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Processo nº 143/06
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que são 
 recorrentes A. e B., foi proferida decisão sumária, nos termos previstos no 
 artigo 78º-A, nº 1, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal 
 Constitucional (LTC), por se ter entendido que não podia conhecer-se do objecto 
 do recurso, interposto ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da 
 LTC. Considerou-se, então, não estar presente um dos requisitos do recurso: a 
 suscitação, durante o processo, de uma questão de inconstitucionalidade 
 normativa.
 São os seguintes os fundamentos da decisão:
 
  
 
 «Um dos requisitos do recurso de constitucionalidade que o recorrente pretendeu 
 interpor – o previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC – é que a 
 questão de constitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo, de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em 
 termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigos 70º, nº 1, alínea b), e 
 
 72º, nº 2, da LTC).
 Resulta dos autos e, designadamente, dos excertos transcritos das peças 
 processuais indicadas pelos recorrentes na resposta ao convite ao 
 aperfeiçoamento do requerimento de interposição de recurso para este Tribunal 
 que não se pode dar como verificado este requisito, pois não há, no caso em 
 apreço, suscitação adequada de qualquer questão de constitucionalidade.
 Com efeito, não há a identificação da norma (ou normas) cuja 
 inconstitucionalidade os recorrentes pretendem ver apreciada (apreciadas) – 
 considerada a norma na sua totalidade, em determinado segmento ou segundo certa 
 interpretação –, mantendo-se a não identificação da norma no requerimento de 
 interposição de recurso para o Tribunal Constitucional (já depois de 
 aperfeiçoado).
 Como bem destaca Lopes do Rego, “quando se pretenda questionar a 
 constitucionalidade de uma dada interpretação normativa, é indispensável que a 
 parte identifique expressamente essa interpretação ou dimensão normativa, em 
 termos de o Tribunal, no caso de a vir a julgar inconstitucional, a poder 
 enunciar na decisão, de modo a que os respectivos destinatários e os operadores 
 do direito em geral fiquem a saber que essa norma não pode ser aplicada com tal 
 sentido.
 Não é, deste modo, como vem reiteradamente decidindo o Tribunal Constitucional, 
 forma idónea e adequada de suscitar uma questão de inconstitucionalidade 
 normativa a simples invocação de que seria inconstitucional um vasto e 
 heterogéneo conjunto de preceitos legais quando aplicados ao caso dos autos; ou 
 certa ou certas normas legais na interpretação que a decisão das instâncias lhes 
 conferiu, não suficientemente definida ou precisada pelo recorrente (…), cabendo 
 sempre à parte que pretende suscitar adequadamente uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa o ónus de especificar qual é, no seu 
 entendimento, o concreto sentido com que tal norma ou normas foram realmente 
 tomadas no caso concreto pela decisão que se pretende impugnar perante o 
 Tribunal Constitucional” (“O objecto idóneo dos recursos de fiscalização 
 concreta da constitucionalidade: as interpretações normativas sindicáveis pelo 
 Tribunal Constitucional”, Jurisprudência Constitucional, nº 3, 2004, p. 8).
 Importa, pois, e uma vez que o Tribunal Constitucional não está vinculado à 
 decisão de admissão de recurso proferida nos autos (artigo 76º, nº 3, da LTC), 
 concluir pelo não conhecimento do objecto do recurso, o que justifica a prolação 
 da presente decisão  (artigo 78º-A, nº 1, da LTC)».
 
  
 
 2. Da decisão sumária vêm agora os então recorrentes reclamar para a 
 conferência, ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 78º-A da LTC, invocando o 
 seguinte:
 
  
 
 «A. e Mulher, B. vêm reclamar para a Conferência da Decisão Singular de não 
 recebimento do Recurso por inadequação argumentativa de questão de 
 Inconstitucionalidade, nos termos e com os seguintes fundamentos:
 
 1)      O Douto Despacho da Excelentíssima Conselheira Relatora segue a Tese 
 comum do ónus de especificar qual é no entendimento concreto dos Recorrentes o 
 exacto sentido com que as normas arguidas foram realmente tomadas, no caso em 
 apreço, pela Decisão recorrida perante o Tribunal Constitucional.
 
 2)      Ora, os Reclamantes discordam frontalmente deste entendimento redutor, 
 que reputa infraccional, pois desrespeita, em boa verdade, o princípio da 
 proporcionalidade das reduções dos Direitos Fundamentais ou equiparados.
 
 3)      Na verdade, o Direito de recorrer para o T.C. por antinomia normativa 
 Constitucional é, pelo menos, um Direito análogo aos Direitos e Liberdades 
 Fundamentais.
 
 4)      Susceptível, portanto, de convocar nas questões práticas a que dê origem 
 o disposto no Artº 18/3 da C.R.P.
 
 5)      E, assim sendo, não se vê como é que a exigência restritiva 
 jurisprudencial, porventura justificada numa qualquer celeridade nos Debates 
 Judiciários, pode quase inutilizar o Direito de Recorrer;
 
 6)      Sobretudo quando a cultura jurídica de Milénios apenas exige à Parte que 
 apresente os dados de facto e não os modelos de justificação da solução jurídica 
 do caso. Com efeito, o que a Jurisprudência pede aos Recorrentes é, afinal, que 
 se pronuncie sobre o modelo jurídico e não sobre o acontecimento e a 
 discordância.
 
 7)      Tanto este como esta podem ser, muito bem, referido em geral, sem 
 necessidade de preciso recorte técnico, este que torna aristocrático o sistema.
 
 8)      Porém, a Constituição Portuguesa tem o propósito de instituir uma 
 Democracia avançada, até onde, naturalmente, os Poderes Inquisitórios dos 
 Tribunais se avolumam, para compensar os desfavores inevitáveis da cultura e 
 fortuna dos Cidadãos.
 
 9) Enfim, a interpretação restritiva tanto é desproporcionada quanto inútil e 
 perversa, no sentido da participação dos Cidadãos, Democrática e Democratizante 
 
 (…)».
 
  
 II. Fundamentação
 O recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da 
 LTC tem requisitos próprios, entre os quais se conta o ónus de suscitar a 
 questão da inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal recorrido, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 
 
 72º, nº 2, da LTC). Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 
 
 560/94, “é uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal 
 recorrido deva pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade e para que o 
 Tribunal Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame (e 
 não a um primeiro julgamento) de tal questão” (Diário da República, II Série, de 
 
 10 de Janeiro de 1995; no mesmo sentido, o Acórdão nº 611/04, não publicado).
 De resto, diferentemente do que sustentam os reclamantes, trata-se até de um 
 
 ónus alicerçado no artigo 280º, nº 1, alínea b), da Constituição da República 
 Portuguesa, na medida em que esta disposição explicita a exigência da suscitação 
 prévia, durante o processo, da inconstitucionalidade da norma.
 Não tendo os reclamantes demonstrado haver dado cumprimento ao ónus da 
 suscitação adequada da questão de constitucionalidade, importa concluir pelo 
 indeferimento da reclamação.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do 
 recurso.
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 
  
 Lisboa, 9 de Maio de 2006
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos
 Artur Maurício