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Processo n.º 877/05
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
  
 
  
 
                         Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                         1. Relatório
 
                         A. e B. e mais seis requerentes requereram, no Tribunal 
 do Trabalho de Lisboa, contra C., L.da, e D., ACE, providência cautelar de 
 suspensão de despedimento, aduzindo, em suma, o seguinte: (i) os requerentes 
 celebraram com a primeira requerida contratos de trabalho temporário, mediante 
 os quais passaram a prestar trabalho a diversas empresas utilizadoras, todas 
 pertencentes ao grupo de sociedades do Banco E., sendo que, pelo menos a partir 
 de Fevereiro de 2003, prestaram o seu trabalho à segunda requerida (com excepção 
 de uma requerente, que celebrou contrato de trabalho temporário com a primeira 
 requerida em 29 de Julho de 2003 e, desde então, prestou trabalho à segunda 
 requerida); (ii) apesar de os recibos de retribuição serem emitidos pela 
 primeira requerida, os requerentes prestaram trabalho sob as ordens, direcção e 
 fiscalização da segunda requerida, sem que existisse qualquer contrato de 
 utilização e, mesmo que existisse, o mesmo teria sido celebrado fora dos casos 
 tipificados no artigo 90.º do Decreto‑Lei n° 358/89, de 17 de Outubro; (iii) em 
 
 1 de Julho de 2004 foi celebrado, entre a primeira e a segunda requeridas, 
 contrato de prestação de serviços, mediante o qual a primeira requerida se 
 obrigava a desempenhar determinadas tarefas junto da segunda requerida, sua 
 cliente; (iv) porém, tal contrato não é um contrato de utilização de trabalho 
 temporário; (v) inexistindo contrato de utilização de trabalho temporário 
 celebrado entre a primeira e a segunda requeridas, nos termos do artigo 11.º do 
 Decreto‑Lei n° 358/89, e tendo os trabalhadores continuado ao serviço da 
 segunda requerida, sem que tivessem celebrado qualquer contrato com esta última 
 que legitimasse essa prestação de trabalho, tem aplicação o disposto no artigo 
 
 10.º do referido diploma legal, ou seja, os requerentes são considerados como 
 trabalhadores da segunda requerida, por tempo indeterminado; (vi) no dia 3 de 
 Janeiro de 2005, quando se preparavam para reentrar ao serviço nas instalações 
 da segunda requerida, os requerentes foram impedidos de entrar pelo “segurança” 
 e foi‑lhes comunicado que, por ordens da direcção, os requerentes estavam 
 impedidos de entrar nas instalações da segunda requerida, pois já não 
 trabalhavam para a mesma; (vii) tal constitui, no entender dos requerentes, um 
 despedimento ilícito, uma vez que não foi invocada pela entidade empregadora 
 alguma das causas de caducidade do contrato de trabalho, não foi promovido o 
 seu despedimento com justa causa, nem foi sequer instaurado procedimento 
 disciplinar – pelo que requereram que seja decretada a suspensão do 
 despedimento de que foram alvo por parte da segunda requerida.
 
                         Mais aduziram os requerentes – para a hipótese de se vir 
 a concluir pela inexistência de vínculo laboral entre eles e a segunda 
 requerida – que: (i) considerando‑se que tinham um contrato de trabalho com a 
 primeira requerida, na medida em que os contratos de trabalho temporário que com 
 ela celebraram não contêm a menção concreta dos factos e circunstâncias que 
 integravam esse motivo e, por outro lado, foram objecto de mais do que duas 
 renovações ou duraram mais do que três anos, pelo que se converteram em 
 contratos de trabalho sem termo, o que foi admitido pela primeira requerida; 
 
 (ii) no dia 3 de Janeiro de 2005 foi comunicado pela primeira requerida aos 
 requerentes que estes já não eram seus trabalhadores, tendo‑lhes sido recusada 
 a prestação de trabalho por alegadamente a posição de entidade empregadora se 
 ter transmitido para uma outra sociedade denominada Redware; (iii) tal recusa 
 consubstancia um despedimento de facto ilícito – pelo que requereram 
 subsidiariamente que fosse decretada a suspensão do despedimento de que foram 
 alvo por parte da primeira requerida.
 
                         A providência requerida foi liminarmente indeferida, por 
 despacho de 14 de Janeiro de 2005, do Juiz do 3.º Juízo do Tribunal do Trabalho 
 de Lisboa, com a seguinte fundamentação:
 
  
 
 “Há que apreciar, liminarmente, se o procedimento cautelar instaurado se adequa 
 
 à situação dada a conhecer pelos requerentes (cf. artigos 234.º‑A, n.º 1, e 
 
 234.º, n.º 4, alínea b), do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 
 
 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho e ainda artigo 32.º, 
 n.º 1, corpo, do Código de Processo do Trabalho).
 O Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de fixação de jurisprudência n.° 
 
 1/2003, de 1 de Outubro de 2003, publicado no Diário da República, I Série‑A, 
 de 12 de Novembro de 2003, pág. 7647 e seguintes, pronunciou‑se sobre o âmbito 
 de aplicação do procedimento cautelar de suspensão de despedimento. Aí se 
 pondera que «a concessão da providência cautelar tem de se bastar com uma 
 summario cognitio da situação através de um procedimento – o procedimento 
 cautelar – simplificado e rápido. Ou, por outras palavras, tem de se contentar 
 com a existência de fumus boni juris. A necessidade de celeridade e a natureza 
 provisória de providência cautelar sobrepõem‑se, necessária e inelutavelmente, 
 a um mais profundo e necessariamente mais moroso apuramento da existência, 
 natureza e dimensão do direito a tutelar, o que só é praticável na acção de que 
 o procedimento cautelar é dependente. Na vigência do CPT de 1981, era 
 entendimento comum, jurisprudencial e doutrinalmente, que o procedimento 
 cautelar de suspensão de despedimento só era admissível quando se verificassem 
 cumulativamente dois pressupostos: a inquestionável existência de um contrato de 
 trabalho entre requerente e requerido e a existência de inequívoco despedimento 
 levado a cabo pela entidade patronal. Daqui a inadmissibilidade da providência 
 nos casos em que as partes questionassem a natureza jurídica do contrato (de 
 trabalho ou de prestação de serviços) ou a qualificação da causa da sua cessação 
 
 (caducidade ou despedimento).» Face ao novo Código de Processo do Trabalho, 
 aprovado pelo Decreto‑Lei n° 480/99, de 9 de Novembro, o STJ considera não haver 
 razões para alterar esse entendimento. Segundo o STJ, o facto de no artigo 35.° 
 do Código de Processo do Trabalho se passar a autorizar a produção de outras 
 provas, que não a meramente documental, nos casos em que se invoque um 
 despedimento não antecedido de processo disciplinar, «apenas facilita a 
 constatação da existência do despedimento e não a indagação sobre se, invocada 
 outra causa para cessação da relação laboral pela entidade empregadora, ela é 
 ou não real e, se o não for, se não se está perante um verdadeiro despedimento 
 que, como tal, seja merecedor da providência cautelar da sua suspensão». Assim, 
 o STJ adere à jurisprudência contida no acórdão fundamento – do Tribunal da 
 Relação de Lisboa, de 6 de Março de 2002 – segundo a qual a providência cautelar 
 de suspensão de despedimento «só pode ser requerida e concedida quando for 
 indiscutível a existência de um contrato de trabalho a que a entidade 
 empregadora pôs fim por despedimento e não por invocação de qualquer outra 
 causa de cessação da relação laboral, por exemplo, por caducidade».
 Daí que o Supremo Tribunal de Justiça tenha uniformizado a jurisprudência no 
 sentido de que «o trabalhador despedido (individual ou colectivamente) pode 
 socorrer‑se do procedimento cautelar de suspensão de despedimento desde que 
 esta seja a causa invocada pela entidade patronal para cessação da relação 
 laboral ou, na sua não indicação, se configure a verosimilhança de um 
 despedimento».
 
             No caso dos autos, os requerentes dizem que foram objecto de 
 despedimento, sem justa causa nem antecedência de processo disciplinar, por 
 parte da sua entidade patronal, a segunda requerida. Só que essa é uma conclusão 
 jurídica que retiram a partir de uma situação complexa e controvertida, que 
 descrevem, que se inicia pela celebração de contratos de trabalho temporário 
 entre os requerentes e outra entidade (a primeira requerida), com base nos quais 
 os requerentes foram colocados a prestar trabalho para a segunda requerida. Em 
 parte alguma os requerentes alegam que entre eles e a suposta entidade 
 patronal, a segunda requerida, foi celebrado voluntária e conscientemente um 
 contrato de trabalho, ou que a segunda requerida se assumiu como sua entidade 
 patronal, ou seja, aceitou que entre os requerentes e a segunda requerida 
 vigorava um contrato de trabalho. Assim, também não resulta dos factos alegados 
 pelos requerentes que a recusa da segunda requerida em continuar a receber o seu 
 trabalho constituiu a manifestação de intenção, por parte da segunda requerida, 
 de os despedir, ou seja, de pôr termo a uma relação de trabalho subordinado 
 existente entre ela e os requerentes. Em vez da simples análise sobre se os 
 trabalhadores foram despedidos pela entidade empregadora sem antecedência de 
 processo disciplinar, ou mediante um processo disciplinar nulo, ou sem justa 
 causa, a qual constitui o objecto do procedimento cautelar de suspensão de 
 despedimento individual (artigo 39.º, n.º 1, do Código de Processo do 
 Trabalho), nestes autos os requerentes começam por forçar a indagação de 
 questões prévias e controvertidas, como é a da própria existência de um contrato 
 de trabalho entre os requerentes e a segunda requerida, contra quem é proposto 
 o procedimento cautelar a título principal. Prevendo a eventualidade de a 
 resposta a essa indagação lhes ser desfavorável, então os requerentes 
 apresentam, como questão a investigar subsidiariamente, e que também ela é 
 controvertida, que é a de os contratos de trabalho temporário celebrados com a 
 primeira requerida se terem convertido em contratos de trabalho sem termo e de 
 a declaração de não aceitação de trabalho por parte da primeira requerida 
 constituir um despedimento.
 O objecto do litígio apresentado pelos requerentes a este tribunal não se 
 coaduna com a natureza e o objecto próprios do procedimento cautelar de 
 suspensão de despedimento, conforme constitui jurisprudência obrigatória fixada 
 pelo Supremo Tribunal de Justiça.
 Conforme se acrescenta no citado acórdão do STJ, «se não se puderem socorrer do 
 procedimento cautelar de suspensão do despedimento – singular ou colectivo – não 
 deixam os trabalhadores de poder obter uma adequada providência cautelar, 
 através dos procedimentos cautelares – comum e especificados – regulados no 
 Código de Processo Civil, e que, pela natureza do conflito, sejam aplicáveis no 
 foro laboral». Para tanto terão de alegar os respectivos pressupostos, 
 nomeadamente a ocorrência de «lesão grave e dificilmente reparável ao seu 
 direito», que a providência possa adequadamente evitar (artigo 381.º n.° 1, do 
 Código de Processo Civil) – lesão essa que, aliás, neste procedimento cautelar 
 os requerentes não alegaram.”
 
  
 
                         Os requerentes agravaram deste despacho para o Tribunal 
 da Relação de Lisboa, terminando as respectivas alegações com a formulação das 
 seguintes conclusões:
 
  
 
 “1. A decisão recorrida, ao interpretar o artigo 39.° do Código de Processo do 
 Trabalho no sentido segundo o qual a providência cautelar de suspensão de 
 despedimento só pode ser requerida e concedida quando seja indiscutível a 
 existência de um contrato de trabalho a que a entidade empregadora tenha posto 
 fim por despedimento e não por invocação de qualquer outra causa de cessação da 
 relação laboral, é manifestamente inconstitucional, por violação dos artigos 
 
 20.º, 13.º e 53.º da Constituição da República Portuguesa.
 
 2. O artigo 39.° do CPT, interpretado de acordo com a Constituição, jamais 
 poderia excluir do seu campo de aplicação relações laborais e despedimentos 
 encapotados igualmente merecedores de uma tutela jurisdicional efectiva e 
 cautelar.
 
 3. A interpretação do artigo 39.°, n.° 1, do CPT, levada a cabo pelo tribunal a 
 quo, acaba por criar uma desigualdade de cariz substantivo: Passa a haver 
 trabalhadores de 1.ª, que merecem a tutela cautelar do seu direito, 
 constitucionalmente consagrado, de proibição dos despedimentos sem justa causa, 
 e os outros trabalhadores, que, por terem sido vítimas das manobras fraudulentas 
 da entidade patronal, não são merecedores de tutela cautelar.
 
 4. Tal interpretação da lei desemboca, inelutavelmente, numa clara violação do 
 direito à igualdade constitucionalmente consagrado no artigo 13.° da CRP.
 
 5. O Tribunal da Relação de Lisboa deverá, pois, em sede de fiscalização 
 concreta da constitucionalidade, desaplicar a norma resultante da errónea 
 interpretação que foi dada ao artigo 39.°, n.º  1, do CPT pelo Tribunal a quo.
 
 6. Nem se diga, como faz o Tribunal a quo, que tais trabalhadores não ficam 
 desprotegidos uma vez que «se não se puderem socorrer do procedimento cautelar 
 de suspensão de despedimento – singular ou colectivo –, não deixam de poder 
 obter uma adequada providência cautelar, através dos procedimentos cautelares – 
 comum e especificados – regulados no Código de Processo Civil e que, pela 
 natureza do conflito, sejam aplicáveis no foro laboral».
 
  7. Com efeito, em tais casos, não é possível invocar o perigo de lesão, uma vez 
 que, como vai sendo uma constante na nossa jurisprudência, «Se essa cessação foi 
 ilegal, então o direito do requerente já sofreu a lesão que tinha que sofrer, 
 não sendo concebível, pela própria natureza das coisas, o perigo de ocorrerem 
 novas violações».
 
 8. Mal andou a decisão recorrida quando refere: «Em parte alguma os requerentes 
 alegam que entre eles e a suposta entidade patronal, a segunda requerida, foi 
 celebrado voluntária e conscientemente um contrato de trabalho, ou que a 
 segunda requerida se assumiu como a sua entidade patronal, ou seja, aceitou que 
 entre os requerentes e a segunda requerida vigorava um contrato de trabalho».
 
 9. Bastará atentar ao alegado pelos ora agravantes nos artigos 111.º e seguintes 
 da petição de providência cautelar apresentada, para facilmente concluir que os 
 agravantes, contrariamente ao que é afirmado na decisão recorrida, não se 
 limitaram a invocar uma conclusão jurídica.
 
 10. Invoca ainda a decisão recorrida: «(...) também não resulta dos factos 
 alegados pelos requerentes que a recusa da requerida em continuar a receber o 
 seu trabalho constituiu a manifestação de intenção, por parte da segunda 
 requerida, de os despedir, ou seja, de pôr termo a uma relação de trabalho 
 subordinado existente entre ela e os requerentes».
 
 11. Bastaria atentar no alegado pelos agravantes nos artigos 137.° e seguintes 
 da petição de providência cautelar, maxime no alegado pelos agravantes no 
 artigo 139.°, para que o Tribunal a quo se desse conta da falta de pertinência 
 da questão suscitada.
 
 12. Ao julgar manifestamente improcedente a petição de providência cautelar 
 requerida pelos agravantes, a decisão recorrida procedeu a uma errada 
 interpretação do disposto no artigo 234.º‑A do Código de Processo Civil.
 
 13. Com efeito, a decisão recorrida não poderia ter julgado a providência 
 cautelar inevitavelmente vetada ao fracasso antes de ouvidas as requeridas e 
 produzida prova sumária dos factos alegados.
 
 14. Por outro lado, a decisão recorrida, ao indeferir liminarmente a petição 
 de providência cautelar, acolhendo a tese segundo a qual a providência cautelar 
 só pode ser requerida e concedida quando for indiscutível a existência de um 
 contrato de trabalho a que a entidade empregadora pôs fim por despedimento e 
 não por invocação de qualquer outra causa de cessação da relação laboral, não 
 permitindo a produção de prova sobre os factos invocados pelos agravantes, 
 procedeu a uma errada interpretação dos artigos 35.º e 39.°, n.° 1, do CPT, 
 violando as referidas normas legais.”
 
  
 
                         A este recurso foi negado provimento pelo acórdão do 
 Tribunal da Relação de Lisboa, de 13 de Julho de 2005, com a seguinte 
 fundamentação:
 
  
 
             “Afigura‑se nos que a decisão recorrida não merece qualquer censura, 
 sendo acertada.
 
             Na verdade, como refere, na contra‑alegação, a recorrida C., dos 
 factos articulados pelos requerentes, para que o Tribunal possa apreciar se 
 existiu ou não um despedimento sem justa causa, terá de se debruçar previamente 
 sobre a questão da validade ou invalidade dos contratos de trabalho temporário 
 celebrados entre os requerentes e a requerida C. e sobre o vínculo jurídico 
 existente entre esta e a segunda requerida (D.).
 
             Nos termos em que os requerentes configuram a situação jurídica 
 controvertida, é impossível ao Tribunal apreciar a questão do despedimento, 
 sem resolver previamente as questões relacionadas com o trabalho temporário.
 
             Só apreciando estas questões será possível averiguar quem é 
 efectivamente a entidade patronal dos requeridos, se existiu ou não um 
 despedimento em sentido próprio e se o mesmo ocorreu com ou sem justa causa.
 
             O procedimento cautelar de suspensão do despedimento é o meio 
 próprio para o trabalhador reagir contra um despedimento ilícito e obter um 
 reconhecimento provisório do seu direito.
 
             Este procedimento só tem razão de ser e só é, portanto, aceitável 
 nos casos de cessação do contrato de trabalho em que se discuta a justa causa 
 
 (ou a falta dela).
 
             Como procedimento cautelar, obedece aos mesmos requisitos gerais dos 
 procedimentos cautelares previstos no Código de Processo Civil, ou seja, tem de 
 existir a aparência do direito invocado (fumus boni juris) e tem de ser feita a 
 prova do periculum in mora.
 
             Com base nestes elementos, o juiz fará um juízo de mera 
 probabilidade de existência do direito invocado (summaria cognitio).
 
             Este juízo de mera probabilidade incide unicamente sobre o facto de 
 saber se o trabalhador foi despedido com ou sem justa causa, não se coadunando 
 com a resolução de outras questões atinentes à relação laboral.
 
             No âmbito do procedimento cautelar de suspensão do despedimento não 
 cabe, pois, discutir questões inerentes à qualificação do contrato existente 
 
 [entre] as partes, à forma de cessação dessa relação, à falta de motivação do 
 contrato e à sua conversão em contrato sem termo (cf. Albino Mendes Baptista, 
 Código de Processo do Trabalho Anotado, Quid Juris, 2000, pág. 84).
 
             Para que se possa recorrer a este meio processual, é necessário 
 pressupor a existência de um contrato de trabalho e de uma efectiva situação 
 de despedimento, com exclusão das situações emergentes da simples caducidade do 
 contrato de trabalho ou da nulidade do mesmo (neste sentido, António Abrantes 
 Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, IV, pág. 351).
 
             Este é, de resto, o entendimento jurisprudencial unânime (a título 
 exemplificativo, entre outros, Acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Janeiro de 
 
 1980, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 297, pág. 402; Acórdão da Relação 
 de Évora, de 11 de Julho de 2000, Colectânea de Jurisprudência, 2000, tomo IV, 
 pág. 287; Acórdão da Relação de Lisboa, Colectânea de Jurisprudência, tomo III, 
 pág. 54; Acórdão da Relação de Lisboa, de 4 de Junho de 2003, rec. n.° 
 
 9089/02-4.ª Secção, e Acórdão da Relação de Lisboa, de 28 de Janeiro de 2004, 
 rec. n.º 7471/03‑4.ª Secção).
 
             E nem se argumente que o disposto no artigo 35.º do CPT, quanto aos 
 meios de prova admissíveis no âmbito deste procedimento, pode indiciar uma 
 interpretação contrária.
 
             Os meios de prova consentidos pelo citado artigo 35.º destinam-se 
 exclusivamente a fundar a verosimilhança de um despedimento, nos casos em que 
 o mesmo não foi precedido de processo disciplinar.
 
             Não foi intenção do legislador permitir a discussão da natureza da 
 relação jurídica existente entre requerente(s) e requerido(s), mas tão‑somente 
 permitir a produção de meios de prova complementares nos casos em que o 
 despedimento não seja precedido de processo disciplinar (neste sentido Acórdão 
 de Uniformização de Jurisprudência, proferido pelo pleno da Secção Social do 
 STJ em 1 de Outubro de 2003 – Jurisprudência n° 1/2003, proc. n.º 3073/2002, 4.ª 
 Secção, Diário da República, I Série, de 12 de Novembro de 2003).
 
             Deste modo, para que o Tribunal conheça do pedido de suspensão do 
 despedimento são necessárias, à partida, três condições sine qua non, ou seja, 
 
 é necessário (i) que tenha havido um verdadeiro despedimento; (ii) que se saiba, 
 sem quaisquer dúvidas, quem praticou o acto qualificável como despedimento e, 
 finalmente, (iii) que seja líquida a existência de um contrato de trabalho 
 entre o despedido e a entidade que despede (neste sentido, Acórdão da Relação de 
 Lisboa, de 21 de Janeiro de 1998, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 473, 
 pág. 556).
 
             O procedimento cautelar de suspensão do despedimento é inadequado 
 para nele se averiguar a verificação destas condições.
 
             No caso vertente, é notório que as mesmas não se verificam, não 
 sendo possível, por isso, realizar um juízo indiciário sobre se ocorreu ou não 
 um despedimento sem justa causa.
 
             Desde logo, não é linear que exista um contrato de trabalho sem 
 termo entre os requerentes e as requeridas, dependendo tal questão da apreciação 
 da validade dos contratos de trabalho temporário celebrados.
 
             Por outro lado, não se descortina qual das duas requeridas terá 
 procedido efectivamente ao alegado despedimento.
 
             Nem, tão‑pouco, é liquido que tenha ocorrido efectivamente um 
 despedimento.
 
             De salientar que, quanto à segunda requerida, não é sequer alegado 
 qualquer facto susceptível de consubstanciar um despedimento por parte desta.
 
             Assim, é indiscutível que a apreciação do alegado despedimento dos 
 requeridos depende da discussão de questões várias, que se reconduzem, em última 
 análise, à questão da apreciação da validade dos contratos de trabalho 
 celebrados entre as partes.
 
             Estas considerações correspondem aos dados existentes nos autos, bem 
 como à doutrina e à jurisprudência, que pensamos serem maioritárias sobre a 
 questão, acolhidas no citado Acórdão, proferido no processo n.° 3073/2002 da 4.ª 
 Secção do STJ, de 1 de Outubro de 2003, que uniformiza a jurisprudência 
 
 (Jurisprudência n.° 1/2003).
 
             Alegam ainda os recorrentes que a decisão recorrida, na 
 interpretação que fez do artigo 39.º, n.° 1, do CPT, violou as normas dos 
 artigos 13.° – princípio da igualdade, 20.° – negação do acesso ao direito e 
 aos tribunais, e 53.° – segurança no emprego e proibição dos despedimentos sem 
 justa causa – todos da Constituição da República Portuguesa.
 
             Também esta alegação, a nosso ver, é desprovida de fundamento.
 
             Em síntese, diremos apenas o seguinte:
 
             No caso, não existe violação do princípio da igualdade, porquanto 
 não se pode equiparar a situação de alguém que intenta uma providência cautelar 
 de suspensão de despedimento, ancorado na existência de indiscutido contrato de 
 trabalho subordinado e de indiscutido despedimento, com a situação dos 
 requerentes, em que a natureza do contrato e a existência de despedimento são 
 discutíveis e que exigiriam discussão e apreciação prévias, que não são 
 compagináveis com a natureza da providência cautelar referida, que tem 
 natureza provisória e «tem de se bastar com uma summaria cognitio da situação 
 através de um procedimento – o procedimento cautelar – simplificado e rápido», 
 como refere o citado Acórdão do STJ uniformizador da jurisprudência.
 De qualquer modo, aos recorrentes não estava vedado o eventual recurso a outros 
 procedimentos cautelares previstos na legislação processual civil, por força do 
 disposto no artigo 47.° do Código de Processo do Trabalho e, genericamente, pela 
 alínea a) do n.° 2 do artigo 1.º do mesmo Código.
 Finalmente, podem os recorrentes instaurar acção declarativa, em que poderão 
 também discutir as referidas questões prévias da existência e natureza do 
 contrato, bem como da qualificação dos actos dos requeridos – se os mesmos se 
 traduzem em despedimento –, por forma a poderem defender, eficazmente, os seus 
 eventuais direitos.
 Não se verifica, assim, a violação do princípio constitucional da igualdade.
 Simplesmente, as situações em que os requerentes fundamentam a providência 
 cautelar não são lineares, são complexas e dependem de apreciação e decisão de 
 questões prévias fundamentais, que não cabem na natureza daquela providência 
 cautelar.
 Aliás, os requerentes contrataram tais situações e não outras (que denotassem 
 claramente a celebração de contratos de trabalho subordinado), não se podendo 
 agora queixar da situação para a qual também deram o seu contributo.
 As considerações precedentes valem igualmente para se dizer que a decisão 
 recorrida não negou aos recorrentes o acesso ao direito e aos tribunais e, 
 assim, também não se verifica a violação do artigo 20.° da CRP.
 Finalmente, a alegação da violação do artigo 53. ° da CRP – segurança no emprego 
 e proibição dos despedimentos sem justa causa – não tem qualquer consistência, 
 porquanto a decisão recorrida não apreciou nem decidiu as questões fundamentais 
 da natureza do contrato e da sua existência, bem como se foi praticado o 
 despedimento, que, como já se referiu, são questões prévias que ultrapassam e 
 não cabem no âmbito da providência cautelar de suspensão de despedimento, 
 tendo‑se o M.mo Juiz limitado a considerar inadequada a providência cautelar 
 que foi instaurada, pelo que a indeferiu liminarmente.
 Pelo exposto, improcedem as conclusões do recurso.”
 
  
 
                         É contra este acórdão que pelas requerentes A. e B. vem 
 interposto o presente recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro 
 
 (LTC), pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade, por violação dos 
 artigos 13.º, 20.º, n.º 5, e 53.º da Constituição da República Portuguesa 
 
 (CRP), da norma do artigo 39.º do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo 
 Decreto‑Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro (CPT), interpretada no sentido de que a 
 providência cautelar de suspensão de despedimento só pode ser requerida e 
 concedida quando seja indiscutível a existência de um contrato de trabalho a que 
 a entidade empregadora tenha posto fim por despedimento e não por invocação de 
 qualquer outra causa de cessação da relação laboral.
 
                         Neste Tribunal, as recorrentes apresentaram alegações, 
 no termo das quais formularam as seguintes conclusões:
 
  
 
             “1. O artigo 39.º do Código de Processo do Trabalho, na 
 interpretação que lhe foi dada pelo [Tribunal] recorrido, segundo a qual a 
 providência cautelar de suspensão de despedimento só pode ser requerida quando 
 seja indiscutível a existência de um contrato de trabalho a que a entidade 
 empregadora tenha posto fim por despedimento e não por invocação de qualquer 
 outra causa de cessação da relação laboral, sem que seja dada a oportunidade às 
 requerentes de provarem a existência de contrato de trabalho e de 
 verosimilhança com despedimento ilícito, é manifestamente inconstitucional por 
 violação dos artigos 20.º, 13.º e 53.º da Constituição da República Portuguesa.
 
             2. O acesso ao direito e aos tribunais postula uma tutela 
 jurisdicional cautelar e efectiva.
 
             3. O acórdão recorrido, ao alvitrar uma outra via processual – 
 procedimentos cautelares comuns – que também está fechada, acaba por consentir 
 numa denegação do ordenamento jurídico.
 
             4. Ao interpretar o artigo 39.º, n.º 1, do CPT, afastando do seu 
 
 âmbito de protecção trabalhadores cuja entidade patronal não reconhece como tal 
 
 (quando nem sequer lhe foi dada a oportunidade de o reconhecer, nem às 
 recorrentes de provar a existência da alegada relação laboral), entidade 
 patronal essa que, sem invocar qualquer causa de cessação, recusa a prestação de 
 trabalho (sem sequer ser dada oportunidade às requerentes de provar a 
 verosimilhança de tal recusa como despedimento ilícito), o Tribunal recorrido 
 violou o artigo 20.º da Constituição da Republica Portuguesa.
 
             5. O princípio da igualdade postula que todos os trabalhadores 
 mereçam tratamento igual.
 
             6. O princípio da segurança no trabalho e da proibição de 
 despedimentos sem justa causa vale para todos os trabalhadores e não apenas 
 para aqueles que contratem situações que denotem claramente a celebração de 
 contratos de trabalho subordinado.
 
             7. Ao interpretar o artigo 39.º, n.º 1, do CPT no sentido segundo o 
 qual só merecem protecção cautelar os trabalhadores que tenham celebrado 
 claramente contratos de trabalho subordinado viola o princípio da igualdade, da 
 segurança no emprego e da proibição de despedimentos sem justa causa, 
 constitucionalmente consagrados, respectivamente, nos artigos 13.º e 53.º da 
 Constituição da República Portuguesa.
 
             8. Uma interpretação do artigo 39.º, n.º 1, conforme à Constituição 
 impunha que o Tribunal recorrido concedesse provimento ao agravo e revogasse a 
 decisão recorrida, determinando a sua substituição por outra que viabilizasse o 
 procedimento cautelar de suspensão do despedimento.”
 
  
 
                         A recorrida D., ACE, contra‑alegou, concluindo:
 
  
 
 “1. É sabida a ampla e vasta discussão que se tem gerado em tomo do princípio da 
 igualdade, sendo certo que é, de longe, o princípio constitucional mais debatido 
 na doutrina e na jurisprudência.
 
 2. De forma lapidar definiu o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 433/87, in 
 Boletim do Ministério da Justiça, n.º 371, que a igualdade «consiste em tratar 
 por igual o que é essencialmente igual e em tratar diferentemente o que 
 essencialmente for diferente. A igualdade não proíbe, pois, o estabelecimento 
 de distinções; proíbe, isso sim, as distinções arbitrárias ou sem fundamento 
 bastante».
 
 3. No que se refere à interpretação dada ao artigo 39.º do Código de Processo do 
 Trabalho, quer pelo Acórdão recorrido, quer mesmo pelo Acórdão de fixação de 
 jurisprudência n.º 1/2003, de 1 de Outubro de 2003, publicado no Diário da 
 República, I Série‑A, de 12 de Novembro de 2003, seguido de perto pelos 
 Meritíssimos Julgadores das instâncias, não existe qualquer violação do 
 princípio da igualdade, porquanto a situação dos recorrentes não é comparável 
 com a de alguém que intenta uma providência cautelar de suspensão de 
 despedimento, ancorado na existência de indiscutido contrato de trabalho 
 subordinado e indiscutido despedimento.
 
 4. Não existiu, também, qualquer violação do artigo 20.º da Constituição, dado 
 que sempre a mesma poderia ser obtida através da propositura da acção 
 declarativa, que seria o meio adequado para fazer valer o direito invocado.
 
 5. Não se vislumbra, ainda, qualquer violação do artigo 53.º da Constituição, 
 dado que a decisão recorrida não apreciou quaisquer questões relacionadas com o 
 alegado despedimento, muito pelo contrário, a decisão recorrida julgou 
 inadequado o procedimento cautelar de suspensão de despedimento, razão pela qual 
 confirmou o indeferimento liminar proferido pelo Meritíssimo Juiz da primeira 
 instância.
 
 6. Assim, salvo o devido respeito, não faz qualquer sentido sustentar que foi 
 violado o princípio constitucional da segurança no emprego.”
 
  
 
                         Por seu turno, a recorrida C., L.da, também apresentou 
 contra‑alegações, no termo das quais formulou as seguintes conclusões:
 
  
 
 “1. É jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça que o 
 procedimento cautelar de suspensão do despedimento só pode ser requerido se for 
 inequívoca a existência de um contrato de trabalho, de um despedimento em 
 sentido próprio e a certeza de quem praticou o acto qualificável como 
 despedimento.
 
 2. O procedimento cautelar de suspensão do despedimento não é o meio adequado 
 para nele se aferir qualquer destas circunstâncias, na medida em que pressupõe 
 um juízo sumário que não se coaduna com a investigação de tais questões.
 
 3. Não existe identidade entre a situação em que é indiscutível a existência de 
 um contrato de trabalho, um despedimento e a entidade que o levou a cabo e a 
 situação das recorrentes.
 
 4. O facto de não puderem recorrer àquele procedimento cautelar em concreto não 
 impedia as recorrentes de fazerem valer os seus direitos através de outros meios 
 processuais ao seu dispor.
 
 5. A interpretação feita pelo Tribunal de 1.ª instância e pelo Tribunal da 
 Relação do n.º 1 do artigo 39.º do CPT apenas levou a concluir que o meio usado 
 pelas recorrentes não era o meio adequado para fazer valer o direito que 
 pretendiam ver reconhecido.
 
 6. Tal interpretação não viola qualquer princípio constitucional, nomeadamente 
 os constantes dos artigos 13.º, 20.º e 53.º.”
 
  
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                         2. Fundamentação
 
                         2.1. O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 
 uniformização de jurisprudência, de 1 de Outubro de 2003 (Diário da República, 
 I Série‑A, n.º 262, de 12 de Novembro de 2003, p. 7647), cuja doutrina as 
 decisões das instâncias afirmaram seguir, contém uma desenvolvida explanação 
 sobre a figura da providência cautelar de suspensão do despedimento, desde a sua 
 introdução no nosso ordenamento jurídico, pela Lei n.º 48/77, de 11 de Julho, 
 passando à sua consagração no Código de Processo do Trabalho de 1981 (aprovado 
 pelo Decreto‑Lei n.º 272‑A/81, de 30 de Setembro), ao alargamento ao 
 despedimento colectivo (pelo artigo 25.º do Regime Jurídico da Cessação do 
 Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de 
 Trabalho a Termo, aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 64‑A/89, de 27 de Fevereiro) e à 
 cessação do contrato de trabalho por inadaptação do trabalhador ao posto de 
 trabalho (pelo artigo 9.º do Decreto‑Lei n.º 400/91, de 16 de Outubro), até à 
 sua regulação pelo Código de Processo do Trabalho de 1999 (aprovado pelo 
 Decreto‑Lei n.º 480/99, aplicável ao caso dos presentes autos), no âmbito do 
 qual surgiram as divergências jurisprudenciais a que se visou pôr cobro.
 
                         Não cabe, obviamente, no âmbito do presente recurso a 
 reedição dos argumentos em que se basearam as correntes jurisprudenciais em 
 confronto, mas apenas registar que, de acordo com a formulação final da 
 jurisprudência assim uniformizada, acolhida pela decisão ora recorrida, “o 
 trabalhador despedido (individual ou colectivamente) pode socorrer‑se do 
 procedimento cautelar de suspensão de despedimento desde que esta seja a causa 
 invocada pela entidade patronal para cessação da relação laboral ou, na sua não 
 indicação, se configure a verosimilhança de um despedimento”. Sublinhou‑se esta 
 expressão final porque ela se afasta de algumas formulações de acórdãos 
 inseridos nessa corrente, que aparentavam bastar‑se com o questionamento, pelo 
 requerido, da existência de um contrato de trabalho e de um despedimento, para 
 afastar a admissibilidade do recurso à providência cautelar de suspensão de 
 despedimento. O que resulta do acórdão de uniformização de jurisprudência é que 
 o procedimento em causa pode ser usado sempre que a causa expressamente invocada 
 pela entidade patronal para a cessação do contrato de trabalho seja o 
 despedimento, mas ainda quando, apesar de o requerido não apelidar de laboral a 
 relação mantida com o requerente e/ou não apelidar de despedimento o acto pelo 
 qual procede à cessação da relação, “se configure a verosimilhança de um 
 despedimento”. Isto é: se, apesar de a entidade requerida afirmar, por exemplo, 
 que o contrato que a liga ao requerente não é um contrato de trabalho, mas antes 
 um contrato de prestação de serviço, ou, reconhecendo tratar‑se de um contrato 
 de trabalho, sustentar que foi diversa da do despedimento a sua causa de 
 cessação (por exemplo, a caducidade), basta que ao tribunal se configure a 
 verosimilhança de um despedimento para que o uso da providência cautelar de 
 suspensão de despedimento seja admitido.
 
  
 
                         2.2. Feita esta precisão, cumpre apreciar se a 
 interpretação normativa acolhida no acórdão recorrido viola, como sustentam as 
 recorrentes, o direito de acesso aos tribunais, o princípio da igualdade e a 
 garantia da segurança no emprego, consagrados, respectivamente, nos artigos 
 
 20.º, 13.º e 53.º da CRP.
 
  
 
                         2.2.1. Em conformidade com o preceituado no artigo 20.º 
 da CRP, “a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa 
 dos seus direitos e interesses legítimos, não podendo a justiça ser denegada 
 por insuficiência de meios económicos” (n.º 1), e “todos têm direito a que uma 
 causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante 
 processo equitativo” (n.º 4).
 
                         A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem 
 salientado (cf., entre outros, o Acórdão n.º 440/94) que o direito de acesso aos 
 tribunais ou à tutela jurisdicional implica a garantia de uma protecção 
 jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efectiva, cujo âmbito normativo 
 abrange nomeadamente: (a) o direito de acção, no sentido do direito subjectivo 
 de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional; (b) o 
 direito ao processo, traduzido na abertura de um processo após a apresentação 
 daquela pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se 
 pronunciar mediante decisão fundamentada; (c) o direito a uma decisão judicial 
 sem dilações indevidas, no sentido de a decisão haver de ser proferida dentro 
 dos prazos preestabelecidos, ou, no caso de estes não estarem fixados na lei, 
 dentro de um lapso temporal proporcional e adequado à complexidade da causa; (d) 
 o direito a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da 
 sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela 
 falta de medidas de defesa expeditas.
 
                         Aceitando‑se que “a tutela jurisdicional efectiva 
 postula a adopção de um sistema de providências cautelares que acautele o 
 efeito útil da acção, impedindo uma lesão grave e dificilmente reparável do 
 direito ou interesse legalmente protegido que se pretende defender em tribunal” 
 
 (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra, 
 
 2005, p. 203), não menos certo é que, embora vinculado a criar meios 
 jurisdicionais de tutela efectiva dos direitos e interesses ofendidos dos 
 cidadãos, “o legislador não deixa de ser livre de os conformar, não sendo de 
 todo o modo obrigado a prever meios iguais para situações diversas, considerando 
 ainda que a identidade ou diversidade das situações em presença há‑de resultar 
 de uma perspectiva global que tenha em conta a multiplicidade de interesses em 
 causa, alguns deles conflituantes entre si” (Acórdão n.º 63/2003).
 
                         Estes princípios implicam que, no caso dos presentes 
 autos, às recorrentes devesse ser conferida a faculdade, não só de accionarem 
 judicialmente as suas pretensões, mas também de lançarem mão de meio cautelar 
 que assegurasse o efeito de eventual provimento da acção principal, mas já não 
 que fosse constitucionalmente imposto que tivessem acesso a um específico meio 
 cautelar, que, segundo o critério normativo acolhido pelas instâncias, era 
 inaplicável ao presente litígio.
 
                         Ora, o que as instâncias entenderam, em consonância com 
 o referido Acórdão uniformizador de jurisprudência, foi que, sendo inadmissível, 
 no caso, o procedimento cautelar específico da suspensão de despedimento, 
 regulado nos artigos 34.º a 40.º do Código de Processo do Trabalho, às 
 requerentes estava aberta a possibilidade de utilização do procedimento 
 cautelar comum, regulado nos artigos 32.º e 33.º do mesmo Código.
 
                         Não se evidenciando que este procedimento cautelar comum 
 seja imprestável para a consecução da tutela efectiva das pretensões das 
 recorrentes, não se pode dar por verificada a alegada afectação do direito de 
 acesso aos tribunais.
 
  
 
                         2.2.2. Do que já se referiu resulta também a não 
 violação do princípio da igualdade.
 
                         Na verdade, mostra‑se materialmente fundada a 
 diferenciação de meios cautelares postos pelo legislador à disposição dos 
 interessados, em conformidade com a diversidade das situações subjacentes: o 
 procedimento cautelar específico da suspensão de despedimento, nos casos em que 
 
 “o despedimento seja a causa invocada pela entidade patronal para cessação da 
 relação laboral ou, na sua não indicação, se configure a verosimilhança de um 
 despedimento”; e o procedimento cautelar comum, nos casos em que o requerido 
 não invoque o despedimento como causa de cessação da relação que o vinculava ao 
 requerente, nem ao tribunal se configure a verosimilhança de um despedimento.
 
                         Não é constitucionalmente desconforme que, para além de 
 diferenças de tramitação processual, os critérios decisórios não sejam 
 coincidentes: naquela primeira situação, para o deferimento da providência 
 basta que o tribunal constate que não foi instaurado procedimento disciplinar, 
 que este é nulo ou que há probabilidade séria de inexistência de justa causa 
 
 (artigo 39.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho), enquanto que no segundo 
 grupo de situações se segue o critério geral de que a providência deve ser 
 decretada quando haja probabilidade séria da existência do direito invocado pelo 
 requerente e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão, a menos 
 que o prejuízo que da providência resultar para o requerido exceda 
 consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar (n.ºs 1 e 2 do 
 artigo 387.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 32.º do Código de 
 Processo do Trabalho).
 
                         Considera‑se, assim, não ocorrer violação do princípio 
 da igualdade.
 
  
 
                         2.2.3. Também não ocorre violação do princípio da 
 segurança no emprego.
 
                         Este princípio não impede a existência de despedimentos, 
 desde que fundados em razões constitucionalmente atendíveis. Aliás, no caso, não 
 está em causa a licitude, em termos substantivos, da cessação das relações que 
 ligavam as recorrentes às recorridas, mas apenas os meios adjectivos postos à 
 disposição daquelas para defesa dos seus interesses e interesses legítimos. Ora, 
 esses meios, como já se apurou, não se revelam insuficientes para assegurar uma 
 tutela jurisdicional efectiva das pretensões das recorrentes e a diferenciação 
 de meios processuais mostra‑se constitucionalmente aceitável.
 
                         Improcedem, assim, na totalidade, as alegações das 
 recorrentes.
 
  
 
                         3. Decisão
 
                         Em face do exposto, acordam em:
 
                         a) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 39.º do 
 Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 480/99, de 9 de 
 Novembro, interpretado no sentido de que a providência cautelar de suspensão de 
 despedimento só pode ser utilizada quando o despedimento seja a causa invocada 
 pela entidade patronal para cessação da relação laboral ou, na sua não 
 indicação, se configure a verosimilhança de um despedimento; e, em 
 consequência,
 
                         b) Negar provimento ao recurso, confirmando a decisão 
 recorrida, na parte impugnada.
 
                         Custas pelas recorrentes, fixando‑se a taxa de justiça 
 em 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 2 de Maio de 2006.
 Mário José de Araújo Torres
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Benjamim Silva Rodrigues
 Rui Manuel de Moura Ramos