art. 678º, nº 1 se 
 aplica às condenações fundadas em manifesta improcedência das pretensões 
 deduzidas, na medida em que contradiz o disposto no art. 456º, nº 3 do C.P.Civil 
 
 é inconstitucional, pois viola o princípio da igualdade consagrado no art. 13º 
 da Constituição da República, segundo o qual, as situações da vida que, de um 
 ponto de vista substancial, seja[m] iguais, devem ser igualmente tratadas pela 
 lei, para além de violar o disposto no art. 20º do mesmo Texto Fundamental 
 quando consagra o acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva.” 
 
 (fls. 12).
 
  
 Daqui decorre que a recorrente não suscitou, em parte alguma, a 
 inconstitucionalidade “da norma do art. 678º, nº 1 do C.P.Civil quando entendida 
 como aplicável aos recursos interpostos de decisões que, proferidas ao abrigo do 
 disposto no art. 16º, nº 1 do Código das Custas Judiciais, condenem as partes em 
 custas entre 1 UC e 20 UC” (fls. 66).
 
  
 
 6. Quanto à questão relativa à inutilidade processual do conhecimento da questão 
 suscitada, por força da expiração de prazo para reclamação das custas, importa 
 esclarecer que este Tribunal não detém poderes para conhecer, em sede de 
 recurso, de questões relativas ao Direito infra-constitucional. Ou seja, este 
 Tribunal não curou de determinar se a recorrente reclamou (ou não) em tempo das 
 custas fixadas pelo tribunal recorrido. A única questão relevante, para efeitos 
 de decisão sobre o conhecimento da questão de inconstitucionalidade suscitada, 
 reside em determinar se uma eventual decisão favorável à recorrente, a proferir 
 pelo Tribunal Constitucional, seria apta a alterar o sentido decisório do aresto 
 proferido pelo tribunal “a quo”.
 
  
 A decisão sumária agora reclamada limitou-se a ter em conta que “a decisão 
 recorrida considerou ainda, a título subsidiário, que – mesmo que os seus 
 argumentos procedessem – a recorrente já havia deixado expirar o prazo legal 
 para impugnar a decisão sobre as custas”. Significa isto que este Tribunal não 
 conheceu – nem tão pouco poderia tê-lo feito – sobre se o prazo para reclamação 
 das custas fixadas havia ou não expirado. Pelo contrário, a decisão sumária ora 
 reclamada limitou-se a constatar “que uma hipotética decisão favorável à 
 recorrente, nesta sede de fiscalização da inconstitucionalidade, nunca seria 
 apta a alterar o sentido da decisão recorrida”, visto que o Tribunal da Relação 
 do Porto já havia considerado estar excedido o prazo de impugnação de custas.
 
  
 Como tal, todas as considerações tecidas pela recorrente no sentido de 
 demonstrar que o referido prazo não foi ultrapassado revelam-se manifestamente 
 irrelevantes para os presentes autos, na medida em que este Tribunal não pode 
 revogar, em sede de recurso, decisões dos tribunais recorridos que digam 
 exclusivamente respeito à aplicação do Direito infra-constitucional, sendo ainda 
 certo que, quanto a este ponto, não vem aqui colocada qualquer questão de 
 constitucionalidade normativa.
 
  
 Assim sendo, a presente reclamação é manifestamente improcedente.
 
  
 
  
 III – DECISÃO
 
  
 Pelos fundamentos supra expostos, e ao abrigo do disposto no do n.º 3 do artigo 
 
 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei 
 n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se indeferir a presente reclamação. 
 
  
 Custas devidas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC’s, nos 
 termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
 
  
 Lisboa, 12 de Outubro de 2007
 Ana Maria Guerra Martins
 Vítor Gomes
 Gil Galvão