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Processo nº 44/91
 Plenário
 Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
 
  
 Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 
  
 
                    1. O Provedor de Justiça, 'no uso da faculdade que lhe é 
 atribuída pela alínea d) do nº 2 do artigo 281º da Constituição, nos termos do 
 nº 1 do artigo 51º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro', veio requerer a este 
 Tribunal Constitucional a apreciação e declaração da inconstitucionalidade, com 
 força obrigatória geral, das normas que identifica 'do Decreto-Lei nº 151/90, de 
 
 15 de Maio, da Portaria nº 481/90, de 28 de Junho, da Portaria nº 580/90, de 21 
 de Julho, e do Decreto-Lei nº 282-B/84, de 20 de Agosto'.
 
  
 
                    E essas normas - conforme leitura que se faz do requerimento 
 inicial e seguindo-o na sua explanação - são:
 
  
 
 - as dos artigos 2º, nº 1,  4º, 6º, nº 4, 40º, nº 1, alínea a), 7º 12º, nº 1, 
 
 32º, nºs 2 e 3, 22º (conjugado com os artigos 24º e 26º), 29º, nº 2, 28º, 34º, 
 nºs 1 e 2, 35º, nº 2, 36º, 37º, 38º e 39º, todos do Decreto-Lei nº 151/90, de 15 
 de Maio.
 
  
 
 - as dos nºs 1º, 8º, 13º e 15º da Portaria nº 481/90, de 28 de Junho.
 
  
 
 - as da Portaria nº 580/90, de 21 de Julho.
 
  
 
                    O pedido do requerente envolve ainda as normas dos artigos 
 
 1º, nº 3, 2º, 6º, e 11º, nºs 1 e 2, pelo menos estas, do Decreto-Lei nº 
 
 282-B/84, de 20 de Agosto, diploma que havia sido revogado expressamente pelo 
 Decreto-Lei nº 151/90 (artigo 51º), e também as normas dos artigos 2º e 7º, nº 
 
 1, do Decreto--Lei nº 46/83, de 27 de Janeiro, revogado expressamente pelo 
 artigo 23º daquele Decreto-Lei nº 282-B/84 (e foi a convite do Presidente do 
 Tribunal que o requerente esclareceu que 'o pedido de declaração de 
 inconstitucionalidade abrange as normas do artº 2º e do nº 1 do artigo 7º do 
 Decreto-Lei nº 46/83, de 27 de Janeiro'), sempre na óptica de que elas não podem 
 nunca 'ser repristinadas'.
 
  
 
                    São estas as conclusões do requerimento inicial:
 
  
 
 '(1) O artº 4º do Decreto-Lei nº 151/90, vedando a outros agentes económicos, 
 que não os operadores portuários, tal como são configurados nesse diploma, o 
 exercício das actividades compendiadas no nº 1 do artº 1º do mesmo Decreto- 
 
 -Lei nº 151/90, colide com o princípio da igualdade, constitucionalmente 
 consagrado (artº 13).
 
  
 
  (2) Essa proibição ofende ainda os princípios da equilibrada concorrência entre 
 as empresas (artº 81º, alínea f), e da eficiência (arts. 9º, alínea d), in fine, 
 e 81º, alíneas c) e d), da Constituição).
 
  
 
  (3) E colide com a directriz inscrita na alínea e) do mesmo artigo 81º, que 
 tem como uma das incumbências prioritárias do Estado a de eliminar e impedir a 
 formação de monopólios privados.
 
  
 
  (4) Ao impedir a actividade económica consistente na realização de operações 
 portuárias às cooperativas, o artigo 2º, nº 1 do Decreto-Lei nº 151/90 é 
 inconstitucional - materialmente, por não poder haver sectores económicos 
 vedados à iniciativa cooperativa (artº 87º, nº 3, e alínea e), do artº 80º da 
 Constituição), e organicamente, uma vez que a delimitação de sectores compete 
 
 à Assembleia da República (artº 168º, nº 1, alínea j), da Constituição) e que o 
 Decreto-Lei nº 151/90 foi editado sem prévia autorização legislativa.
 
  
 
  (5) Este nº 1 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 151/90, ao proibir o exercício de 
 outras actividades pelos operadores portuários, transgride o conteúdo essencial 
 da liberdade de iniciativa económica (artº 61º da Constituição).
 
  
 
  (6) É questionável que a atribuição de competência de decisão sobre os pedidos 
 de licenciamento às autoridades portuárias locais, e não às nacionais (arts. 
 
 6º, nº 4, e 40º, nº 1, do Decreto-Lei 151/90), não afronte o princípio da 
 igualdade.
 
  
 
  (7) Mas o que é indubitável é que ao remeter-se para portaria ministerial os 
 requisitos do licenciamento para o exercício da actividade de operador portuário 
 
 (artº 7º do Decreto-Lei nº 151/90) inobserva-se a regra de reserva de lei sobre 
 iniciativa económica (artº 61º da Constituição) e a proibição de a lei conferir 
 a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar e 
 integrar qualquer dos seus preceitos (artº 115º, nº 5, 2ª parte, da 
 Constituição).
 
  
 
  (8) Atribuindo aos operadores portuários a direcção técnica de quaisquer 
 operações, independentemente de quem seja o proprietário dos equipamentos, 
 instalações e espaços utilizados (arts. 12º, nº 1, e 32º, nº 3), ofende o 
 De-creto-Lei nº 151/90 o artº 61º, nº 1, da Constituição noutro segmento, já que 
 subtrai, designadamente aos titulares, por concessão ou licença, de terminais 
 especializados, a livre utilização de factores de produção que são seus e a 
 condução efectiva de actividades em que são plenamente interessados.
 
  
 
  (9) Entretanto, e em contra-pólo, os operadores portuários são privados (nº 2 
 do artº 32º do Decreto-Lei nº 151/90) dos poderes que, segundo a lei geral do 
 trabalho, pertencem à entidade empregadora relativamente aos trabalhadores; 
 esta excepção ou distorção transgride, se não o artº 61º, nº 1, por certo o artº 
 
 87º da Constituição, pois que equivale a uma constitucionalmente não admissível 
 intervenção na gestão de empresas privadas.
 
  
 
  (10) O artº 22º do mesmo Decreto-Lei, conjugado com os arts. 24º e 26º, é 
 inconstitucional - por violação dos arts. 47º, nº 1, e 115º, nº 5, da 
 Constituição.
 
  
 
  (11) O artº 29º, ao impor que os instrumentos de regulamentação colectiva de 
 trabalho aplicáveis aos trabalhadores portuários serão outorgados entre as 
 suas associações sindicais e os operadores portuários ou suas associações, é 
 inconstitucional, por afectador do princípio da igualdade, uma vez que ficam 
 afastadas da contratação colectiva empresas que desenvolvem operações 
 relacionadas com as operações portuárias ou operações exceptuadas pelo próprio 
 artº 5º do Decreto-Lei nº 151/90.
 
  
 
  (12) O artº 28º, que versa sobre a suspensão, revogação da inscrição e reforma 
 compulsiva de trabalhadores portuários, é organicamente inconstitucional, por 
 incidir sobre direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores (artº 168º, nº 
 
 1, alínea b)).
 
  
 
  (13) Se os organismos de gestão de mão de obra portuária (OGMOP) fossem 
 efectivamente pessoas colectivas de direito privado, tal como os define o nº 2 
 do artº 34º do Decreto-Lei, as normas que os regem - impondo a sua existência 
 obrigatória, pertença de todas as associações sindicais de trabalhadores e de 
 todos os operadores portuários ou das suas associações e a unicidade - seriam 
 materialmente inconstitucionais, por violarem a regra da liberdade de 
 associação, positiva e negativa (artº 46º da Constituição).
 
  
 
  (14) Mas os OGMOP poderão ser caracterizados como pessoas colectivas de direito 
 público e, provavelmente, como associações públicas, tendo em vista as funções 
 genéricas e específicas que lhe são cometidas (arts. 34º e 37º do Decreto-Lei), 
 as regras sobre estatuto, organização interna, fiscalização e federação (arts. 
 
 35º, 36º e 39º) e os poderes de que dispõem, quer em relação aos trabalhadores 
 
 (artº 32º, nº 2), quer em relação aos operadores portuários (artº 35º, nº 6).
 
  
 
  (15) E então por-se-á a interrogativa sobre se esse novo tipo de associações 
 públicas - de associações públicas económicas - corresponde a uma 'necessidade 
 específica', na acepção do nº 3 do artº 267º da Constituição, pois, se não 
 ocorre, ocorrerá de igual modo (embora noutro plano) uma inconstitucionalidade 
 material.
 
  
 
  (16) Mas sejam os OGMOP associações como quaisquer outras associações, ou 
 associações públicas, sempre as normas do Decreto-Lei a eles referentes são 
 frontalmente inconstitucionais - inconstitucionalidade orgânica, por 
 preterição do artº 168º, nº 1, alíneas b) e u).
 
  
 
  (17) É material e formalmente inconstitucional, face ao artº 115º, nº 5, 2ª 
 parte, a norma do artº 35º, nº 2, do Decreto-Lei nº 151/90, ao delegar em 
 portaria ministerial os regimes de organização, competência e financeiro a que 
 se deverão conformar os OGMOP, declarados de utilidade pública administrativa.
 
  
 
  (18) Por decorrência do exposto, e por violação das aduzidas regras 
 constitucionais, é inconstitucional a Portaria 580/90, de 21 de Julho, e as 
 especificadas normas da Portaria nº 481/90, de 28 de Junho.
 
  
 
  (19) Quanto ao Decreto-Lei nº 282-B/84, de 20 de Agosto, são inconstitucionais, 
 pelas invocadas razões, pelo menos os seus nº 3 do artº 1º, artº 2º, artº 6º e 
 nºs 1 e 2 do artº 11º, por conterem preceitos homólogos dos que vieram, com 
 simples alterações de forma, a ser acolhidos no Decreto-Lei nº 151/90.
 
  
 
  (20) Não podem, pois, essas normas ser repristinadas.
 
  
 
  (21) Oportuno explicitar, numa jurisprudêcia das cautelas, que o artº 2º e nº 1 
 do artº 7º do Decreto-Lei nº 46/83, de 27 de Janeiro, revogado pelo artº 23º do 
 Decreto-Lei nº 282-B/  /84, são, por paridade de motivos, inconstitucionais.'
 
  
 
                    Com o requerimento inicial e com a resposta ao convite do 
 Presidente do Tribunal, juntou o requerente dois pareceres, dos Profs. Jorge 
 Miranda e José Joaquim Gomes Canotilho.
 
  
 
                    2. Aos presentes autos e atento o disposto no artigo 64º da 
 Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, foi mandado incorporar, por despacho do 
 Presidente do Tribunal, o Processo nº 45/91, em que o mesmo Provedor de Justiça  
 veio requerer 'a apreciação e declaração da inconstitucionalidade e ilegalidade, 
 com força obrigatória geral, do Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M, de 21 
 de Dezembro, que adapta à Região Autónoma da Madeira o regime jurídico da 
 operação portuária (Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio)', na base de que ele 
 patenteia 'específicos vícios de inconstitucionalidade' assim caracterizados:
 
  
 
 '12
 
  
 Assim, e desde logo, tendo a forma de decreto regulamentar regional, contém, 
 todo ele, normas substancialmente legislativas - em inobservância dos nºs 1 e 3 
 do artº 115º da Constituição.
 
  
 
 13
 
  
 Aliás, o Decreto-Lei nº 151/90 é uma lei geral da República e não se vê que 
 interesse específico poderá justificar um diploma regional.
 
  
 
 14
 
  
 Daí, mesmo que se estivesse face a um acto sob forma legislativa - o que não 
 aconteceu - o Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M sempre será organicamente 
 inconstitucional, por violação do artº 229º, nº 1, alínea a), da Constituição.
 
  
 
 15
 
  
 O artº 2º do Decreto Regulamentar cria um organismo de gestão de mão de obra 
 portuária, por acordo entre o Governo Regional, as associações sindicais 
 representativas dos trabalhadores portuários e os operadores portuários ou suas 
 associações.
 
  
 
 16
 
  
 Essa norma sempre seria ilegal, por contraditória com o artº 34º, nº 1, do 
 Decreto-Lei nº 151/90.
 
  
 
  
 
 17
 
  
 Aliás, e não obstante nesse OGMOP ser parte o Governo Regional (artº 2º), ele é 
 considerado como pessoa colectiva de direito privado (artº 11º, nº 1).
 
  
 
 18
 
  
 De qualquer modo, a regulamentação de uma lei geral da República sempre caberá à 
 Assembleia Legislativa Regional, e não ao Governo Regional (arts. 229º, nº 1, 
 alínea d), e 234º, nº 1).
 
  
 
 19
 
  
 Daqui, ainda, a inconstitucionalidade orgânica do Decreto Regulamentar Regional 
 nº 23/90/M.'
 
  
 
  
 
                    3. Responderam aos pedidos, em cumprimento do artigo 54º da 
 Lei nº 28/82, o Primeiro-Ministro, sustentando em longo articulado 'a plena 
 conformidade constitucional das normas questionadas' (as normas a que se refere 
 o pedido dos presentes autos), e o Presidente do Governo Regional da Madeira, 
 concluindo no seu articulado que 'quanto ao Decreto Regulamentar Regional não 
 terá violado a Constituição' (o diploma visado no processo incorporado).
 
  
 
                    Aos autos foi ainda junta uma exposição da Federação 
 Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores Portuários, subscrita pelo presidente 
 da respectiva direcção, na qual se formulam, após largo desenvolvimento da 
 matéria, estas conclusões:
 
  
 
 '1. Com excepção do que se refere à exclusão das cooperativas do âmbito da 
 actividade do operador portuário, e da própria exclusão de trabalhadores 
 portuários das operações referidas no nº 1 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 
 
 151//90, onde, de facto, parece de julgar inconstitucional essa exclusão, não 
 se afigura que as alegadas inconstitucionalidades devam ser reconhecidas e 
 declaradas pelo Tribunal Constitucional nos termos e para os efeitos requeridos 
 pelo Senhor Provedor de Justiça.
 
  
 
  2. A legislação e regulamentação em referência não ofendem os princípios e 
 regras constitucionais sobre a liberdade de iniciativa económica.
 
  
 
  3. Não são, igualmente, violados os preceitos constitucionais condicionadores 
 de regimes que contendam com direitos, liberdades e garantias 
 constitucionalmente consagradas.
 
  
 
  4. Não é também sacrificado o princípio da igualdade pelos diplomas e preceitos 
 sobre que se suscitam as questões de inconstitucionalidade.
 
  
 
  5. Do mesmo modo não se encontra inconstitucionalmente afectado ou 
 comprometido o princípio da equilibrada concorrência entre as empresas.
 
  
 
  6. Os valores e princípios atinentes à liberdade de empresas, à eficiência e 
 ao aproveitamento dos recursos disponíveis também não são prejudicados pelo 
 regime de direcção técnica da operação portuária e por quaisquer outros 
 normativos da legislação e regulamentação postas em crise pela requerida 
 declaração de inconstitucionalidade.
 
  
 
  7. Não se vislumbram, igualmente, inconstitucionalidades orgânicas, materiais 
 e formais no regime instituído para os OGMOP - Organismos de Gestão e 
 Mão-de-Obra Portuária, cuja constituição não é obrigatória, que são associações 
 de direito privado e cujo regime de exclusividade constitui um postulado 
 requerido pelas características e particularidades do sector.
 
  
 
  8. Tais organismos asseguram, em regime de devolução e/ou delegação de poderes, 
 atribuições que exprimem uma gestão indirecta de matéria de interesse público.
 
  
 
  9. O regime de licenciamento dos operadores portuários e dos requisitos e 
 termos em que se exerce a sua actividade não cerceiam a liberdade de empresa em 
 matéria de acesso à operação portuária, condicionando tão só o regime do 
 referido licenciamento, sem, no entanto, estabelecer qualquer 'numerus 
 clausus'.
 
  
 
 10. A exclusividade do exercício da operação portuária responde a objectivos de 
 interesse público.
 
  
 
  11. O estatuto de trabalho dos trabalhadores portuários revela-se conforme com 
 a Constituição, não introduzindo limitações ou restrições ao livre acesso à 
 profissão, impondo apenas limites de contingentação requeridos pela natureza da 
 actividade portuária.
 
  
 
  12. Os diplomas regulamentares do regime jurídico da operação portuária, 
 nomeadamente o referente à Região Autónoma da Madeira, mostram-se orgânica e 
 formalmente conformes com a Constituição.'
 
  
 
                    4. Cumpre agora decidir.
 
  
 
                    4.1. O Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio, que constitui o 
 eixo da controvérsia constitucional exibida pelo requerente foi emitido pelo 
 Governo nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 201º da Constituição, 
 doravante CRP, e estabelece o regime jurídico da operação portuária.
 
  
 
                    O diploma está dividido em 7 capítulos, subordinados às 
 seguintes epígrafes: capítulo I - da operação em geral (artigos 1º a 3º); 
 capítulo II - do operador portuário (artigos 4º a 21º); capítulo III - do 
 trabalhador portuário (artigos 22º a 33º); capítulo IV - organismos de gestão 
 da mão-de-obra portuária (artigos 34º a 39º); capítulo V - das administrações 
 e juntas autónomas dos portos (artigos 40º e 41º); capítulo VI - sanções 
 
 (artigos 42º a 44º); capítulo VII - disposições finais e transitórias (artigos 
 
 45º a 53º). O capítulo II compreende 6 secções: secção I - exclusivo (artigos 
 
 4º e 5º); secção II - licenciamento (artigos 6º a 8º); secção III - 
 responsabilidade (artigos 9º a 11º); secção IV - direitos (artigos 12º a 15º); 
 secção V - dever de cooperação (artigos 16º e 17º); secção VI - preços (artigos 
 
 18º a 21º). O capítulo III é constituído por 3 secções: secção I - exclusivo 
 
 (artigos 22º e 23º); secção II - inscrição (artigos 24º a 28º); secção III - 
 regime jurídico-laboral (artigos 29º a 33º).
 
  
 
                    O conteúdo do mesmo diploma pode resumir-se do seguinte modo:
 
  
 
                    No artigo 1º definem-se operações portuárias:
 
  
 
 'todas as que requeiram as mercadorias desembarcadas ou para embarque 
 directamente destinadas ou provenientes de transporte marítimo relativas à 
 estiva, desestiva, conferência, carga, descarga, transbordo, movimentação e 
 arrumação em cais, terraplanos ou armazéns, formação e decomposição de 
 unidades de carga, recepção, armazenagem e entrega, bem como as operações 
 complementares, designadamente as de superintendência de cargas, dentro da zona 
 portuária'.
 
  
 
                    No artigo 2º caracterizam-se como operadores portuários as 
 
 'sociedades exclusivamente licenciadas para o exercício das operações 
 portuárias referidas no artigo anterior' (nº 1) e como trabalhadores portuários 
 os 'titulares de título de qualificação profissional, devidamente inscritas nos 
 termos da lei' (nº2). 
 
  
 
                    No artigo 4º estabelece-se o princípio de que 'as operações 
 portuárias só podem ser executadas por operadores portuários'. Mas no artigo 5º 
 indicam-se as operações que 'estão isentas da obrigatoriedade de intervenção de 
 operadores portuários'.
 
  
 
                    O artigo 6º faz depender o exercício da actividade de 
 operador portuário de 'licenciamento nas condições do presente diploma e 
 respectivos regulamentos'. No artigo 7º remete--se para portaria a indicação dos 
 requisitos de que depende o licenciamento e exercício da actividade de operador 
 portuário. E o artigo 8º regula a caducidade da licença.
 
  
 
                    Os artigos 9º, 10º e 11º dispõem sobre a responsabilidade 
 do operador portuário: pelos  danos que causar na realização de qualquer 
 operação portuária a seu cargo e pelos danos provocados nas mercadorias que lhe 
 tenham sido confiadas ou que se encontrem à sua guarda (artigo 9º); pelos danos 
 causados às infra-estruturas, instalações e equipamentos portuários (artigo 
 
 10º).; e pelas mercadorias armazenadas ou estacionadas no interior da área 
 portuária e sujeitas a regime alfandegário (artigo 11º).
 
  
 
                    Os artigos 12º a 15º estabelecem os direitos do operador 
 portuário no que respeita à direcção técnica das operações e do pessoal nelas 
 utilizado (artigo 12º) e à utilização de instalações (artigo 13º), de 
 equipamentos (artigo 14º) e dos trabalhadores portuários (artigo 15º).
 
  
 
                    Os artigos 16º e 17º impõem ao operador portuário o dever de 
 colaboração com a autoridade portuária.
 
  
 
                    Os artigos 18º a 21º regulam as seguintes matérias: preços 
 indicativos (artigo 18º), indicadores de gestão da actividade portuária (artigo 
 
 19º), escrituração (artigo 20º) e publicidade (artigo 21º).
 
  
 
                    Os artigos 22º a 33º ocupam-se do trabalhador portuário. No 
 artigo 22º estabelece-se o princípio de que 'as operações portuárias só podem 
 ser exercidas por trabalhadores portuários devidamente admitidos e inscritos e 
 titulares de título de qualificação profissional' No artigo 23º exceptuam-se 
 desse princípio as operações indicadas no artigo 5º. No artigo 24º remete-se 
 para normas regulamentares a admissão dos trabalhadores portuários pelos 
 organismos previstos no capítulo IV. No artigo 25º regula-se a inscrição desses 
 trabalhadores no Registo Oficial Nacional dos Trabalhadores Portuários 
 Inscritos (RONTPI). No artigo 26º remetem-se para portaria os termos em que 
 será visado o título de qualificação profissional dos mesmos trabalhadores. O 
 artigo 27º prevê a caducidade da inscrição pela morte e pela reforma. O artigo 
 
 28º regula a suspensão e a revogação da inscrição e a reforma compulsiva. O 
 artigo 29º torna aplicável, como regime supletivo, o regime jurídico do contrato 
 individual de trabalho. O artigo 30º regula a organização do trabalho. E o 
 artigo 31º diz o que constitui o contingente de cada porto - 'o conjunto dos 
 trabalhadores do contingente comum e os trabalhadores dos quadros privativos 
 das empresas' -, ocupando-se o artigo 32º do contingente comum e o artigo 33º 
 dos quadros privativos.
 
  
 
                    Os artigos 34º a 39º tratam dos organismos de gestão da 
 mão-de-obra portuária (OGMOP), isto é, os organismos criados por acordo entre as 
 associações sindicais representativas dos trabalhadores portuários e os 
 operadores portuários ou suas associações, tendo por objecto, nos termos do nº 1 
 do artigo 34º, 'o registo dos operadores portuários, bem como a admissão, a 
 inscrição e a identificação do contingente do respectivo porto, a distribuição 
 e o pagamento aos trabalhadores do contingente comum', e, de acordo com o nº 2, 
 a natureza de 'pessoas colectivas de carácter associativo de direito privado, 
 sem fins lucrativos', e que, segundo o nº 3 do mesmo artigo, podem ser 
 declarados 'de utilidade pública administrativa'. O artigo 35º trata dos 
 respectivos estatutos e, no seu nº 2, remete para portaria a fixação dos 
 
 'regimes de organização, competência e financeiro a que se deverão conformar 
 os OGMOP declarados de utilidade pública administrativa'. O artigo 36º regula 
 a fiscalização dos OGMOP declarados de utilidade pública administrativa. O 
 artigo 37º contém as obrigações dos OGMOP. O artigo 38º dispõe que, 'em cada 
 porto, e relativamente à zona portuária respectiva, só pode existir um único 
 organismo de gestão de toda a mão-de-obra portuária local'. E o artigo 39º prevê 
 a associação dos OGMOP em federações.
 
  
 
                    O artigo 40º fixa a competência das administrações e juntas 
 autónomas dos portos relativamente aos operadores portuários (nº 1), aos 
 trabalhadores portuários (nº 2) e aos organismos de gestão de mão-de-obra (nº 
 
 3). E o artigo 41º prevê a constituição de uma secção especializada nos 
 respectivos conselhos consultivos para assuntos relativos ao trabalho 
 portuário, com a competência definida no seu nº 4.
 
  
 
                    Os artigos 42º, 43º e 44º ocupam-se das contra-ordenações e 
 respectivas sanções.
 
  
 
                    Das disposições finais e transitórias destacam-se: o artigo 
 
 45º, que remete para portaria as 'normas de execução das matérias referentes ao 
 operador portuário', bem como a 'regulamentação das matérias referentes ao 
 trabalhador portuário e ao OGMOP'; e o artigo 51º, que revoga, entre outros 
 diplomas, o Decreto-Lei nº 282-B/84, já atrás referido.
 
  
 
  
 
                    4.2. A Portaria nº 481/90, emitida 'nos termos dos artigos 7º 
 e 45º do Decreto-Lei nº 151/90', já referenciados, estabelece 'a regulamentação 
 dos requisitos para o licenciamento e exercício da actividade de operador 
 portuário, bem como as obrigações e fiscalização a que essa actividade se 
 encontra adstrita', como se lê no seu considerando.
 
  
 
                    É constituída por 3 capítulos, subordinados às seguintes 
 epígrafes: do licenciamento (nºs. 1º a 8º), das obrigações (nºs. 9º a 16º) e da 
 fiscalização (nºs. 17º a 20º).
 
  
 
                    No capítulo I, em que se regulam o pedido de licença 
 
 (requisitos e documentos que devem instruí-lo) e respectivo despacho (de 
 deferimento ou indeferimento), contêm-se duas normas que importa realçar: a do 
 ponto 2 do nº 1º, segundo a qual 'o exercício da actividade de operador 
 portuário deverá constituir o objecto social exclusivo da entidade prevista no 
 número anterior [isto é, a 'entidade que pretende exercer a actividade de 
 operador portuário']'; e a do nº 8º, que exige ao operador portuário, 'como 
 requisito necessário ao licenciamento e ao exercício da actividade', um 
 determinado 'capital realizado', variável conforme os portos (Lisboa, Douro e 
 Leixões, Setúbal e outros portos).
 
  
 
                    No capítulo II, estabelecem-se, entre as obrigações a que 
 fica sujeito o operador portuário: a de prestar caução, de montante variável 
 conforme o porto em que exerça a sua actividade (nº 10º); a de celebrar os 
 
 'contratos de seguro legalmente obrigatórios para o exercício da sua 
 actividade, designadamente os necessários à cobertura dos danos referidos no 
 artigo 10º do Decreto-Lei nº 151/90' (nº 12º); e a de satisfazer às condições 
 de higiene, prevenção e segurança fixadas pelo organismo de gestão de 
 mão-de-obra (nº 13º). E o nº 15º estabelece: 'O registo do operador portuário 
 no respectivo OGMOP efectuar-se-á com a exibição da respectiva licença, sem 
 necessidade de qualquer outra formalidade, além das fixadas nos seus 
 estatutos'.
 
  
 
                    4.3. A Portaria nº 580/90 compõe-se de 3 capítulos.
 
  
 
                    O capítulo I (nºs. 1º a 6º) trata dos organismos de gestão de 
 mão-de-obra portuária, definindo os seus objectivos (nº 1º), competência (nº 
 
 2º) e estrutura orgânica (nºs. 3º a 5º) e remetendo para os respectivos 
 estatutos ou pacto social o regime de extinção e destino do activo e passivo 
 desses organismos (nº 6º).
 
  
 
                    O capítulo II (nº 7º) ocupa-se do título de classificação 
 profissional do trabalhador portuário, determinando que ele seja visado pelo 
 organismo de gestão de mão-de-obra.
 
  
 
                    O capítulo III (nº 8º) regulamenta a admissão dos 
 trabalhadores.
 
  
 
                    4.4. O Decreto-Lei nº 282-B/84, que anteriormente ao 
 Decreto-Lei nº 151/90 definia operações portuárias e estabelecia o regime 
 jurídico dos operadores portuários, era constituído por 23 artigos: artigo 1º - 
 definições; artigo 2º - realização das operações portuárias; artigo 3º (sem 
 epígrafe); artigo 4º - licenciamento; artigo 5º - competência da autoridade 
 portuária; artigo 6º - requisitos a satisfazer pelos operadores portuários; 
 artigo 7º - caducidade da licença; artigo 8º - tarifas; artigo 9º - comissão de 
 tarifas; artigo 10º - (sem epígrafe); artigo 11º - direcção técnica da operação 
 portuária; artigo 12º - responsabilidade do operador portuário - princípio 
 geral; artigo 13º - responsabilidade perante a autoridade portuária; artigo 14º 
 
 - responsabilidade perante a alfândega; artigo 15º - utilização de instalações 
 na área portuária; artigo 16º - informações a prestar pelos operadores 
 portuários; artigo 17º - infracções; artigo 18º - exercício não licenciado da 
 actividade; artigo 19º - destino das verbas por aplicação de coimas; artigos 
 
 20º, 21º, 22º e 23º - todos subordinados à epígrafe 'disposições finais e 
 transitórias'.
 
  
 
                    O artigo 23º revogou o Decreto-Lei nº 46/83.
 
  
 
                    4.5. O Decreto-Lei nº 46/83 era o diploma que, antes do 
 Decreto-Lei nº 282-B/84, estabelecia as condições de acesso à actividade de 
 operador portuário.
 
  
 
                    Depois de, no artigo 1º, dizer o que se consideravam 
 operações portuárias para os efeitos desse Decreto-Lei, definia no artigo 2º 
 operadores portuários como sendo 'as sociedades ou empresas públicas 
 licenciadas exclusivamente para o exercício das operações portuárias referidas 
 no artigo 1º'. E no nº 1 do artigo 7º - para só referir as normas postas em 
 causa pelo Provedor de Justiça - dispunha que 'o licenciamento dos operadores 
 portuários depende da satisfação de requisitos a definir em decreto 
 regulamentar, nomeadamente no que se refere à natureza jurídica, capacidade 
 técnica, económica e financeira dos requerentes'.
 
  
 
                    4.6. O Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M, adaptando à 
 Região Autónoma da Madeira o regime jurídico da operação portuária, editado ao 
 abrigo da alínea d) do nº 1 do artigo 229º da Constituição e da alínea b) do 
 artigo 33º do Decreto Lei nº 318-D/76, de 30 de Abril, está dividido em 4 
 capítulos.
 
  
 
                    O capítulo I - disposições gerais tem 10 artigos 
 subordinados às seguintes epígrafes: artigo 1º - autoridade portuária; artigo 
 
 2º - organismo de gestão de mão-de-obra portuária; artigo 3º - licenciamento; 
 artigo 4º - requisitos; artigo 5º - admissão; artigo 6º - inscrição; artigo 7º 
 
 - título de qualificação profissional; artigo 8º - caducidade, suspensão, 
 revogação; artigo 9º - contingente e contingente comum; artigo 10º - produto 
 das coimas.
 
  
 
                    O capítulo II - do organismo de gestão de mão-de-obra 
 portuária é formado por 6 artigos, subordinados às seguintes epígrafes: artigo 
 
 11º - natureza e objecto; artigo 12º - estatutos; artigo 13º - fiscalização; 
 artigo 14º - obrigações; artigo 15º - exclusivo; artigo 16º - federações.
 
  
 
                    O capítulo III - da Direcção Regional de Portos é constituído 
 por 2 artigos, que têm as seguintes epígrafes: artigo 17º - competências; 
 artigo 18º - secção especializada. O primeiro define a competência da Direcção 
 Regional dos Portos relativamente aos operadores portuários, aos trabalhadores 
 portuários e ao organismo de mão-de-obra; o segundo prevê o funcionamento de 
 uma secção especializada junto da Direcção Regional de Portos, no âmbito da 
 autoridade portuária.
 
  
 
                    O capítulo IV - disposições finais e transitórias contém 6 
 artigos: artigo 19º - regulamentação; artigo 20º - regulamentos de exploração; 
 artigo 21º - tabela de preços indicativos e IGAP [indicadores de gestão da 
 actividade portuária]; artigo 22º - trabalhadores portuários, operadores 
 portuários e organismo de gestão do trabalho portuário; artigo 23º - 
 trabalhadores portuários do contingente comum; artigo 24º (sem epígrafe, 
 refere-se à entrada em vigor).
 
  
 
                    5. Acontece, porém, que, na pendência do presente pedido de 
 fiscalização abstracta sucessiva de constitucionalidade das normas acabadas de 
 identificar, foi publicada a Lei nº 1/93, em 6 de Janeiro e então tudo se veio a 
 modificar, substituindo-se os regimes jurídicos do trabalho e das operações 
 portuárias.
 
  
 
                    É o que, em síntese, se passa a ponderar, nos pontos de 
 maior relevância, para se ver o alcance da revogação daqueles regimes jurídicos, 
 porque de verdadeira e expressa/ou tácita revogação se trata, como se verá.
 
  
 
                    Aquela Lei nº 1/93, de 6 de Janeiro, autorizou o Governo a 
 rever, quer o regime jurídico do trabalho portuário, quer o das operações 
 portuárias.
 
  
 
                    No uso dessa autorização, foram publicados, respectivamente 
 no que toca àquelas matérias, os Decretos-Leis nºs 280/93, de 13 de Agosto e 
 
 298/93, de 28 do mesmo mês (complementados já por diplomas regulamentares 
 posteriores) e com entrada em vigor no dia 1 de Novembro de 1993 (artigos 25º e 
 
 38º daqueles Decretos-Leis).
 
  
 
                    O Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio, foi revogado 
 expressamente pelo primeiro daqueles diplomas (artigo 24º, alínea b)), assim 
 como foram igualmente revogadas as Portarias nºs 481/90 e 580/90 (alínea c) do 
 mesmo artigo 24º).
 
  
 
                    A autorização foi dada, como se lê no artigo 1º, alínea e) 
 daquela lei, e no que toca à operação portuária, no sentido de o Governo 
 entregar, 'em exclusivo, às empresas de estiva as actividades de movimentação de 
 cargas nos cais públicos e nas áreas portuárias não concessionadas'.
 
  
 
                    Por sua vez, o artigo 5º, nº 1, do Decreto-Lei nº 298/93 veio 
 estabelecer:
 
 'Os titulares de direitos de uso privativo de parcelas do domínio público, de 
 concessões de exploração de bens dominiais, de concessões de serviço público ou 
 de obras públicas podem realizar livremente, na área que lhes está afecta, 
 operações de movimentação de cargas, desde que as mercadorias provenham ou se 
 destinem ao seu próprio estabelecimento industrial e as operações se enquadrem 
 no exercício normal da actividade prevista no respectivo título deuso 
 privativo ou no objecto da concessão'.
 
  
 
                    Destas disposições resulta, pois, que as empresas titulares 
 de direitos e de concessões previstos naquele nº 1 do artigo 5º não ficam 
 proibidas de exercer a actividade de 'operadores portuários'. Mister é que a 
 exerçam dentro do condicionalismo imposto em tal preceito.
 
  
 
                    Este diploma diverge, pois, do Decreto-Lei nº 151//90, que, 
 no seu artigo 2º, nº 1, estabelecia que 'operadores portuários são as sociedades 
 exclusivamente licenciadas para o exercício das actividades portuárias' 
 referidas no artigo 1º.
 
  
 
                    Aquele preceito restringia o direito a tal iniciativa, uma 
 vez que permitia o exercício da actividade portuária apenas às entidades 
 licenciadas exclusivamente para o efeito, arredando dessa actividade as 
 empresas titulares de cais privativos (terminais especializados).
 
  
 
                    Ora, o legislador de 1993 veio permitir que também os 
 titulares daqueles direitos e concessões possam exercer operações portuárias.
 
  
 
                    E mais ainda.
 
  
 
                    Embora a actividade de movimentação de cargas [que integra 
 genericamente a noção de 'Operação portuária' (cfr. artigo 2º, alínea a)] seja 
 prestada mediante concessão de serviço público a empresas de estiva (artigo 3, 
 nº 2, alínea a)) e estas assumam a forma de sociedades comerciais (artigo 8º do 
 mesmo diploma), certo é que na realização de operações portuárias podem também 
 participar as cooperativas, desde que a sua actividade consista exclusivamente 
 na cedência de trabalhadores para o exercício das diferentes tarefas portuárias 
 ou movimentação de cargas (cfr. artigos 2º, alínea c) e 9º, nº 1, do 
 Decreto-Lei nº 280/93).
 
  
 
                    O diploma parece tentar um equilíbrio na defesa dos 
 interesses, por um lado, das sociedades comerciais e, por outro, das 
 cooperativas.
 
  
 
                    Também o Decreto-Lei nº 298/93 veio definir os requisitos de 
 que depende o licenciamento da prestação ao público da actividade portuária 
 
 (artigos 9º e seguintes), contrariamente ao Decreto-Lei nº 151/90, que remetia 
 para portaria tal definição e que constava da Portaria nº 481/90.
 
  
 
                    Ao enunciar de uma forma tão pormenorizada tais requisitos, 
 terá o legislador querido estabelecer 'critérios suficientemente densos' (cfr. 
 Parecer de Gomes Canotilho, pág. 11), de forma a garantir a objectividade e 
 igualdade no licenciamento.
 
  
 
                    Por seu turno, não se encontra no Decreto-Lei nº 280/93, em 
 matéria de regime jurídico do trabalho portuário, nenhum preceito idêntico ao  
 do nº 2  do artigo 32º do Decreto--Lei nº 151/90: não se retiram aos operadores 
 portuários, passando-os para os organismos de gestão de mão-de-obra, os poderes 
 que a lei geral do trabalho lhes atribui como entidade empregadora, 
 relativamente aos seus trabalhadores. 
 
  
 
                    Reforça-se, assim, a estabilidade do vínculo laboral à 
 entidade empregadora e extingue-se o regime de inscrição e de exclusivo do 
 trabalho portuário.
 
  
 
                    O referido Decreto-Lei já não impõe a existência dos 
 organismos de gestão de mão-de-obra portuária; permite mesmo (embora não a 
 torne obrigatória) a transformação deles em empresas de trabalho portuário 
 
 (artigo 12º, nº 1).
 
  
 
                    Tais organismos deixaram de ter o monopólio da inscrição 
 obrigatória do trabalhador, da sua admissão e da emissão de qualificação 
 profissional.
 
  
 
                    Como já se referiu, os regimes de inscrição e de exclusivo 
 dos trabalhadores portuários inscritos são extintos (artigo 11º, nº 1). A 
 carteira profissional é emitida a requerimento do trabalhador (artigo 11º, nº 
 
 2).
 
  
 
                    É, pois, toda uma realidade do mundo do trabalho portuário e 
 da gestão da mão-de-obra portuária que em bloco termina e é substituída por uma 
 realidade nova, por aplicação das normas legais e regulamentares ora em vigor (a 
 
 'nova disciplina de relações de trabalho portuário' de que fala o preâmbulo do 
 Decreto-Lei nº 280/93, ou as 'profundas alterações introduzidas no 
 enquadramento legislativo do trabalho portuário', na linguagem do preâmbulo do 
 Decreto Regulamentar nº 2/94, de 28 de Janeiro, editado ao abrigo do disposto no 
 nº 2 do artigo 9º daquele Decreto-Lei).
 
  
 
                    6. O mesmo discurso pode agora transpor-se para o Processo 
 incorporado nº 45/91, tendo por objecto as normas do Decreto Regulamentar 
 Regional nº 23/90/M, de 21 de Dezembro, que adaptou à Região Autónoma da Madeira 
 o regime jurídico da operação portuária constante do ora revogado Decreto-Lei nº 
 
 151/90, de 15 de Maio.
 
  
 
                    É que, de igual modo, aquele Decreto Regulamentar, foi  
 substituído pelos  Decretos Legislativos Regionais nºs 18//94/M e 22/94/M, de 8 
 e 13 de Setembro de 1994, ambos aprovados em sessão plenária da Assembleia 
 Legislativa Regional da Madeira, de 14 de Julho de 1994.
 
  
 
                    O Decreto Legislativo Regional nº 18/94/M, reconhecendo no 
 seu preâmbulo que o 'regime jurídico das operações portuárias foi revisto pelo 
 Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto', dispõe no artigo 1º:
 
  
 
 'Na aplicação, à Região Autónoma da Madeira do regime jurídico das operações 
 portuárias estabelecido pelo Decreto-Lei nº 298/93, de 28 de Agosto, ter-se-ão 
 em conta as adaptações de carácter  orgânico constantes dos artigos seguintes.'
 
  
 
  
 
                    Por seu turno, o Decreto Legislativo Regional nº 22/94/M, 
 referindo no seu preâmbulo o 'novo regime jurídico do trabalho portuário' e a 
 
 'nova disciplina de trabalho portuário', dispõe no artigo 1º:
 
  
 
 'Na aplicação à Região Autónoma da Madeira do regime jurídico do trabalho 
 portuário, estabelecido pelo Decreto-Lei nº 280/93, de 13 de Agosto, ter-se-ão 
 em conta as adaptações de carácter orgânico constantes dos artigos seguintes.'
 
  
 
                    Ora, visando o Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M, em 
 causa nos presentes autos, adaptar à Região Autónoma da Madeira o regime 
 jurídico da operação portuária ('torna- -se necessário garantir a exequibilidade 
 do regime jurídico contido no Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de Maio' e 
 
 'introduzir os ajustamentos considerados necessários, definindo as entidades que 
 na Região Autónoma irão executar o disposto no Decreto-Lei nº 151/90, de 15 de 
 Maio', conforme se lê no seu preâmbulo), o seu suporte desapareceu com a 
 revogação expressa naquele Decreto-Lei nº 151/90 e daí a necessidade de serem 
 emitidos os actuais e seguintes Decretos Legislativos Regionais nº 18/94/M e 
 
 22/94/M.
 
  
 
                    Com o que se operou uma revogação tácita do primitivo 
 Decreto Regulamentar Regional nº 23/90/M.
 
  
 
                    7. De tudo isto decorre que a primeira questão que deve 
 colocar-se é a do não conhecimento dos pedidos do Provedor de Justiça, 
 relativamente ao processo principal e ao processo incorporado, quanto a todas as 
 normas neles identificados, por falta de interesse jurídico relevante.
 
  
 
                    É certo que se pode 'considerar - como se lê no acórdão nº 
 
 806/93, publicado na II Série do Diário da República, nº 24, de 29 de Janeiro 
 de 1994 - jurisprudência pacífica deste Tribunal Constitucional (cfr., entre 
 outros, os Acórdãos nº 73/90, nº 135/90 e nº 213/92, todos publicados no Diário 
 da República, II Série, de, respectivamente, 19 de Julho e 7 de Setembro de 1990 
 e de 18 de Setembro de 1992) que a revogação de uma norma não faz cessar, ipso 
 facto, a possibilidade de fiscalização abstracta da sua constitucionalidade, nem 
 tão pouco faz desaparecer necessariamente a utilidade dessa fiscalização. Com 
 efeito, enquanto a revogação dispõe, em princípio, de uma eficácia prospectiva 
 
 (ex nunc), a declaração de inconstitucionalidade de uma norma tem, por via de 
 regra, uma eficácia retroactiva (ex tunc), podendo assim haver interesse na 
 eliminação dos efeitos jurídicos produzidos medio tempore, isto é, no período 
 de vigência da norma sob sindicância'.
 
  
 
  
 
                    Mas, talqualmente acrescenta o mesmo acórdão nº 806/93, 'o 
 Tribunal também tem dito ( cfr., entre outros, o já citado Acórdão nº 135/90 e 
 ainda os Acórdão nº 415/89 e nº 465//91, estes dois últimos publicados na II 
 Série do Diário da República, respectivamente, de 15 de Setembro de 1989 e de 2 
 de Abril de 1992 ) que não existe interesse jurídico relevante no conhecimento 
 de um pedido de declaração de inconstitucionalidade  com força obrigatória 
 geral naqueles casos onde  não se vislumbre qualquer alcance prático em tal 
 declaração por, se hipoteticamente tal declaração viesse a ter lugar, razões de 
 segurança jurídica ou de equidade - tal como previsto no nº 4 do artigo 282º da 
 Constituição - levarem à conclusão de que se impunha, de modo necessário, 
 efectuar a limitação dos respectivos efeitos'.
 
  
 
                    Ora, aplicando as referidas orientações jurisprudenciais ao 
 caso vertente, tem de entender-se que não subsiste um interesse jurídico 
 relevante ao conhecimento dos presentes pedidos.
 
  
 
                    É que, as normas - todas elas, sejam as 1990, sejam as 
 anteriores que eventualmente poderiam vir a ser repristinadas - cuja 
 inconstitucionalidade é arguida pelo requerente já não subsistem no ordenamento 
 jurídico. Elas foram revogadas, ou expressamente ou tacitamente, e substituídas 
 por outras com um conteúdo diferente, como, de modo pontual e a título 
 meramente exemplificativo, se deixou atrás registado.
 
  
 
                    Não oferecendo dúvidas que todo o regime jurídico do trabalho 
 portuário e todo o regime jurídico das operações portuárias, refiram-se eles ao 
 Continente ou à Região Autónoma da Madeira, está hoje contemplado em diplomas 
 
 (legais, regulamentares e regionais) totalmente novos, este Tribunal 
 Constitucional não deixaria de usar da faculdade referida no nº 4 do artigo 
 
 282º, da Constituição, reportando os efeitos de uma eventual declaração de 
 inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, fosse ela qual fosse, por 
 razões de segurança jurídica, à data da publicação do acórdão no Diário da 
 República. Pois que, ter-se-ia sempre de ressalvar os efeitos produzidos medio 
 tempore pelas normas revogadas ou substituídas, quer no que toca aos 
 trabalhadores portuários e à gestão de mão-de-obra nos portos portugueses, quer 
 no que toca às operações portuárias e ao universo das empresas engajadas nessas 
 operações (é o próprio requerente que alerta para 'salvaguardar os direitos dos 
 trabalhadores portuários' - fls. 293).
 
  
 
                    Assim sendo, e como ocorre in casu uma situação em que é 
 patente a priori que 'o Tribunal Constitucional, viria ele próprio, esvaziar de 
 qualquer sentido útil a declaração de inconstitucionalidade que viesse 
 eventualmente a proferir, bem se justifica que conclua desde logo o Tribunal 
 pela inutilidade superveniente de uma decisão de mérito' (cfr. os citados 
 Acórdãos nºs 135/90, 415/89 e 465/91).
 
  
 
                    8. Termos em que, e DECIDINDO, não se toma conhecimento dos 
 pedidos do requerente, relativamente a todas as normas por ele questionadas.
 
  
 Lisboa, 8 de Março de 1995
 Guilherme da Fonseca
 Bravo Serra
 Armindo Ribeiro Mendes
 Antero Monteiro Dinis
 Messias Bento
 José de Sousa e Brito
 Assunção Esteves
 Tavares da Costa
 Vítor Nunes de Almeida
 José Manuel Cardoso da Costa