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Processo nº 601/2005
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
   
 Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 A – Relatório
 
  
 
  
 
    1 – A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na 
 alínea b) do n.º 1 do art. 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua 
 actual versão (LTC), da decisão proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal de 
 Justiça, de 1 de Junho de 2005, que indeferiu a reclamação apresentada nos 
 termos do art. 405º do Código de Processo Penal, pelo mesmo recorrente, contra o 
 despacho do Desembargador Relator, no Tribunal da Relação de Coimbra (RC), que 
 não lhe admitiu o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 
 acórdão proferido pelo mesmo Tribunal da Relação. 
 
  
 
    2 – Neste acórdão, a RC decidiu rejeitar o recurso interposto pelo ora 
 recorrente de decisão do tribunal de 1ª instância que o condenara, em cúmulo 
 jurídico, na pena única de dois anos de prisão, suspensa na sua execução por 
 quatro anos, sob condição de pagamento no mesmo prazo da indemnização arbitrada 
 ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, pela prática de um crime 
 continuado de abuso de confiança contra a segurança sócia, p. e p. pelo art. 
 
 107º do Regime Geral das Infracções Tributárias, e de um crime continuado de 
 fraude contra a segurança social, p. e p. pelos art. 103º e 106º, do mesmo 
 Regime, bem como no pagamento da indemnização ao referido ofendido de 145.850,10 
 Euros, acrescida dos juros legais à taxa que, em cada momento, for devida, por 
 haver considerado que o recorrente não dera adequado cumprimento ao ónus de 
 apresentação de conclusões da motivação feita naquele recurso, não obstante 
 haver sido convidado a “apresentar nova motivação do recurso, suprindo a 
 prolixidade das conclusões que formulara”, pois que tendo-o feito apresentou 
 novamente 214 conclusões. 
 
  
 
    3 – Desta decisão, o ora recorrente interpôs recurso para o STJ sustentando, 
 entre o mais, que ao caso não interessa, que o acórdão da RC havia efectuado uma 
 interpretação extensiva das disposições conjugadas dos art. 414º, n.º 2, e 420º, 
 n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), porquanto a “falta de concisão das 
 conclusões não se revela contemplada na letra do art. 414º, n.º 2”, e que essa 
 interpretação extensiva violava o disposto nos art. 18º, n.º 2, e 32º, n.º 1, da 
 Constituição da República Portuguesa (CRP).
 
    O recurso não foi, todavia, admitido por despacho do Desembargador Relator, 
 com base na fundamentação de que “atendendo à moldura penal objecto 
 correspondente do tipo legal de crimes, tal recurso não é admissível, face ao 
 disposto no art. 400º, n.º 1, alínea e), do CPP”.
 
  
 
    4 – Reclamou, então, o recorrente para o Presidente do Supremo Tribunal de 
 Justiça nos termos do art. 405º do CPP, sustentando, entre o mais, que a decisão 
 da RC, que rejeitou o recurso por prolixidade não pode ser tida como decisão de 
 mérito, mas, antes, como uma decisão que põe termo à causa sem conhecer do 
 mérito da mesma, e que a norma constante do art. 400º, n.º 1, alínea e), do CPP, 
 quando interpretada no sentido da não admissibilidade do recurso para o STJ, nos 
 casos em que o Tribunal de recurso decide não conhecer do mérito do recurso, 
 interposto pelo arguido da decisão condenatória de 1ª instância, que não por 
 manifesta improcedência ou casos previstos nas alíneas do n.º 2 do art. 412º do 
 CPP, rejeitando tal recurso por falta de concisão das conclusões, viola o n.º 1 
 do art. 32º da CRP, na sua dimensão de garantia a um duplo grau de jurisdição.
 
  
 
    5 – A reclamação foi indeferida com base nas seguintes considerações:
 
  
 
 “No caso em apreço, está em causa um acórdão da Relação que rejeitou o recurso 
 interposto pelo arguido da decisão final.
 Daí, o referido acórdão, ao não conhecer do fundo do recurso, não alterou a 
 decisão da 1ª instância que, em processo respeitante a um concurso de 
 infracções, condenara o arguido pela prática de um crime continuado de abuso de 
 confiança contra a segurança social, p. e p. pelo art. 107º, com referência ao 
 art. 105º, n.º 1, do RGIT, na pena de um ano e seis meses de prisão, e de um 
 crime continuado de fraude contra a segurança social, p. e p. pelo art. 106º, 
 com referência ao art. 103º, do RGIT, na pena de oito meses de prisão. Em cúmulo 
 jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 2 anos de prisão suspensa na 
 sua execução pelo período de 4 anos sob condição de pagamento, em igual período, 
 da indemnização arbitrada ao IGFSS, no montante de € 145.850,10, acrescida de 
 juros legais.
 Assim sendo, estando em causa um acórdão da Relação proferido em processo 
 respeitante a um concurso de infracções, face ao disposto no art. 400º, n.º 1, 
 alínea e), 2ª parte do CPP, há apenas de ter 'em conta a pena aplicável a cada 
 um dos crimes', como nos refere Germano Marques da Silva, in 'Curso de Processo 
 Penal', III, 2ª edição, pág. 325, e os acórdãos deste Supremo Tribunal de 
 Justiça de 16 de Janeiro de 2003, de 13 de Fevereiro de 2003, de 16 de Abril de 
 
 2003 e de 22 de Maio de 2003 in CJ, Acs. do Supremo Tribunal de Justiça, Ano 
 XXVIII, Tomo I, págs. 162 e ss. e 186 e ss., Tomo II, p. 163 e 88 e 190 e ss., 
 respectivamente.
 Ora, a nenhum dos crimes abrangido pelo concurso corresponde pena superior a 
 cinco anos.
 Quanto à invocada inconstitucionalidade pelo ora reclamante, cabe dizer que após 
 a revisão levada a efeito pela Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, 
 na sequência da jurisprudência do Tribunal Constitucional, o direito ao recurso 
 foi expressamente referenciado como uma garantia de defesa do processo criminal, 
 no n.º 1 do art. 32º da CRP.
 Todavia, como o T. C. também tem sustentado, a Constituição não impõe que tenha 
 de haver recurso de todos os actos do juiz, como também não exige que se garanta 
 um triplo grau de jurisdição (cf., por todos, os Acórdãos do T.C. de 19-06-90, 
 BMJ, 398, p.152, e de 19-11-96, DR, II Série, de 14-03-97).
 
                No caso dos autos, encontrava-se legalmente assegurado o duplo 
 grau de jurisdição, como resulta do art. 400º, n.º 1, alínea e), do CPP. Se a 
 Relação não conheceu do recurso interposto da decisão final, tal ficou-se a 
 dever ao arguido, por não ter sintetizado capazmente (de 237 para 214) as suas 
 conclusões, após convite para o efeito”.
 
  
 
    6 – Inconformado com o decidido, o reclamante interpôs recurso para o 
 Tribunal Constitucional, afirmando pretender “ver apreciada a questão de 
 constitucionalidade da norma constante da aliena e) do n.º 1 do artigo 400º do 
 CPP, ratio decidendi da decisão recorrida, quando interpretada no sentido de que 
 não é admissível recurso para o STJ nos casos em que o Tribunal da Relação 
 profere decisão de rejeição do recurso interposto pelo arguido da decisão da 1ª 
 instância, não apreciando o mérito do recurso que lhe foi submetido à 
 apreciação, por falta de concisão das conclusões”.
 
  
 
    7 – Alegando neste recurso, o recorrente concluiu o seu discurso do seguinte 
 jeito:
 
    
 
 “A.         O ora recorrente interpôs recurso para o STJ do Acórdão proferido 
 pela Relação de Coimbra, na parte em que este rejeitou o recurso interposto da 
 decisão final de primeira instância, por falta de concisão de conclusões.
 
  
 B.           Fê-lo por considerar que o fundamento apresentado pela Relação de 
 Coimbra para a rejeição não só não se verificava, como não se encontra previsto 
 na lei processual penal tal fundamento de rejeição, e ainda porque o juízo de 
 subjectividade daquele Tribunal impediu a apreciação do mérito de um recurso 
 penal, que é um direito fundamental da defesa, impedindo o constitucionalmente e 
 internacionalmente consagrado duplo grau de jurisdição.
 
  
 C.           O Tribunal de Relação de Coimbra não admite o recurso, invocando 
 para o efeito o disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 400º do CPP.
 
  
 D.           Perante tal decisão impunha-se reclamar para o presidente do 
 Tribunal recorrido, o que se fez.
 
  
 E.           Aduziu-se a fundamentação, mormente de cariz constitucional, por se 
 considerar que o arguido viu precludido o seu direito constitucionalmente 
 consagrado de recorrer, plasmado no n.º 1 do artigo 32º da CRP.
 
  
 P.           Com efeito, impõe-se ver apreciada a questão da constitucionalidade 
 da norma constante da alínea e) do n.º 1 art. 400º do Código Processo Penal, 
 quando interpretada no sentido de que não é admissível recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça nos casos em que o Tribunal da Relação profere decisão de 
 rejeição do recurso interposto pelo Arguido da decisão condenatória da 1ª 
 instância, não apreciando o mérito do recurso que lhe foi submetido à apreciação 
 por falta de concisão das conclusões.
 
  
 G.           Infelizmente, o STJ veio a considerar que, no caso concreto, se 
 encontrava legalmente assegurado o duplo grau de jurisdição.
 
  
 H.                      Adianta até que 'Se a Relação não conheceu do recurso 
 interposto da decisão final, tal ficou a dever-se ao arguido, por não ter 
 sintetizado capazmente (de 237 para 214) as suas conclusões, após convite para o 
 efeito'.
 
  
 I.                         Salvo o devido respeito, que é muito, não se 
 compreende como o mesmo Venerando Tribunal indefere uma reclamação com base no 
 supra argumento depois de ter decidido no Ac. do STJ de 15/01/2004, proferido no 
 P.º 03P3472 (disponível no site www.dgsi.pt) que uma decisão que ponha fim à 
 causa por um motivo formal, que não o da manifesta improcedência, não é uma 
 decisão sobre o seu mérito e, por isso, que negar-se o recurso à defesa será, 
 nesses casos, não permitir um duplo grau de jurisdição.
 
  
 J. Isto para além de ter decidido, nesse mesmo caso, que não existe nenhuma 
 medida de prolixidade, que é, aliás, um conceito subjectivo sem padrão 
 normativo.
 
  
 K.                     A garantia do duplo grau de jurisdição encontra-se 
 prevista no n.º 1 do artigo 32º da nossa Lei Fundamental, para além de se 
 encontrar internacionalmente consagrada, na Convenção Europeia dos Direitos do 
 Homem.
 
  
 L.                       Com efeito, o artigo 2º do protocolo n.º 7 à Convenção 
 para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais prevê 
 exactamente o direito a um duplo grau de jurisdição em matéria penal, que no 
 caso concreto não foi, nem ainda se encontra assegurado.
 
  
 M.                    Por que o STJ indeferiu a reclamação apresentada, 
 considerando que a nossa Lei Fundamental não se encontrava violada, foi 
 necessário recorrer a este Tribunal.
 
  
 N.                     Não foi garantido à defesa o direito a um duplo grau de 
 jurisdição em matéria penal, violando-se o disposto no n.º 1 do artigo 32º da 
 CRP.
 
  
 O.                     Tendo a norma da alínea e) do artigo 400º do C.P.P. sido 
 interpretada e aplicada com esse condicionalismo e alcance, mostra-se ela 
 afectada de inconstitucionalidade material.
 
  
 
  
 
  
 Pelo exposto, deve ser julgada inconstitucional a norma constante da alínea e) 
 do n.º 1 do artigo 400º do Código Processo Penal, quando interpretada no sentido 
 de que não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça nos casos em 
 que o Tribunal da Relação profere decisão de rejeição do recurso interposto pelo 
 Arguido da decisão condenatória da 1ª instância, não apreciando o mérito da 
 causa que lhe foi submetida com fundamento na falta de concisão das conclusões 
 
 […]”. 
 
  
 
    8 – Por seu lado, o Procurador-Geral Adjunto no Tribunal Constitucional 
 contra-alegou, concluindo do seguinte modo:
 
  
 
    “1 - A norma constante da alínea e) do n.º 1 do artigo 400º do Código de 
 Processo Penal, ao condicionar o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, em via 
 de recurso, à gravidade das penas aplicáveis aos crimes cometidos em concurso 
 pelo arguido, não viola o disposto no artigo 32º da Constituição da República 
 Portuguesa.
 
  
 
 2 - Não tendo o recorrente questionado a constitucionalidade das normas do 
 processo penal que regem sobre os requisitos da motivação e respectivas 
 conclusões - e que constituem a efectiva base legal e normativa do regime 
 preclusivo por ele questionado - não deve conhecer-se da questão colocada em 
 sede de rejeição do recurso por incumprimento do ónus de concisão, a cargo do 
 recorrente”.
 
  
 
  
 
    9 – Ouvido sobre a questão prévia suscitada pelo Ministério Público, o 
 recorrente respondeu sintetizando a argumentação expendida na seguinte síntese 
 conclusiva:
 
  
 
 “A.         O objecto de apreciação no caso vertente é a norma contida na alínea 
 e) do n.º 1 do artigo 400º do CPP quando aplicada a recursos interpostos de 
 acórdãos da Relação que rejeitem o recurso interposto de decisões da 1ª 
 instância por prolixidade das conclusões, ou seja, por um motivo formal que não 
 a manifesta improcedência.
 
  
 B.           A decisão da Relação de rejeição do recurso interposto não é sequer 
 uma decisão confirmativa da decisão proferida pela Vara Mista de Coimbra em 1ª 
 instância.
 
  
 C.           O Acórdão da Relação de Coimbra é uma decisão que põe termo à causa 
 sem conhecer do mérito da mesma.
 
  
 D.           E põe termo à causa por um motivo formal (que não a manifesta 
 improcedência).
 
  
 E.           Isto é, é uma decisão de 1ª instância que pode e deve ser 
 sindicada, sob pena de o arguido ver precludido o seu direito 
 constitucionalmente consagrado de recorrer plasmado no n.º 1 do artigo 32º da 
 CRP.
 
  
 F.           Em face de tudo o supra exposto, a norma constante do art. 400º, 
 n.º 1, alínea e), do CPP, quando interpretada no sentido da não admissibilidade 
 de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nos casos em que o Tribunal de 
 recurso decide não conhecer do mérito do recurso interposto pelo arguido da 
 decisão condenatória da 1ª instância, que não por manifesta improcedência ou 
 casos previstos nas alíneas do n.º 2 do artigo 412º do CPP, rejeitando tal 
 recurso por falta de concisão das conclusões, viola n.º 1 do artigo 32º da CRP.
 
  
 G.           Mais sinteticamente, a norma constante do art. 400º, n.º 1, alínea 
 e), do CPP, quando interpretada no sentido da não admissibilidade de recurso 
 para o Supremo Tribunal de Justiça no caso de rejeição de recurso por 
 prolixidade ou falta de concisão das conclusões viola n.º 1 do artigo 32º da 
 CRP.
 
  
 H.           A norma constante da alínea e) do n.º 1 do artigo 400º do CPP, ao 
 condicionar o acesso ao STJ, em via de recurso, à gravidade das penas aplicáveis 
 aos crimes cometidos em concurso pelo arguido, só não violará o disposto no 
 artigo 32º da CRP se estiver garantido o duplo grau de jurisdição, se o Acórdão 
 de que se recorre for um verdadeiro Acórdão proferido em 2ª instância, for um 
 Acórdão que analise a matéria do recurso interposto da decisão de 1ªintância”.
 
  
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
    10 – Questão prévia
 
  
 
    Nas suas contra-alegações, o Procurador-Geral Adjunto suscita a questão da 
 inutilidade do conhecimento do recurso de constitucionalidade. Sustenta este 
 magistrado que, prendendo-se a definição do “efeito preclusivo associado ao não 
 cumprimento, em termos adequados, pelo recorrente do ónus de aperfeiçoar as 
 conclusões da motivação do recurso, [por deixar] (…) subsistir o vício de falta 
 de concisão das alegações que as inquinava, mesmo após a oportunidade que lhe 
 foi conferida para suprir tal irregularidade” com a interpretação e aplicação do 
 estatuído nos artigos 412º, 414º, n.º 2, e 420º do Código de Processo Penal, 
 
 “não é possível apreciar essa questão de inconstitucionalidade quando o 
 recorrente tratou de a reportar a preceito legal [o artigo 400º, n.º 1, alínea 
 e)] que nada tem que ver com o regime questionado sob o prisma de 
 constitucionalidade” e depois, em termos algo divergentes, que “é inútil a sua 
 dirimição [da referida questão do efeito preclusivo] já que a decisão, proferida 
 pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, se manteria obviamente incólume 
 com o primeiro fundamento invocado [a limitação do acesso em via de recurso ao 
 STJ, em função da gravidade dos crimes cometidos ainda que em concurso], ligado 
 
 à gravidade das penas aplicáveis em concurso”.
 
    Na sua resposta, o recorrente acentua que o “objecto de apreciação (…) é a 
 norma contida na alínea e) do n.º 1 do artigo 400º do CPP quando aplicada a 
 recursos interpostos de acórdãos da Relação que rejeitem o recurso interposto de 
 decisões da 1ª instância por prolixidade das conclusões, ou seja, por um motivo 
 formal que não a manifesta improcedência”, não sendo a “decisão da Relação, de 
 rejeição do recurso interposto (…) uma decisão confirmativa da decisão proferida 
 pela Vara Mista de Coimbra em 1ª instância”, correspondendo apenas a “uma 
 decisão que põe termo à causa sem conhecer do mérito da mesma”.      
 
    Respondendo, por seu lado, ao argumento de inconstitucionalidade da 
 inadmissibilidade do recurso decorrente da adopção de um tal entendimento 
 normativo, a decisão recorrida fez notar que “a Constituição não impõe que tenha 
 de haver recurso de todos os actos do juiz, como também não exige que se garanta 
 um triplo grau de jurisdição” e que, no caso dos autos, se encontrava legalmente 
 assegurado o duplo grau de jurisdição, como resulta do art. 400º, n.º 1, alínea 
 e), do CPP” e que “se a Relação não conheceu do recurso interposto da decisão 
 final, tal ficou a dever-se ao arguido, por não ter sintetizado capazmente (de 
 
 234 para 214) as suas conclusões, após convite para o efeito”.
 
    Confrontando o articulado da reclamação para o Presidente do STJ com o 
 despacho reclamado, de não admissão do recurso para o STJ, proferido pelo 
 relator na Relação, conclui-se que o que o recorrente pretende controverter sub 
 species constitucionis é a norma que estabelece a inadmissibilidade de recurso 
 para o Supremo Tribunal de Justiça “de acórdãos proferidos, em recurso, pelas 
 relações em processo por crime a que seja aplicável (…) pena de prisão não 
 superior a cinco anos, mesmo em caso de concurso de infracções (…)”, nas 
 situações, como a dos autos, em que o acórdão da Relação não conheceu do mérito 
 do recurso, por o arguido não ter sintetizado “capazmente” as conclusões da sua 
 motivação depois de convidado para tanto, e não a(s) norma(s) que estabelece(m) 
 o efeito preclusivo do incumprimento desse ónus de sintetização adequada da 
 motivação do recurso.
 
    O recorrente pôs em causa, constitucionalmente, a alínea e) do n.º 1 do 
 artigo 400º do CPP não no seu todo hipotético, mas apenas no entendimento, que 
 foi, implicitamente, sufragado pelo despacho reclamado e posteriormente acolhido 
 pela decisão ora recorrida, segundo o qual cabem nesse universo também aqueles 
 casos em que a decisão da Relação, tendo sido proferida em processo por crime a 
 que seja aplicável pena de prisão não superior a cinco anos, mesmo em caso de 
 concurso de infracções, acabou por não conhecer do mérito do recurso, por o 
 recorrente não haver cumprido “capazmente” o ónus de concisão das conclusões da 
 sua motivação, depois de para tanto ser convidado.
 
    Perspectivada a questão de constitucionalidade nestes termos, há que 
 reconhecer que o objecto do recurso não se prende com a(s) norma(s) que 
 estabelece(m) o efeito preclusivo do recurso por incumprimento do ónus de 
 conclusão da motivação, mas, antes, com a que foi indicada pelo recorrente.      
 
   
 
    Temos, assim, de concluir que se mostra indicada em termos suficientemente 
 pertinentes a base normativa da interpretação questionada constitucionalmente 
 pelo recorrente.
 
    E, ao contrário do sustentado, não é poderá afirmar-se que a decisão de uma 
 tal questão de constitucionalidade não será susceptível de poder implicar a 
 reforma da decisão recorrida, por esta pretensamente se fundar em um outro 
 fundamento autónomo que seria o “ligado à gravidade das penas aplicáveis aos 
 crimes em concurso”.
 
    É que a decisão recorrida interpretou e aplicou a norma, se bem que de uma 
 forma implícita, em termos exactamente correspondentes aos que foram 
 questionados constitucionalmente na reclamação, ao não ter acolhido a 
 interpretação que o recorrente defendeu – de admissibilidade do recurso para o 
 STJ, nas situações delineadas pela alínea e) do n.º 1 do art. 400º do CPP em que 
 a relação não conhecesse do recurso por incumprimento do ónus de sintetização da 
 motivação de recurso, e para sindicar este mesmo fundamento –  e ao refutar o 
 vício da inconstitucionalidade de que o mesmo apodou a interpretação que havia 
 sido adoptada e que veio a ser confirmada.
 
    Ora, se esta dimensão normativa vier a ser considerada violadora da Lei 
 fundamental, não poderá tal decisão deixar de acarretar a reforma da decisão 
 recorrida.
 
    Improcede, pois, a questão prévia suscitada pelo Ministério Público.
 
    
 
    11 – Do mérito do recurso de constitucionalidade
 
  
 
    A norma do CPP cuja inconstitucionalidade o recorrente defende tem a seguinte 
 redacção:
 
  
 
 «Artigo 400.º
 
  
 
 1. Não é admissível recurso:
 a)...
 b)...
 c)...
 d) 
 e) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, em processo crime a que 
 seja aplicável pena de multa ou pena de prisão não superior a cinco anos, mesmo 
 em caso de concurso de infracções, ou em que o Ministério Público tenha usado da 
 faculdade prevista no art. 16.º, n.º 3;
 
 [...]».
 
  
 
    A questão de constitucionalidade da disposição constante da alínea e) do n.º 
 
 1 do art. 400º do CPP, que limita o recurso penal a dois graus de jurisdição, 
 foi, pelo menos, já objecto de tratamento nos Acórdãos deste Tribunal nºs 49/03, 
 
 377/03 e 390/04, o primeiro e o último publicados no Diário da República, II 
 Série, respectivamente, de 16 de Abril de 2003 e 7 de Julho de 2004, e o segundo 
 inédito, tendo-se concluído sempre pela sua constitucionalidade. A questão da 
 limitação do recurso penal a dois graus de jurisdição foi, também, apreciada, e 
 no mesmo sentido à excepção do caso analisado no Acórdão n.º 628/05, disponível 
 em www.tribunalconstitucional.pt/, entre outros, nos Acórdãos n.º 189/01 
 
 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 50º vol., p. 285), n.º 
 
 369/01 (inédito) e n.º 435/01 (inédito), a propósito das disposições constantes 
 das alíneas c) e f), do mesmo número e artigo. 
 
    
 
    Sobre a matéria escreveu-se o seguinte naquele Acórdão n.º 390/04:
 
    
 
    «Fazendo uma síntese da doutrina defendida nestes últimos arestos, assim 
 discreteou aquele Acórdão n.º 377/03:
 
  
 
  “O direito de recurso conta-se entre ‘todas as garantias de defesa’ conferidas 
 pelo art. 32.º, n.º 1, da CRP. Todavia, no domínio do processo penal, esse 
 direito ao recurso basta-se com a existência de um duplo grau de jurisdição. Do 
 art. 20.º, n.º 1, da CRP não resulta que os interessados tenham de ter 
 assegurados todos os graus de recurso abstractamente configuráveis ou um direito 
 irrestrito ao recurso. Numa hipótese, como a da alínea e) do n.º 1 do art. 400.º 
 do CPP, em que se mostra assegurado um duplo grau de jurisdição não poderá 
 dizer-se que não esteja assegurado em termos constitucionalmente justificados o 
 direito de acesso aos tribunais. A limitação dos graus de recurso, na situação a 
 que se reporta a alínea e) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, justifica-se por 
 estarem em causa crimes que são punidos com penas leves ou de média gravidade e 
 pela necessidade de limitar a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça a casos 
 de maior gravidade, por razões de capacidade de resposta do sistema judiciário e 
 de economia processual”.
 
    
 
    É esta jurisprudência que aqui se renova. 
 
  
 
    É certo que o recorrente questiona, aqui, uma específica dimensão normativa 
 do art. 400º, n.º 1, alínea e) do CPP, traduzida na irrecorribilidade de acórdão 
 condenatório da Relação, ainda que o fundamento desse recurso se traduza na 
 respectiva nulidade.
 
    Lembre-se, porém, que a garantia de um duplo grau de jurisdição apenas tem 
 sido defendida pela jurisprudência do Tribunal Constitucional relativamente a 
 decisões penais condenatórias e a decisões respeitantes à situação do arguido 
 face à privação ou restrição de liberdade ou a quaisquer outros direitos 
 fundamentais (cf. Acórdão n.º 265/94, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 
 
 27º vol., pp. 751 e ss.), mas não já relativamente a determinadas normas 
 processuais que denegam a possibilidade de o arguido recorrer de determinados 
 despachos ou decisões proferidas na pendência do processo (v.g., quer de 
 despachos interlocutórios, quer de outras decisões, Acórdãos n.º 259/88, n.º 
 
 118/90 e n.º 353/91, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 12º vol., p. 735; 
 
 15º vol., p. 397, e 19º vol., p. 563, e Acórdão n.º 30/01, publicado no Diário 
 da República, II Série, de 23 de Março de 2001 - também in Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 49º vol., p. 171 - relativo à irrecorribilidade da decisão 
 instrutória que pronuncie o arguido pelos factos constantes da acusação 
 particular quando o Ministério Público acompanhe essa acusação particular).
 
    Ora, nesta linha de pensamento, não se vislumbram suficientes razões que 
 justifiquem a alteração da posição tomada quanto à matéria só porque o 
 fundamento do recurso é constituído por nulidades do acórdão. A consagração de 
 um duplo grau de jurisdição em matéria penal decorre essencialmente da 
 exigibilidade constitucional de se conferir um grau elevado de asseguramento, de 
 concretização e de realização aos direitos e garantias fundamentais da liberdade 
 e segurança dos cidadãos (sendo igualmente invocável relativamente a outros 
 direitos e garantias fundamentais), dado que estes são directamente atingidos 
 pelas decisões condenatórias e outras decisões judiciais que limitem ou 
 restrinjam a liberdade. A existência de um segundo grau de reexame jurisdicional 
 das medidas de privação, limitação ou restrição desses direitos fundamentais 
 corresponde, assim, ao patamar que a Constituição tem como minimamente tolerável 
 para que se possam haver por arredados os perigos de uma ofensa inconsistente de 
 tais direitos.
 
    Dentro desta perspectiva, escreveu-se no Acórdão n.º 49/03, a propósito da 
 inadmissibilidade do recurso para o STJ nos termos da alínea e) do n.º 1 do art. 
 
 400º do CPP, em caso de decisão condenatória da Relação que sucedeu a decisão 
 absolutória da 1ª instância:
 
  
 
 «[...]
 A norma impugnada pela recorrente – contida na alínea e) do nº 1 do artigo 400º 
 do Código de Processo Penal – exclui, nos casos nela previstos, a possibilidade 
 de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos proferidos em recurso 
 pela relação. 
 Importa ter presente, todavia, que tais acórdãos resultam justamente da 
 reapreciação por um tribunal superior (o tribunal da relação), perante o qual o 
 arguido tem a possibilidade de expor a sua defesa. Por outras palavras, o 
 acórdão da relação, proferido em 2ª instância, consubstancia a garantia do duplo 
 grau de jurisdição, indo ao encontro precisamente dos fundamentos do direito ao 
 recurso.
 Dir-se-á – como faz a recorrente – que, tendo havido uma decisão absolutória na 
 primeira instância, o direito ao recurso implicaria a possibilidade de recorrer 
 da primeira decisão condenatória: precisamente o acórdão da relação.
 Tal entendimento, não só encara o direito ao recurso desligado dos seus 
 fundamentos substanciais (como resulta do que já se disse), mas levaria também, 
 em bom rigor, a resultados inaceitáveis, como se passa a demonstrar.
 Se o direito ao recurso em processo penal não for entendido em conjugação com o 
 duplo grau de jurisdição, sendo antes perspectivado como uma faculdade de 
 recorrer – sempre e em qualquer caso – da primeira decisão condenatória, ainda 
 que proferida em recurso, deveria haver recurso do acórdão condenatório do 
 Supremo Tribunal de Justiça, na sequência de recurso interposto de decisão da 
 Relação que confirmasse a absolvição da 1ª instância. O que ninguém aceitará.
 A verdade é que, estando cumprido o duplo grau de jurisdição, há fundamentos 
 razoáveis para limitar a possibilidade de um triplo grau de jurisdição, mediante 
 a atribuição de um direito de recorrer de decisões condenatórias”.
 
  
 
    O Tribunal Constitucional, sempre, entendeu a garantia do duplo grau de 
 jurisdição enquanto respeitando ao direito ao recurso relativo a decisões penais 
 condenatórias e, ainda, quanto às decisões penais respeitantes à situação do 
 arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros 
 direitos fundamentais.
 
    Paradigmático de uma tal leitura da Constituição é o discurso expendido no 
 Acórdão n.º 265/94 (Diário da República, II Série, de 19 de Julho de 1994), mas 
 cujo sentido informa igualmente a fundamentação, entre outros, dos Acórdãos n.º 
 
 610/96, n.º 468/97, n.º 216/99 e nº 113/00 (todos disponíveis em www.tribunal 
 constitucional.pt/jurisprudencia, estando ainda o primeiro e o terceiro 
 publicados, respectivamente, no Diário da República, II Série, de 6 de Julho de 
 
 1996 e 6 de Agosto de 1999):
 
  
 
    «A garantia do duplo grau de jurisdição existe quanto às decisões penais 
 condenatórias e ainda quanto às decisões penais respeitantes à situação do 
 arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros 
 direitos fundamentais.
 Sendo, embora, a faculdade de recorrer, em processo penal, uma tradução da 
 expressão do direito de defesa (veja-se nesse sentido o Acórdão n.º 8/87 do 
 Tribunal Constitucional, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9º volume, p. 
 
 235), a verdade é que, como se escreveu no Acórdão n.º 31/87 do mesmo Tribunal, 
 
 “se há-de admitir que essa faculdade de recorrer seja restringida ou limitada em 
 certas fases do processo e que, relativamente a certos actos do juiz, possa 
 mesmo não existir, desde que, dessa forma, se não atinja o conteúdo essencial 
 dessa mesma faculdade, ou seja, o direito de defesa do arguido”. E, mais à 
 frente, lê-se no mesmo aresto:
 
 “Ora, a salvaguarda desse direito de defesa impõe seguramente que se consagre a 
 faculdade de recorrer da sentença condenatória, como se determina, aliás, de 
 forma expressa no n.º 5 do artigo 14º do Pacto Internacional sobre os Direitos 
 Civis e Políticos, aprovado para ratificação pela Lei n.º 29/78, de 12 de Junho: 
 
 «Qualquer pessoa declarada culpada de crime terá o direito de fazer examinar por 
 uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade e a sentença, em 
 conformidade com a lei»; como imporá, também, que a lei preveja o recurso dos 
 actos judiciais que, durante o processo, tenham como efeito a privação ou a 
 restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais do arguido. Mas já não 
 impõe que se possibilite o recurso de todo e qualquer acto do juiz” (in Acórdãos 
 do Tribunal Constitucional, 9º vol., pp. 467-468; no mesmo sentido, veja-se o 
 Acórdão n.º 178/88, in Acórdãos, vol. 12º, pp. 569 e seguintes)».
 
  
 A garantia de um duplo grau de jurisdição traduz-se, deste modo, na 
 possibilidade de a situação de eventual ofensa ao direito de liberdade e 
 segurança poder ser reexaminada, concernentemente a todos os fundamentos que 
 poderão determinar a decisão da causa, por um tribunal diferente, 
 hierarquicamente superior. Dito de uma forma simplista, a garantia de um duplo 
 grau de jurisdição tem que ver essencialmente com a definição da situação 
 jurídico-criminal do arguido em matéria que contenda com a privação, limitação 
 ou restrição dos seus direitos e garantias fundamentais da liberdade e segurança 
 
 (como é, por exemplo, o caso das decisões condenatórias ou de aplicação de 
 medidas de coacção), e não, directamente, com o cumprimento das regras 
 procedimentais ou processuais a que o legislador subordine as decisões judiciais 
 em tal matéria. 
 Sendo assim, não decorre forçosamente da garantia constitucional de um duplo 
 grau de jurisdição que haja de ser sempre admissível o recurso para o tribunal 
 superior, nos casos em que o tribunal de recurso se pronuncie, pela primeira 
 vez, sobre questões que influam na decisão da causa (ressalvando-se o recurso de 
 constitucionalidade para o órgão jurisdicional específico não enquadrado na 
 hierarquia dos tribunais) ou nos de, ao proferir a decisão, incorrer na violação 
 de lei processual ou procedimental que seja sancionada com o estigma da 
 nulidade.
 Nada impõe que se leve a autonomização da questão da nulidade da decisão em 
 relação à questão de fundo tão longe que seja constitucionalmente exigível a 
 existência de um 2º grau de jurisdição especificamente para esta questão, 
 considerando o regime de arguição e conhecimento das nulidades em processo penal 
 por via de recurso, a possibilidade de arguir as nulidades perante o órgão que 
 proferiu a decisão, quando aquele recurso não existir, e, como no presente caso, 
 a existência de duas decisões concordantes em sentido condenatório (o Tribunal 
 da Relação confirmou a decisão da 1ª instância nesse sentido).
 
 É claro que o legislador poderia, na sua discricionariedade legislativa, admitir 
 esse recurso, mesmo nas hipóteses em que o fundamento deste resida na arguição 
 de nulidades processuais, assim ampliando o âmbito material do direito de 
 recurso, mas a sua inadmissibilidade não será constitucionalmente intolerável».
 
  
 
    Pode transpor-se para a resolução da questão de constitucionalidade, agora 
 sob exame, o essencial da argumentação que se transcreveu, expendida no referido 
 aresto, pelo que é de lhe dar a mesma solução, sem a ressalva, sequer, das 
 dúvidas expostas na declaração de voto a ele aposta.
 
    Na verdade, se, tal como aí, não deixa de estar em causa uma dimensão 
 normativa do direito ao recurso que se mostra afectada de elementos processuais 
 que não dizem directamente respeito ao mérito da decisão recorrida – no Acórdão 
 n.º 390/04 estava, em causa, a inadmissibilidade de recurso relativo a decisão 
 condenatória com fundamento em nulidades processuais imputadas à decisão 
 condenatória do tribunal; agora a questão tem que ver com a inadmissibilidade de 
 recurso da decisão que rejeitou o recurso, não conhecendo do seu mérito, pelo 
 não cumprimento “capaz” de ónus processuais que impendem sobre o recorrente – , 
 o certo é que, aqui, a inadmissibilidade do recurso para o STJ respeita a uma 
 decisão da Relação cujo não conhecimento do mérito do recurso para ela 
 interposto se baseia num incumprimento do ónus de concisão das conclusões da 
 motivação do recorrente, apesar de convidado a fazê-lo.
 
    Como fundamento do recurso para o STJ, pretendido interpor, que não do 
 despacho que não o admitiu, está um alegado incumprimento, por parte do tribunal 
 da Relação, das normas processuais que regem o conhecimento do recurso para ela 
 interposto, mas, antes, o cumprimento, por banda do recorrente/arguido, de 
 normas processuais que estabelecem condições formais para que o tribunal possa 
 conhecer do mérito do objecto do recurso.
 
    O segundo grau de jurisdição mostra-se assegurado em toda a sua extensão, 
 incluindo na sua vertente de direito a uma decisão de mérito, através da 
 possibilidade do recurso da 1ª instância para a Relação, de acordo com as 
 disposições combinadas dos art. 399º e 400, n.º 1, aliena e), do CPP. 
 
    Se o recorrente não usufruiu em efectividade dele, tal se deveu, na 
 perspectiva do tribunal recorrido, apenas, à circunstância de não dar cabal 
 cumprimento ao ónus de concisão das conclusões da motivação de recurso, não 
 obstante convite para o efeito.
 
    Não sendo o estabelecimento, por parte do legislador ordinário, desse ónus e 
 do efeito preclusivo que lhe está associado depois do convite ao recorrente para 
 corrigir o vício processual ofensivo das garantias de defesa constitucionalmente 
 reconhecidas, como se retira da repetida jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional a propósito do art. 412º, n.ºs 1 e 2, do CPP (neste sentido, 
 entre muitos outros, os Acórdãos, n.º 43/99 – Diário da República II Série, n.º 
 
 72, de 26 de Março de 1999, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 42.º vol., p. 
 
 171; n.º 417/99 – Diário da República II Série, n.º 61, de 13 de Março de 2000; 
 n.º 43/2000 – Acórdãos do Tribunal Constitucional, 46.º vol., p. 803; Acórdão 
 n.º 337/2000 – de declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória 
 geral –, Diário da República I Série-A, n.º 167, de 21 de Julho de 2000, e 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, 47.º vol., p. 47; e, por último, mais 
 recentemente, o Acórdão n.º 140/04, que faz uma abundante recensão da 
 jurisprudência anterior – Diário da República II Série, de 17 de Abril de 2004), 
 não pode deixar de concluir-se que impor-se um novo grau de recurso, numa tal 
 situação, seria retirar todo o sentido à exigência condicionadora do 
 estabelecimento de tal ónus.
 
    O recurso não merece assim provimento.
 
  
 
  
 C – Decisão
 
  
 
    12 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide:
 
  
 
    a) Não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 400º, n.º 1, 
 alínea e), do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que 
 não é admissível recurso para o STJ de acórdãos proferidos, em recurso, pelas 
 relações, em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão não superior 
 a cinco anos, mesmo em caso de concurso de infracções, e em que a decisão é de 
 rejeição do recurso interposto pelo arguido da decisão da 1ª instância, por 
 falta de concisão das conclusões” apresentadas depois de prévio convite para a 
 sua correcção;
 
  
 
    b) Negar provimento ao recurso;
 
  
 
    c) Condenar o recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 20 UCs. 
 
  
 
 21 de Fevereiro de 2006
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Paulo Mota Pinto
 Maria Fernanda Palma (com declaração de voto correspondente à que juntei ao 
 Acórdão n.º 390/04, em que suscitei dúvidas no sentido de 
 inconstitucionalidade).
 Rui Manuel Moura Ramos