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Proc. nº 518/94
 
 2ª Secção
 Relator: Cons. Luís Nunes de Almeida
 
  
 Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 
             I - RELATÓRIO
 
  
 
  
 
             1. A ..., cidadão brasileiro,  recorreu para o Tribunal 
 Constitucional do acórdão de 7 de Julho de 1994 do Supremo Tribunal de Justiça 
 que confirmou a decisão de 10 de Março de 1994 do Tribunal de Relação de Lisboa, 
 autorizando a extradição do recorrente para os Estados Unidos da América, para 
 aí ser julgado sob a acusação de tráfico organizado de cocaína do Brasil para os 
 Estados Unidos e de distribuição do mesmo produto neste país entre 1974 e 1987, 
 crimes previstos e puníveis nos termos do disposto  nos artigos 841 (a) (1), 952 
 e 963 do United States Code.
 
  
 
             O recorrente pede que se aprecie a constitucionalidade do disposto 
 no artigo 6º, nº 1, alínea e), do Decreto-Lei nº 43/91, de 22 de Janeiro, pois 
 considera que tal norma, na interpretação perfilhada naquele acórdão, viola os 
 artigos 12º, 13º, 15º, 30º e 33º da Constituição.
 
  
 
  
 
             2. Distribuídos os autos no Tribunal Constitucional, o relator 
 lavrou parecer liminar no sentido de que tal recurso não podia ser admitido, uma 
 vez que o recorrente nunca suscitou durante o processo a questão da 
 inconstitucionalidade daquela norma, mas sim a do artigo 6º, nº 2, alínea c), do 
 mesmo decreto-lei.
 
  
 
             Ouvido sobre a questão prévia, o recorrente pediu que se admita o 
 recurso, porquanto a norma do artigo 6º, nº 1, alínea e), foi aplicada de forma 
 inesperada, não tendo o recorrente podido antever essa aplicação, por forma a 
 suscitar  anteriormente a respectiva inconstitucionalidade. Juntou parecer do 
 Prof. Doutor Jorge Miranda e do Dr. Miguel Pedrosa Machado, sobre a matéria da 
 questão prévia e sobre o mérito da causa.
 
  
 
             O Ministério Público manifestou-se de acordo com o parecer do 
 relator, por não considerar que tivesse sido inesperada ou imprevisível a 
 aplicação da norma em questão.
 
  
 
  
 
  
 
             Corridos os vistos, cumpre decidir a questão prévia.
 
  
 
  
 
             II - FUNDAMENTOS
 
  
 
  
 
             3. É a seguinte a redacção das diposições pertinentes do artigo 6º 
 do Decreto-Lei nº 43/91:
 
  
 Artigo 6º
 
  
 Requisitos gerais negativos                   da cooperação internacional
 
  
 
 1 - O pedido de cooperação é recusado quando:
 
  
 
 [...]
 
  
 e) O facto a que respeita for punível com pena de morte ou com pena de prisão 
 perpétua;
 
  
 f) Respeitar a infracção a que corresponda medida de segurança com carácter 
 perpétuo.
 
  
 
 2 - O disposto nas alíneas e) e f) do número anterior não obsta à cooperação:
 
  
 
  
 a) Se o Estado que formula o pedido tiver comutado aquelas penas ou retirado 
 carácter perpétuo à medida;
 
  
 
 [...]
 
  
 c) Se respeitar a auxílio solicitado com fundamento na relevância do acto para 
 presumível não aplicação dessas penas ou medidas.
 
  
 
 [...]
 
  
 
             
 
             4. Em resposta ao referido parecer liminar do relator (segundo o 
 qual não deveria conhecer-se do recurso, por a questão de inconstitucionalidade 
 deste nº 1, alínea e), não ter sido tempestivamente suscitada), o recorrente 
 afirma o seguinte, a fls. 573:
 
  
 
             [...]Vistas as coisas objectivamente, o Supremo Tribunal de Justiça 
 entendeu que o facto a que respeita o pedido de extradição não é punível com a 
 pena de morte ou de prisão perpétua (hipótese contida na alínea e) do nº 1):
 
  
 
             - ou porque a pena foi comutada (hipótese prevista na alínea a) do 
 nº 2 do mesmo artigo, inconstitucionalidade invocada no recurso que o 
 extraditando interpôs ad cautelam),
 
  
 
             - ou porque presumiu que nenhuma dessas penas seria aplicada 
 
 (hipótese contida na alínea c) do nº 2 do mesmo artigo, neste caso norma cuja 
 inconstitucionalidade vinha sendo invocada ao longo do processo).
 
  
 
             Indiscutível, porém, e decisivo para a interposição do presente 
 recurso é o facto de que o Supremo Tribunal de Justiça considerou como ratio 
 decidendi a alínea e) do nº 1 do já citado artigo 6º.
 
  
 
             Ora, ao invocar a alínea e) do nº 1, o Supremo Tribunal de Justiça 
 fez a aplicação de uma norma inesperada [...].
 
  
 
             Estamos perante um caso excepcional em que a questão prévia da 
 inconstitucionalidade da norma no tribunal recorrido não foi suscitada porque 
 não houve oportunidade processual para levantar a questão até essa altura, já 
 que não era de antever a aplicação da alínea e) do nº 1 do artigo 6º a este caso 
 concreto, de forma a impor ao ora recorrente o ónus de ter de suscitar a questão 
 antes da decisão.
 
  
 
  
 
             A isto, opõe o Ministério Público o seguinte:
 
  
 
             a) Não é exacto que este [recorrente] não tenha tido oportunidade 
 processual de suscitar, durante o processo, a questão da inconstitucionalidade 
 de todas as normas do Decreto-Lei nº 43/91 que considerasse, por qualquer razão, 
 
 'inconstitucionais' e que de algum modo tivessem vocação para ser aplicáveis ou 
 aplicadas ao caso dos autos - como sucede com o artigo 6º, nº 1, alínea e) de 
 tal diploma. Não se diga, na verdade, que a aplicabilidade de tal norma - que 
 prescreve em que circunstâncias deve ser recusado o pedido de cooperação 
 internacional em matéria penal - não era, desde o início, 'previsível' numa 
 hipótese com a configuração do caso dos autos !
 
             
 
 [...]
 
  
 
             b) Acresce, ainda, na nossa perspectiva, uma outra razão que, só por 
 si, sempre condenaria o presente recurso. 
 
  
 
             Na verdade, temos como seguramente inconcebível que se possa 
 controverter a 'constitucionalidade' de uma norma proibitiva da extradição, como 
 
 é a indicada pelo recorrente, como objecto do recurso !  Como sustentar, na 
 verdade, que é 'inconstitucional' a norma que determina a recusa do acto de 
 cooperação judiciária em que se traduz a extradição quando o facto a que 
 respeita for punível com pena de morte ou de prisão perpétua ? É evidente que, 
 na óptica do extraditando, as 'inconstitucionalidades' que alega só poderiam 
 radicar em normas limitativas desta proibição de extraditar - e nunca a própria 
 afirmação ou proclamação da regra da proibição de extradição naqueles dois 
 casos.
 
  
 
             E não se diga que tal possibilidade teria sido precludida pela 
 circunstância de o Supremo Tribunal de Justiça ter 'declarado', na decisão 
 recorrida, que não aplicou tais normas 'permissivas' da extradição: como 
 recentemente se decidiu neste Tribunal, em reclamações enxertadas em processos 
 de extradição vindos de Macau, o que verdadeiramente releva é a substância  do 
 caso 'sub juditio' e não a simples 'afirmação do tribunal recorrido sobre quais 
 as normas que considera 'aplicáveis'.
 
  
 
 [...]
 
  
 
  
 
             Não realizou, deste modo, o Supremo Tribunal de Justiça qualquer 
 interpretação 'inesperada', 'imprevisível' e violadora de princípios ou 
 preceitos constitucionais das normas jurídicas que - desde o início do processo 
 
 - era evidente que estavam co-envolvidas na apreciação da hipótese 'sub juditio' 
 
 - limitando-se a  tomar posição e a valorar em certo sentido as circunstâncias 
 concretas do caso, a própria materialidade da situação de facto que condicionava 
 a subsunção e o enquadramento e decisão jurídica do pleito».
 
  
 
  
 
             5. Nas alegações do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o 
 extraditando alegou a inconstitucionalidade do artigo 6º, nº 2, alínea c), do 
 Decreto-Lei nº 43/91, «com o sentido e interpretação»  com que o acórdão do 
 Tribunal de Relação de Lisboa o aplicou (artigo 22º das conclusões, a fls. 428). 
 
 
 
  
 
             No entanto, o S.T.J. não se pronunciou expressamente sobre esta 
 matéria no acórdão que confirmou a decisão do T.R.L. Antes examinou a  questão 
 
 «do requisito negativo da cooperação estatuído no artigo 6º nº 1 e) do Dec.-Lei 
 nº 43/91» e concluíu o seguinte:
 
  
 
  
 
  
 
             No caso A ... nem sequer se põe a questão de saber se o Estado 
 requerente demonstrou que não vai ser aplicada qualquer daquelas sanções 
 criminais [pena de morte ou prisão perpétua]. Isso só seria necessário se a 
 infracção por que o recorrente vai ser julgado fosse punível com alguma dessas 
 sanções.
 
             
 
             Ora, segundo a incriminação feita pelo juiz do processo (...), a 
 infracção imputada ao arguido é punível com prisão cujo máximo é de 20 anos ou 
 multa de 1.000.000 de dólares, ou ambas. 
 
  
 
             Nenhuma destas penas está incluída nos requisitos gerais  negativos 
 do artigo 6º do Dec.-Lei nº 43/91, de 22/12, designadamente nas alíneas e) e f) 
 do seu nº 1.
 
  
 
             Consequentemente não se verifica qualquer obstáculo à concessão da 
 referida extradição.
 
  
 
             
 
             Notificado deste acórdão, o extraditando arguiu, entre outras 
 invalidades, a omissão de pronúncia relativamente à questão de 
 inconstitucionalidade que havia suscitado inicialmente (a do nº 2, alínea c), 
 deste artigo). Mas foi desatendido, pois o Supremo fez notar que havia decidido, 
 
 «com base no preceituado nas alíneas e) e f) do nº 1 do art. 6º do citado 
 Dec.-Lei nº 43/91, que não se verificava qualquer obstáculo à concessão da 
 extradição, afastando-se assim a aplicação da alínea c) do nº 2 do mesmo artigo 
 
 6º que fundamentou a decisão do Tribunal da Relação» (Acórdão de 6 de Outubro de 
 
 1994).  
 
  
 
             Face a este esclarecimento, o extraditando recorreu para o Tribunal 
 Constitucional, invocando agora a inconstitucionalidade da norma do citado 
 artigo 6º, nº 1, alínea e). Inconstitucionalidade que antes nunca havia 
 expressamente invocado. 
 
  
 
             Todavia, e analisando a questão mais de perto, não pode deixar de se 
 concluir que, embora formalmente o Supremo Tribunal de Justiça tivesse tido em 
 consideração uma norma diversa da que o Tribunal de Relação aplicou, a questão 
 de constitucionalidade é substancialmente a mesma. Ou melhor, estamos aqui 
 perante dois aspectos incidíveis de uma mesma questão de constitucionalidade, 
 não podendo, no contexto da decisão do Supremo, desligar-se nela o teor do 
 artigo 6º, nº 1, alínea e), e o teor do nº 2, alínea c), face à interpretação 
 que tal decisão lhes deu. 
 
  
 
             Vejamos porquê.
 
  
 
  
 
             6. Desde logo, é preciso notar que o S.T.J., ao decidir o recurso, 
 teve em consideração factos diferentes dos que foram considerados pelo Tribunal 
 de Relação.
 
  
 
             Na verdade, o T.R.L., ao considerar a questão tinha em vista saber 
 se era aplicável ao recorrente a disposição do artigo 6º, nº 2, alínea c), do 
 Decreto-Lei nº 43/91; entendeu que «apesar de, no caso 'sub judice', o limite 
 máximo da pena ser de prisão perpétua, a extradição ainda assim é de conceder se 
 houver elementos donde se possa deduzir presumivelmente a sua não aplicação». 
 
  
 
             E, segundo o T.R.L., esses elementos existiam: embora o crime fosse 
 punível com prisão perpétua, era de presumir que ela não iria ser aplicada, pois 
 o Departamento de Estado dos E.U.A. informava que «a pena normal» para aquele 
 tipo de crimes era de cinco a dez anos de prisão, e que «até ao presente, 
 ninguém foi condenado à pena de prisão perpétua por este tipo de crime» 
 
 (documento de fls. 65), e o procurador dos Estados Unidos encarregado do 
 processo afirmara que «o governo não pedirá uma pena de prisão perpétua no caso 
 do A ...» (documento de fls. 68).
 
  
 
             Por isso, concluía o T.R.L., «nos termos da alínea c), do art. 6º, 
 nº 2, citado, não obsta à extradição o facto de o limite máximo da moldura penal 
 abstracta, no caso dos autos, ser de prisão perpétua, precisamente porque há 
 elementos nos autos que apontam para a 'presumível não aplicação' dessa medida».
 
  
 
             Este acórdão foi proferido em 10 de Maio e houve recurso para o 
 S.T.J. Aí, porém, já depois da fase das alegações, o Ministério Público juntou 
 ao processo novos documentos provenientes das autoridades dos Estados Unidos. 
 Segundo estes documentos, o juiz encarregado do processo naquele país havia 
 proferido em 27 de Abril a seguinte decisão (fls. 479):
 
  
 
             1. Após a extradição, o réu A ... será julgado pelos crimes de que é 
 acusado no processo número CR 87-146(S-3) por fazer parte de um conluio para 
 importar, distribuir e estar de posse com a intenção de distribuir grandes 
 quantidades de cocaína, constituindo uma violação aos Títulos 18, Código dos 
 Estados Unidos, Secções 841(a)(1) e 846; e,
 
  
 
             2. Se for condenado, a sentença a ser imposta será a prevista no 
 Título 18, Código dosa Estados Unidos, Secção 841(b)(1)(C), o qual dispõe que a 
 pena máxima a aplicar é de 20 anos, uma nulta de 1,000,000 de dólares, ou 
 ambas».
 
             
 Esclarecia ainda o mesmo documento:
 
  
 
             A lei dos Estados Unidos permite estabelecer acordos antes de 
 pronunciada a sentença. O Artigo 11(e) da Lei Federal dos Processos Criminais 
 diz, em parte, o seguinte:
 
     
 
             (1) Em geral. O Procurador e o advogado representando o réu ... 
 podem encetar conversações com vista à satisfação de um acordo, depois de 
 acordada pelo réu a admissão de culpa (plea of guilty) ou 'nolo contendere' em 
 relação a uma determinada violação da lei ...
 
  
 
             O Supremo Tribunal dos Estados Unidos da América acordou, há mais de 
 
 20 anos, que uma vez que o Governo faça uma promessa ao réu sobre a pena a 
 imputar, o réu pode recorrer se o Governo não mantiver a promessa. Santobello v. 
 New York, 92 S.Ct. 495, 404 U.S. 257, 30 L.Ed. 2d 427 (1971). Em suma, o Governo 
 compromete-se  perante o réu. Esta é uma lei bem definida. Aplica-se em qualquer 
 processo criminal nos Estados Unidos.
 
  
 
  
 
             Estes documentos já tinham sido apresentados no T.R.L. e o tribunal 
 ordenara que fossem desentranhados; mas foram novamente apresentados no S.T.J., 
 que os  admitiu e que os teve  em conta na decisão do recurso, muito embora não 
 tenha notificado o extraditando da sua junção aos autos, pelo que ele, antes 
 daquela decisão, não se pôde pronunciar sobre tais documentos e suas implicações 
 
 .
 
  
 
             Foi em face deste novo elemento que o Supremo Tribunal avaliou a 
 situação à luz da disposição  do artigo 6º, nº 1, alínea e). E que concluiu que 
 agora o crime já não se podia considerar como sendo punível com prisão perpétua, 
 pelo que ficava prejudicada a aplicação da disposição do nº 2, alínea c), do 
 mesmo artigo.
 
  
 
             Mas só pôde concluir assim porque interpretou implicitamente aquele 
 nº 1, alínea e), no sentido de que  os factos e a correspondente moldura penal 
 abstracta a ter aí em conta para decidir a extradição não são os referidos 
 inicialmente no processo em que tal extradição é pedida, mas sim os factos e a 
 moldura penal abstracta pelos quais, por decisão do juiz, o arguido virá a ser 
 efectivamente submetido a julgamento nesse processo. 
 
  
 
             Portanto, e sem que o extraditando sobre tais matérias (a de facto e 
 a de direito, mas só desta última cabe aqui curar) tivesse podido pronunciar-se 
 previamente, o S.T.J. considerou um aspecto novo  -  do qual terá resultado 
 prejudicada a aplicação do nº 2, alínea c), para se resolver a questão face ao 
 nº 1, alínea e). 
 
  
 
             Ora, este Tribunal vem entendendo pacificamente que é de admitir o 
 recurso naquelas situações excepcionais em que o interessado, como aconteceu no 
 caso dos autos, «não disponha da oportunidade processual para levantar a questão 
 antes de proferida a decisão» (cfr. Acórdãos nº 90/95 e nº 136/95, in Acórdãos 
 do Tribunal Constitucional, 5º vol., págs. 663 e segs., e 6º vol., págs. 615 e 
 segs., respectivamente).
 
  
 
             Assim sendo, e porque o ora recorrente não teve conhecimento da 
 situação de facto - vertida nos documentos de cuja junção não foi notificado  - 
 que terá estado na origem da aplicação da norma do artigo 6º, nº 1, alínea e), 
 há-de se entender que não teve oportunidade de suscitar, no momento normalmente 
 adequado, a inconstitucionalidade desta norma, e, consequentemente, que se deve 
 tomar conhecimento do recurso.
 
  
 
  
 
             7. Aliás, ainda que se visse a questão numa outra perspectiva, a 
 conclusão haveria de ser idêntica.
 
  
 
  
 
             Na verdade, sempre se poderia sustentar que a questão que o 
 recorrente suscitou desde o início foi sempre a da inconstitucionalidade da 
 norma que, proibindo a extradição no caso de os factos que fundamentam tal 
 extradição serem puníveis com prisão perpétua segundo a moldura penal abstracta 
 que, de acordo com a lei, é aplicável à partida no processo, a permite, no 
 entanto, quando, apesar disso, for previsível (ou certa) a sua não aplicação no 
 caso concreto. Ora, esta questão não muda se a não aplicação da prisão perpétua 
 resulta precisamente de uma decisão judicial que optou por se auto-limitar a uma 
 moldura penal abstracta inferior à que poderia ser legalmente aplicável.
 
  
 
             Assim, o S.T.J., afastando formalmente a aplicação do nº 2, alínea 
 c), deste artigo 6º, não teria deixado, no entanto, de aplicar, numa visão 
 substancial das coisas, norma com sentido idêntico ou semelhante à, desde 
 sempre, impugnada pelo extraditando.
 
  
 
             Aliás, se, por mera hipótese, a norma do nº 1, alínea e), na parte 
 em que serviu de ratio decidendi ao Supremo Tribunal, fosse inconstitucional, a 
 questão teria de ser reexaminada à luz do nº 2, alínea c), caso se não 
 entendesse mesmo que, então, esta norma teria necessariamente de ser tida também 
 por inconstitucional, por maioria de razão - o que inculcaria não estarmos aqui 
 perante duas questões diferentes de constitucionalidade, mas sim 
 substancialmente perante uma mesma questão, incindível.
 
  
 
             Razão por que, no contexto da decisão proferida, a invocação da 
 inconstitucionalidade do nº 1, alínea e), só formalmente se poderia distinguir 
 da invocação da inconstitucionalidade do nº 2, alínea c). A norma a que o 
 recorrente se refere sempre seria, substancialmente, a mesma.
 
  
 
             De todo o modo, há-de reconhecer-se que seria manifestamente 
 excessivo considerar que fosse exigível ao recorrente suscitar a questão de 
 forma a radicar a norma inconstitucional no preceito do nº 2, alínea c), quando 
 fora o próprio Supremo a induzir que a norma a ter em conta se situava no 
 preceito do nº 1, alínea e).
 
             
 
             Assim sendo, entende-se que não há motivo para que se não tome 
 conhecimento do recurso oportunamente interposto para este Tribunal.    
 
  
 
  
 
             III - DECISÃO
 
  
 
             8. Nestes termos, e face ao exposto, determina-se o prosseguimento 
 do recurso.        
 
  
 
  
 Lisboa, 16 de Fevereiro de 1995
 Luis Nunes de Almeida
 Guilherme da Fonseca
 Bravo Serra
 Fernando Alves Correia
 Messias Bento
 José de Sousa e Brito
 José Manuel Cardoso da Costa