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Processo n.º 382/06
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
 
  
 
  
 
  
 ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
 
  
 
  
 
  
 
 1.         A.  reclama para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no 
 n.º 4 do artigo 76º da Lei 28/82 de 25 de Novembro (LTC), pedindo a revogação do 
 despacho que, no Supremo Tribunal de Justiça, lhe não admitiu o recurso que 
 pretendia interpor, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da citada Lei. 
 Diz:
 
  
 
 1. O ora reclamante havia apresentado a petição de recurso para o Tribunal 
 Constitucional, indicando as seguintes normas cujas inconstitucionalidades 
 pretendia ver sindicada:
 arts. 399°, 400º 1 e) e f), 420° 1 e 4 e 185,1, todos do CPP.
 
 2. O Meritíssimo Senhor Conselheiro Relator apreciou, em primeiro lugar, este 
 
 último artigo, o qual, manifestamente, extravasava do contexto processual em que 
 foi indicado, por mero lapso, já que o que se tinha pretendido era invocar o 
 art. 188°. Tem pois toda a razão, quando afirma que nenhuma das decisões aplicou 
 norma sobre “Apreensão de coisas perecíveis, perigosa ou deterioráveis'. Assim, 
 resta ao ora reclamante, nesta parte, conformar-se com a decisão, e confessar o 
 seu erro, que facilmente pode ser convolado de lapsus linguae em lapsus calami.
 
 3. Passou depois o mesmo Ilustre Magistrado à análise do art. 400° 1 e) e f), 
 onde, salvo o sempre e muito devido respeito, agita o argumento do terror do 3° 
 grau (de jurisdição), defendendo a sonegação ao conhecimento do Tribunal 
 Constitucional da questão que se pretendia que fosse por este Alto Tribunal 
 apreciada, por isso que '...à pergunta sobre se essa norma seria 
 inconstitucional tem sido - e continua (...) a ser - negativa... ', citando a 
 este propósito um aresto de que foi relator o Excelentíssimo Senhor Conselheiro 
 Mário Torres.
 Contudo, este entendimento, vocacionado para, no limite, fundamentar a extinção 
 do Tribunal Constitucional, já que em todos os processos de apreciação da 
 constitucionalidade de interpretação e aplicação de normas se poderá agitar a 
 terrífica bandeira do 3° grau (de jurisdição), não é sustentável em face do 
 alegado e a alegar pelo ora reclamante, como se crê que irá ser reconhecido pela 
 serena e isenta lucidez deste Alto Tribunal.
 
 4. No concernente aos meios 'ínvios' a que mais uma vez, com uma insistência que 
 não pode deixar de ser menorizante da mandatária do ora reclamante, o que muito 
 se lamenta, até porque segundo um velho brocardo da praxe forense 'nos Tribunais 
 a delicadeza nunca é demais', a apreciação feita sobre a indicação do art. 420° 
 
 1 e 4, omite o entendimento que muito claramente defendida na Jurisprudência 
 mais recente.
 Acresce que é ininteligível o 'distinguo' aludido sobre o poder de selecção de 
 causas por parte dos Tribunais superiores e o mero regime simplificado de 
 decisão. Conceitualmente, valorando referências subjectivas, concebe-se. Na 
 prática, é puramente temerário e aleatório.
 O que pode transparecer deste argumento é, no fundo, uma aparência de quase 
 paternal protecção do STJ sobre o TC, que não quadra bem nem com os direitos do 
 arguido, nem com a dignidade deste Alto Tribunal.
 O ora reclamante confessa que tem dificuldade em perceber que a declaração de 
 manifesta improcedência do recurso, por razões de mérito, possa ser emitida, sem 
 lhe ser dada a possibilidade de argumentar em sentido contrário. E que tal 
 declaração é sempre uma decisão infundamentada e uma petição de princípio. É um 
 precedente perigoso, até porque, quanto mais não seja, pode facilmente 
 confundir-se com o retorno ao princípio da oportunidade que, crê-se que há muito 
 tempo, cedeu perante o princípio da legalidade.
 
 5. Sobre a indicação do art. 399º, tanto quanto se julga ter entendido, o aliás 
 douto despacho reclamado é pura e simplesmente omisso.
 
 6. Acresce que está comprovado nos presentes autos que ora reclamante suscitou 
 durante o processo inconstitucionalidades, nos momentos aliás indicados no seu 
 requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional.
 
 7. Quanto as restantes inconstitucionalidades invocadas pelo ora reclamante e 
 identificadas no requerimento de arguição de nulidades, apenas foram invocadas 
 nessa fase porque se prendem com decisão também só proferida nesse momento, pelo 
 que o ora reclamante não podia invocá-las antes de ter sido proferida aquela 
 decisão.
 
 8. Assim sendo o ora reclamante requer que Vossa Excelência se digne ordenar que 
 o recurso interposto para este Alto Tribunal Constitucional seja admitido e 
 apreciado.
 
  
 
  
 Sobre o mérito esta reclamação diz o representante do Ministério Público neste 
 Tribunal:
 
  
 A presente reclamação carece obviamente de fundamento sério.
 Cumpre notar, desde logo, que o recorrente não cumpre minimamente o ónus de 
 delimitar, em termos inteligíveis, qual a específica interpretação ou dimensão 
 normativa dos preceitos legais “arrolados” como “inconstitucionais”, e que 
 pretende controverter: não o faz manifestamente no requerimento de interposição 
 de recurso e continua a não o fazer no âmbito da presente reclamação, 
 desaproveitando, deste modo, a oportunidade de explicitar qual é, afinal, o 
 objecto normativo do recurso que pretende interpor (bem sabendo que, na 
 tramitação do processo de reclamação não cabe a prolação de “convite” para 
 aperfeiçoar o dito requerimento). Tal estratégia processual priva, em rigor, o 
 recurso de um verdadeiro objecto normativo, impedindo o Tribunal Constitucional 
 de conhecer quais as questões sobre que deveria fazer incidir os seus poderes 
 cognitivos.
 Acresce que se não mostra suscitada, durante o processo e em termos 
 processualmente adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa 
 
 (cfr. as conclusões do recurso para o STJ, transcritas a p. 17 dos autos), sendo 
 manifesto que a interpretação redigida pelo STJ, do disposto nos art. 400º, n.º 
 
 1, alínea e) e f) e 420º (incluindo o n.º 4) do CPP não pode seguramente 
 qualificar-se como constituindo “decisão surpresa”, que, pelo seu carácter 
 
 “insólito” e “imprevisível”, dispensasse o recorrente do ónus de suscitação que 
 sobre si recaía.
 
  
 
 2.         Para uma melhor enunciação da questão que nos ocupa, é útil recordar 
 que o reclamante reclamara do acórdão proferido no Supremo Tribunal de Justiça, 
 nos seguintes termos:
 
  
 A., recorrente nos autos em epígrafe, tendo sido notificado do alias douto 
 acórdão que indeferiu a aclaração por si requerida, vem muito respeitosamente 
 arguir nulidades e em consequência requerer a anulação do aliás douto acórdão 
 final global, com base nos seguintes termos e fundamentos:
 
 1. Subjaz a tal aresto uma interpretação restritiva dos direitos do arguido, no 
 que tange aos art. 400° n.º1 al. e) e 399° do Código de Processo Penal que se 
 traduz na aplicação e interpretação inconstitucional destes preceitos legais, 
 por manifesta colisão com o disposto no art. 32° n.º 1 da CRP e em consequência 
 na violação do princípio constitucional das garantias de defesa.
 
 2. Acresce que, por muito douta que seja a decisão de rejeição de qualquer 
 recurso, por manifesta improcedência, sem que seja concedido ao arguido o 
 direito de demonstrar a tese contrária, cingindo aos limites iniciais do 
 recurso, constitui também uma intolerável redução do exercício dos seus direitos 
 e consequentemente uma interpretação e aplicação inconstitucional do art. 420° 
 do CPP, por violação do disposto no já citado art. 32° n.º1 da CRP.
 
 3. A permissão contida no art. 420°, de rejeição por manifesta improcedência, do 
 recurso, poderá aplicar-se apenas aos casos de inobservância de requisitos 
 formais e adjectivos, ou aos casos em que o recurso versa sobre a apreciação de 
 matéria vedada ao STJ.
 
 4. É inconstitucional, a aplicação e interpretação daquele preceito legal, 
 quando permite uma apreciação sumária, sem audição do arguido, das pretensões 
 contidas no recurso, por esta ser insuficiente e não garantir plenamente os 
 direitos do arguido, quer na vertente do direito ao recurso, quer no princípio 
 do contraditório.
 
 5. Para além disso, a condenação do recorrente a título de sanção, por aplicação 
 do disposto no n.º 4 do art. 420° do CPP, colide com direito ao recurso 
 consagrado constitucionalmente e coarcta os direitos do arguido.
 
 6. Na verdade, nos autos em epígrafe, os recursos subiram ao STJ, por decisão 
 proferida em sede de reclamação dirigida ao Excelentíssimo Senhor Presidente 
 deste Tribunal, pelo que por tal razão e mesmo tendo sido rejeitado tal recurso 
 por inadmissível, não deveria ter aplicação o disposto no  n.º 4 do mencionado 
 preceito legal.
 
 7. Para além disso, nem sequer os motivos que levaram à rejeição por manifesta 
 improcedência no caso sub judice se enquadram nas atitudes que o legislador quis 
 sancionar, ou seja a lide temerária e a falta de seriedade na interposição do 
 recurso, ao estabelecer aquela norma.
 
 8. Entendemos assim, que houve também incorrecta e inconstitucional 
 interpretação e aplicação do disposto no art. 420° n.º 4 do CPP.
 
  
 Este requerimento obteve a seguinte decisão:
 
  
 
 1. Os pedidos de aclaração
 
 1.1. [...] e A., em 27SET05, pediram a aclaração do acórdão de rejeição do 
 recurso principal: «O aresto rejeitou, por  inadmissibilidade e/ou manifesta 
 improcedência, o recurso. O arguido tem direito de saber em concreto se o seu 
 recurso foi rejeitado ou não apenas por inadmissibilidade e, na eventualidade de 
 ter sido rejeitado também por manifesta improcedência, quais os fundamentos 
 subjacentes tão curiosa decisão».
 
 1.2. Todavia, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu em 03Nov05 esse pedido.
 
 2. Os pedidos de declaração de inconstitucionalidade
 
 2.1. Notificados do acórdão aclaratório em 11Nov05, os arguidos, em 24, 
 invocaram, como se de «arguição de nulidades» se tratasse, a 
 
 «inconstitucionalidade» da «interpretação que subjaz a tal aresto, restritiva 
 dos direitos do arguido, no que tange aos art. 400° n.º 1 al. e) e 399° do 
 Código de Processo Penal» e, bem assim, a da «aplicação e interpretação [do art. 
 
 420.1 do CPP], quando permite uma apreciação sumária, sem audição do arguido, 
 das pretensões contidas no recurso».
 
 2.2. Sustentaram ainda que, «mesmo tendo sido rejeitado tal recurso por 
 inadmissível, não deveria ter aplicação o disposto no art. n.º 4 do mencionado 
 preceito legal», por «os motivos que levaram à rejeição por manifesta 
 improcedência no caso sub judice não se enquadrarem nas atitudes que o 
 legislador quis sancionar (a lide temerária e a falta de seriedade na 
 interposição do recurso)». E daí, também, a «incorrecta e inconstitucional 
 interpretação e aplicação do disposto no art. 420° n.º 4 do CPP»:
 
 «1. Subjaz a tal aresto uma interpretação restritiva dos direitos do arguido, no 
 que tange aos art. 400° n.º 1 al. e) e 399° do Código de Processo Penal, que se 
 traduz na aplicação e interpretação inconstitucional destes preceitos legais, 
 por manifesta colisão com o disposto no art. 32° n. ° 1 da CRP e em consequência 
 na violação do princípio constitucional das garantias de defesa. 2. Acresce que, 
 por muito douta que seja a decisão de rejeição de qualquer recurso por manifesta 
 improcedência sem que seja concedido ao arguido o direito de demonstrar a tese 
 contrária, cingindo aos limites iniciais do recurso, constitui também uma 
 intolerável redução do exercício dos seus direitos e consequentemente uma 
 interpretação e aplicação inconstitucional do art. 420° do CPP, por violação do 
 disposto no já citado art. 32° n.º 1 da CRP. 3. A permissão contida no art. 420º 
 de rejeição por manifesta improcedência, do recurso, poderá aplicar-se apenas 
 aos casos de inobservância de requisitos formais e adjectivos, ou em aos casos 
 em que o recurso versa sobre a apreciação de matéria vedada ao STJ. 4. É 
 inconstitucional, a aplicação e interpretação daquele preceito legal, quando 
 permite uma apreciação sumária, sem audição do arguido, das pretensões contidas 
 no recurso, por esta ser insuficiente e não garantir plenamente os direitos do 
 arguido, quer na vertente do direito ao recurso, quer no principio do 
 contraditório. 5. Para além disso, a condenação do recorrente a titulo de 
 sanção, por aplicação do disposto no n. ° 4 do art. 420° do CPP, colide com 
 direito ao recurso consagrado constitucionalmente e coarcta os direitos do 
 arguido. 6. Na verdade, nos autos em epigrafe, os recurso subiram ao STJ, por 
 decisão proferida em sede de reclamação dirigida ao Presidente deste Tribunal, 
 pelo que por tal razão e mesmo tendo sido rejeitado tal recurso por 
 inadmissível! não deveria ter aplicação o disposto no art. n. ° 4 do mencionado 
 preceito legal. 7.Nem sequer os motivos que levaram à rejeição por manifesta 
 improcedência no caso sub judice se enquadram nas atitudes que o legislador quis 
 sancionar, ou seja, a lide temerária e a falta de seriedade na interposição, ao 
 estabelecer aquela norma. 8. Entendemos assim, que houve também incorrecta e 
 inconstitucional interpretação e aplicação do disposto no art. 420° n. ° 4 do 
 CPP»
 
 2.3. O MP, na sua resposta de 27DEZO5, pronunciou-se pelo indeferimento dos 
 pedidos:
 
 «A [primeira] questão (…) já fora suscitada e objecto de pronúncia no acórdão de 
 
 3 de Novembro (cfr. n. ° 3.5). A [segunda] questão (…) encontra-se igualmente, 
 de alguma forma, respondida no mesmo ponto do acórdão: «A lei ordinária, ela 
 própria, apenas garante a recorribilidade dos acórdãos, das sentenças e dos 
 despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei». O juízo de 
 manifesta improcedência, assente numa apreciação liminar dos fundamentos do 
 pedido, não colide com as garantias de defesa. Não se trata de incumprimento dos 
 requisitos formais de determinado pedido, que poderiam obstar ao seu 
 conhecimento (caso em que, na perspectiva constitucional, se justifica o convite 
 
 à correcção), mas apenas apurar se o referido pedido está claramente (no que 
 respeita ao seu mérito) votado ao insucesso. Dito de outro modo: a possibilidade 
 de rejeição de um recurso por manifesta improcedência não viola o direito 
 constitucional ao recurso. Por último, não será certamente a decisão do 
 presidente do STJ incidindo sobre a reclamação do despacho de não admissão do 
 recurso) que isenta o recorrente do regime do n. ° 4 do art. 420° do Cód Proc. 
 Penal. O n. ° 4 do art. 405 do Cód Proc. Penal estabelece que a decisão do 
 presidente do tribunal superior (no caso de deferimento da reclamação não 
 vincula o tribunal de recurso. Não se vê razão (em sede de garantias) para que o 
 juízo formulado por um colectivo de juízes conselheiros sobre a 
 inadmissibilidade (e consequente rejeição merecesse restrições consoante fosse, 
 ou não, precedido de uma decisão individual do presidente do STJ»
 
 3. Brevíssima apreciação
 
 3.1. «É correspondentemente aplicável aos acórdãos proferidos em recurso o 
 disposto nos artigos 379.º e 380º, sendo o acórdão ainda nulo quando lavrado 
 contra o vencido» (art. 425.4 do CPP).
 
 3.2. Por outro lado, «a violação ou Inobservância das disposições da lei do 
 processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente 
 cominada na lei» (art. 118.1).
 
 3.3. Daí que só sejam arguíveis – perante o próprio tribunal se a decisão não 
 admitir recurso (art. 668.3 do C PC) – as nulidades do acórdão proferido em 
 recurso se lavrado contra o vencido ou quando não contiver as menções, de entre 
 as correspondentemente aplicáveis, referidas no art. 374.2, ou o tribunal deixar 
 de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conhecer de questões de 
 que não podia tomar conhecimento.
 
 3.4. Porém, nenhuma dessas eventuais nulidades o recorrente arguiu, antes se 
 tendo limitado a aproveitar o incidente (facultado pela lei, tão só, «para 
 arguir nulidades») para, antes, invocar a inconstitucionalidade de algumas das 
 normas aplicadas no acórdão.
 
 3.5. Ora, o Incidente de arguição de nulidades não é o momento processual 
 próprio para invocação de inconstitucionalidades. Nem poderá tolerar-se que tal 
 incidente seja aproveitado como meio ínvio de «preparar» um recurso 
 constitucional fundado na aplicação, pela decisão recorrida, de «norma cuja 
 inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo» (art. 70.1.b da 
 LTC).
 
 3.6. De qualquer modo, para que «o acórdão ora reclamado» pudesse ser – como o 
 recorrente declarou pretender – «anulado e substituído por outro que admita o 
 recurso interposto e designe data para a realização da audiência», importaria 
 que enfermasse – não de uma qualquer aplicação inconstitucional das normas 
 aplicadas – mas de uma «nulidade», «expressamente cominada na lei» (art. 118.1 
 do CPP) e especificamente arguida pelo interessado (art. 120.1), que, por si, 
 conduzisse à invalidação e repetição do acto nulo (art. 122.1 e 2). E, como se 
 viu, nenhuma nulidade de catálogo foi, oportunamente, arguida pelo reclamante.
 
 3.7. Poderia admitir-se quando muito, ao abrigo do disposto o art. 669.1.b do 
 CPC (se aplicável, ao processo penal, por força do art. 4.º do CPP), a reforma 
 do acórdão quanto à sanção processual aplicada.
 
 3.8. No entanto, não só à rejeição do recurso por manifesta improcedência 
 corresponde, de preceito (art. 420.4 do CPP), a condenação do recorrente em 
 sanção processual de 3 e 10 UC (independentemente dos requisitos exigidos, pelo 
 art. 456.1 e 2 do CPC, para a condenação em multa por litigância de má fé), como 
 tal «manifesta improcedência» – diversamente do que o reclamante entende – não 
 tem a ver com os «casos de inobservância de requisitos formais e adjectivos» e, 
 menos ainda, com aqueles «em que o recurso verse sobre a apreciação de matéria 
 vedada ao STJ» (que serão aqueles em que se «verifique causa que devia ter 
 determinado a sua não admissão nos termos do art. 414.2» - art. 420.1, 2.ª 
 parte), mas antes, como no caso, «quando seja manifesto que o recurso, por 
 razões (...) de mérito, não pode proceder».
 
 4. Decisão
 Tudo visto, o Supremo Tribunal de Justiça, reunido em conferência para os 
 apreciar, indefere os pedidos de anulação formulados, contra os acórdãos 
 condenatório e aclaratório de O7JUL e O3Nov05, pelos cidadãos A. e [...], e 
 condena-os nas custas do incidente, com 4 (quatro) UC de taxa de justiça e 1 
 
 (uma) UC de procuradoria, por cada um.
 
  
 Foi na sequência deste acórdão que o reclamante quis interpor o recurso de 
 inconstitucionalidade, que formalizou nos seguintes termos:
 
  
 A., arguido e recorrente nos autos em epígrafe, tendo sido notificado do aliás 
 douto acórdão neles proferido em 19 p.p., que veio decidir desfavoravelmente a 
 arguição de nulidades e de questões de inconstitucionalidade suscitadas em torno 
 do também aliás douto acórdão nos mesmos autos prol atado em 3 de Novembro e em 
 
 7 de Julho de 2005 e não se podendo com eles conformar, vem muito 
 respeitosamente interpor recurso para o Alto Tribunal Constitucional, para o 
 que, em obediência ao estatuído no art. 75° da Lei 28/82, de 15 de Novembro com 
 as alterações que lhe foram posteriormente introduzidas, se passa a indicar o 
 seguinte:
 
 1. A alínea do nº 1 do art.70°, ao abrigo da qual o recurso é interposto é a al. 
 b);
 
 2. As normas cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal 
 Constitucional aprecie são as dos art.
 a) 399°,
 b) 400° n. º1 al. e), 
 c) 400° n. º1 al. f),
 d) 420° e
 e) 420° n.º 4, e ainda
 f)185° n.º1, todos do Cód. Proc. Penal.
 
 3. As normas da nossa Lei Fundamental que se consideram violadas com a 
 interpretação e aplicação que foram feitas daqueles incisos legais são:
 e) 32° n.º 1, e
 f) 208° n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
 
 4. As peças processuais nas quais o recorrente já suscitou a questão da 
 inconstitucionalidade, foram as seguintes:
 a) Requerimento de arguição reclamação do aliás douto acórdão proferido no 
 Venerando Supremo Tribunal de Justiça, nos presentes autos, em 7 de Julho de 
 
 2005;
 b) Requerimento para aclaração do mesmo e aliás douto acórdão;
 g) Motivação do recurso interposto para o Venerando Supremo Tribunal de Justiça 
 do aliás douto acórdão prolatado pelo Tribunal da Relação de Lisboa;
 h) Motivação do recurso interposto para este último Venerando, Tribunal do aliás 
 douto acórdão proferido na 1ª instância.
 Termos em que, com o sempre e muito douto suprimento de Vossa Excelência se 
 requer que o presente recurso – que não foi preparado com aproveitamento de meio 
 
 ínvio, como se exarou, em letra de forma no aliás douto acórdão de 19 p.p. – 
 seja aceite, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
 
  
 O requerimento foi indeferido por despacho do seguinte teor:
 
  
 
 [...] Pretendem os arguidos A. e [...] – através dos seus requerimentos de 
 
 09FEV06 – recorrer constitucionalmente dos acórdãos de 07JUL05 (que rejeitou, 
 por inadmissibilidade e manifesta improcedência os recursos por eles opostos ao 
 acórdão da Relação de Lisboa que, em 29ABR04, fixara respectivamente em 8 anos 
 de prisão e em 7,5 anos de prisão as penas conjuntas correspondentes aos 
 concursos criminosos por que haviam sido julgados, em 25MAR03, na 7ª Vara 
 Criminal de Lisboa), de 03NOV05 que indeferiu o seu pedido de aclaração do 
 acórdão anterior) e de 19JAN06 (que indeferiu igualmente o seu pedido de 
 anulação dos dois acórdãos precedentes). O recurso para o Tribunal 
 Constitucional foi interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70.º da 
 LTC, nele se tendo indicado, como «normas cuja inconstitucionalidade se pretende 
 que o tribunal aprecie», as dos art.s 399º e 400.1 e) e f), 420.1 e 4 e 185.1 do 
 CPP.
 Quanto à norma do art. 185.1 («Apreensão de coisas perecíveis, perigosas ou 
 deterioráveis»), nenhuma das decisões recorridas a aplicou.
 Quanto às dos art. 400.1 e) e f), «ao Tribunal Constitucional não compete 
 apreciar a correcção da interpretação do direito ordinário feita pela decisão 
 recorrida, mas tão só apurar se essa interpretação, que recebe como um dado da 
 questão, é, ao não, conforme às normas e princípios constitucionais». A esse 
 respeito, «tudo se passa» – no caso – «como se existisse uma norma legal que, de 
 forma clara e explícita, dissesse que não havia recurso para o STJ de acórdãos 
 das Relações que tivessem confirmado (mesmo que parcialmente, desde que in 
 melius) decisão da 1ª instância, quando o limite máximo da moldura penal dos 
 crimes, individualmente considerados, por que o arguido fora condenado não 
 ultrapassasse 8 anos de prisão. Ora, «à pergunta sobre essa se essa norma seria 
 inconstitucional, a resposta do Tribunal Constitucional tem sido – e continua 
 
 (…) a ser – negativa, pela elementar razão de que não é constitucionalmente 
 imposto, mesmo em processo penal, um terceiro grau de jurisdição» (Tribunal 
 Constitucional 03JAN06, relator- Cons. Mário Torres, ac. n.º 2/06, proc. n.º 
 
 954/05-2
 E, enfim, quanto às do art. 420.1 e 4, o ora recorrente pretende ter invocado a 
 
 «questão» da sua (pretensa) inconstitucionalidade no requerimento de arguição de 
 nulidades.
 Porém, o incidente de arguição de nulidades não é o momento processual próprio 
 para invocação de inconstitucionalidades. Nem poderá tolerar-se – como não se 
 tolerará agora – que tal incidente seja aproveitado como meio ínvio de 
 
 «preparar» um recurso constitucional fundado na aplicação, pela decisão 
 recorrida, de «norma cuja inconstitucionalidade haja sido [mas efectivamente o 
 não tenha] suscitada durante o processo» (art. 70.1.b da LTC).
 De qualquer modo, e quanto à «aplicação e interpretação [do art. 420.1 do CPP] , 
 quando permite uma apreciação sumária, sem audição do arguido, das pretensões 
 contidas no recurso», recorda-se aqui o que a esse respeito já se disse no 
 acórdão de 19JAN06: «É importante precisar que o que aqui se equaciona não é a 
 possibilidade de os tribunais superiores seleccionarem as causas que lhes são 
 submetidas mas sim um regime simplificado de decisão quando seja manifesto que o 
 recurso, por razões processuais ou de mérito, não pode proceder».
 E o mesmo se dirá – repetindo o que já oportunamente se disse – quanto à alegada 
 inconstitucionalidade da norma do art. 420.4 do CPP: «Não só à rejeição do 
 recurso por manifesta improcedência corresponde, de preceito (art. 420.4 do 
 CPP), a condenação do recorrente em sanção processual de 3 e 10 UC 
 
 (independentemente dos requisitos exigidos, pelo art. 456.1 e 2 do CPC, para a 
 condenação em multa por litigância de má fé), como tal «manifesta improcedência» 
 
 – diversamente do que o reclamante entende – não tem a ver com os «casos de 
 inobservância de requisitos formais e adjectivos» e, menos ainda, com aqueles 
 
 «em que o recurso verse sobre a apreciação de matéria vedada ao STJ» (que serão 
 aqueles em que se «verifique causa que devia ter determinado a sua não admissão 
 nos termos do art. 414.2» - art. 420.1, 2ª parte), mas antes, como no caso, 
 
 «quando seja manifesto que o recurso, por razões (...) de mérito, não pode 
 proceder».
 Os recursos não são pois admissíveis quanto às inconstitucionalidades não 
 suscitadas durante o processo (art. 70.1.b da LTC), e, quanto às demais, é de 
 indeferir porque «manifestamente infundados»: «O requerimento de interposição de 
 recurso para o Tribunal Constitucional deve ser indeferido (...), no caso dos 
 recursos previstos nas alíneas b) e f) do n. º 1 do artigo 70º, quando forem 
 manifestamente infundados» (art. 76.2 da LTC). [...]
 III
 
  [...] E indefiro, também, os recursos de constitucionalidade, de 9FEV06, dos 
 cidadãos A. e [...].
 
  
 
 3.1.      Cumpre decidir, começando por sublinhar que se a decisão do Tribunal 
 Constitucional revogar o despacho de indeferimento 'faz caso julgado quanto à 
 admissibilidade do recurso' (n.º 4 do artigo 77º da LTC); tal determina que, ao 
 apreciar a reclamação, o Tribunal deva pronunciar-se não só sobre o específico 
 fundamento que motivou o despacho de não recebimento do recurso, mas sobre a 
 verificação de todos os demais pressupostos exigidos pelo tipo de recurso 
 interposto.
 
  
 
 3.2.      Deve ter-se em atenção, depois, que o reclamante se conformou com o 
 despacho reclamado na parte em que decidiu não admitir, como objecto do recurso, 
 norma constante do artigo 185º n.º 1 do Código de Processo Penal, pelo que não é 
 agora oportuno tratar desta matéria.
 
  
 
 3.3.      De seguida, caberá dizer – porque o reclamante em certa medida 
 questiona na reclamação esta matéria – que devendo o tribunal recorrido 
 
 'apreciar a admissão' de recurso de inconstitucionalidade, nos termos do artigo 
 
 76º n.º 1 da LTC, não lhe está vedado poder indeferir o requerimento de 
 interposição do recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 
 
 70º da LTC, por motivo de manifesta improcedência, conforme está expressamente 
 previsto no n.º 2 do artigo 76º da mesma LTC; esta solução, que constitui um 
 afloramento da genérica proibição de praticar actos processuais inúteis, não 
 traduz qualquer compressão intolerável no direito do recorrente, pois tal 
 decisão pode ser impugnada (como efectivamente aconteceu) perante o próprio 
 Tribunal Constitucional – n.º 4 do artigo 76º da LTC.
 Não pode, por isso, afirmar-se que ocorra sonegação da questão ao conhecimento 
 do Tribunal Constitucional, como infundadamente alega o reclamante.
 
  
 
 4.         À pretensão do reclamante opõe o Ministério Público um argumento 
 inultrapassável, ao afirmar, como acima se deixou transcrito, 'que o recorrente 
 não cumpre minimamente o ónus de delimitar, em termos inteligíveis, qual a 
 específica interpretação ou dimensão normativa dos preceitos legais “arrolados” 
 como “inconstitucionais”, e que pretende controverter: não o faz manifestamente 
 no requerimento de interposição de recurso e continua a não o fazer no âmbito da 
 presente reclamação, desaproveitando, deste modo, a oportunidade de explicitar 
 qual é, afinal, o objecto normativo do recurso que pretende interpor (bem 
 sabendo que, na tramitação do processo de reclamação não cabe a prolação de 
 
 “convite” para aperfeiçoar o dito requerimento). Tal estratégia processual 
 priva, em rigor, o recurso de um verdadeiro objecto normativo, impedindo o 
 Tribunal Constitucional de conhecer quais as questões sobre que deveria fazer 
 incidir os seus poderes cognitivos.'
 Na verdade, exigindo-se, conforme jurisprudência constante e uniforme, que o 
 recorrente indique, no requerimento de interposição, qual a concreta dimensão 
 normativa impugnada, deve concluir-se que a mera indicação dos preceitos legais 
 impugnados não satisfaz este ónus do recorrente. Conforme se relata no Acórdão 
 n.º 39/2003, recordando o entendimento do Tribunal sobre o assunto: 
 
  
 
 «Como se disse, por exemplo, no Acórdão n.º 178/95, “Tendo a questão de 
 constitucionalidade que ser suscitada de forma clara e perceptível (cfr., entre 
 outros, o Acórdão nº 269/94, Diário da República, II Série, de 18 de Junho de 
 
 1994), impõe-se que, quando se questiona apenas uma certa interpretação de 
 determinada norma legal, se indique esse sentido (essa interpretação) em termos 
 que, se este tribunal o vier a julgar desconforme com a Constituição, o possa 
 enunciar na decisão que proferir, por forma a que o tribunal recorrido que 
 houver de reformar a sua decisão, os outros destinatários daquela e os 
 operadores jurídicos em geral, saibam qual o sentido da norma em causa que não 
 pode ser adoptado, por ser incompatível com a Lei Fundamental”. Porém, in casu, 
 verifica-se que nem no requerimento de interposição do recurso nem na resposta 
 ao despacho de aperfeiçoamento – (...) – o recorrente identifica a exacta 
 dimensão ou interpretação normativa dos preceitos do Código de Processo Penal e 
 do Código de Processo Civil, por si referidos, cuja inconstitucionalidade 
 pretende ver apreciada, limitando-se a referir que tais preceitos são 
 inconstitucionais na interpretação que lhes é dada pelo Supremo Tribunal de 
 Justiça. Ora, tal forma de proceder não é suficiente para que se possa 
 considerar cumprido o ónus referido supra. 
 Efectivamente,   pretender ver apreciada a inconstitucionalidade de um preceito 
 na interpretação normativa que lhe é dada por uma decisão judicial não é ainda 
 identificar essa interpretação normativa. Na verdade, ao limitar-se a remeter 
 para a “interpretação que lhes (aos preceitos) é dada pelo Supremo Tribunal de 
 Justiça”, o recorrente mais não está do que a transferir – de forma inadmissível 
 
 – para o Tribunal ad quem – no caso o Tribunal Constitucional – o ónus, que 
 sobre ele impende, de delimitar o objecto do recurso. Acresce que a não 
 indicação das exactas interpretações normativas dos preceitos referidos cuja 
 inconstitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada coloca ainda o 
 Tribunal numa situação de verdadeira impossibilidade de verificar se se 
 encontram preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade do recurso que 
 pretendeu interpor, ou seja: (i) saber se o recorrente suscitou, durante o 
 processo, a inconstitucionalidade dessa dimensão normativa; (ii) saber se a 
 decisão recorrida utilizou, como ratio decidendi, a exacta dimensão normativa 
 cuja inconstitucionalidade foi suscitada. Por tudo o exposto, torna-se evidente 
 que não pode conhecer-se do objecto do recurso interposto pelo recorrente, por 
 falta dos seus pressupostos legais de admissibilidade».
 
  
 Ora, os preceitos legais arrolados no requerimento de interposição do recurso 
 pelo reclamante comportam manifestamente diversas dimensões normativas, pelo que 
 se, por hipótese, fosse admitido este seu requerimento, o Tribunal ficaria 
 efectivamente sem saber qual o objecto do recurso. 
 Tal é o suficiente, sem que outros motivos devam a ser analisados, para concluir 
 pela falta de verificação dos pressupostos legais de admissibilidade do recurso 
 interposto.
 
  
 
 5.         Em face do exposto, decide-se indeferir a reclamação, confirmando a 
 decisão de não recebimento do recurso.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 Lisboa,  10 de Maio de 2006
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria Helena Brito
 Rui Manuel Moura Ramos