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Processo nº 840/93
 
 2ª Secção 
 Relator: Cons. Messias Bento
 
  
 Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 
                         I. Relatório:
 
  
 
                         1. O SECRETÁRIO ADJUNTO PARA OS TRANSPORTES E OBRAS 
 PÚBLICAS DE MACAU, por despacho de 9 de Fevereiro de 1993 e precedendo proposta 
 do INSTITUTO A ..., autorizou a contratação, além do quadro, de B..., para 
 exercer funções públicas naquele Território.
 
  
 
  
 
                         O referido INSTITUTO, em 15 de Fevereiro de 1993, 
 formalizou o contrato com a interessada, atribuindo-lhe a categoria de 1º 
 oficial, 1º escalão, com o nível remuneratório correspondente ao índice 265 da 
 tabela.
 
  
 
  
 
                         Submetido o respectivo expediente à fiscalização do 
 Tribunal de Contas de Macau, o Juiz da Secção de Fiscalização Prévia, não 
 obstante a oposição do Ministério Público, concedeu o visto.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         Desta decisão do Juiz da Secção de Fiscalização Prévia 
 recorreu o MINISTÉRIO PÚBLICO para o Colectivo do Tribunal de Contas de Macau, o 
 qual, por acórdão de 28 de Setembro de 1993, anulou aquela decisão e, em 
 consequência, recusou o visto à contratação da referida B..., uma vez que, sendo 
 funcionária pública em Portugal, se encontra na situação de licença sem 
 vencimento e, por isso, abrangida pela incapacidade do artigo 13º, nº 1, alínea 
 a), do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.
 
  
 
  
 
                         Para o efeito, o Tribunal de Contas de Macau recusou 
 aplicação, com fundamento na sua inconstitucionalidade, ao artigo único do 
 Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro.
 
  
 
  
 
                         2. É desse acórdão do Tribunal de Contas de Macau (de 28 
 de Setembro de 1993) que vem o presente recurso, interposto pelo MINISTÉRIO 
 PÚBLICO ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, para apreciação da constitucionalidade da norma constante do 
 mencionado artigo único do Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro.
 
  
 
  
 
                         Neste Tribunal, alegou o Procurador-Geral Adjunto, 
 formulando as seguintes conclusões:
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
 1º - O regime estabelecido no artigo único do Decreto‑Lei nº 5/93/M, de 8 de 
 Fevereiro, não inova no que se refere ao regime jurídico aplicável ao pessoal 
 dos quadros próprios do território de Macau, plasmado no Estatuto dos 
 Trabalhadores da Administração Pública de Macau (aprovado pelo Decreto-Lei nº 
 
 87/89/M, de 21 de Dezembro, no exercício da autorização legislativa constante da 
 Lei nº 9/89/M, de 23 de Outubro).
 
 2º - Na verdade, a norma constante daquele artigo único incide sobre um aspecto 
 específico da regulamentação do recrutamento de pessoal no exterior, revogando 
 parcialmente o nº 3 do artigo 1º do Decreto‑Lei nº60/92/M, de 24 de Agosto, ao 
 estabelecer que a capacidade profissional dos agentes recrutados no exterior não 
 tem de obedecer aos condicionalismos previstos no artigo 13º, nº 1, do Estatuto 
 dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.
 
 3º - O estabelecimento da disciplina jurídica do recrutamento de pessoal no 
 exterior, mediante densificação e regulamentação da norma constante do artigo 
 
 69º, nº 1, do Estatuto Orgânico de Macau, não se situa no âmbito da competência 
 legislativa reservada da Assembleia Legislativa de Macau, tendo, aliás, o 
 Decreto-Lei nº 60/92/M sido editado pelo Governador de Macau, no exercício da 
 sua competência legislativa própria.
 
 4º - Assim sendo, o esgotamento e caducidade da autorização legislativa 
 concedida pela Lei nº 9/89/M não pode implicar a inconstitucionalidade orgânica 
 da norma constante do referido artigo único.
 
 5º - A diferenciação de regimes decorrente do artigo único do Decreto-Lei nº 
 
 5/93/M não viola os princípios constitucionais da igualdade e da não 
 discriminação do acesso à função pública, por na sua base se encontrar um 
 fundamento razoável, que constitui suporte material bastante do regime 
 instituído quanto à capacidade profissional dos agentes recrutados no exterior.
 
 6º - Tal diferenciação é consentida pelos artigos 68º a 70º do Estatuto Orgânico 
 de Macau, que instituem uma diversidade de regimes e uma tendencial 
 estanquicidade entre os quadros do funcionalismo próprios do território e os 
 quadros dependentes dos órgãos de soberania e das autarquias da República.
 
 7º - O recrutamento de pessoal no exterior, nos termos do artigo 69º, nº 1, do 
 Estatuto Orgânico de Macau e do estatuído no Decreto-Lei nº 60/92/M, tem 
 carácter excepcional e visa  realizar um interesse público da Administração, 
 suprindo as carências do território em pessoal dotado das qualificações 
 necessárias ao cargo a prover.
 
  
 
  
 
 8º - O regime constante do citado artigo único do Decreto-Lei nº 5/93/M não 
 implica tratamento discriminatório arbitrário e desrazoável para os funcionários 
 dos quadros próprios de Macau, prevendo a lei as formas e procedimentos 
 adequados para voluntariamente poderem reingressar na função pública.
 
                Termos em que deverá proceder o presente recurso determinando-se 
 a reforma da decisão recorrida, em conformidade com o juízo de 
 constitucionalidade da norma desaplicada.
 
  
 
  
 
                         3. Corridos os vistos, cumpre decidir: decidir, desde 
 logo, se deve conhecer-se do recurso; e, em caso de resposta afirmativa, se a 
 norma que se contém no referido artigo único do Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de 
 Fevereiro, é (ou não) inconstitucional.
 
  
 
  
 
                         II. Fundamentos:
 
  
 
                         4. A questão prévia do conhecimento do recurso:
 
                         4.1. Preliminarmente, dir-se-á que as decisões do 
 Tribunal de Contas relativas ao visto prévio são decisões judiciais sujeitas ao 
 controlo de constitucionalidade do Tribunal Constitucional.
 
  
 
  
 
                         A propósito, recorda-se aqui o que se escreveu no 
 acórdão nº 214/90 (Diário da República, II série, de 17 de Setembro de 1990) 
 acerca do visto do Tribunal de Contas, previsto no artigo 216º da Constituição. 
 Escreveu-se aí:
 
  
 O Tribunal de Contas, quando procede à fiscalização prévia da legalidade e da 
 cobertura orçamental dos documentos geradores de despesas para o Estado, 
 desempenha uma função própria, típica, que lhe está constitucionalmente 
 cometida. É a função que certa doutrina designa por função de exame e visto 
 
 (...).
 O visto é, assim, uma decisão proferida no exercício de uma competência que a 
 própria Constituição atribui ao  Tribunal  de  Contas.  (No mesmo sentido, 
 também o 
 acórdão nº 251/90, cujo sumário foi publicado no Boletim do Ministério da 
 Justiça, nº 399, página 551, e o acórdão nº 253/90, por publicar).
 
  
 
  
 
                         Sendo isto assim, pode, então concluir-se - à semelhança 
 do que se fez nesse aresto - que, seja qual for, em definitivo, a natureza 
 jurídica do visto (jurisdicional ou administrativa), o visto, que o Tribunal de 
 Contas de Macau recusou à contratação de B..., constitui uma verdadeira decisão 
 judicial  para os efeitos do artigo 280º da Constituição da República Portuguesa 
 
 - ou seja: para o efeito de se poder interpor dela um recurso de 
 constitucionalidade.
 
  
 
  
 
                         O exercício das funções de exame e visto relativamente 
 aos actos e contratos da competência das autoridades do território de Macau 
 comete-as, na verdade, a lei ao respectivo Tribunal de Contas.
 
  
 
  
 
                         Com efeito, o artigo 10º da Lei nº 112/91, de 20 de 
 Agosto (Lei de Bases da Organização Judiciária de Macau) - depois de preceituar, 
 no nº 1, que o 'Tribunal de Contas tem jurisdição e poderes de controlo 
 financeiro no âmbito da ordem jurídica de Macau' - prescreve no nº 4, alínea a), 
 que, funcionando como tribunal singular, compete-lhe 'julgar sobre a concessão 
 ou recusa de visto de processos de fiscalização prévia'. E o nº 5, alínea a), do 
 mesmo artigo 10º acrescenta que 'compete ao Tribunal de Contas, funcionando como 
 tribunal colectivo', 'julgar os recursos das decisões do tribunal singular, 
 designadamente quanto à concessão e recusa de visto'.
 
  
 
  
 
                         De sua parte, o artigo 8º, nº 1, do Decreto-Lei nº 
 
 18/92/M, de 2 de Março - que veio 'regulamentar a organização, competência, 
 funcionamento e processo' do Tribunal de Contas de Macau - dispõe que 'a 
 fiscalização prévia é exercida através da concessão ou da recusa de visto e tem 
 por fim verificar se os actos ou contratos a ela sujeitos estão conformes com as 
 leis em vigor e se os respectivos encargos têm cabimento em verba orçamental 
 própria'.
 
  
 
  
 
                         A recorribilidade da decisão de recusa de visto que aqui 
 está sub iudicio não oferece, pois, dúvidas.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         4.2. Inquestionável é também a competência deste 
 Tribunal para o julgamento dos recursos de constitucionalidade, interpostos de 
 decisões proferidas por tribunais de Macau.
 
  
 
  
 
                         No seu acórdão nº 284/89 (Diário da República, II série, 
 de 12 de Junho de 1989), partindo da ideia de que os princípios fundamentais que 
 estruturam a Constituição da República Portuguesa (entre os quais o do respeito 
 e garantia dos direitos e liberdades fundamentais), por um 'evidente imperativo 
 de coerência', não podem deixar de valer no território de Macau, uma vez que a 
 respectiva comunidade jurídica 'participa da ordem jurídica portuguesa'; e 
 considerando, bem assim, que o Tribunal Constitucional exerce 'a sua jurisdição 
 no âmbito de toda a ordem jurídica portuguesa' (por conseguinte, também em 
 Macau); concluiu-se que o Estatuto Orgânico de Macau 'aponta para que ao 
 Tribunal Constitucional caiba, em última instância, e por via de recurso, a 
 fiscalização em concreto da constitucionalidade material de normas jurídicas 
 emitidas, quaisquer que elas sejam, pelos órgãos legislativos do território'.
 
  
 
  
 
                         Posteriormente, no acórdão nº 245/90 (Diário da 
 República, II série, de 22 de Janeiro de 1991), essa competência do Tribunal 
 Constitucional foi afirmada também quanto às normas que, sendo editadas pelos 
 
 órgãos de soberania da República, vigorem em Macau.
 
                         Escreveu-se aí, a propósito:
 
 [...] não obstante o caso em apreço respeitar a norma constante dum diploma 
 legal aplicável (hoje) exclusivamente ao território de Macau, nenhuma dúvida 
 pode suscitar-se acerca da competência deste Tribunal para dele conhecer.
 
  
 
  
 
                         A competência do Tribunal Constitucional para conhecer 
 dos recursos de constitucionalidade, interpostos de decisões dos tribunais de 
 Macau, abrange, pois, os recursos das decisões que desapliquem normas jurídicas, 
 com fundamento na sua inconstitucionalidade, quer se trate de normas editadas 
 pelos órgãos de soberania portugueses, quer de normas provenientes dos órgãos 
 legislativos de Macau.
 
  
 
  
 
                         Essa competência resulta hoje claramente da conjugação 
 dos artigos 2º, 11º, nº 1, alínea e), 15º, nº 2, 30º, nº 1, alínea a), 40º, nº 
 
 3, e 41º, do Estatuto Orgânico de Macau, com o artigo 11º da já citada Lei de 
 Bases da Organização Judiciária de Macau e com o artigo 3º do Decreto-Lei nº 
 
 17/92/M, de 2 de Março, que 'contém a regulamentação geral da nova organização 
 judiciária'.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         De facto, o artigo 41º do Estatuto Orgânico dispõe que 
 
 'nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que 
 infrinjam as regras constitucionais ou estatutárias ou os princípios nelas 
 consignados' (cf., identicamente, o artigo 3º do Decreto-Lei nº 17/92/M), com o 
 que não pode deixar de referir-se às normas e princípios relativos aos 
 
 'direitos, liberdades e garantias estabelecidos na Constituição da República e 
 no [...] Estatuto', que o artigo 2º deste último manda observar. E essa 
 observância é assegurada, em última instância, pelo Tribunal Constitucional, 
 cuja competência, em via de recurso, é ressalvada pelo artigo 11º da Lei de 
 Bases da Organização Judiciária de Macau, quando dispõe que 'o Tribunal Superior 
 de Justiça é o órgão superior da hierarquia dos tribunais de Macau, sem prejuízo 
 da competência [...] do Tribunal Constitucional em matéria de recursos'. E é por 
 ele assegurada também em sede de fiscalização abstracta, já que os artigos 11º, 
 nº 1, alínea e), 15º, nº 2 (conjugado com o artigo 40º, nº 3) e 30º, nº 1, 
 alínea a), do Estatuto Orgânico lhe cometem tal controlo.
 
  
 
  
 
                         4.3. Mas, pergunta-se: das decisões do Tribunal de 
 Contas de Macau, que recusem o visto com fundamento em inconstitucionalidade da 
 norma ao abrigo da qual foi praticado o acto a ele sujeito, poder-se-á recorrer, 
 directamente, para o Tribunal Constitucional? Não terá que recorrer-se, 
 previamente, para o Tribunal de Contas da República?
 
  
 
  
 
                         É que - como, adiante, melhor se verá - 'as divergências 
 entre o Governo de Macau e o Tribunal de Contas deste território em matéria de 
 exame ou visto' são decididas, em via de recurso, pelo Tribunal de Contas da 
 República, tendo legitimidade para interpor tal recurso o respectivo Governador 
 
 (cf. artigo 10º, nº 6, da citada Lei de Bases e artigos 46º, nº 2, e 49º, nº 4, 
 do Decreto-Lei nº 18/92/M, de 2 de Março).
 
  
 
  
 
                         Pois bem: a Constituição de Macau é, verdadeiramente, o 
 seu Estatuto Orgânico. A Constituição da República Portuguesa só se aplica em 
 Macau por devolução desse Estatuto - ou seja, nos casos e termos em que ele, 
 explícita ou implicitamente, para ela remeter.
 
  
 
  
 
                         Este Tribunal, no seu acórdão nº 292/91 (publicado no 
 Diário da República, II série, de 30 de Outubro de 1991), já teve ocasião de 
 ponderar a tal propósito o seguinte:
 De acordo com a Constituição vigente (artigo 5º, a silentio, e artigo 292º, nº 
 
 1) - e de acordo agora, também, coma Declaração Conjunta do Governo da República 
 Portuguesa e do Governo da República Popular da China sobre a Questão de Macau, 
 ratificada pelo 
 Decreto do Presidente da República nº 38-A/87, de 14 de Dezembro (nº 1) -, Macau 
 não é território português: é unicamente território 'sob administração 
 portuguesa', regendo-se por 'estatuto adequado à sua situação especial' (cf. 
 artigo 292º, nº 1, cit.).
 Significa isto - como o Tribunal já teve ocasião de dizer, seguindo a lição da 
 doutrina - que, salvo quando ela própria o diga, a 'Constituição não rege 
 directa e automaticamente para o território de Macau e que este tem a sua 
 
 'Constituição', verdadeiramente, no respectivo Estatuto': só, pois, onde o 
 Estatuto 'devolva', explícita ou implicitamente, para a Constituição da 
 República, a mesma se aplicará a Macau (v. por último, o acórdão nº 245/90, no 
 Diário da República, II série, de 22 de Janeiro de 1991; e, antes, o acórdão nº 
 
 284/89, no Diário da República, II série, de 12 de Junho de 1989; e, na 
 doutrina, AFONSO R. QUEIRÓ, Lições de Direito Administrativo, 1976, páginas 382 
 e seguintes).
 Há-de ser, pois, no Estatuto Orgânico de Macau que, em primeira linha, terá de 
 procurar-se o regime não apenas de produção de normas jurídicas no próprio 
 território, mas igualmente do seu controlo: só subsidiariamente, e por devolução 
 
 (explícita ou implícita) do estatuto, a Constituição da República intervirá na 
 regulamentação de tal matéria.
 
  
 
  
 
                         Ora, o Estatuto Orgânico de Macau - depois de, no artigo 
 
 64º, prescrever que 'o exercício das funções de exame e visto relativamente aos 
 actos e contratos que forem da competência das autoridades do território, 
 incumbem ao seu Tribunal Administrativo' - acrescenta, no artigo 66º, que 'ao 
 Tribunal de Contas da República compete decidir, em via de recurso, as 
 divergências entre o Governo de Macau e o Tribunal Administrativo deste 
 território em matéria de exame e visto'.
 
  
 
  
 
                         Estes artigos 64º e 66º do Estatuto deixaram, no 
 entanto, de vigorar com a entrada em vigor do já mencionado Decreto-Lei nº 
 
 17/92/M, de 2 de Março (o que sucedeu 30 dias após a data da sua publicação: cf. 
 artigo 59º).
 
                         Na verdade, o artigo 48º da Lei nº 13/90, de 10 de Maio 
 
 - que, recorda-se, alterou o Estatuto Orgânico - dispôs que 'a vigência dos 
 artigos [...] 64º [...] e 66º do Estatuto Orgânico de Macau cessa com a entrada 
 em vigor da lei que desenvolve as bases do sistema judiciário de Macau' (que é 
 aquele Decreto-Lei nº 17/92/M), 'a qual definirá a composição, competência e 
 regras de funcionamento da entidade, dotada de autonomia, encarregada da 
 fiscalização financeira das pessoas colectivas públicas que a lei determinar'.
 
  
 
  
 
                         A Lei de Bases da Organização Judiciária de Macau (Lei 
 nº 112/91, de 29 de Maio, editada para cumprimento do disposto no artigo 51º, nº 
 
 2, do Estatuto Orgânico), cometeu ao Tribunal de Contas de Macau (em vez de ao 
 seu Tribunal Administrativo) 'jurisdição e poderes de controlo financeiro no 
 
 âmbito da ordem jurídica de Macau' (cf. artigo 10º, nº 1), atribuindo-lhe, 
 designadamente, a competência para julgar 'sobre a concessão ou recusa de visto 
 de processos de fiscalização prévia' [cf. o artigo 10º, nº 4, alínea a), e nº 5, 
 alínea a)].
 
  
 
  
 
                         Esta Lei de Bases - à semelhança do que fazia o artigo 
 
 66º do Estatuto Orgânico - atribui ao Tribunal de Contas da República, como se 
 disse já, a competência para, em via de recurso, decidir 'as divergências entre 
 o Governo de Macau e o Tribunal de Contas deste território em matéria de exame 
 ou visto' (cf. artigo 10º, nº 6).
 
  
 
  
 
                         Significa isto que a matéria do 'controlo financeiro no 
 
 âmbito da ordem jurídica de Macau' foi objecto de desconstitucionalização, pois 
 que é a lei ordinária - e não já o Estatuto Orgânico de Macau - que atribui ao 
 Tribunal de Contas do território a competência para 'julgar sobre a concessão ou 
 recusa de visto de processos de fiscalização prévia' e que comete ao Tribunal de 
 Contas da República a competência para 'decidir, por via de recurso, as 
 divergências entre o Governo de Macau e o Tribunal de Contas deste território em 
 matéria de exame ou visto' (cf. artigo 10º da citada Lei de Bases; cf. também o 
 artigo 46º, nº 2, do Decreto-Lei nº 18/92/M, de 2 de Março).
 
  
 
  
 
                         Das decisões do Tribunal de Contas de Macau, que recusem 
 o visto à contratação de alguém para exercer funções públicas no território - 
 visto a que essa contratação está sujeita nos termos do artigo 38º, nº 1, alínea 
 c), do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aprovado 
 pelo Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro -, há, pois, recurso para o 
 Tribunal de Contas da República, o qual só pode ser interposto pelo Governador 
 
 (cf. artigo 10º, nº 6, da Lei de Bases e artigos 46º, nº 2, e 49º, nº 4, do 
 Decreto-Lei nº 18/92/M).
 
  
 
  
 
                         Se, no entanto, a recusa do visto se fundar na 
 inconstitucionalidade da norma ao abrigo da qual o Governo de Macau pretende 
 fazer a nomeação ou celebrar o contrato, de tal decisão do Tribunal de Contas do 
 território, pode recorrer-se directamente para o Tribunal Constitucional (sem 
 necessidade, portanto, de se recorrer, primeiro, para o Tribunal de Contas da 
 República).
 
  
 
  
 
                         É certo que o artigo 10º, nº 6, da Lei de Bases e o 
 artigo 46º, nº 2, do Decreto-Lei nº 18/92/M não excepcionam do recurso para o 
 Tribunal de Contas da República os casos em que a divergência entre o Governo de 
 Macau e o Tribunal de Contas do território decorre da recusa de aplicação de uma 
 norma legal com fundamento na sua inconstitucionalidade.
 
  
 
  
 
                         Simplesmente, o artigo 11º da Lei de Bases, que começa 
 por preceituar que o Tribunal Superior de Justiça é o órgão superior da 
 hierarquia dos tribunais de Macau, acrescenta: 'sem prejuízo da competência 
 
 [...] do Tribunal Constitucional em matéria de recursos' (cf. também o artigo 
 
 34º da mesma Lei de Bases).
 
                         Ora, das decisões dos outros tribunais que recusem 
 aplicação de qualquer norma, com fundamento em inconstitucionalidade, ainda que 
 seja admissível recurso ordinário, pode recorrer-se, directamente, para o 
 Tribunal Constitucional, sendo esse recurso obrigatório para o Ministério 
 Público [cf. o nº 1, alínea a), em confronto com os nºs 2, 3 e 4 do artigo 70º e 
 com o artigo 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional].
 
  
 
  
 
                         Não havendo razões para que tal disciplina não valha 
 também para os tribunais de Macau (Tribunal de Contas incluído), pode, então, 
 concluir-se nada haver que obste a que se conheça do objecto do recurso.
 
  
 
  
 
                         5. Objecto do recurso:
 
  
 
                         5.1. A questão da inconstitucionalidade orgânica do 
 Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro:
 
                         5.1.1. O artigo único do Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de 
 Fevereiro, preceitua como segue:
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 Artigo único. As situações constituídas no âmbito dos quadros dependentes dos 
 
 órgãos de soberania ou das autarquias da República Portuguesa, nomeadamente de 
 licença de curta ou longa duração, licença ilimitada, aposentação, reforma ou 
 reserva não constituem incapacidade para o exercício de funções públicas no 
 território de Macau, em qualquer dos regimes previstos no Estatuto dos 
 Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aprovado pelo Decreto-Lei nº 
 
 87/89/M, de 21 de Dezembro.
 
  
 
  
 
                         Com este normativo, o legislador pretendeu (segundo diz) 
 
 'esclarecer o alcance e âmbito de aplicação do disposto no nº 1 do artigo 13º do 
 Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aprovado pelo 
 Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro' (cf. o preâmbulo), uma vez que 'têm 
 surgido dúvidas e interpretações divergentes, no tocante ao universo pessoal de 
 aplicação das normas atinentes à capacidade para o exercício de funções públicas 
 no território de Macau' (cf. citado preâmbulo).
 
  
 
  
 
                         Ao editar o Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, o 
 legislador diz ter pretendido fazer interpretação autêntica ('clarificação 
 legislativa autêntica') do nº 1 do artigo 13º do mencionado Estatuto dos 
 Trabalhadores da Administração Pública de Macau [cuja alínea a) - única que aqui 
 interessa considerar - fere de incapacidade para o exercício das funções 
 públicas em Macau os funcionários que se encontrem, entre outras, na situação de 
 licença sem vencimento de curta ou longa duração], vindo estatuir que essa 
 incapacidade atinge apenas os funcionários pertencentes aos quadros do 
 território de Macau, e não também os funcionários pertencentes aos quadros da 
 República.
 
  
 
  
 
                         5.1.2. O tribunal recorrido pondera que 'o artigo 13º do 
 ETAPM era e é claro quando enumera as situações susceptíveis de travar o 
 ingresso nos serviços da Administração Pública de Macau', valendo a disciplina 
 nele consagrada para 'todos os servidores públicos, independentemente da sua 
 origem', como, de resto, vinha entendendo 'larga jurisprudência tirada no 
 território'. Por isso - acrescenta -, como 'só há lei interpretativa quando o 
 legislador, através de novo diploma, clarifica, esclarece, diploma anterior de 
 conteúdo incerto ou controvertido', e como o Decreto-Lei nº  5/93/M, de 8 de 
 Fevereiro, o que fez foi alterar aquele artigo 13º, nº 1, do Estatuto, 
 
 'dando-lhe um conteúdo que ele não comportava' (pois que veio dizer que esse 
 normativo 'se restringia ao universo dos quadros de Macau', desse modo abrindo, 
 
 'aos quadros dependentes da República a possibilidade de exercerem no território 
 funções públicas em situações que não são permitidas aos quadros locais'), é ele 
 um diploma legislativo inovador. E, como foi editado sem autorização legislativa 
 
 (a que fora concedida pela Lei nº 9/89/M, de 23 de Outubro, esgotou-se, 
 
 'gastou-se') e versa matéria que (segundo o tribunal recorrido) o Governador só 
 poderia tratar legislativamente se estivesse munido de tal autorização, há que 
 concluir - diz o aresto sob recurso - que ele é organicamente inconstitucional.
 
  
 
  
 
                         5.1.3. O Procurador-Geral Adjunto - depois de ponderar 
 ser irrelevante que o preâmbulo do Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, 
 diga que ele é lei interpretativa  do artigo 13º, nº 1, do Estatuto dos 
 Trabalhadores da Administração Pública de Macau, uma vez que 'a verdadeira 
 natureza e função por ele substancialmente desempenhadas' 'sempre terá de ser 
 alcançada através da análise do conteúdo material da norma editada' - anota que 
 o que esta norma, em direitas contas, fez foi 'interpretar, integrar ou, 
 porventura, modificar, o estatuído no Decreto-Lei nº 60/92/M, no que se refere 
 ao estatuto do pessoal recrutado no exterior, ao abrigo do artigo 69º, nº 1, do 
 Estatuto Orgânico de Macau, e não inovar em sede do regime aplicável ao pessoal 
 dos serviços públicos dos quadros próprios do território de Macau, a que alude o 
 artigo 68º do Estatuto Orgânico de Macau e que está estabelecido no citado 
 Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau'.
 
                         Aquele Magistrado precisou que, como o artigo único do 
 Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, aqui sub iudicio, 'tem directa conexão 
 com o estatuto do pessoal recrutado no exterior, não envolvendo qualquer 
 definição do estatuto do pessoal dos quadros próprios do território de Macau', 
 
 'o que, afinal, se vai integrar ou, mais precisamente, modificar, através da 
 edição do referido artigo único, é o estatuído no artigo 1º, nº 3, do 
 Decreto-Lei nº 60/92/M - dispondo-se que a capacidade de exercício de funções 
 públicas do pessoal recrutado no exterior é determinada pelo nele expressamente 
 estatuído, e não pela aplicação supletiva do regime da função pública de Macau - 
 como resultava do preceituado na norma legal atrás citada - assim se afastando a 
 aplicação subsidiária ou supletiva do estatuído no artigo 13º, nº 1, do Estatuto 
 dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau'.
 
                         Disse ainda o Procurador-Geral Adjunto que 'o diploma 
 verdadeiramente 'interpretado' (em termos seguramente inovatórios) pela norma 
 questionada foi editado no exercício da competência legislativa própria do 
 Governador de Macau, não incidindo, afinal, sobre matéria situada no âmbito da 
 competência reservada da Assembleia Legislativa'.
 
                         Por isso - concluiu -, não tendo o mencionado 
 Decreto‑Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, nada 'a ver com a definição do 
 estatuto do pessoal dos quadros próprios de Macau, nem com os três diplomas 
 credenciados pela autorização legislativa constante da Lei nº 9/89/M, é evidente 
 que o 'esgotamento' e 'caducidade' desta se revelam, neste caso [...], 
 perfeitamente irrelevantes'.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         5.1.4. Enunciada a posição do tribunal recorrido e a do 
 Magistrado recorrente, vejamos, então, se o Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de 
 Fevereiro, é (ou não) organicamente inconstitucional.
 
  
 
  
 
                         Começando por recordar que o legislador apresenta o 
 Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, como lei interpretativa do nº 1 do 
 artigo 13º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau 
 
 (aprovado pelo Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro), dir-se-á que é de 
 considerar como lei interpretativa (por natureza) aquela que, com o fim de pôr 
 cobro à controvérsia (ou, pelo menos, à incerteza) sobre o sentido de certa 
 regra jurídica, vem consagrar uma solução que os tribunais poderiam ter 
 adoptado: não, necessariamente, uma das correntes jurisprudenciais anteriores ou 
 uma forte corrente jurisprudencial anterior - que, até, podem não existir -, mas 
 um sentido que os operadores jurídicos podiam ter extraído da norma.
 
                         Claro é que, se se formou uma corrente jurisprudencial 
 de tal modo forte que possa dizer-se que o sentido da norma se tornou 
 praticamente certo, a lei nova que, acaso, venha consagrar uma interpretação 
 diferente, já não pode ser considerada realmente como interpretativa, embora o 
 legislador a possa qualificar como tal, antes tendo que ser havida como 
 inovadora (cf. J. BAPTISTA MACHADO,  in Introdução ao Direito e ao Discurso 
 Legitimador, Coimbra, 1983, página 246).
 
                         Escreve este Autor:
 Para que uma LN possa ser realmente interpretativa são necessários, portanto, 
 dois requisitos: que a solução do direito anterior seja controvertida ou pelo 
 menos incerta; e que a solução definida pela nova lei se situe dentro dos 
 quadros da controvérsia e seja tal que o julgador ou o intérprete a ela poderiam 
 chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e 
 aplicação da lei. Se o julgador ou o intérprete, em face de textos antigos, não 
 podiam sentir-se autorizados a adoptar a solução que a LN vem consagrar, então 
 esta é decididamente inovadora (cf. obra cit. página  247).
 
  
 
  
 
                         Mesmo quando a nova lei é inovadora, o legislador pode 
 declarar, no texto do diploma ou no respectivo preâmbulo, que ela é 
 interpretativa. Em tal caso, do que, ao cabo e ao resto, se trata é de uma lei 
 retroactiva disfarçada.
 
  
 
  
 
                         A propósito deste último tipo de leis, escreve J. 
 BAPTISTA MACHADO (ob. cit., página 245):
 Quando não existe norma de hierarquia superior que proíba a retroactividade, tal 
 qualificação do legislador deve ser aceite para efeito de dar a tal disposição 
 um efeito equivalente ao de uma lei interpretativa, nos termos do artigo 13º [do 
 Código Civil]. Na verdade, o legislador teria, na hipótese, o poder de declarar 
 retroactiva a LN e definir os limites   desta  retroactividade  (sobre  o  tema, 
 cf.também JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENÇÃO, in O Direito. Introdução e Teoria Geral, 2ª 
 edição, Lisboa, 1980, páginas 197 e 199 e 439 a 444, sp. página 444).
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         A interpretação autêntica é algo que integra o próprio 
 exercício da função normativa; por isso, só quem tem competência para, ab 
 initio, produzir uma norma a pode interpretar autenticamente [cf. acórdãos nºs 
 
 32/87, 157/88, 372/91, 139/92 e 805/93 (Diário da República, II série, de 7 de 
 Abril de 1987, I série, de 26 de Julho de 1988, I-A série, de 7 de Novembro de 
 
 1991, II série, de 21 de Agosto de 1992 e I-A série, de 4 de Janeiro de 1994, 
 respectivamente)].
 
  
 
  
 
                         5.1.5  Expostos estes princípios, vejamos, então, se o 
 Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, versa matéria que se inscreva na 
 reserva de competência legislativa da Assembleia Legislativa de Macau e, bem 
 assim, se, tal como se diz no preâmbulo, é ele uma lei interpretativa do artigo 
 
 13º, nº 1, do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, 
 aprovado pelo Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro.
 
  
 
  
 
                         Se ele tiver natureza de lei interpretativa do 
 mencionado artigo 13º, nº 1, ou, sendo inovador, se versar matéria da 
 competência reservada da Assembleia Legislativa de Macau, é ele 
 inconstitucional.
 
                         De facto, em qualquer dessa hipóteses, o Governador só 
 podia editá-lo munido de autorização legislativa, que, no caso, não tinha.
 
  
 
                         Prosseguindo, pois.
 
  
 
  
 
                         O Estatuto Orgânico de Macau (aprovado pela Lei nº 1/76, 
 de 17 de Fevereiro) dispõe, no artigo 67º, que 'os serviços públicos de Macau 
 são organismos privativos deste território, podendo constituir entidades 
 autónomas, dotadas de personalidade jurídica, sem prejuízo do disposto no artigo 
 
 51º'. (Este artigo 51º preceitua que 'a administração da justiça ordinária no 
 território de Macau continua a regular-se pela legislação emanada dos órgãos de 
 soberania da República'). E, no artigo 68º, acrescenta que 'o pessoal dos 
 serviços públicos, seja qual for a sua categoria, integra-se nos quadros 
 próprios do território, ficando apenas sujeito à autoridade e fiscalização dos 
 seus órgãos' (cf., identicamente, os artigos 67º e 68º do referido Estatuto, 
 após as alterações introduzidas pela Lei nº 13/90, de 10 de Maio).
 
                         Correspondentemente com o que se preceitua neste artigo 
 
 68º, prescreve-se, no artigo 31º, nº1, alínea e), e 2 (conjugado com o artigo 
 
 13º, nº 2), que só a Assembleia Legislativa (ou o Governador por ela autorizado) 
 pode 'criar novas categorias ou designações funcionais ou alterar as tabelas que 
 definem aquelas categorias e fixar os vencimentos, salários e outras formas de 
 remuneração do pessoal dos quadros' [cf., identicamente, após as alterações 
 introduzidas pela Lei nº 13/90, o artigo 31º, nºs 1, alínea q), e 3, conjugado 
 com o artigo 13º, nº 2].
 
  
 
  
 
                         O Governador de Macau, para legislar sobre o estatuto do 
 pessoal dos quadros próprios dos serviços públicos do território, tem, pois, que 
 munir-se de autorização legislativa. De contrário, invade, 
 inconstitucionalmente, a área de reserva legislativa da respectiva assembleia.
 
  
 
  
 
                         Justamente por isso, a Assembleia Legislativa de Macau, 
 pela Lei nº 9/89/M, de 23 de Outubro, concedeu ao Governador autorização 
 legislativa para: (a). Estabelecer o Estatuto dos Trabalhadores da Administração 
 Pública; (b). Rever o regime das carreiras do pessoal da Administração Pública; 
 
 (c). Rever o regime do pessoal de direcção e chefia dos Serviços da 
 Administração Pública.
 
                         Foi no uso desta autorização legislativa que o 
 Governador editou o Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro, que aprovou o 
 Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, a que pertence o 
 mencionado artigo 13º, que o Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, diz vir 
 interpretar autenticamente.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         Este artigo 13º, dispõe, na alínea a) do nº 1 - única 
 que aqui interessa considerar - o seguinte:
 Artigo 13º (Capacidade profissional)
 
 1. Não têm capacidade para o exercício de funções públicas:
 a). Os funcionários na situação de licença sem vencimento de curta ou longa 
 duração ou por interesse público ou que hajam requerido a passagem a uma destas 
 situações.
 
  
 
  
 
                         A incapacidade para o exercício de funções públicas que 
 aqui se prevê, directamente, aplica-se apenas ao pessoal dos quadros próprios 
 dos serviços públicos de Macau, pois que é para eles que este Estatuto rege, 
 como, desde logo, resulta do seu artigo 1º, nº 1.
 
  
 
  
 
                         Aliás, só para esses funcionários tal disciplina poderia 
 valer directamente.
 
                         Na verdade, o Estatuto em causa foi editado para dar 
 execução à alínea e) do nº 1 do artigo 31º do Estatuto Orgânico (cf. a Lei nº 
 
 9/89/M, de 23 de Outubro - autorização legislativa), que está em correspondência 
 com o respectivo artigo 68º, que - recorda-se - trata do pessoal dos quadros 
 próprios dos serviços públicos do território de Macau.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         A situação do pessoal dos quadros dependentes dos órgãos 
 de soberania da República, essa está prevista no artigo 69º do mesmo Estatuto 
 Orgânico, aí se dispondo que tal pessoal pode, ' a seu requerimento e com 
 autorização do respectivo Ministro e concordância do Governador, prestar serviço 
 por tempo determinado no território de Macau, contando‑se, para todos os 
 efeitos, como efectivo serviço no seu quadro e categoria, o tempo de serviço 
 prestado nessa situação' (cf. nº 1 do citado artigo 69º).
 
  
 
  
 
                         Este pessoal é aquele a que o Decreto-Lei nº 53/89/M, de 
 
 28 de Agosto (editado pelo Governador, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 
 
 13º do Estatuto Orgânico, ou seja, no exercício da sua competência legislativa 
 própria, embora cumulativa), chama pessoal recrutado no exterior: a ele deve 
 recorrer-se excepcionalmente e sem exceder nunca o contingente que, anualmente, 
 
 é fixado pelo Governador (cf. o preâmbulo e o artigo 4º). O seu recrutamento - 
 que tem que ser autorizado pelo Governador (cf. artigo 6º, nº 1) - faz-se para 
 exercer funções em Macau, por um período de três anos (renovável por um período 
 igual ou inferior), em regime de comissão de serviço (tratando‑se de lugares de 
 direcção ou de chefia) e, nos restantes casos, em regime de contrato além do 
 quadro ou de assalariamento (cf. artigo 8º, nºs 1 e 2).
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         Na vigência deste Decreto-Lei nº 53/89/M, de 28 de 
 Agosto, para o pessoal a que ele se refere (o pessoal recrutado no exterior para 
 exercer funções públicas em Macau), valiam as incapacidades profissionais que a 
 lei fixasse para o pessoal dos quadros próprios do território (cf. artigo 3º). 
 Com uma excepção, contudo: nos termos do artigo 7º, nº 4, do Decreto-Lei nº 
 
 86/84/M, de 11 de Agosto (na redacção do Decreto-Lei nº 15/88/M, de 29 de 
 Fevereiro), 'a situação de licença ilimitada nos quadros dependentes dos órgãos 
 de soberania da República Portuguesa não prejudica[va] o desempenho de funções 
 públicas no Território'.
 
  
 
  
 
                         O Decreto-Lei nº 15/88/M, de 29 de Fevereiro - que 
 introduziu a ressalva que acaba de referir-se - foi, no entanto, revogado pelo 
 já mencionado Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro [cf. artigo 28º, nº 1, 
 alínea 59)].
 
                         De sua parte, o Decreto-Lei nº 53/89/M, de 28 de Agosto, 
 veio a ser revogado pelo Decreto-Lei nº 60/92/M, de 24 de Agosto (cf. artigo 
 
 24º), que passou a regular o recrutamento de pessoal no exterior, que continua a 
 ser uma 'forma excepcional de dotar a Administração dos meios humanos 
 indispensáveis às tarefas que lhe incumbe desenvolver' (cf. o respectivo 
 preâmbulo).
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         Este Decreto-Lei nº 60/92/M, de 24 de Agosto (editado 
 pelo Governador no exercício da sua competência legislativa própria, embora 
 cumulativa, ou seja, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 13º do Estatuto 
 Orgânico), veio, na verdade, estabelecer 'as normas que regem o recrutamento de 
 pessoal ao abrigo do nº 1 do artigo 69º do Estatuto Orgânico de Macau para 
 exercer funções nos serviços e organismos públicos [...]' (cf. artigo 1º, nº 1).
 
                         É este um recrutamento que - além de continuar a ter que 
 ser autorizado pelo Governador (cf. artigo 4º, nº1) - mantém o seu carácter 
 excepcional, pois que, com ele, visa-se 'suprir as carências do território de 
 pessoal com qualificações necessárias ao desempenho das atribuições que incumbem 
 
 à Administração' (cf. artigo 3º). Faz-se para que o pessoal recrutado no 
 exterior preste serviço em Macau, em regra, durante dois anos (cf. artigo 7º, nº 
 
 2), em regime de comissão de serviço, contrato além do quadro (excepcionalmente, 
 assalariamento) e contrato individual de trabalho (cf. artigo 7º, nº 1).
 
                         A este pessoal 'aplica-se, supletivamente, o regime da 
 função pública de Macau' - dispõe o artigo 1º, nº 3. Ou seja: para o pessoal 
 recrutado no exterior, valem as incapacidades profissionais previstas no artigo 
 
 13º (do citado Estatuto), cuja alínea a) do nº 1 se transcreveu atrás.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         É no seguimento desta evolução legislativa que é 
 publicado o Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro - aqui sub iudicio -, 
 dispondo que as situações de licença de curta ou longa duração, de licença 
 ilimitada, aposentação, reforma ou reserva ('constituídas no âmbito dos quadros 
 dependentes dos órgãos de soberania ou das autarquias da República Portuguesa') 
 
 'não constituem incapacidade para o exercício de funções públicas em Macau, em 
 qualquer dos regimes previstos no Estatuto dos Trabalhadores da Administração 
 Pública de Macau, aprovado pelo Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro'.
 
  
 
  
 
                         Este Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, veio, no 
 fundo, reeditar a disciplina que já havia sido lei no território, durante a 
 vigência do Decreto-Lei nº 15/88/M, de 29 de Fevereiro, alargando-a a outras 
 situações, para além da de 'licença ilimitada nos quadros dependentes dos órgãos 
 de soberania da República'. E, desse modo, afastou a aplicação da alínea a) do 
 nº 1 do artigo 13º daquele Estatuto, que se aplicava ao pessoal recrutado no 
 exterior para a Administração Pública de Macau, não directamente, mas por 
 remissão do artigo 1º, nº 3, do Decreto-Lei  nº 60/92/M, de 24 de Agosto.
 
  
 
  
 
                         5.1.6. Do excurso que acaba de fazer-se pela legislação 
 que tem regulado a matéria, pode, assim, assentar-se no seguinte:
 
 (a). O Governador de Macau só pode legislar sobre o estatuto do pessoal dos 
 quadros próprios dos serviços públicos do Território, munido de autorização 
 legislativa, uma vez que se trata de matéria que se inscreve na reserva de 
 competência legislativa da Assembleia Legislativa [cf. artigo 31º, nºs 1, alínea 
 q), e 3, conjugado com o artigo 13º, nº 2, do Estatuto Orgânico de Macau];
 
 (b). O Governador de Macau pode, porém, legislar sobre o estatuto do pessoal 
 recrutado no exterior para exercer funções na Administração Pública do 
 Território, sem necessidade de se munir de autorização da Assembleia Legislativa 
 
 [cf. artigo 13º, nº 1, conjugado com o artigo 30º, nº 1, alínea c), do mesmo 
 Estatuto Orgânico];
 
 (c). O Decreto-Lei nº 87/89/M, de 21 de Dezembro - que aprovou o Estatuto dos 
 Trabalhadores da Administração Pública de Macau - versa matéria reservada à 
 Assembleia Legislativa de Macau [cf. artigo 31º, nº 1, alínea e) e, hoje, alínea 
 q)];
 
 (d). O Decreto-Lei nº 60/92/M, de 24 de Agosto, estabelecendo normas relativas 
 ao recrutamento de pessoal no exterior para o exercício de funções públicas em 
 Macau, versa matéria que pode ser tratada legislativamente, tanto pela 
 Assembleia Legislativa, como pelo Governador,.sem necessidade, para este, de 
 autorização legislativa [cf. artigo 69º, nº 1, com referência aos artigos 13º, 
 nºs 1 e 2, 30º, nº 1, alínea c), e 31º, nºs 1, alínea q) e 3, do Estatuto].
 
 (e). O Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, dispondo que a incapacidade 
 profissional [prevista no artigo 13º do Estatuto dos Trabalhadores da 
 Administração Pública de Macau, maxime na alínea a) do seu nº 1], não é 
 aplicável aos funcionários recrutados no exterior - recte, nos quadros de 
 pessoal dependente dos órgãos de soberania ou das autarquias locais da República 
 Portuguesa -, vem modificar a disciplina que se contém no nº 3 do artigo 1º do 
 Decreto-Lei nº 60/92/M, de 24 de Agosto, só indirectamente atingindo o artigo 
 
 13º do citado Estatuto;
 
 (f). Tal Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, contém, pois, disciplina 
 referente ao recrutamento no exterior de pessoal para exercer funções públicas 
 em Macau - disciplina que é inovatória, mas versa matéria sobre que o 
 Governador, como se viu, pode legislar sem necessitar de autorização 
 legislativa.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         O Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro - tal como 
 sustenta o Ministério Público - veio, assim, modificar a disciplina que se 
 contém no artigo 1º, nº 3, do Decreto-Lei nº 60/92/M, de 24 de Agosto: 
 dispõe-se, com efeito, neste normativo que, ao pessoal recrutado no exterior 
 para o desempenho de funções públicas em Macau, se aplica 'supletivamente, o 
 regime da função pública de Macau'.
 
                         Ora, com a entrada em vigor daquele Decreto-Lei nº 
 
 5/93/M, tal regime deixou de aplicar-se aos funcionários oriundos dos quadros do 
 funcionalismo da República, no tocante às incapacidades profissionais previstas 
 no artigo 13º do Estatuto, aprovado pelo Decreto-Lei nº 87/89/M.
 
                         O regime de incapacidades previsto no citado artigo 13º 
 continuou, no entanto, a ser inteiramente aplicável, desde logo, aos 
 funcionários a que o Estatuto se aplica directamente, que são os funcionários 
 dos quadros próprios dos serviços públicos de Macau.
 
  
 
  
 
                         Vale isto por dizer que o Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de 
 Fevereiro, só indirectamente restringiu o campo de aplicação do artigo 13º do 
 Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei nº 87/89/M, já que a remissão, que para ele 
 faz o nº 3 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 60/92/M, passou a ter um alcance mais 
 limitado.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         O artigo único do Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de 
 Fevereiro, não é, assim, interpretativo do artigo 13º do mencionado Estatuto. 
 Ele restringiu antes o domínio de aplicação do artigo 1º, nº 3, do Decreto-Lei 
 nº 60/92/M.
 
                         Embora sendo um diploma inovatório, como a matéria de 
 que trata se inscreve na competência legislativa do Governador de Macau, não 
 viola ele qualquer norma de competência constante do Estatuto Orgânico de Macau, 
 atinente à produção legislativa no Território.
 
                         Tal diploma legislativo não é, por isso, organicamente 
 inconstitucional.
 
  
 
  
 
                         5.2. A questão da violação do princípio da igualdade:
 
  
 
                         Entende o acórdão recorrido que a norma aqui sub iudicio 
 
 (dito artigo único do Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro) viola o 
 princípio da igualdade e, em particular, a igualdade no acesso à função pública, 
 afirmado no nº 2 do artigo 47º da Constituição.
 
                         De facto - diz-se aí -, ela consagra uma discriminação 
 que 'não assenta em nada de sólido, estruturando-se apenas na diferença do 
 território de origem dos quadros em presença', pois que permite que 
 
 'funcionários dos quadros de Portugal concorram a lugares da Administração de 
 Macau em pé de desigualdade com os do próprio Território, beneficiando de 
 facilidades que a estes últimos são negadas'.
 
  
 
  
 
                         O Procurador-Geral Adjunto, ao contrário, pronuncia-se 
 no sentido de que a norma sob apreciação não viola o princípio da igualdade, 
 pois que a 'diferenciação de regime terá, afinal, na sua base um suporte 
 material bastante': desde logo, é o próprio Estatuto Orgânico de Macau - que é 
 uma 'verdadeira 'mini-Constituição' do Território' - que, nos artigos 68º e 69º, 
 
 'legitima a diferenciação entre os agentes administrativos ao serviço de Macau, 
 dispensando a existência de um sistema unitário no que se refere à organização e 
 regime da função pública do Território, instituindo, pelo contrário, uma 
 dualidade de quadros do funcionalismo e prevendo uma tendencial estanquicidade 
 entre os quadros próprios de Macau e os quadros do funcionalismo da República'.
 
                         Depois - acrescenta o mesmo Magistrado - 'o recrutamento 
 de pessoal no exterior, para além de ter carácter excepcional, pressupõe que 
 inexista no Território pessoal com as qualificações necessárias ao desempenho do 
 cargo a prover. Ou seja: a 'ratio' do regime instituído não seria operar uma 
 
 'discriminação' em desfavor dos agentes integrados nos quadros próprios do 
 Território, mas suprir 'carências' em pessoal qualificado, que apenas no 
 exterior seria possível encontrar, realizando, pois, um interesse público 
 relevante da própria Administração'. Ao que acresce que, se se compreende que 
 certos funcionários dos quadros da República, cujo vínculo se encontra suspenso 
 ou, mesmo, extinto, possam exercer funções para que estão particularmente 
 habilitados em Macau, já não se entenderia facilmente que 'funcionários dos 
 quadros próprios de Macau', 'mantendo-se a referida suspensão ou extinção do 
 vínculo' passassem 'a exercer as funções que voluntariamente houvessem cessado 
 ou interrompido', até porque 'existem outras formas adequadas para satisfazer o 
 interesse do funcionário que quer reingressar no quadro de que saiu'.
 
  
 
  
 
                         Também aqui a razão está com o Ministério Público.
 
  
 
  
 
                         De facto, o princípio da igualdade, consagrado no artigo 
 
 13º da Constituição (e, no que particularmente concerne ao acesso à função 
 pública, no artigo 47º, nº 2), não proíbe que se estabeleçam tratamentos 
 diferenciados; proíbe tão-só o arbítrio, as distinções de tratamento 
 irrazoáveis, porque carecidas de fundamento material ou racional.
 
                         A ideia de igualdade, com efeito, impõe se dê tratamento 
 igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferenciadamente o que for 
 diferente.
 
 
 
 
 
  
 
  
 
  
 
                         O princípio da igualdade (maxime, a ideia de igualdade 
 no acesso à função pública) vale, obviamente, no espaço jurídico de Macau, pois 
 que o respectivo Estatuto Orgânico - que é a sua Constituição (cf. o já citado 
 acórdão nº 292/91) - fez seus, justamente, os princípios e os direitos, 
 liberdades e garantias estabelecidas na Constituição da República (cf. artigo 
 
 2º).
 
  
 
  
 
                         Mas, o facto de a lei permitir que funcionários dos 
 quadros de funcionalismo da República na situação de licença sem vencimento (e 
 de outras situações que, agora, não interessa considerar) exerçam funções 
 públicas em Macau no regime de contrato além do quadro e de não permitir outro 
 tanto aos funcionários dos quadros próprios do Território, não representa uma 
 solução arbitrária ou discriminatória.
 
  
 
  
 
                         Desde logo (e como sublinha o Ministério Público), é a 
 própria Constituição do território que estabelece uma distinção de regimes entre 
 os funcionários de Macau e aqueles que são recrutados no exterior para aí 
 exercerem funções públicas. Depois, o recrutamento destes últimos tem carácter 
 excepcional, é contingentado, faz-se para um curto período de tempo (em regra, 
 dois anos) e visa suprir carências do próprio território; ou seja: com ele, o 
 que se pretende é a satisfação de interesses públicos que, de outro modo, 
 ficariam por satisfazer, justamente, por não haver, no território, quem tivesse 
 as qualificações necessárias para os cargos a prover.
 
  
 
  
 
                         O acesso à função pública, que a norma do artigo único 
 do Decreto-Lei nº 5/93/M, de 8 de Fevereiro, abre exclusivamente para os 
 funcionários oriundos dos quadros do funcionalismo da República, cujo vínculo se 
 encontre suspenso ou extinto, não representa, assim, uma distinção de tratamento 
 assente no Território de origem. A distinção de tratamento, que essa norma 
 introduz no ordenamento jurídico de Macau, conferindo àqueles funcionários um 
 direito que as leis não reconhecem os funcionários dos quadros próprios do 
 Território, funda-se, antes, no facto de aqueles possuirem qualificações ou 
 habilitações que estes não detêm.
 
  
 
  
 
                         Assentando a diferenciação de tratamento num motivo 
 razoável, que é o possuirem melhor título, a norma que a consagra não afronta o 
 princípio da igualdade.
 
  
 
  
 
                         6. Uma última nota: o facto de o ordenamento jurídico 
 português não prever que um funcionário de Macau, que, acaso, se encontre 
 nalguma das situações para que provê o artigo único do Decreto-Lei nº 5/93/M, 
 possa exercer funções públicas na República, é irrelevante do ponto de vista da 
 igualdade: como Macau é um território que apenas está sob administração 
 portuguesa, se as qualificações de uns funcionários fossem idênticas às dos 
 outros (e já se viu que o não são), o que poderia era colocar-se um problema de 
 reciprocidade. Não de igualdade, pois que a força irradiante da ideia de 
 igualdade não se estende a espaços jurídicos diferentes daqueles para que as 
 normas são editadas.
 
  
 
  
 
                         III. Decisão:
 
  
 Pelos fundamentos expostos, concede-se provimento ao recurso e, em consequência, 
 revoga-se o acórdão recorrido quanto ao julgamento da questão de 
 constitucionalidade, a fim de ser reformulado em conformidade com o aqui 
 decidido sobre essa questão.
 
  
 Lisboa, 21 de Fevereiro de 1995
 Messias Bento
 Bravo Serra
 
 
 
 
 
  
 Fernando Alves Correia
 Luis Nunes de Almeida
 Guilherme da Fonseca
 José Manuel Cardoso da Costa