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Processo n.º 558/2005
 
 2.ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
 1.  Nos presentes autos de reclamação foi proferido o Acórdão nº 459/2005 no 
 qual o Tribunal Constitucional decidiu indeferir a reclamação (fls. 1674 e ss.).
 A. e B., deduziram pedido de reforma ao abrigo do artigo 669º, nº 2, alínea b), 
 do Código de Processo Civil, nos seguintes termos:
 
  
 
 1.  No douto Acórdão de 21.9.2005, decidiu-se confirmar a decisão de não 
 admissão do recurso por se julgar não ter utilidade a apreciação do objecto do 
 recurso de constitucionalidade não admitido.
 
 2.  Na base desta decisão está o facto de se ter entendido que “caso o Tribunal 
 Constitucional viesse a formular um juízo de não inconstitucionalidade sobre a 
 norma em causa, afigura-se seguro que a decisão recorrida sempre subsistiria com 
 o fundamento relacionado com a protecção de direitos de accionista”.
 
 3.  Isto por o Tribunal da Relação de Lisboa ter considerado que o agravo “seria 
 de prover”, em face do que se considerou ser a existência de prejuízos por parte 
 do Requerente da providência cautelar, em virtude de serem violados os seus 
 direitos de accionista.
 
 4.  Dito de outro modo: nenhuma utilidade teria apreciar a questão do juízo de 
 inconstitucionalidade formulado pela Relação sobre o art. 490°, n.º 3, do Código 
 das Sociedades Comerciais, se a Relação entendeu que a procedência do agravo 
 sempre decorreria do facto de ter julgado violados os direitos de accionista do 
 Agravante.
 
 5.  Ressalvado o devido respeito, porém, afigura-se não ser isso o que resulta 
 do Acórdão da Relação de Lisboa.
 
 6.  Aquela decisão, na estrutura da sua fundamentação de direito, desenvolve-se 
 da forma seguinte:
 
 - Numa primeira parte (que, na transcrição efectuada no douto Acórdão de 
 
 21.9.2005, corresponde aos 7 primeiros parágrafos, indo até “Neste aspecto, e 
 pondo aí a tónica dominante, seria de prover o agravo”), analisa-se a existência 
 da violação dos direitos de accionista do Requerente;
 
 - Numa segunda parte (desde “Não obstante, todavia, concentra-se o estado de 
 coisas num apelo à norma do n.º 3, artº 490º CSC” até “Daí que a dominante, 
 tendo obtido 90% do capital social da empresa, como se vê nos (fto) 15, tenha 
 agido em conformidade, por ter obtido “33.305 acções pertencentes aos sócios 
 livres”, como se exara no pto 14”), pondera-se os efeitos que sobre a situação 
 anteriormente analisada teve a aquisição de acções tendente ao domínio total 
 promovida pela B. ao abrigo do art. 490° do C.S.C.;
 
 - por último, afasta-se a aplicação do art. 490° do C.S.C. (e, por conseguinte, 
 dos efeitos que a aquisição pela B. teria sobre os direitos de accionista do 
 Requerente) por se entender que aquela norma padece de inconstitucionalidade 
 orgânica.
 
 7.  De forma esquemática, crê-se poder sintetizar-se a fundamentação do Acórdão 
 deste modo: considera-se que os direitos do Requerente, como accionista da A., 
 foram violados; seguidamente, porém, analisa-se a aquisição de acções realizada 
 pela B. ao abrigo do art. 490° do C.S.C., com o que, na prática, se questiona se 
 o Requerente ainda é accionista da A.; para, no final, se afastar esta objecção, 
 com fundamento num juízo de inconstitucionalidade da norma do art. 490°, n.º 3, 
 do C.S.C..
 
 8.  Mas se assim é, não pode então entender-se que um eventual juízo de não 
 inconstitucionalidade, a formular pelo Tribunal Constitucional em decisão do 
 recurso para este interposto, seria inútil porque a decisão recorrida sempre 
 subsistiria com o fundamento relacionado com a protecção de direitos de 
 accionista.
 
 9.  Pelo contrário. Assentando-se em que a norma do art. 490°, n.º 3, do C.S.C. 
 não contraria a Constituição, a decisão da Relação, nos seus próprios termos, 
 não poderia manter-se, porque nada impediria, então, que se tirasse as devidas 
 consequências da aquisição, pela B., das acções anteriormente detidas pelos 
 accionistas minoritários.
 
 10.  Se o Requerente, por força de tal aquisição, já não é accionista da A., não 
 há direitos de accionista que possam estar a ser violados.
 
 11.  A decisão a proferir em sede de recurso para o Tribunal Constitucional 
 mantém, pois, inteira utilidade.
 
 12.  Daí que, no modesto entender das Reclamantes, e sempre ressalvado o devido 
 respeito, se tenha incorrido, no douto Acórdão de 21.9.2005, em manifesto lapso 
 ao não se tomar em consideração elementos do Acórdão da Relação de Lisboa que, 
 por si só, deveriam conduzir a decisão diversa da proferida e, concretamente, à 
 admissão do recurso.
 
 13.  Assinale-se que a terminologia utilizada no Acórdão da Relação de Lisboa 
 não contraria o que vem de ser dito. Quando ali se afirma, no final da primeira 
 parte da sua fundamentação de direito, que “Neste aspecto, e pondo aí a tónica 
 dominante, seria de prover o agravo”, não se está a encerrar a análise da 
 questão na perspectiva da procedência do agravo (nem sequer quanto a um dos 
 fundamentos da decisão) mas, tão‑somente, a adiantar uma conclusão provisória, 
 cuja consistência se foi, depois, testar no confronto com a factualidade 
 referente à aquisição das acções pela B. e consequente perda da qualidade de 
 accionista pelo Requerente.
 
 14.  Isso mesmo é demonstrado pelo próprio facto de, no Acórdão recorrido, logo 
 depois de se dizer que “Neste aspecto, e pondo aí a tónica dominante, seria de 
 prover o agravo”, imediatamente se ressalvar: “Não obstante, todavia, 
 concentra-se o estado de coisas num apelo à norma do n.º 3, artº 490º CSC”, num 
 sinal claro de que as considerações seguintes não são mero obiter dictum nem se 
 destinam a funcionar como fundamento alternativo da decisão tomada a final.
 
 15.  Daí que quando, no final, se conclui que “também, por aí, seria de dar 
 provimento ao agravo”, não se esteja apenas a juntar um fundamento alternativo à 
 decisão. Pelo contrário, o que aí se afirma é que, vencido por via da 
 inconstitucionalidade o obstáculo da aquisição feita ao abrigo do art. 490° do 
 C. S. C., se pode confirmar a conclusão provisória que antes se adiantara, 
 decidindo pela procedência do recurso.
 
  
 C. pronunciou‑se no sentido da improcedência do pedido.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar.
 
  
 
  
 
 2.  As reclamantes deduziram o presente pedido de reforma ao abrigo do artigo 
 
 669º, nº 2, alínea b), do Código de Processo Civil. De acordo com tal preceito, 
 a reforma da decisão pode ser requerida quando “constem do processo documentos 
 ou quaisquer elementos que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa 
 da proferida e que o juiz, por lapso manifesto, não haja tomado em 
 consideração”.
 As reclamantes, ao contrário do que artificiosamente afirmam, não invocam 
 quaisquer documentos ou elementos do processo que não tenham sido ponderados 
 pelo Tribunal por manifesto lapso.
 Na verdade, as reclamantes procedem a uma interpretação do Acórdão do qual 
 interpuseram o recurso de constitucionalidade que não foi admitido diversa 
 daquela que é feita pelo Tribunal Constitucional no Acórdão nº 459/2005, 
 revelando, desse modo, que discordam da decisão do Tribunal Constitucional.
 Ora, a interpretação que as reclamantes fazem do fundamento do acórdão do 
 Tribunal da Relação de Lisboa não consubstancia um elemento que, só por si, 
 implique necessariamente decisão diversa da proferida e que o Tribunal, por 
 lapso manifesto, não tenha tomado em conta. Tal interpretação consubstancia o 
 entendimento que as reclamantes têm dos autos, entendimento esse que não foi 
 aquele que o Tribunal Constitucional, fundadamente, acolheu no Acórdão nº 
 
 459/2005.
 No entanto, a mera divergência quanto ao sentido da decisão não pode legalmente 
 fundamentar um pedido de reforma ao abrigo do artigo 669º, nº 2, alínea b), do 
 Código de Processo Civil.
 Nessa medida, indeferir‑se‑á o presente pedido de reforma.
 
  
 
  
 
 4.  Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir o presente 
 pedido de reforma.
 
  
 
  
 Custas pelas reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em  15  UCs. 
 
  
 
  
 Lisboa, 9 de Novembro de 2005
 
  
 Maria Fernanda Palma
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos