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Processo n.º 171/05
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
  
 
  
 
             Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
             1 – O Município de A. reclama, ao abrigo do disposto no n.º 3 do 
 art. 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), da 
 decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, de não 
 conhecimento do recurso de constitucionalidade interposto do acórdão do Supremo 
 Tribunal Administrativo, de 7 de Outubro de 2004, completado pelo acórdão do 
 mesmo Supremo, de 7 de Dezembro de 2004, que indeferiu o pedido da sua 
 aclaração.
 
  
 
             2 – Como fundamento da sua reclamação, o reclamante desenvolve o 
 seguinte e longo discurso argumentativo:
 
  
 
 «I - Considerações Preliminares
 
  
 Não poderemos deixar de iniciar a presente reclamação com o sentimento de que o 
 recurso de fiscalização concreta acaba por ser um meio jurisdicional tão 
 restrito e – a adjectivação consiste num critério e naturalmente não é nossa - 
 insólito que acaba por levar a que os destinatários se vejam confrontados com um 
 sentimento de descrença na justiça constitucional.
 
  
 Iremos ao longo da presente reclamação verificar que a não admissão do presente 
 recurso acaba por votar a recorrente a uma situação de desprotecção, que cremos 
 intolerável, perante uma questão de direito com a qual não poderia contar.
 
  
 A insólita questão emergente do presente processo prende-se com a circunstância 
 do Supremo Tribunal Administrativo ter decidido dar provimento à argumentação 
 expendida quanto à ratio decidendi fixada pelo Tribunal Administrativo de 1ª 
 Instância que indeferiu a excepção de extemporaneidade do recurso contencioso.
 
  
 Ou seja, face à decisão de indeferimento da sobredita excepção devido a uma 
 errónea aplicação do artigo 254º do CPC, veio o Supremo Tribunal Administrativo 
 julgar que assistia razão à recorrente.
 
  
 Todavia, considerou expressamente o Supremo Tribunal Administrativo que a 
 questão deveria ser discutida sob um ângulo que não chegou a ser encarado pelo 
 Tribunal ad quo, tendo vindo a julgar improcedente a referida excepção mediante 
 o recurso a diversas normas legais e a outros elementos interpretativos que 
 serviram para decidir que a notificação ao mandatário não vale como notificação 
 do destinatário para os efeitos dos artigos 28º e 29º da LPTA.
 
  
 Ora, é efectivamente a mobilização de diversas normas legais e princípios gerais 
 de direito administrativo que serviram para interpretar a aplicação dos artigos 
 
 28º e 29º da LPTA - interpretação essa que não foi suscitada por qualquer parte 
 processual, nem considerada pelo Juiz de 1ª instancia - que a recorrente reputa 
 de inconstitucional e que configura uma verdadeira decisão surpresa, pois não 
 poderia ter previsivelmente contado com a convocação deste novo prius 
 argumentativo quando elaborou as suas alegações de recurso jurisdicional.
 
  
 Isto porque, salvo o devido respeito, o Supremo Tribunal Administrativo não se 
 limitou a julgar que a interpretação dos artigos 28º e 29º da LPTA - que 
 estabelecem o prazo de interposição de recurso contencioso - deveria ser 
 realizada com base no regime próprio de notificação dos actos administrativos 
 constante do Código do Procedimento Administrativo como refere o Digníssimo 
 Relator.
 
  
 Como veremos foram mobilizadas normas legais e princípios gerais que não se 
 reportam ao regime da notificação dos actos administrativos constante do Código 
 do Procedimento Administrativo.
 
  
 Por outro lado, ao contrário do foi considerado pelo Digníssimo Relator do 
 processo, a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo não 
 corresponde exactamente à tese defendida pela recorrente contenciosa perante o 
 Tribunal de 1ª Instância.
 
  
 São assim estes os motivos, que passaremos a evidenciar, que nos levam a 
 considerar que estarmos perante um caso em que não se impõe o ónus de suscitar a 
 questão de inconstitucionalidade durante o processo, na medida em que a 
 recorrente constitucional não poderia, mediante um prévio juízo de prognose, 
 contar com a interpretação dos artigos 28º e 29º da LPTA que reputa de 
 inconstitucional.
 
  
 II - Da sentença de 1ª Instância
 
  
 Preliminarmente teremos de referir que a recorrente constitucional interpôs 
 recurso jurisdicional do despacho que julgou improcedente a questão prévia da 
 extemporaneidade do recurso contencioso com fundamento numa errónea 
 interpretação da presunção legal de notificação do mandatário contida no artigo 
 
 254º, nº 2 do CPC, tendo defendido que a correcta interpretação deste normativo 
 legal determinava a prova de que o mesmo foi notificado em 31/01/2001, logo o 
 recurso contencioso deveria ter sido julgado intempestivo à luz dos artigos 28º 
 e 29º da LPTA. Mal escrito.
 
  
 Esta era a ratio decidendi fixada pelo Tribunal de 1ª instância sobre esta 
 questão e não qualquer outra que se prendia com a aplicação do regime de 
 notificação dos actos administrativos contido no Código do procedimento 
 Administrativo.
 
  
 Assim, segundo as regras processuais inerentes aos recursos jurisdicionais, a 
 recorrente só poderia ter dirigido o seu juízo de censura contra a matéria 
 decidida no despacho e não sobre qualquer outra questão de direito hipotética 
 que pudesse ter sido suscitada pela parte contrária durante o processo.
 
  
 Ou seja, em nosso entendimento, quando o julgador decidiu indeferir a questão 
 prévia suscitada, por considerar que não se encontrava provado nos autos que o 
 mandatário da recorrente contenciosa tivesse sido notificado em 31/01/2001, 
 delimitou o objecto do recurso à questão de se saber se existia ou não prova nos 
 autos que determinasse a interpretação de que o prazo de recurso contencioso 
 começaria a contar a partir da notificação ao mandatário.
 
  
 Por outro lado, o Tribunal a quo decidiu - decisão na qual a recorrente confiou 
 não esperando assim que pudesse ser alterada pelo Supremo Tribunal 
 Administrativo – que lhe assistia razão sobre a questão prévia, caso tivesse 
 sido provado nos autos que o mandatário foi notificado em 31-01-200 1, quando 
 refere '(...) sendo certo que a notificação é de facto eficaz quando feita na 
 pessoa do mandatário do recorrente'.
 
  
 Assim, o objecto do recurso jurisdicional interposto pela recorrente não poderia 
 ser outro que não aquele que efectivamente foi equacionado, sendo que a decisão 
 do Supremo Tribunal Administrativo é que, como veremos, se mostra totalmente 
 insólita e imprevisível.
 
  
 Deste modo - devido à circunstância da recorrente não ter podido em sede de 
 recurso jurisdicional para o STA suscitar a questão da aplicabilidade do regime 
 da notificação dos actos administrativos contido no CPA, pois não foi este o 
 sentido decisório do despacho e não era previsível que o viesse a ser depois de 
 provada que a notificação ao mandatário tinha sido realizada em 31/01/2001 - 
 torna-se evidente que a recorrente não teve oportunidade processual de suscitar 
 a questão de inconstitucionalidade durante o processo.
 
  
 Razão pela qual, só por este argumento, deveria o presente recurso jurisdicional 
 ter sido admitido.
 
  
 III - Da interpretação dos artigos 28º e 29º da LPTA
 
  
 Chegados a este ponto, não obstante o que defendemos supra, teremos de verificar 
 se assiste razão ao Digníssimo Relator relativamente aos argumentos que invoca 
 para considerar que não era de todo imprevisível que os artigos 28º e 29º da 
 LPTA viessem a ser interpretados pelo Supremo tribunal Administrativo com o 
 sentido que se reputa de inconstitucional.
 
  
 Antes de mais convém vincar que a recorrente não suscitou a 
 inconstitucionalidade material dos artigos 28º e 29º da LPTA, mas sim a dimensão 
 interpretativa da sentença que atribuiu o sentido de que o prazo contido nestes 
 normativos não se inicia a partir da notificação do mandatário do recorrente.
 
  
 A segunda questão determinante para aferirmos da justiça da presente decisão de 
 não admissão do recurso prende-se com a circunstância de o Digníssimo Relator do 
 processo, salvo o devido respeito, ter presumido que a recorrente pretendia 
 suscitar a inconstitucionalidade da interpretação que o STA formulou dos artigos 
 
 28º e 29º da LPTA mediante o sentido normativo que o Tribunal inferiu dos 
 artigos 66º a 70º do CPA e 69º do DL nº 445/91.
 
  
 
 É certo que o sentido normativo com que estes foram convocados para interpretar 
 os artigos 28º e 29º da LPTA assumem questão com a qual a recorrente não poderia 
 contar, bem como, como veremos infra, não foi apenas com base nestes normativos 
 que o STA decidiu considerar que a notificação ao mandatário valia para efeitos 
 de inicio do prazo de interposição do recurso contencioso.
 
  
 Mas relevante na decisão do Supremo Tribunal Administrativo - constituindo a 
 ratio decidendi da questão prévia suscitada pela recorrente - foi a argumentação 
 desenvolvida para afastar a relevância da notificação do acto administrativo ao 
 mandatário para os efeitos previstos nos artigos 28º e 29º da LPTA.
 
  
 Ou seja, o que se vem de referir é que se o STA não tivesse considerado 
 irrelevante a notificação do mandatário do recorrente, sempre poderia ter 
 decidido que os actos administrativos devem ser notificados aos particulares 
 segundo as regras do CPA, na medida em que isso em nada influenciaria a decisão 
 sobre a questão da intempestividade.
 
  
 Assim, o que interessava saber e decidir era se a notificação ao mandatário se 
 assumia como determinante para efeitos de início de contagem do prazo de recurso 
 contencioso, pois é por todas reconhecido que as normas do CPA determinam que o 
 mesmo seja notificado do acto administrativo.
 
  
 Com efeito, estamos a tratar de duas realidades distintas, pois uma coisa é 
 saber se o interessado tem de ser notificado pessoalmente do acto administrativo 
 para que se mostre cumprida a lei substantiva; situação completamente distinta é 
 a discussão sobre a aplicação da lei processual e, nomeadamente, saber se a 
 notificação do mandatário determina o início do prazo do recurso contencioso.
 
  
 Deste modo, o segmento decisório que a recorrente reputa de inconstitucional e 
 que não teve oportunidade de discutir o processo - na medida em que não foi 
 suscitada pela parte contrária e nem tomada em consideração pelo Tribunal de 1ª 
 instância - prende-se com a interpretação e efeitos atribuídos pelo Supremo 
 Tribunal Administrativo ao artigo 229-A do CPC e que serviu para afastar a 
 relevância da notificação do acto administrativo ao mandatário para efeitos dos 
 artigos 28º e 29º da LPTA.
 
  
 Assim considerou o Supremo Tribunal Administrativo a folhas 7:
 
 'Este Supremo Tribunal, e principalmente numa época em que o regime processual 
 civil não impunha que os mandatários judiciais das partes se notificassem dos 
 articulados e requerimentos autónomos (regime que passou a vigorar com o artigo 
 
 229º-A, aditado ao CPC pelo DL 183/2000, de 10 de Agosto) considerou, repetidas 
 vezes, valer como notificação do acto administrativo a comunicação efectuada 
 através do Tribunal'.
 
  
 No seguimento desta argumentação sobre a matéria veio o STA dar conta de que 
 apesar de existir jurisprudência contraditória, foi recentemente proferido um 
 Acórdão do Pleno em 17/06/2004 que manteve a orientação de que a notificação do 
 acto administrativo ao mandatário do recorrente tinha o efeito de iniciar o 
 prazo de recurso contencioso.
 
  
 Mas a verdadeira ratio decidendi da questão que se discute - sendo nesta 
 argumentação que se colhe a verdadeira decisão imprevisível e até se quisermos 
 insólita de não considerar relevante a notificação do mandatário - encontra-se 
 desenvolvida a folhas 8 da sentença que passamos a transcrever:
 
  
 
 'A oscilação deste Tribunal, na questão supra, não deve, em nosso entender, 
 colocar-se quando já não se trata, sequer, de uma comunicação efectuada tribunal 
 mas, simplesmente, de notificação entre os mandatários das partes efectuada nos 
 termos do artigo 229º-A do CPC. 
 Com efeito, o regime de notificações previsto na lei processual civil está 
 pensado para valer no interior do processo a que respeitam e para os efeitos 
 desse processo. Dos requerimentos (e documentos que os acompanham) notificados 
 entre si pelos respectivos mandatários das partes deverão estas, ainda através 
 dos seus mandatários, retirar as consequências processuais que se imponham. Mas, 
 qualquer consequência exterior a esse processo deve ser excluída, salvo previsão 
 em contrário'.
 
  
 Ora mediante a argumentação seguida pelo STA podemos verificar de forma clara 
 que a circunstância de a notificação ao mandatário não ser tida como relevante 
 para efeito do início da contagem do prazo de recurso contencioso, foi 
 efectivamente a mobilização do artigo 229º-A do CPC.
 
  
 Com efeito, caso o Supremo Tribunal Administrativo não tivesse mobilizado o 
 artigo 229º-A do CPC - interpretando os efeitos processuais e extra-processuais 
 
 às notificações entre mandatários - a questão seria decidida no sentido de que a 
 notificação ao mandatário tem o efeito de iniciar o prazo de recurso 
 contencioso, na medida em que o próprio Tribunal assume que este é o sentido 
 mais recente da jurisprudência e, mais grave ainda, do Tribunal Pleno.
 
  
 Por outro lado, ao contrário do que o Digníssimo Relator refere, esta questão de 
 saber se as notificações entre mandatários podem ter efeitos extra-processuais 
 não se apresenta como controvertida na jurisprudência ou na doutrina, na medida 
 em que o próprio aresto não cita qualquer Jurisconsulto ou Acórdão anterior onde 
 esta questão se encontre debatida ou decidida.
 
  
 Também ao contrário do que o Exmo. Relator decidiu, a mobilização do artigo 
 
 229º-A do CPC para afastar a interpretação de que a notificação ao mandatário 
 inicia o prazo de recurso contencioso previsto nos artigos 28º e 29º da LPTA, 
 não foi suscitada por qualquer parte processual ou considerada pelo Tribunal de 
 
 1ª Instância.
 
  
 Logo, nunca se poderá considerar que a recorrente mediante um prévio juízo de 
 prognose poderia contar com a convocação do artigo 229º-A do CPC para afastar a 
 relevância da notificação ao mandatário para início da contagem do prazo de 
 recurso contencioso previsto nos artigos 28º e 29º da LPTA.
 
  
 Razão pela qual, temos que o elemento normativo decisivo para a interpretação 
 dos artigos 28º e 29º da LPTA e que a recorrente entende ser inconstitucional 
 foi a aplicação do artigo 229º-A do CPC, norma que não foi suscitada no 
 processo, nenhuma das partes ou o próprio Tribunal de 1ª Instância a assumiu 
 como decisiva para a questão prévia que se discutiu nos autos, bem como o 
 sentido e alcance daquela disposição legal nunca foi discutida ou decidida na 
 doutrina e jurisprudência; logo, esta decisão foi de todo imprevisível e 
 insólita e impossibilitou a recorrente de cumprir o ónus da invocação da 
 inconstitucionalidade durante o processo.».
 
  
 
             3 – A parte contrária não respondeu à reclamação.
 
  
 
             4 – A decisão sumária reclamada tem o seguinte teor:
 
  
 
   «1 – O município de A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do 
 disposto na alínea b) do n.º 1 do art. 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, 
 na sua actual versão (LTC), do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 7 
 de Outubro de 2004, completado pelo acórdão do mesmo Supremo, de 7 de Dezembro 
 de 2004, que indeferiu o pedido da sua aclaração, pretendendo a apreciação da 
 questão de inconstitucionalidade dos artigos 28º e 29º da Lei de Processo dos 
 Tribunais Administrativos (Decreto-Lei n.º 267/85, de 16 de Julho) – LPTA – 
 enquanto entendidos no “sentido de que a notificação do mandatário, realizada no 
 
 âmbito de um processo jurisdicional de execução de sentenças, não vale como 
 notificação do destinatário para efeitos de impugnabilidade de uma decisão 
 administrativa”, por violação do disposto nos “artigos 268º, nºs 3 e 4, e 20º, 
 nºs 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa, 47º da Carta dos Direitos 
 Fundamentais da União Europeia e 8º e 9º da Carta dos Direitos do Homem”.
 
   No seu requerimento de interposição de recurso alega que a decisão recorrida 
 se manifesta como uma decisão surpresa na medida em que aquela interpretação 
 
 “não tinha sido ratio decidendi da decisão jurisdicional recorrida e logo, 
 segundo a jurisprudência do Tribunal Constitucional, deve ser concedido recurso 
 por inconstitucionalidade da aplicação de uma norma (...)”.
 
  
 
   2 – O recurso foi admitido pelo tribunal a quo. Porque essa decisão não 
 vincula o Tribunal Constitucional, de acordo com o disposto no art. 76º, n.º 3, 
 da LTC, e porque se desenha uma situação processual que se enquadra na hipótese 
 recortada no n.º 1 do art. 78º-A, da mesma Lei, passa a decidir-se 
 imediatamente.
 
  
 
 3 – Constitui requisito do recurso interposto ao abrigo do disposto na alínea b) 
 do n.º 1 do art. 280º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e na alínea 
 b) do n.º 1 do art. 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, em cuja categoria 
 se insere o interposto pelo recorrente, e como decorre dos mesmos preceitos 
 quando falam de aplicação de norma cuja inconstitucionalidade haja sido 
 suscitada durante o processo, mas que encontra igualmente tradução no n.º 2 do 
 art. 75º-A da LTC, que a questão de inconstitucionalidade da norma efectivamente 
 aplicada como ratio decidendi da decisão recorrida tenha sido suscitada durante 
 o processo.  
 O sentido deste conceito tem sido esclarecido, por várias vezes, por este 
 Tribunal Constitucional. Assim, por exemplo, no Acórdão n.º 352/94, publicado no 
 Diário da República II Série, de 6 de Setembro de 1994, disse-se que esse 
 requisito deve ser entendido “não num sentido meramente formal (tal que a 
 inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância)”, mas 
 
 “num sentido funcional”, de tal modo que essa invocação haverá de ter sido feita 
 em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão, “antes de 
 esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que (a mesma questão de 
 constitucionalidade) respeita”. 
 Por seu lado, afirma-se, igualmente, no Acórdão n.º 560/94, publicado no Diário 
 da República II Série, de 10 de Janeiro de 1995, que «a exigência de um cabal 
 cumprimento do ónus de suscitação atempada - e processualmente adequada - da 
 questão de constitucionalidade não é [...] “uma mera questão de forma 
 secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal 
 recorrido deva pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade para o 
 Tribunal Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame da 
 questão (e não a um primeiro julgamento de tal questão». 
 Neste domínio há que acentuar que, nos processos de fiscalização concreta, a 
 intervenção do Tribunal Constitucional se limita ao reexame ou reapreciação da 
 questão de (in)constitucionalidade que o tribunal a quo apreciou ou devesse ter 
 apreciado. Ainda na mesma linha de pensamento podem ver-se, entre outros, o 
 Acórdão n.º 155/95, publicado no Diário da República II Série, de 20 de Junho de 
 
 1995, e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o Acórdão n.º 
 
 192/2000, publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de 2000 - sobre o 
 sentido de um tal requisito, cf. José Manuel Cardoso da Costa, «A jurisdição 
 constitucional em Portugal», separata dos Estudos em Homenagem ao Prof. Afonso 
 Queiró, 2ª edição, Coimbra, 1992, pp. 51).
 
 É certo que tal doutrina sofre restrições, como se salientou naquele Acórdão n.º 
 
 354/94, mas isso apenas acontece em situações excepcionais ou anómalas, nas 
 quais o interessado não dispôs de oportunidade processual para suscitar a 
 questão de constitucionalidade antes proferida ou não era exigível que o 
 fizesse, designadamente por o tribunal a quo ter efectuado uma aplicação de todo 
 insólita e imprevisível. 
 Usando os termos do recente Acórdão n.º 192/2000, dir-se-á, ainda, que “quem 
 pretenda recorrer para o Tribunal Constitucional com fundamento na aplicação de 
 uma norma que reputa inconstitucional tem, porém, a oportunidade de suscitar a 
 questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferido 
 o acórdão da conferência de que recorre...”. 
 E é claro que não poderá deixar de entender-se que o recorrente tem essa 
 oportunidade quando a apreensão do sentido com que a norma é aplicada numa 
 decisão posteriormente proferida poderá/deverá ser perscrutado no(s) 
 articulado(s) processual(ais) funcionalmente previsto(s) para discretear 
 juridicamente sobre as questões cuja resolução essa decisão tem de ditar, por 
 antecedentemente colocadas, e em que aquele sentido, cuja constitucionalidade se 
 poderá questionar, se apresenta como sendo um dos plausíveis a ser aplicados 
 pelo juiz. 
 Ao encararem ou equacionarem na defesa das suas posições a aplicação das normas, 
 as partes não estão dispensadas de entrar em linha de conta com o facto de estas 
 poderem ser entendidas segundo sentidos divergentes e de os considerar na defesa 
 das suas posições, aí prevenindo a possibilidade da (in)validade da norma em 
 face da lei fundamental. 
 Digamos que as partes têm um dever de prudência técnica na antevisão do direito 
 plausível de ser aplicado e, nessa perspectiva, quanto à sua conformidade 
 constitucional. O dever de suscitação da inconstitucionalidade durante o 
 processo e pela forma adequada enquadra-se dentro destes parâmetros  acabados de 
 definir.
 
  
 
 4 – A questão que se põe no caso concreto é a de saber se estamos perante uma 
 dessas situações ditas de anómalas em que o recorrente se deve ter por 
 dispensado do cumprimento do ónus de suscitação, por mor do respeito devido à 
 garantia constitucional do acesso aos tribunais consagrado no art. 20º da CRP.
 A resposta não pode deixar de ser negativa. Senão vejamos.
 Na contestação que deduziu ao recurso contencioso interposto por B., - tendo por 
 objecto o pedido de anulação da deliberação da Câmara Municipal de A. de 25 de 
 Janeiro de 2001, deliberação esta que, além de mais, decidiu “indeferir o pedido 
 de licenciamento de obras particulares apresentado por B.” – o ora recorrente 
 suscitou a questão da intempestividade do recurso contencioso por o acto 
 recorrido, proferido em processo de execução de sentença que anulara, por falta 
 de fundamentação, acto anterior da mesma Câmara Municipal, ter sido levado ao 
 conhecimento do Tribunal e do mandatário do recorrente contencioso em 29 de 
 Janeiro de 2001 e chegado ao conhecimento deste em 30 de Janeiro de 2001, e por 
 o recurso contencioso haver sido interposto mais de dois meses depois da 
 notificação do acto contenciosamente recorrido.
 
 À suscitação desta questão prévia prejudicante do conhecimento do recurso 
 contencioso, a recorrente contenciosa respondeu alegando em síntese que a 
 notificação feita ao mandatário judicial do acto administrativo em causa não 
 relevava para efeitos de cômputo do prazo de interposição do recurso contencioso 
 em virtude de o acto recorrido não ser um acto judicial ou sequer um acto 
 praticado no processo, mas antes um acto administrativo que como tal devia ser 
 notificado ao interessado a que respeita para produzir eficácia, tendo ao mesmo 
 tempo indicado diversos autores que sufragariam a sua posição.
 Após parecer, no mesmo sentido, do Ministério Público junto do Tribunal 
 Administrativo de Coimbra, este tribunal julgou improcedente a questão prévia e 
 determinou o prosseguimento do recurso, abonando-se na fundamentação de que a 
 recorrida não havia conseguido ilidir a presunção de notificação do acto 
 recorrido, no terceiro dia posterior ao do registo, constante do n.º 2 do art. 
 
 254º do Código de Processo Civil, pelo que tendo a notificação sido posta no 
 correio em 29/01/2001 e o recurso dado entrada em 02/04/2001 se mostrava 
 cumprido o disposto no art. 28º, n.º 1, alínea a), da LPTA.
 O ora recorrente interpôs recurso desta decisão para o Supremo Tribunal 
 Administrativo (STA), tendo o mesmo sido admitido com subida diferida, 
 defendendo, nas suas alegações de recurso, que a mesma havia errado ao não 
 julgar, perante as normas dos artigos 229º-A, 253º e 254º, n.º 2, todas do 
 Código de Processo Civil e do art. 28º da LPTA, extemporaneamente interposto o 
 recurso contencioso. Sobre este recurso, a recorrente contenciosa não 
 contra-alegou.
 Tendo prosseguido o recurso contencioso, veio este a ser julgado procedente e o 
 acto recorrido anulado por sentença do mesmo tribunal de círculo, de 21/10/2003, 
 com fundamento na verificação do vício formal da falta de audiência da 
 interessada recorrente contenciosa (art. 100º do Código do Procedimento 
 Administrativo - CPA).
 Inconformado, o ora recorrente interpôs recurso de tal decisão para o Supremo 
 Tribunal Administrativo, defendendo a revogação do julgado.
 Subidos os autos ao STA para conhecimento dos recursos interpostos, proferiu o 
 mesmo o acórdão recorrido. 
 Nele, começou-se por apreciar a questão prévia da intempestividade do recurso 
 contencioso. 
 Após dar conta da existência de divergências jurisprudenciais relativamente à 
 questão de saber se vale como notificação do acto administrativo a comunicação 
 do acto feita através do tribunal, assinalando arestos num e noutro sentido, a 
 decisão recorrida concluiu, em síntese, no sentido de que o acto administrativo 
 em causa estava sujeito ao regime de notificação dos actos administrativos 
 constante dos art.ºs 66º a 70º, do CPA, e, enquanto acto relativo ao 
 licenciamento de obras particulares, ao disposto no art. 69º do Decreto-Lei n.º 
 
 445/91, de 20 de Novembro, e no de que não havia sido excedido o prazo de 
 interposição do recurso contencioso estabelecido nos art.ºs 28º e 29º da LPTA, 
 negando, consequentemente, provimento ao recurso da decisão que conhecera de tal 
 questão. 
 Conhecendo do mérito do recurso relativo à sentença que julgara procedente o 
 recurso, o acórdão recorrido negou-lhe também provimento.
 
  
 
 5 – Como se infere linearmente do recorte histórico, acima deixado, relativo às 
 posições que as partes tomaram perante o tribunal de 1ª instância sobre a 
 alegada questão da extemporaneidade do recurso contencioso, estas divergiam 
 sobre qual o regime que devia ser aplicado para determinar a data em que a 
 recorrente contenciosa devia ser tida como notificada da prolação do acto 
 contenciosamente recorrido, defendendo a ora recorrente que se devia aplicar o 
 regime das notificações em processo civil e que, de acordo com uma aplicação 
 correcta dele, o direito de recurso havia caducado e a ora recorrida que devia 
 antes aplicar-se o regime próprio de notificação dos actos administrativos aos 
 interessados em procedimento administrativo e que o recurso era, à face do 
 mesmo, tempestivo.
 A primeira instância, como já se disse, julgou improcedente a alegação da 
 referida questão prévia, mas fê-lo por razões fundadas não na inaplicabilidade 
 do regime próprio de notificação dos actos administrativos, pois apurou a 
 solução à luz do regime de notificação dos actos em processo civil, mas na falta 
 de prova sobre o facto alegado de que a recorrente contenciosa fora notificada 
 em 30/01/2001. Temos assim que a 1ª instância seguiu o entendimento defendido 
 pelo ora recorrente, da aplicação ao caso das normas do CPC que regulam a 
 notificação dos actos no processo.
 Na solução dessa questão da tempestividade do recurso contencioso, cujo prazo, 
 dies a quo e dies ad quem são regidos pelas normas dos art.ºs 28º e 29º da LPTA, 
 o acórdão recorrido acolheu antes o entendimento que a recorrente contenciosa 
 havia sustentado com êxito na 1ª instância, de que era aplicável o regime de 
 notificação dos actos administrativos estabelecido no CPA e no art. 69º do 
 referido Decreto-Lei n.º 445/91.
 Está bom de ver que, conquanto a decisão de 1ª instância sindicada 
 jurisdicionalmente pelo acórdão recorrido não se tenha fundado na aplicação ao 
 caso do regime próprio de notificação dos actos administrativos constante do CPA 
 e deste DL. n.º 445/91 ou seja, não constituindo estes preceitos sua ratio 
 deciendi ou fundamento normativo, nem por isso a sua aplicação se poderá ter 
 como imprevisível ou insólita, em termos de o recorrente estar dispensado de 
 hipotizar ou antecipar a sua aplicação e de, consequentemente, suscitar logo a 
 questão da sua inconstitucionalidade.
 E não estava, desde logo, porque essa solução correspondia exactamente à tese 
 que a recorrente contenciosa defendera na 1ª instância e bem poderia o STA 
 considerá-la aplicável, como veio a suceder, dentro do princípio da oficiosidade 
 do conhecimento do direito, expresso no velho brocardo latino jus novit curia.
 Depois, ainda, porque a decisão de 1ª instância não deixara de, implicitamente, 
 equacionar qualquer das soluções, como de resto lhe competia de acordo com a 
 regra de que na selecção dos factos ele deve seleccionar os factos relevantes à 
 decisão da causa “segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, 
 expressa no n.º 1 do art. 511º, do CPC. 
 Na verdade, ao julgar esses factos, a decisão de 1ª instância fixou quer o dia 
 em que a recorrente contenciosa foi notificada da deliberação contenciosamente 
 recorrida (02/02/2001) quer a data em que foi posta no correio a notificação da 
 mesma deliberação para o seu mandatário judicial (29/01/2001).
 Finalmente, porque a questão de poder valer ou não como notificação do acto 
 administrativo a comunicação do acto efectuada através do tribunal era uma 
 questão jurídica controversa, tendo a mesma sido já objecto de decisões 
 diferentes do  STA, como dá conta o acórdão recorrido que identifica decisões em 
 um e em outro sentido.
 De tudo resulta não ser absolutamente nada desrazoável ou inadequado exigir-se 
 do ora recorrente, até enquanto pessoa que está representada no processo por 
 pessoa que exerce por profissão o mandato judiciário e cujo exercício pressupõe 
 o conhecimento das pertinentes normas jurídicas aplicáveis à decisão do caso, um 
 prévio juízo de prognose relativo à aplicação do regime cuja constitucionalidade 
 se impugna.
 Temos, pois, de concluir que o recorrente não satisfez o ónus da prévia 
 suscitação da questão de inconstitucionalidade nem dele estava dispensado.
 Sendo assim, não pode tomar-se conhecimento do recurso.
 
  
 
 6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar 
 conhecimento do recurso.
 Sem custas, por ao tempo da interposição do recurso, o recorrente estar delas 
 subjectivamente isento [art. 2º, n.º 1, alínea e), do C. C. Judiciais, e art. 
 
 16º do DL. n.º 324/2003, de 27/12]».
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
             5 – A argumentação desferida pela reclamante contra a decisão 
 sumária não tem qualquer consistência e é totalmente contrariada pelos elementos 
 dos autos nela considerados.
 
             Antes de mais importa precisar que a decisão sumária relevou como 
 constituindo objecto do recurso de constitucionalidade interposto pelo 
 reclamante, precisamente, a dimensão normativa que o mesmo definiu, no 
 requerimento de interposição de recurso, como, aliás, lhe cabia por mor dos 
 princípios da autonomia da vontade e da auto-responsabilidade processual, como 
 correspondendo à ratio decidendi do acórdão pretendido recorrer, razão pela qual 
 os seus termos se mostram destacados entre aspas. 
 
             Basta confrontar o que se diz no n.º 1 da decisão sumária com o 
 alegado no seguinte trecho desse requerimento para se concluir que o relator 
 interpretou correctamente qual é a dimensão normativa dos artigos 28º e 29º da 
 LPTA, tidos pelo reclamante como constituindo o fundamento normativo ou ratio 
 decidendi da decisão recorrida, cuja inconstitucionalidade pretende ver 
 apreciada.
 
             Na verdade, afirmou, aí, o ora reclamante:
 
  
 
 «A questão da interpretação dos artigos 28º e 29º da LPTA, que se pretende ver 
 apreciada, foi decidida pelo Supremo Tribunal Administrativo, em segundo grau de 
 jurisdição, sem que tivesse sido discutida pelas partes processuais ou servido 
 de fundamento à decisão jurisdicional proferida pelo Tribunal de 1ª instância.
 
  
 Nesta conformidade, a questão da interpretação inconstitucional dos supra 
 mencionados normativos - no sentido de que a notificação do mandatário, 
 realizada no âmbito de um processo jurisdicional de execução de sentenças, não 
 vale como notificação do destinatário para efeitos de impugnabilidade de uma 
 decisão administrativa - manifesta-se com uma decisão-surpresa, na medida em que 
 não tinha sido ratio decidendi da decisão jurisdicional recorrida, logo, e 
 segundo a jurisprudência do Tribunal Constitucional, deve ser concedido recurso 
 por inconstitucionalidade da aplicação de uma norma que o recorrente não previa 
 e, por esse motivo, não suscitou o seu juízo de censura constitucional nas 
 alegações de recurso perante o Tribunal ad quem.
 
  
 Considera-se, pois, que a interpretação dos artigos 28º e 29º da LPTA realizada 
 pelo Tribunal Superior sob a veste de uma decisão-surpresa, técnica decisória 
 que também se pretende ver controlada pelo Tribunal Constitucional, viola as 
 seguintes normas e princípios Constitucionais:
 a) Artigo 268º, nºs 3 e 4 da Constituição da República Portuguesa;
 b) Artigo 20º, nºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa;
 c) Artigo 47º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
 d) Artigos 8º e 9º da Carta dos Direitos do Homem.».
 
  
 
             Mostrando-se assumido que foi (pelo menos, também) nesse fundamento 
 normativo, diferente, na sua substancialidade jurídica, do considerado pela 
 decisão da 1ª instância como elemento determinante para julgar improcedente a 
 questão prévia da extemporaneidade da interposição do recurso contencioso que o 
 recorrente suscitara na sua contestação ao recurso contencioso, o que é 
 verdadeiramente decisivo, para considerar o reclamante como dispensado do ónus 
 de prévia suscitação da questão de inconstitucionalidade, é saber se a 
 utilização dessa dimensão normativa há-de ter-se como “insólita” ou 
 imprevisível”, em termos de ser desrazoável e inadequado exigir do interessado 
 um prévio juízo de prognose relativo à sua aplicação, em termos de se antecipar 
 
 à prolação da decisão, suscitando a questão de inconstitucionalidade. 
 
             E é claro que essa desrazoabilidade ou inadequação há-de ser aferida 
 em função de uma pessoa que exerce o mandato forense por profissão e para o 
 exercício do qual, mesmo na perspectiva legal, está pressuposta uma certa 
 aptidão ou competência técnica quanto ao conhecimento do direito aplicável à 
 resolução das questões postas, nomeadamente, por ele, como é o caso.
 
             A circunstância de se poder considerar (o que não é totalmente 
 líquido, perante a sua primeira parte em que computa o prazo de interposição do 
 recurso contencioso em função da data da notificação ao administrado, e não ao 
 seu mandatário, do acto administrativo recorrido) que a decisão de 1ª instância 
 se posta, eventualmente, quanto à determinação do direito que aplicou, dentro da 
 linha argumentativa alegada pelo reclamante – apenas concluindo em sentido 
 diferente com base na falta de prova quanto ao momento do conhecimento, no 
 processo contencioso de execução de julgado, do acto administrativo recorrido 
 por banda do seu mandatário judicial – não autoriza, ao contrário do defendido 
 pelo reclamante, que a sua alegação, no recurso interposto de tal decisão, se 
 tenha de quedar dentro das balizas do quadro jurídico em que a mesma se moveu, 
 ou seja, no entendimento de poder valer como notificação do acto administrativo 
 a comunicação do acto feita através do tribunal, nesta se compreendendo a 
 notificação efectuada nos termos dos art. 229º e 253º do Código de Processo 
 Civil. 
 
             Objecto do recurso jurisdicional interposto pela ora reclamante, ao 
 contrário do que afirma, é a decisão de 1ª instância e não o entendimento ou 
 quadro jurídicos cuja aplicação a mesma tenha equacionado. Uma coisa é a 
 decisão, outra diferente são os seus fundamentos jurídicos, sendo certo que, no 
 comum dos casos, o recurso jurisdicional combate não a sintonia entre a decisão 
 e os seus fundamentos, mas a correcção jurídica dos fundamentos considerados 
 relevantes. 
 
             Por outro lado, importa ainda notar que, no domínio da determinação 
 do direito aplicável, ainda que as partes defendam a aplicação de certo regime 
 jurídico, não está o tribunal vinculado a essa alegação, pois que conhece 
 oficiosamente do direito.
 
             Ora – e reafirmando o que se diz na decisão reclamada – é por demais 
 evidente que a aplicação da dimensão normativa dos art. 28º e 29º da LPTA, cuja 
 constitucionalidade o reclamante pretende sindicar, fora já defendida pela 
 recorrida na resposta que esta deu à suscitação da questão prévia efectuada pela 
 ora reclamante, na sua contestação ao recurso contencioso.
 
             Na verdade, a ora recorrida não deixou de afastar aí o entendimento 
 de que, para efeitos de cômputo do prazo da interposição do recurso contencioso, 
 não valia a notificação do acto administrativo feita, nos termos do CPC, ao 
 advogado, no processo de execução de julgado, mas a notificação feita 
 directamente ao interessado no procedimento administrativo.
 
             Alegou, então, a ora recorrida o seguinte:
 
  
 
 «A entidade recorrida alega na sua douta contestação a excepção da 
 intempestividade do presente recurso, mas quanto nós sem qualquer razão.
 
  
 Com efeito, a procuração emitida pelo recorrente aos seus mandatários, confere 
 apenas poderes forenses normais e gerais.
 O que vale por dizer, que confere apenas poderes aos mandatários judiciais para 
 a prática de actos judiciais e processuais.
 
  
 Assim, tal mandato judicial permite apenas aos mandatários praticar actos dentro 
 do processo respectivo e receber notificações de actos judiciais nesse mesmo 
 processo praticados.
 
  
 No caso em análise, o acto recorrido não é um acto judicial nem tão pouco foi 
 praticado dentro do processo. 
 
  
 Trata-se pois de um acto administrativo, praticado no procedimento 
 administrativo que tem de ser notificado ao interessado a que respeita para 
 produzir eficácia (art. 268º, nº 3 da C.R.P., art. 66º e art. 130º do Cód. Proc. 
 Adm.) - veja-se neste sentido C.P.A., anotado, de Santos Botelho e Outros, págs. 
 
 194 e segs. e 382/3; C.P.A. I vol., de Esteves de Oliveira e Outros pág. 409 e 
 segs., e ainda o Contencioso Administrativo, anotado, de Santos Botelho, pág. 
 
 246 e segs.
 
  
 Assim, o prazo para a interposição do recurso sub judice só podia contar‑se a 
 partir da notificação ao interessado, aqui recorrente, a quem o procedimento 
 administrativo respeita. 
 
  
 Aliás, e sempre com o devido respeito, assim também o entendeu a entidade 
 recorrida ao notificar a aqui recorrente da deliberação em apreço pelo seu 
 ofício nº 0447, de 02/02/2001 já junto com a petição de recurso sob o documento 
 nº 1 (vide artigo 3º).».
 
             
 
             Muito embora a decisão recorrida para o STA não tenha acolhido este 
 entendimento da parte, tal não quer dizer que a discussão sobre qual o quadro 
 jurídico aplicável à determinação da data da notificação do acto administrativo 
 para efeitos do cômputo do prazo de interposição do recurso contencioso – nele 
 se compreendendo a questão de saber se essa data poderá ser aferida em função de 
 uma notificação que desse conhecimento da prática do acto administrativo, 
 notificação essa efectuada em processo de execução de julgado ao mandatário 
 judicial do interessado, aí também parte – se tenha de ter por cingida à posição 
 tomada pela decisão recorrida e não considerá-la como questão ainda em aberto, 
 susceptível de vir a ter a solução aventada pela parte que então ficou vencida.
 
             O ora reclamante não podia, assim – e desde logo – deixar de 
 equacionar a possibilidade de o STA vir a considerar que o quadro jurídico 
 aplicável, em geral, à notificação dos actos administrativos poderia arredar a 
 aplicação dos preceitos dos art.ºs 229º-A e 253º do CPC, para efeitos de 
 determinação da data em que o interessado em determinado procedimento 
 administrativo, e, simultaneamente, parte em um processo de execução de julgado, 
 em que figure como demandada a mesma entidade administrativa, se há-de ter por 
 notificado do acto administrativo, para efeitos do cômputo do prazo de 
 interposição do recurso contencioso.
 
             A relevância ou não da comunicação do acto administrativo, efectuada 
 através da via da notificação efectuada, em processo jurisdicional, ao 
 mandatário judicial do interessado, e consequentemente, da aplicação ou não do 
 regime dos arts. 229º-A e 253º do CPC, não poderá ser vista, numa óptica de 
 aplicação das soluções plausíveis de direito, desligada, inteiramente, da 
 determinação do regime jurídico a que está sujeita a notificação dos actos 
 administrativos, mesmo para efeitos do cômputo do prazo de recurso contencioso.
 
             É de exigir, pois, do ora reclamante que antecipasse a aplicação da 
 dimensão normativa, feita pelo acórdão pretendido recorrer, e suscitasse a sua 
 inconstitucionalidade.
 
             Mas, independentemente de a susceptibilidade da aplicação dessa 
 dimensão normativa haver sido cogitada pela ora recorrida e de, portanto, a 
 reclamante poder antecipar a adesão do tribunal ad quem a esse entendimento 
 normativo, verifica-se, ainda, que, ao contrário do que alega, a mesma 
 correspondia, pelo menos, a um entendimento, entre outro, que era sufragado 
 jurisprudencialmente, pelo que bem poderia o mesmo vir a ser adoptado pelo STA, 
 até com base em um argumento de maioria de razão relativamente a um tempo 
 anterior em que a notificação era feita pelo tribunal e nunca era antecedida de 
 notificação entre os mandatários das partes, nos termos do art. 229º-A, do CPC.
 
             Nesta perspectiva, não pode deixar de exigir-se que a reclamante a 
 devesse antecipar e suscitar a questão de constitucionalidade.
 
             A este propósito basta transcrever o que o acórdão pretendido 
 recorrer afirma para se constatar a existência das diferentes correntes 
 jurisprudenciais.
 
             Disse ele:
 
  
 
 «No caso dos autos, não foi alegado que no processo administrativo o 
 destinatário do acto se tenha feito representar por mandatário, e o processo 
 administrativo apenso não o revela.
 Este Supremo Tribunal, e principalmente numa época em que o regime processual 
 civil não impunha que os mandatários judiciais das partes se notificassem dos 
 articulados e requerimentos autónomos (regime que passou a vigorar com o artigo 
 
 229º-A, aditado ao CPC pelo DL 183/2000, de 10 de Agosto), considerou, repetidas 
 vezes, valer como notificação do acto administrativo a comunicação do acto 
 efectuada através do tribunal. Ocorreram tais julgamentos, particularmente, em 
 situações de pedidos de substituição do objecto do recurso, e para apreciar a 
 tempestividade desses pedidos, sendo exemplos os acs., em subsecção, de 25.2.92, 
 rec. 29199 (Apêndice de 29.12.95, pág. 1298), confirmado pelo Ac. do Pleno de 
 
 25.10.94 (Apêndice de 8.8.96, pág. 525), Ac. de 28.9.95, rec. 36580 (Apêndice de 
 
 27.1.98, pág. 7121), Ac. de 23.4.97, rec. 30837 (Apêndice de 23.3.2001, pág. 
 
 2982), e, mais recentemente, o Ac. do Pleno de 17.6.2004, rec. 46924.
 Mas também julgou em sentido oposto, isto é, no sentido de que a notificação do 
 acto tem de ser feita pela Administração, não valendo o conhecimento do mesmo 
 através da notificação efectuada pelo Tribunal dos documentos que acompanham a 
 contestação ou resposta da autoridade recorrida entre os quais consta o acto 
 administrativo, sendo exemplos os acs., em subsecção, de 6.2.1992, rec. nº 29687 
 
 (Apêndice de 29.12.1995, pág. 827), de 19.10.93, rec. nº 31623 (Apêndice de 
 
 15.10.96, pág. 5443), de 23.9.1998, rec. 32434 (Apêndice de 14.5.2002, pág. 
 
 5296). 
 A oscilação deste Tribunal, na questão supra, não deve, em nosso entender, 
 colocar-se quando já não se trata, sequer, de uma comunicação efectuada por 
 tribunal mas, simplesmente, de notificação entre os mandatários das partes 
 efectuada nos termos do artigo 229º-A do C PC. 
 Com efeito, o regime de notificações previsto na lei processual civil está 
 pensado para valer no interior do processo a que respeitam e para os efeitos 
 desse processo. Dos requerimentos (e dos documentos que os acompanham) 
 notificados entre si pelos respectivos mandatários das partes deverão estas, 
 ainda através desses mandatários, retirar as consequências processuais que se 
 imponham. Mas, qualquer consequência exterior a esse processo deve ser excluída, 
 salvo previsão em contrário.
 Esta delimitação de efeitos é a que melhor se compagina com a exigência de 
 notificação dos actos administrativos constante do artigo 268º, nº 3, da 
 Constituição da República, 'notificação aos interessados na forma prevista na 
 lei'.».
 
  
 
             De tudo resulta que a reclamação deve ser indeferida.
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide indeferir a reclamação.
 Sem custas, por ao tempo da interposição do recurso, o recorrente estar delas 
 subjectivamente isento [art. 2º, n.º 1, alínea e), do C. C. Judiciais, e art. 
 
 16º do DL. n.º 324/2003, de 27/12]».
 
  
 Lisboa, 2 de Novembro de 2005
 
  
 Benjamim Rodrigues
 Maria Fernanda Palma
 Rui Manuel Moura Ramos