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Processo nº 140/90       
 Plenário
 Rel. Cons. Tavares da Costa
 
  
 
  
 
  
 
                              Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I
 
  
 
  
 
       1.1.-    O Procurador-Geral da República, no uso da competência que lhe é 
 outorgada pelo artigo 281º, nº 1, alínea a), e nº 2, alínea e), da Constituição 
 da República (CR) requereu que o Tribunal Constitucional aprecie e declare, com 
 força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das normas constantes dos 
 artigos 4º, nºs. 17, 26 (primeira parte), 47, 49 e 54 (segundo segmento), 9º, nº 
 
 3, 10º, nº 4, 11º, nº 6, e 38º do Regulamento de Disciplina do Batalhão de 
 Sapadores Bombeiros da Câmara Municipal de Lisboa, aprovado por deliberações da 
 Câmara, de 16 de Julho de 1970 e de 22 de Abril de 1971, homologadas por 
 despacho emanado do Ministério do Interior, de 5 de Março de 1971 (Diário do 
 Governo, II Série, nº 69, de 23 de Março de 1971).
 
  
 
       1.2.-    Aduziu, para o efeito, os seguintes fundamentos:
 
  
 
             'a)        Admitindo, sem conceder, que o pessoal dos corpos de 
 bombeiros sapadores possa integrar a categoria de 'agentes militarizados dos 
 quadros permanentes em serviço efectivo' para efeitos do artigo 270º da 
 Constituição, as restrições ao exercício dos seus direitos de expressão, 
 reunião, manifestação, associação e petição colectiva e à sua capacidade 
 eleitoral passiva só seriam constitucionalmente legítimas se proviessem de lei, 
 da exclusiva e indelegável competência da Assembleia da República, 
 obrigatoriamente votada na especialidade pelo Plenário e carecendo de aprovação 
 por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à 
 maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções (artigos 167º, alínea 
 p), e 171º, nºs. 4 e 6, da Constituição), e se se contivessem 'na estrita medida 
 das exigências das suas funções próprias'.
 
  
 
  
 
              b)        Assim, a norma do nº 17 do artigo 4º do Regulamento em 
 causa, ao impor ao sapador bombeiro o dever de 'não tomar parte em comícios, 
 congressos ou espectáculos públicos sem estar devidamente autorizado', viola 
 os artigos 45º, nº 1, e 18º, nº 2, da Constituição, pois não há razão válida, do 
 ponto de vista do ordenamento dos valores constitucionais, para se exigir uma 
 autorização para o exercício, pelos sapadores bombeiros, do direito de 
 reunião.
 
  
 
  
 
              c)        É igualmente inconstitucional, por violação dos artigos 
 
 52º, nº 1, e 18º, nº 2, da Constituição, a norma constante da primeira parte do 
 nº 26 do mesmo artigo 4º, que impõe ao sapador bombeiro o dever de 'não promover 
 ou autorizar nem tomar parte em manifestações colectivas ou atentatórias da 
 disciplina', na medida em que considera como tais manifestações 'as reclamações, 
 pedidos, exposições ou representações verbais ou escritas, referentes a casos 
 de disciplina ou de serviço, que, tendo esse fim comum, sejam apresentadas por 
 diversos indivíduos, colectiva ou individualmente, ou ainda por um em nome de 
 outros'.
 
  
 
  
 
              d)        Viola os artigos 46º, nº 1, e 18º, nº 2, da Constituição 
 a norma constante do nº 47 do mesmo artigo 4º, que impõe ao sapador bombeiro o 
 dever de 'não fazer parte de qualquer clube, sociedade ou agremiação sem estar 
 autorizado superiormente'.
 
  
 
  
 
              e)        A norma constante do nº 49 do citado artigo 4º, que impõe 
 ao sapador bombeiro o dever de 'estar integrado na ordem social estabelecida 
 pela Constituição Política da Nação, com activo repúdio do comunismo e de todas 
 as ideias subversivas', a ter-se por não caducada com a instauração do regime 
 constitucional emergente da Revolução de 25 de Abril de 1974, viola os artigos 
 
 37º, nº 1, e 18º, nº 2, da Constituição, e, na medida em que impediria o acesso 
 
 à função de sapador bombeiro com fundamento em convicções políticas, os artigos 
 
 13º, nº 2, e 47º da Lei Fundamental.
 
  
 
  
 
              f)         A norma constante do nº 54, ainda do artigo 4º, no 
 segmento em que impõe ao sapador bombeiro o dever de não se servir da imprensa 
 ou de outro meio de publicidade para responder a apreciações feitas, viola os 
 artigos 37º, nº 1, e 18º, nº 2, da Constituição, já que tal restrição se mostra 
 excessiva, atendendo a que pode estar em causa a defesa da competência, do zelo 
 e dignidade profissional e até a dignidade pessoal do sapador bombeiro.
 
  
 
  
 
              g)        As normas constantes dos artigos 9º, nº 3, 10º, nº 4, e 
 
 11º, nº 6, do Regulamento em causa, prevendo a aplicação de penas de detenção 
 a, respectivamente, subchefes, cabos e sapadores bombeiros, violam o artigo 
 
 27º da Constituição, que só consente a privação, total ou parcial, de liberdade 
 por motivos disciplinares quando imposta a 'militares', em sentido estrito 
 
 [alínea c) do nº 3].
 
  
 
  
 
              h)        Por idêntico motivo, é inconstitucional a norma do 
 artigo 38º do mesmo Regulamento, enquanto prevê e regulamenta a ordem de 
 detenção (preventiva) por motivos disciplinares.
 
  
 
       1.3.-    Tendo em vista o disposto no nº 1 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 
 
 312/80, de 19 de Agosto, foi notificado o Presidente da Câmara Municipal de 
 Lisboa, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 54º e 55º, nº 3, 
 da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
 
  
 
                              Nada se lhe ofereceu dizer.
 II
 
  
 
                   1.-       O Regulamento de Disciplina  -  doravante designado 
 RDBSB.
 
  
 
                              Aprovado pelas deliberações camarárias já 
 referenciadas, o diploma contém uma introdução sob a epígrafe 'Disciplina' 
 cujo teor importa transcrever para completa inteligência da solução proposta:
 
  
 
             'Mais que em nenhuma outra, por ter que ser desempenhada em horas de 
 sofrimento, a função do Sapador Bombeiro, deve ser exercida em observância aos 
 mais sólidos e rigorosos princípios da disciplina e adestramento, numa 
 criteriosa e bem organizada concordância de esforços.
 
  
 
              Uma perfeita e compreendida subordinação de posto para posto, o 
 respeito para com os chefes, a obediência confiante e imediata às ordens, a 
 compreensão nítida das suas funções e o desejo superiormente manifestado de bem 
 cumprir, são elementos basilares da disciplina.
 
  
 
              A responsabilidade, como consequência da iniciativa, deve ser 
 reivindicada para si por todo aquele que comanda ou dirige.
 
  
 
              Para uma perfeita compreensão da disciplina muito contribuem a 
 bondade e a atenção com que os superiores têm obrigação de tratar os 
 inferiores, e os cuidados que estes constantemente lhes devem merecer.
 
  
 
              Todos devem compenetrar-se de que a disciplina, essencial ao êxito 
 da missão a cumprir, se avigora pelo prestígio que nasce das normas da justiça 
 empregadas, do respeito pelos direitos de todos, do cumprimento exacto dos 
 deveres, do saber e da correcção de proceder.
 
  
 
              O procedimento exemplar dos superiores, em todos os seus actos, é 
 elemento primacial da disciplina que deve ser exortado'.
 
  
 
                              Por sua vez, o capítulo I - Generalidades - 
 procura, logo no seu artigo 1º, concretizar o que se entende por disciplina:
 
  
 
             'A disciplina consiste na exacta observância das leis, regulamentos, 
 instruções e ordens de serviço'.
 
  
 
                              E, depois de o artigo 2º preceituar que 'Infracção 
 de disciplina punível por este Regulamento é toda a omissão ou acção contrária 
 ao dever', o artigo 3º adianta que o sapador bombeiro 'terá rigorosamente em 
 conta que:
 
  
 
             1.-        É devida obediência pronta, leal e completa às ordens do 
 superior, sem prejuízo de, em casos excepcionais mas nunca em formatura ou em 
 trabalho, poder o inferior, obtida a autorização, dirigir respeitosamente ao 
 superior as observações que julgar convenientes, obedecendo no entanto, se o 
 superior insistir, sem quebra do direito de queixa à autoridade competente.
 
  
 
             2.-        A obediência é sempre devida ao mais graduado e em 
 igualdade de graduação ao mais antigo.
 
  
 
             3.-        O superior deverá procurar ser para os inferiores exemplo 
 e guia, estabelecendo estima recíproca sem contudo a levar até à 
 familiariedade, que só é permitida fora dos actos de serviço e entre indivíduos 
 da mesma classe.
 
  
 
             4.-        A disciplina sendo condição de êxito da missão a cumprir 
 consolida-se e avigora-se pelo prestígio que nasce das normas de justiça 
 empregadas, do respeito pelos direitos de todos, do cumprimento exacto dos 
 deveres, do saber e da correcção de proceder.
 
  
 
             5.-        Nenhum graduado se deve esquecer em quaisquer 
 circunstâncias de que a atenção dos seus subordinados está sempre fixa sobre os 
 seus actos e que, por isso, a sua conduta irrepreensível é meio seguro de 
 manter a disciplina.'
 
  
 
                              Prossegue o diploma com os capítulos II - Deveres  
 
 - III - Penas disciplinares  - IV - Recompensas  - V - Regras para aplicação e 
 execução das penas disciplinares  - VI - Processo disciplinar  - VII - 
 Reclamações, queixas e recursos  - VIII - Publicação, averbamento e anulação de 
 recompensas e penas  - e IX - Classes de comportamento.
 
  
 
                              As normas questionadas inserem-se nos capítulos II 
 e III.
 
  
 
  
 
                   2.-       Os textos em crise do RDBSB.
 
  
 
                              O artigo 4º, integrado no Capítulo II - Deveres - 
 dispõe no seu corpo e na parte que interessa:
 
  
 
             'O Sapador Bombeiro, cujo proceder em tudo se regulará pelos ditames 
 da virtude e da honra, deve amar a Pátria, guardar fidelidade à Constituição e 
 
 às Leis, servir com o maior brio e praticar o bem em proveito do seu semelhante 
 a quem com risco da própria vida socorrerá em todas as circunstâncias aflitivas, 
 e tem por deveres especiais os seguintes:
 
  
 
             ------------------------------------
 
  
 
             17.       Não tomar parte em comícios, congressos ou espectáculos 
 públicos sem estar devidamente autorizado.
 
  
 
             ------------------------------------
 
  
 
             26.       Não promover ou autorizar nem tomar parte em manifestações 
 colectivas ou atentatórias da disciplina [...].
 
  
 
             ------------------------------------
 
  
 
             47.       Não fazer parte de qualquer clube, sociedade ou agremiação 
 sem estar autorizado superiormente.
 
  
 
             ------------------------------------
 
  
 
             49.       Estar integrado na ordem social estabelecida pela 
 Constituição Política da Nação, com activo repúdio do comunismo e de todas as 
 ideias subversivas.
 
  
 
             ------------------------------------
 
             54.       Não se servir da imprensa ou de qualquer outro meio de 
 publicidade [...] para responder a apreciações feitas [...].
 
  
 
             ----------------------------------.'
 
  
 
  
 
                              O artigo 9º, integrado no Capítulo III - Penas 
 Disciplinares - II - Penas aplicáveis ao pessoal subalterno e às praças, 
 dispõe:
 
  
 
             'As penas aplicáveis a subchefes são as seguintes:
 
  
 
             ------------------------------------
 
  
 
             3.         Detenção (perda de folgas) até 20 dias 
 
  
 
             ----------------------------------.'
 
  
 
  
 
                              O artigo 10º, em idêntico enquadramento 
 sistemático, dispõe:
 
  
 
             'As penas aplicáveis a cabos são as seguintes:
 
  
 
             ------------------------------------
 
  
 
             4.         Detenção (perda de folgas) até 20 dias.
 
  
 
             ----------------------------------.'
 
  
 
  
 
                              O artigo 11º reza, por sua vez:
 
  
 
             'As penas aplicáveis a sapadores bombeiros são as seguintes:
 
  
 
             ------------------------------------
 
  
 
             6.         Detenção (perda de folgas) até 20 dias
 
  
 
             ----------------------------------.'
 
  
 
  
 
                              Finalmente, o artigo 38º está compreendido no mesmo 
 capítulo (parte III - Efeitos das penas) e dispõe:
 
  
 
             '1.-      Todo o superior pode ordenar a detenção dos inferiores 
 sempre que assim o exija a disciplina.
 
  
 
              2.-       Quando o superior que ordenar a detenção no quartel, não 
 tiver competência para punir, deverá imediatamente participar a ocorrência por 
 escrito ao comandante, que resolverá como for de justiça, se para isso tiver 
 competência, ou fará seguir às instâncias superiores a participação devidamente 
 informada e averiguada.
 
  
 
              3.-       A intimação da ordem de detenção de um subchefe-ajudante 
 ou subchefe a um outro, seu inferior, só é permitida nos casos de usurpação de 
 atribuições, abuso de autoridade ou provocação à indisciplina'.
 
  
 
  
 II
 
  
 
                              Questão prévia: da utilidade de conhecer o pedido
 
  
 
       1.1.-    Interessará conhecer o pedido formulado pelo Procurador-Geral da 
 República se se puder desde já concluir que ele respeita a normas presentemente 
 não vigentes no ordenamento jurídico nacional, por revogadas?
 
  
 
                              É certo que, só por si, a revogação, que tem, em 
 princípio, eficácia ex nunc, não obsta a uma eventual declaração de 
 inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, a qual, e também em 
 princípio, tem efeitos retroactivos, ex tunc, mercê do disposto no artigo 282º, 
 nº 1, da Constituição.
 
                              Pode, de facto, haver interesse relativo aos 
 efeitos produzidos pela norma medio tempore, o que acontecerá sempre que a 
 declaração se mostrar indispensável para eliminar os efeitos produzidos pela 
 norma posta em crise durante o tempo que esteve em vigor.
 
  
 
                              Trata-se de entendimento assumido em jurisprudência 
 reiterada do Tribunal Constitucional, caso dos acórdãos nºs. 238/88, 319/89, 
 
 415/89, 73/90, 135/90, 200/90, 446/91, 465/91, 175/93, 308/93 e 188/94, 
 respectivamente publicados no Diário da República, II Série, de 21/12/88, 
 
 28/6/89, 15/9/89, 19/7/90, 7/9/90, 12/9/90, 2/4/90 (os dois de 1991), 29/4/93, 
 
 22/7/93 e 19/5/94.
 
  
 
                              Necessário é que haja um interesse de conteúdo 
 prático apreciável, a justificar o 'accionamento de um mecanismo de índole 
 genérica e abstracta como é a declaração, com força obrigatória geral, de 
 inconstitucionalidade', na expressão do parecer nº 21/81 da Comissão 
 Constitucional (in - Pareceres da Comissão Constitucional, vol. 16º, pág. 203), 
 retomada por outros arestos, tais como os citados acórdãos nºs. 238/88 e 
 
 175/93.
 
  
 
                              A esta luz se apreciará a questão equacionada.
 
                   2.-       Está em vigor o regime disciplinar parcialmente 
 posto em crise pela entidade requerente?
 
  
 
  
 
       2.1.-    O RDBSB pretendeu, consoante se retira da elucidativa nota 
 preambular, estabelecer um regime disciplinar do corpo de sapadores bombeiros 
 municipais de Lisboa concebido segundo uma rígida perspectiva de subordinação 
 hierárquica, rigoroso enquadramento dos efectivos e vocação de serviço público, 
 como se lhe chamou.
 
  
 
                              O Código Administrativo dispunha, então, no § único 
 do artigo 157º  -  preceito que seria revogado pelo artigo 8º do Decreto-Lei nº 
 
 312/80, de 19 de Agosto  -  deverem as câmaras municipais onde existissem 
 batalhões de sapadores bombeiros  
 
 -  caso de Lisboa  -  elaborar regulamentos disciplinares destinados a serem 
 observados por esses batalhões 'segundo as normas de disciplina militar', razão 
 pela qual se atribuíam os respectivos comandos, de harmonia com o corpo do mesmo 
 dispositivo, a oficiais superiores ou capitães da arma de engenharia, sendo o 
 respectivo pessoal militarizado.
 
  
 
                              O Decreto-Lei nº 35 746, de 12 de Julho de 1946, 
 previu, por sua vez, a publicação pelo Governo de um regulamento a cujas 
 disposições se subordinariam os regulamentos de todos os corpos de bombeiros 
 
 (artigo 12º) centralizando em organismo dependente do Ministério do Interior - 
 o Conselho Nacional dos Serviços de Incêndios que, mais tarde, daria lugar ao 
 Serviço Nacional de Bombeiros - a orientação superior dos vários serviços a 
 cargo dos bombeiros, com ganho de prestígio na medida em que se intentava 
 uniformizar quadros, formação técnica e disciplina do pessoal.  Na sequência do 
 disposto naquele artigo 12º, o Decreto nº 35.857, de 11 de Setembro de 1946 e o 
 Decreto nº 38.439, de 27 de Setembro de 1951  -  cujo artigo 71º revogou 
 expressamente o primeiro  -  encarregaram as câmaras municipais de elaborar os 
 regulamentos disciplinares dos seus corpos de bombeiros tendo em consideração 
 não apenas o modelo regulamentar, funcional e organizatório nesses diplomas 
 contido como, bem assim, os regulamentos dos próprios batalhões de sapadores de 
 bombeiros.
 
  
 
                              Posteriormente, o Decreto-Lei nº 312/80, de 19 de 
 Agosto, já aludido, criou uma nova estrutura orgânica e operacional dos 
 batalhões de sapadores bombeiros.
 
  
 
                              O seu artigo 8º revogou os artigos 156º do Código 
 Administrativo  -  preceito que previa a existência de diversos corpos de 
 bombeiros nos municípios  -  e 157º do mesmo diploma, que aludia à militarização 
 do pessoal dos batalhões de sapadores bombeiros e à disciplina militar que os 
 devia reger.
 
  
 
                              Sob a epígrafe 'Disciplina' dispôs o novo texto, no 
 artigo 6º:
 
  
 
             '1.-      O pessoal dos corpos de bombeiros sapadores é 
 militarizado e rege-se por regulamentos elaborados segundo as normas de 
 disciplina militar aprovadas pelas câmaras municipais respectivas.
 
  
 
  
 
              2.-       Para orientação das câmaras municipais interessadas, 
 publicará o Ministério da Administração Interna modelo de regulamento tipo, 
 vigorando como tal, enquanto aquela publicação não ocorrer, o regulamento 
 aplicado actualmente aos batalhões de bombeiros sapadores' (sublinhados 
 agora).
 
  
 
  
 
                              Permitiu-se, assim, como explicitamente se pondera 
 no Despacho Normativo nº 276/82 do Ministro da Administração Interna, ao abrigo 
 do artigo 9º daquele Decreto-Lei nº 312/80 (despacho datado de 25 de Novembro de 
 
 1982 e publicado no Diário da República, I Série, de 11 de Dezembro seguinte) 
 que os municípios, verificado certo grau de profissionalização do pessoal dos 
 corpos municipais de bombeiros, instituíssem batalhões ou companhias de 
 bombeiros profissionais sapadores 'com pessoal militarizado submetido a regime 
 disciplinar próximo do regulamento de Disciplina Militar', em consequência do 
 que se cuida do regime de nomeação dos titulares dos lugares do comando dessas 
 companhias (sublinhado agora).
 
  
 
                              De resto, a legislação entretanto saída relativa a 
 vencimentos, diuturnidades e outros benefícios a abonar a esse pessoal 'situa-o' 
 na área da militarização (se bem que  -  reflexo da aporia verificada em todo o 
 tratamento jurídico desde há muito concedido aos sapadores  -  nem sempre 
 identicamente).  Sirvam como exemplo dois diplomas:  o Decreto-Lei nº 405/75, de 
 
 29 de Julho, ao determinar que o regime e o quantitativo das diuturnidades e 
 outros benefícios a abonar ao pessoal dos batalhões de sapadores bombeiros 
 serão iguais aos estabelecidos para o pessoal da Polícia de Segurança Pública 
 
 (artigo 1º) parte do princípio de que os batalhões de sapadores bombeiros 
 
 'sempre têm estado equiparados' aos elementos das corporações militarizadas do 
 Estado;  o Decreto-Lei nº 87/79, de 18 de Abril, que, ao equiparar os 
 vencimentos base do pessoal dos batalhões de sapadores bombeiros de Lisboa e do 
 Porto ao do pessoal da PSP (artigo 1º) considera 'a natureza de corpos 
 militarizados de que se revestem os batalhões de sapadores bombeiros'.
 
                              Sem retirar qualquer ilação da qualificação feita 
 amiúde pelo legislador sobre a militarização destes corpos de bombeiros, sem 
 prejuízo da nítida componente reforçada de disciplina e de hierarquia que os 
 distingue  -  e os diferenciam, designadamente, de outros corpos de bombeiros  - 
 
  cumprirá verificar se esse enquadramento, em vigor ao tempo do pedido, se 
 mantém hoje em dia.
 
  
 
  
 
       2.2.-    Com efeito, até recente data as iniciativas do legislador não 
 permitiam ao intérprete tarefa fácil.
 
  
 
                              Assim, o Estatuto Social do Bombeiro  -  Lei nº 
 
 21/87, de 20 de Junho  -  após definir bombeiro (artigo 1º) e determinar a sua 
 aplicação aos bombeiros profissionais 'sem prejuízo das disposições mais 
 favoráveis constantes dos diplomas orgânicos dos serviços ou dos regulamentos 
 das entidades a que estejam vinculados' (nº 2 do artigo 2º) diz-nos, no seu 
 artigo 4º que 'o recrutamento, o provimento de categorias, quadros, promoção, 
 antiguidade e regime disciplinar dos bombeiros são os constantes dos respectivos 
 regulamentos e demais legislação em vigor para os corpos de bombeiros'.  E, ao 
 elencar os deveres e os direitos dos bombeiros ressalvam-se os que resultem 'de 
 outras leis ou regulamentos aplicáveis' (nºs. 2 dos artigos 5º e 6º, 
 respectivamente).  Indefinições e incompletudes que igualmente se detectam no 
 Decreto-Lei nº 241/89, de 3 de Agosto, texto que veio regulamentar o regime 
 jurídico estabelecido pela Lei nº 21/87.
 
  
 
                              Consciente de semelhantes perplexidades, veio o 
 Decreto-Lei nº 293/92, de 30 de Dezembro, fixar novo regime jurídico dos corpos 
 de bombeiros profissionais.
 
  
 
                              Considerou-se ser o novo estatuto um compromisso 
 que envolve, para além da prossecução dos objectivos inerentes ao interesse 
 público, a estrutura dos bombeiros em Portugal, os interesses das autarquias e 
 os 'legítimos anseios dos profissionais envolvidos', reconhecendo-se, do mesmo 
 passo, a desactualização do conjunto de normas dispersas que se vêm aplicando 
 aos bombeiros profissionais e as dificuldades advindas da aplicação prática de 
 dois regimes:  'um, proveniente de adaptações do Código Administrativo e da 
 transição imperfeita dos regimentos de sapadores bombeiros para o âmbito 
 municipal, outro, da insuficiência das normativas aplicáveis à administração 
 local', segundo nos diz o preâmbulo do diploma.
 
  
 
                              Como então se observa, e importa reter, 'os 
 bombeiros profissionais são funcionários da autarquia, com todas as implicações 
 que desta qualidade decorrem, e a ligação que se mantém ao Serviço Nacional de 
 Bombeiros justifica-se pela necessidade de harmonização de formação e 
 coordenação no terreno...'(sublinhado nosso).
 
  
 
                              Nesta linha de orientação 'os corpos de bombeiros 
 profissionais regem-se pela legislação geral em vigor para o pessoal da 
 administração local e pela demais legislação especial aplicável, em tudo o que 
 não se encontre especialmente regulado no presente diploma', como nos diz o 
 artigo 2º.
 
  
 
                              Os corpos de bombeiros profissionais são corpos 
 especiais de funcionários especializados de protecção civil integrados nos 
 quadros de pessoal das câmaras municipais, entendendo-se por bombeiros 
 profissionais, para efeitos do diploma, os bombeiros municipais que desempenham 
 funções com carácter profissionalizado e os bombeiros sapadores (artigo 3º).
 
  
 
                              Estes corpos de bombeiros dependem, para efeitos 
 funcionais, administrativos e disciplinares da respectiva autarquia local 
 
 (artigo 4º, nº 1) e os seus efectivos  -  os bombeiros profissionais  -  gozam 
 dos direitos e estão sujeitos aos deveres previstos na lei geral para os demais 
 funcionários da Administração Pública (nº 1 do artigo 17º), observando o artigo 
 
 21º, sob a epígrafe 'Regime disciplinar':
 
  
 
             'Aos bombeiros profissionais aplica-se o Decreto-Lei nº 24/84, de 16 
 de Janeiro, e demais legislação aplicável aos corpos de bombeiros'.
 
  
 
                              O provimento dos cargos de comando passa a ser 
 feito 'nos termos da legislação em vigor para o pessoal dirigente da 
 administração local' dando-se preferência aos oficiais das Forças Armadas na 
 situação de reserva ou a 'indivíduos licenciados de reconhecido mérito no 
 exercício de funções de comando, cumulativamente com experiência profissional 
 na área da protecção civil' (artigo 9º, nº 1), equiparando-se, para efeitos 
 remuneratórios, o cargo de comandante de regimento ou de batalhão de bombeiros 
 sapadores ao de director municipal e o cargo de comandante de companhia ao de 
 director de departamento municipal (nºs. 2 e 4 do artigo 9º).
 
  
 
                              E o artigo 28º revoga o § 3º do artigo 163º do 
 Código Administrativo 'na parte em que remete para o regime disciplinar dos 
 bombeiros sapadores', ou seja, elimina a equiparação do estatuto disciplinar dos 
 serviços de polícia municipal, concebido como 'corpo privativo militarizado', às 
 normas previstas nesse domínio para os batalhões de sapadores bombeiros.
 
                              O Decreto-Lei nº 293/92 foi alterado, por 
 ratificação, pela Lei nº 52/93, de 14 de Julho, com pequenas modificações 
 
 (nelas sobressaindo o aditado artigo 19º-A, que sujeita os bombeiros 
 profissionais ao regime geral de férias, faltas e licenças).
 
  
 
                              Operou-se, através destas medidas legislativas, um 
 inequívoco reequacionamento da natureza organizacional e profissional dos 
 bombeiros sapadores.
 
  
 
                              Já nesta perspectiva, o Decreto-Lei nº 373/93, de 4 
 de Novembro, criou regras para o estatuto remuneratório e a estrutura das 
 remunerações base das categorias que integram a carreira de bombeiros sapadores, 
 prevendo especificidades e remetendo para o regime geral do Decreto-Lei nº 
 
 353-A/89, de 16 de Outubro, que versa a mesma temática no âmbito dos 
 funcionários e agentes da Administração Pública.
 
  
 
                              E, como que cortando de raiz, o Decreto-Lei nº 
 
 407/93, de 14 de Dezembro, estabeleceu o novo regime jurídico dos corpos de 
 bombeiros, revogando expressamente, no seu artigo 15º, o Decreto-Lei nº 312/80, 
 que, recorde-se, concebera uma estrutura orgânica e operacional para os 
 batalhões de bombeiros sapadores assente na militarização do respectivo pessoal 
 e no respeito a normas de disciplina militar.
 
  
 
                              Registem-se, por fim, dois diplomas mais recentes  
 
 -  o Decreto-Lei nº 277/94, de 3 de Novembro, e o Decreto Regulamentar nº 
 
 62/94, de 2 de Novembro  -  que, no entanto, nada acrescentam de significativo 
 aos dados da questão.
 
  
 
                              Com efeito, o primeiro deles introduz alterações à 
 Lei Orgânica do Serviço Nacional de Bombeiros' (Decreto-Lei nº 418/80, de 28 de 
 Setembro), decorrentes da aprovação do novo regime jurídico dos corpos de 
 bombeiros, enquanto o segundo dos citados textos estabelece o regime jurídico da 
 tipificação destes corpos, classificando-os por critérios que têm em conta as 
 dotações dos corpos de bombeiros em recursos humanos, equipamentos e 
 instalações, atribuindo-se a cada corpo um coeficiente indicativo 'em cuja 
 determinação intervenham os factores expressivos do risco potencial do 
 município em que aquele se situa, bem como a respectiva área geográfica de 
 actuação e os serviços que presta' (da breve nota preambular).
 
  
 
                              Ambos os diplomas traduzem adaptações ao mesmo 
 regime jurídico dos corpos de bombeiros e, a esta luz, se nada de relevante 
 encerram quanto à problemática em causa, bem pode defender-se, razoavelmente, 
 que, longe de contrariarem, eles reforçam o novo enfoque jurídico que à matéria 
 se pretende dar.
 
     2.3.1.-   Diz-nos o artigo 270º da Constituição da República que a lei pode 
 estabelecer restrições ao exercício dos direitos 
 de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e à 
 capacidade eleitoral passiva dos militares e agentes militarizados dos quadros 
 permanentes em serviço efectivo, na estrita medida das exigências das suas 
 funções próprias.
 
  
 
                              Não é, no entanto, isenta de dificuldades a tarefa 
 de apurar os conceitos de militar e de agente militarizado dada a sua ténue 
 densificação, agravada pelo facto de a Constituição os mencionar ao longo do seu 
 texto  -  como se surpreende nos artigos 46º, nº 4, 167º, alínea p), e 270º  -  
 não apenas numa perspectiva organizatória mas também em óptica definidora de 
 diferentes estatutos pessoais, como foi observado por este Tribunal no acórdão 
 nº 308/90, publicado no Diário da República, I Série-A, de 21 de Janeiro de 
 
 1991.
 
  
 
                              A este propósito, outro aresto, o nº 103/87, 
 publicado no mesmo jornal oficial, I Série, de 6 de Maio de 1987, utilizando 
 uma metodologia aceite por aquele e também (implicitamente, pelo menos) pelo nº 
 
 221/90 (Diário citado, II Série, de 22 de Janeiro de 1991), ao equacionar os 
 parâmetros de integração e de interpretação do conteúdo constitucionalmente 
 adequado da expressão 'agentes militarizados', não sublinhou tanto o critério 
 do respectivo estatuto profissional mas antes, e sobretudo, o da sua situação 
 organizatória, em termos de comparação com a específica situação organizatória 
 dos militares.
 
  
 
                              Nessa linha de abordagem, 'militarizado' encerrará 
 uma realidade que, por definição, na sua essência, não é militar mas recebe 
 certas características típicas da instituição militar, vindo a assumir uma 
 feição similar a esta (citado acórdão nº 103/87), significando a instituição 
 
 'militarizada' algo que apenas se aproxima, através de determinadas 
 características, da instituição 'militar' mas que não se identifica com esta 
 nem é sequer um seu desenvolvimento (cit. acórdão, após confrontação com o 
 
 'lugar paralelo' do artigo 46º, nº 4, da Constituição).
 
  
 
                              Na assinalada orientação jurisprudencial 
 apontam-se, como notas características da instituição militar, o estrito 
 enquadramento hierárquico dos seus membros, a subordinação da actuação de cada 
 um ao princípio do comando em cadeia, implicando um especial dever de 
 obediência, o uso de armamento, o princípio do aquartelamento, a obrigatoriedade 
 do uso de farda ou uniforme e a sujeição dos membros da instituição a 
 específicas regras disciplinares e, eventualmente, jurídico-penais.
 
  
 
                              Falta, aliás, uma 'norma intermédia' concretizadora 
 dessas restrições como a do artigo 31º da Lei nº 29/82, de 11 de Dezembro (Lei 
 da Defesa Nacional e das Forças Armadas), na redacção da Lei nº 41/83, de 21 de 
 Dezembro, para os militares e agentes militarizados, com referência à Guarda 
 Nacional Republicana, Guarda Fiscal e Polícia de Segurança Pública (artigo 
 
 69º), sendo certo que outros organismos existem situados na 'zona cinzenta' 
 exposta à controvérsia da caracterização militarizada ou de natureza civil das 
 suas atribuições (cfr. Alberto Esteves Remédio - 'Forças Armadas e Forças de 
 Segurança - Restrições aos Direitos Fundamentais' in Estudos sobre a 
 Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Lisboa, 1993, pág. 374).
 
  
 
  
 
     2.3.2.-   Não interessa, porém, ir tão longe na caracterização estatutária 
 e disciplinar dos bombeiros sapadores à luz do ordenamento jurídico, tal como 
 este se apresentava à data do pedido  -  questão que, assim, se deixa em aberto.
 
  
 
                              Na verdade, a partir de 1992, nomeadamente, o 
 legislador optou pela valorização da vertente administrativa civil dos corpos 
 de bombeiros sapadores, estrutural e estatutariamente considerados e, nessa 
 medida, as restrições possíveis a introduzir ao exercício dos direitos, 
 liberdades e garantias dos seus membros ficam necessariamente sujeitas ao regime 
 aplicável aos trabalhadores da Administração pública civil.
 
  
 
                              É inegável a dimensão de interesse público das 
 atribuições funcionais dos corpos de bombeiros profissionais, cujo elenco, 
 constante do artigo 3º do Decreto-Lei nº 407/93, é sintetizado no Estatuto 
 Social do Bombeiro ao atribuir ao bombeiro a missão de protecção das vidas 
 humanas e dos bens em perigo, mediante a prevenção e a extinção de incêndios e o 
 socorro dos feridos, doentes ou náufragos.
 
  
 
                              Para o efeito, o legislador  -  que se presume 
 consagrar as soluções mais acertadas e saber exprimir adequadamente o seu 
 pensamento  -  intentou regular os interesses em jogo, criando os corpos de 
 bombeiros sapadores na dependência de uma câmara municipal, integrando-os 
 exclusivamente por elementos profissionais, dotando-os de uma estrutura que 
 compreende a existência de companhias, batalhões e regimentos ou, pelo menos, 
 de uma dessas unidades estruturais.  E fez compreender, na estrutura dos 
 regimentos e batalhões, o comando, a secção técnica, a companhia de instrução, 
 as companhias operacionais e os serviços logísticos;  e, nas companhias de 
 bombeiros sapadores, quando não enquadradas em regimentos ou batalhões, o 
 comando, a secção técnica e de instrução, os pelotões operacionais e os 
 serviços logísticos (cfr. o artigo 4º, nº 2, do Decreto-Lei nº 407/93).
 
  
 
                              Regime, no entanto, globalmente diferente do 
 anterior.
 
  
 
                              Na verdade, se bem que sujeitos ao princípio de 
 comando, tendo em vista possibilitar 'a máxima eficiência de coordenação 
 técnico-operacional no desempenho das suas funções' (artigo 8º da Lei nº 52/93), 
 os bombeiros profissionais passaram a ter os seus cargos de comando não 
 necessariamente providos com militares, dando-se preferência quer a oficiais 
 das Forças Armadas na situação de reserva, quer a indivíduos licenciados de 
 reconhecido mérito no exercício de funções de comando, cumulativamente com 
 experiência profissional na área da protecção civil.
 
  
 
                              Como funcionários autárquicos, atribuiram-se-lhes o 
 gozo dos direitos e a sujeição aos deveres previstos na lei geral para o 
 funcionalismo da Administração Pública, com as especificidades próprias, e o 
 estatuto do pessoal dirigente da administração local autárquica.
 
  
 
                              E, de igual modo, ficaram sujeitos disciplinarmente 
 ao regime do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração 
 Central, Regional e Local.
 
  
 
                              Estes três factores  -  estruturação dos comandos, 
 enquadramento da função no âmbito autárquico, regime disciplinar comum ao 
 universo dos funcionários e agentes das Administrações Central, Regional e 
 Local  -  são índices expressivos da vigência de um novo tratamento jurídico, 
 organizatório e estatutário nesta área.
 
  
 
                              E é através deles que, actualmente, importa 
 ponderar os interesses em jogo, considerando o intérprete seja o poder de 
 intervenção do legislador, seja o grau de imposição constitucional.
 
  
 
                              Todavia, no âmbito desta questão prévia, não há que 
 curar de saber em que medida a 'missão' do bombeiro sapador, ou seja, a 
 salvaguarda dos interesses e bens da comunidade ligados à função por ele 
 exercida (cfr., J.C. Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição 
 Portuguesa de 1976, Coimbra, 1987, pág. 244) permite ao legislador comprimir os 
 direitos fundamentais.
 
       2.4.-    Chega-se, assim, à conclusão de que o regime disciplinar dos 
 membros dos corpos de bombeiros sapadores vigente à data do pedido foi 
 globalmente revogado, substituindo-se todo o regime jurídico por novo regime, 
 integrando uma situação contemplada pelo artigo 7º, nº 2, in fine do Código 
 Civil.
 
  
 
                              O que, na sequência do anteriormente exposto, 
 conduz ao não conhecimento do pedido, por falta de interesse jurídico relevante.
 
  
 
                              Aliás, algumas das normas em sindicância  -  sirvam 
 de paradigma as dos nºs. 17, 47 e 49 do artigo 4º  -  nem sequer terão caducado 
 com a entrada em vigor da Constituição (cfr., artigo 293º, nº 1, da redacção 
 inicial, hoje 290º, nº 2) porque já então haviam sido afastadas com o 25 de 
 Abril, o Programa do Movimento das Forças Armadas e a Lei nº 3/74, de 14 de Maio 
 
 (cfr. artigo 1º, nº 1), que o publicou em anexo.
 
  
 
                              Quanto às restantes, a terem sido, entretanto, 
 aplicadas -o que o Tribunal desconhece- a verdade é que a eventual declaração 
 da sua inconstitucionalidade, não se reveste de conteúdo prático apreciável, 
 desse modo tornando-se inadequado e desproporcionado accionar um mecanismo de 
 
 índole genérica e abstracta como é o da declaração de inconstitucionalidade 
 com força obrigatória geral (neste sentido, v.g., o acórdão nº 17/83, publicado 
 no Diário da República, II Série, de 31 de Janeiro de 1984 e os pareceres nele 
 citados da Comissão Constitucional).
 
  
 IV
 
  
 
                              Nestes termos e face ao exposto, o Tribunal 
 Constitucional decide não tomar conhecimento do pedido de declaração de 
 inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos 
 artigos 4º, nºs. 17, 26 (primeira parte), 47, 49 e 54 (segundo segmento), 9º, nº 
 
 3, 10º, nº 4, 11º, nº 6, e 38º do Regulamento de Disciplina do Batalhão de 
 Sapadores Bombeiros da Câmara Municipal de Lisboa, aprovado por deliberações da 
 Câmara, de 16 de Julho de 1970 e de 22 de Abril de 1971, homologadas por 
 despacho emanado do Ministério do Interior, de 5 de Março de 1971 (Diário do 
 Governo, II Série, nº 69, de 23 de Março de 1971).
 
  
 
                  Lisboa, 8 de Março de 1995
 
                               Alberto Tavares da Costa
 Vítor Nunes de Almeida
 Bravo Serra
 Armindo Ribeiro Mendes
 Antero Alves Monteiro Dinis
 Messias Bento
 José de Sousa e Brito
 Luís Nunes de Almeida
 Maria da Assunção Esteves
 Guilherme da Fonseca (com dúvidas, porque, tratando-se de matéria disciplinar, 
 regulamentada por normas, como são as ora questionadas, grosseiramente 
 afrontosas do regime de direitos, liberdades e garantias nascido do 25 de Abril 
 de 1974, seria caso de conhecer do mérito do pedido, à luz do nº 3 do artigo 
 
 282º da Constituição, para inevitavelmente declarar a inconstitucionalidade das 
 mesmas normas, sem ressalvar os casos julgados, o que se poderia projectar em 
 benefício de eventuais arguidos prejudicados com a aplicação de um tal sistema 
 disciplinar)
 
                                          José Manuel Cardoso da Costa