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Processo: n.º 356/94.
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Luís Nunes de Almeida.
 
  
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 I — Relatório
 
  
 
 1 — A. — hoje substituído na acção pelos seus sucessores B., C., D., E. e F. — 
 recorreu para o Tribunal Judicial da Comarca de Silves da decisão arbitral que 
 havia fixado em 3 175 448$00 o montante a pagar pelo Estado pela expropriação 
 por utilidade pública da parcela de 11 760 m2 de terreno a que se referem os 
 presentes autos, com vista à construção de um estabelecimento criminal no 
 concelho de Silves.
 No âmbito daquele recurso, houve inspecção judicial e avaliação, tendo os 
 peritos dado resposta aos respectivos quesitos e indicado valores divergentes 
 para a parcela em questão.  O expropriado arguiu nulidades do relatório e das 
 respostas aos quesitos apresentadas pelos peritos designados pelo tribunal e 
 pela entidade expropriante; e, não tendo sido atendido, interpôs recurso de 
 agravo, que foi admitido com subida diferida.
 Por sentença de 10 de Outubro de 1990, o tribunal de primeira instância fixou em 
 
 3 757 800$00 o montante da indemnização, e em 141 939 000$00 o valor da causa 
 para efeito do cálculo das custas devidas pelo expropriado     — que apelou de 
 tal decisão para o Tribunal de Relação de Évora.
 Por acórdão de 1 de Julho de 1993, aquele tribunal superior negou provimento ao 
 agravo anteriormente referido e julgou parcialmente procedente a apelação da 
 sentença, fixando em 5 051 168$00 a indemnização a pagar ao expropriado.
 Deste acórdão foram interpostos dois recursos para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, respectivamente pelo Ministério Público e pelos primeiros três 
 sucessores do expropriado entretanto habilitados nos autos; tendo estes indicado 
 que, caso se entendesse não ser admissível o seu recurso, deveria o mesmo 
 considerar-se interposto para o Tribunal Constitucional.
 Ambos os recursos subiram ao Supremo Tribunal de Justiça.  Porém, aí, o dos 
 expropriados foi julgado deserto, por estes não terem apresentado alegações. E o 
 recurso do Ministério Público não teve seguimento, pois o Supremo Tribunal 
 considerou irrecorrível a decisão da Relação.
 Notificados da decisão que lhes julgou deserto o recurso, os expropriados vieram 
 
 «manter e reafirmar» o teor do requerimento de interposição de recurso para o 
 Tribunal Constitucional.  E, a convite do relator do STJ, esclareceram que 
 consideravam inconstitucionais:
 
  
 
        a)   os artigos 8.º, n.º 1, alínea s), e 126.º, n.º 2, do Código das 
 Custas Judiciais;
 
        b)   o Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro;
 
        c)   o Título IV do Decreto-Lei n.º 845/76, de 11 de Dezembro, 
 designadamente os artigos 27.º, n.º 2, 28.º, n.º 1, bem como os artigos 61.º, 
 
 73.º, n.º 2, face ao artigo 82.º, n.º 1, do diploma;
 
        d)   os artigos 523.º, 524.º e 580.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
 
  
 Este recurso foi admitido.
 
  
 
 2 — Nas alegações apresentadas no Tribunal Constitucional, os recorrentes pedem 
 que se julguem inconstitucionais as normas referidas e se ordene a reforma da 
 decisão recorrida.
 O Ministério Público, porém, observa que o objecto do presente recurso se 
 circunscreve à apreciação da constitucionalidade das normas constantes dos 
 artigos 29.º e 35.º do Código das Expropriações de 1976, as únicas que, ao menos 
 implicitamente, poderiam ter sido aplicadas na decisão recorrida; quanto às 
 restantes normas, ou a questão de inconstitucionalidade não foi suscitada 
 tempestivamente, ou não foram esgotados os recursos ordinários; no entanto, não 
 foram aplicadas na decisão recorrida quaisquer normas inconstitucionais do 
 Título iv do Código referido, uma vez que o único preceito inconstitucional que 
 aí poderia ser aplicado ao caso dos autos, o artigo 30.º, não foi efectivamente 
 aplicado.  Termina pedindo a condenação dos recorrentes por litigância de má fé.
 Respondendo às questões prévias suscitadas pelo Ministério Público, os 
 expropriados consideraram-nas improcedentes, e requereram que o Tribunal ouvisse 
 testemunhas para prova da matéria de facto relativa à má fé que lhes é imputada.
 Corridos os vistos, cumpre decidir.
 II — Fundamentos
 
  
 
 3 — Uma primeira questão prévia que cumpre examinar é a da tempestividade do 
 recurso.
 Como vimos, os expropriados interpuseram recurso do acórdão do Tribunal de 
 Relação de Évora que julgou o agravo e a apelação, referentes respectivamente a 
 uma decisão sobre nulidades por eles invocadas e à sentença final do Tribunal 
 Judicial da Comarca de Silves.  A Relação julgou improcedente o agravo e 
 parcialmente procedente a apelação.  Não se conformando com esta decisão, os 
 expropriados interpuseram recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, fazendo 
 logo notar que, se tal decisão fosse julgada irrecorrível, o recurso deveria 
 considerar-se interposto para o Tribunal Constitucional.
 Ora, o Supremo Tribunal de Justiça não chegou sequer a apreciar a 
 recorribilidade do acórdão da Relação.  Como os expropriados não apresentaram 
 alegações, julgou deserto o recurso.  E só apreciou a admissibilidade do recurso 
 apresentado pelo Ministério Público.
 Notificados da decisão que julgou deserto o recurso no STJ, os interessados 
 vieram «manter e reafirmar» o teor do requerimento de interposição do recurso, 
 pedindo que o Tribunal Constitucional o apreciasse.
 Mas põe-se a questão de saber se, tendo o recurso para o STJ sido julgado 
 deserto, pode agora o recorrente retomá-lo perante o Tribunal Constitucional.
 O recurso é interposto nos termos do artigo 70.º n.º 1, alínea b), da LTC 
 
 (decisão que aplicou norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada 
 durante o processo).  Mas os recursos deste tipo só podem ser admitidos depois 
 de esgotados os recursos ordinários (n.º 2 do mesmo artigo).
 Em conformidade com a orientação jurisprudencial do Acórdão n.º 8/88, Diário da 
 República, II Série, de 15 de Março de 1988, que apreciou uma situação 
 semelhante, entende-se que só quando o recurso foi julgado deserto no STJ é que 
 ficaram esgotados os recursos ordinários que no caso cabiam da decisão da 
 Relação (artigo 70.º, n.º 2, da LTC).
 Assim, e embora o STJ não tivesse chegado a pronunciar-se sobre a 
 admissibilidade do recurso — uma vez que o julgou deserto —, o recorrente estava 
 ainda em condições de recorrer da decisão da Relação para o Tribunal 
 Constitucional.  O requerimento através do qual retomou a questão de 
 inconstitucionalidade que não chegara a ser apreciada no STJ deve ser 
 considerado como interposição de recurso, e foi apresentado tempestivamente.
 
  
 
 4 — Uma segunda questão prévia diz respeito ao âmbito material do recurso: como 
 este foi interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, só pode 
 ter por objecto decisões que o tribunal a quo tenha efectivamente aplicado, e 
 cuja inconstitucionalidade os recorrentes tenham suscitado durante o processo.
 Mas nem todas as normas que os recorrentes pretendem submeter à apreciação deste 
 Tribunal preenchem aquelas condições.
 Os recorrentes não suscitaram durante o processo a questão da 
 inconstitucionalidade do artigo 8.º, n.º 1, alínea s), do Código das Custas 
 Judiciais (valor do recurso para efeito de custas).  Quando recorreram para a 
 Relação de Évora, apenas invocaram a ilegalidade e inconstitucionalidade da 
 decisão de primeira instância (Parte V — Conclusões, fls. 194 v).  Só no STJ é 
 que invocaram a inconstitucionalidade da norma, depois de o recurso ter sido 
 julgado deserto (quando o relator daquele Tribunal os convidou a indicar as 
 normas que consideravam inconstitucionais).  Ou seja, só invocaram a questão 
 depois de proferida a decisão recorrida.  Portanto, tal questão não pode ter-se 
 por suscitada durante o processo.
 O mesmo se passa quanto à questão da inconstitucionalidade da norma do artigo 
 
 126.º, n.º 2, do Código das Custas Judiciais, a qual, aliás, não chegou a ser 
 aplicada mesmo implicitamente — pelo Tribunal recorrido.  Tal norma dispõe que 
 
 «as custas devidas pelo expropriado saem do produto da expropriação».  É 
 manifesto que estamos aqui perante uma regra relativa à elaboração da conta de 
 custas; mas a conta relativa a estes autos não foi ainda elaborada (só o será a 
 final, pelo tribunal de primeira instância — cfr. artigo 126.º, n.º 1, do 
 referido Código), pelo que não se pôs ainda sequer a questão da aplicação da 
 norma em causa.  Note-se que, depois de elaborada a conta, dela cabe reclamação 
 para o juiz, e da decisão deste cabe ainda recurso, nos termos do artigo 138.º, 
 n.º 3, 139.º e 140.º do Código das Custas Judiciais.
 Também não pode considerar-se suscitada durante o processo a questão da 
 inconstitucionalidade das normas dos artigos 523.º, 524.º e 580.º do CPC (regras 
 relativas à produção de prova documental e aos impedimentos dos peritos).  Esta 
 questão também só foi colocada depois de proferida a decisão recorrida (da 
 Relação), tendo portanto o recorrente deixado passar a oportunidade de a ver aí 
 apreciada.
 Os recorrentes consideram também inconstitucional todo o Decreto-Lei n.º 
 
 387-B/87, de 29 de Dezembro, que regula o apoio judiciário — não identificando, 
 no entanto, qualquer norma em particular.
 Ora, desde logo, não poderia considerar-se idoneamente suscitada uma questão de 
 inconstitucionalidade relativa ao diploma no seu todo, sem um mínimo de 
 especificação das normas impugnadas (ver, sobre esta matéria, nomeadamente, o 
 Acórdão n.º 170/92, Diário da República, II Série, de 18 de Setembro de 1992, e 
 o Acórdão n.º 253/93, inédito).  De facto, a necessidade de tal especificação 
 resulta do artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição e do artigo 75.º-A, 
 n.º 1, da LTC.  O requerente, convidado, nos termos do n.º 5 deste último 
 artigo, a fazer tal indicação, não colmatou tal deficiência do requerimento do 
 recurso, pelo que, também por este motivo, ele não poderia ser admitido 
 relativamente a esta matéria.
 E, por outro lado, a decisão recorrida não aplicou nenhuma norma deste diploma, 
 o que obstaria também à sua admissão.  Os recorrentes pediram apoio judiciário 
 no Tribunal de Relação de Évora, pedido que foi julgado parcialmente procedente 
 por despacho de 25 de Junho de 1992.  Tal despacho é que aplicou disposições 
 daquele decreto-lei; mas, como não foi impugnado, transitou em julgado.  Era 
 dele, e não do acórdão que apreciou o mérito da causa, que deveriam ter 
 recorrido, para apreciação desta matéria.
 Quanto às disposições do Título iv do Código das Expropriações aprovado pelo 
 Decreto-Lei n.º 845/76, de 11 de Dezembro, e pelas razões anteriormente 
 referidas, só podem ter-se em conta as que os recorrentes especificaram, depois 
 de para o efeito terem sido convidados nos termos do artigo 75-A, n.º 5, da LTC: 
 os artigos 27.º, n.º 2, 28.º, n.º 1, bem como os artigos 61.º, 73.º, n.º 2, face 
 ao artigo 82.º, n.º 1, do diploma.  No entanto, destas normas, só foi suscitada, 
 durante o recurso, a inconstitucionalidade do artigo 73.º, n.º 2 (alegações da 
 apelação para a Relação de Évora, fls. 189).  Nas alegações do agravo para a 
 Relação (fls. 147 v e 148 v), haviam suscitado a inconstitucionalidade dos 
 artigos 30.º e 33.º, mas não retomaram tal questão no recurso para o Tribunal 
 Constitucional, pelo que tais normas não podem ser aqui examinadas (de qualquer 
 forma, sempre se dirá que o artigo 30.º não foi aplicado pela decisão recorrida, 
 pois, como aí se refere, foram declarados inconstitucionais, com força 
 obrigatória geral, os seus n.os 1 e 2     — Acórdãos do Tribunal Constitucional 
 n.os 131/88 e 52/90, Diário da República, I Série, de 29 de Junho de 1988 e de 
 
 30 de Março de 1990).  No mais, apenas alegaram que o relatório e as respostas 
 dos peritos, bem com o despacho do juiz são inconstitucionais não tendo invocado 
 a inconstitucionalidade de qualquer norma que este último tivesse aplicado (fls. 
 
 126 v, 206 v e 207 v).
 
  
 
 5 — Assim, e em conclusão, o presente recurso tem por objecto apenas a 
 apreciação da inconstitucionalidade da norma do artigo 73.º, n.º 2, do Código 
 das Expropriações de 1976 (Decreto-Lei n.º 845/76, de 11 de Dezembro).  Esta 
 norma já foi apreciada no Acórdão n.º 209/95, ainda inédito.  Não havendo razões 
 para adoptar conclusões diversas daquelas a que o Tribunal aí alcançou, bastará 
 expô-las aqui no essencial.
 
  
 
 6 — O artigo 73.º do Código das Expropriações de 1976 dispõe sobre o recurso da 
 decisão arbitral proferida na fase administrativa do processo de expropriação.  
 Segundo o n.º 1 deste artigo, «no requerimento de interposição do recurso, o 
 recorrente exporá logo as razões da discordância com a decisão arbitral, 
 oferecendo todos os documentos, requerendo as demais provas e designando o seu 
 perito».  E o n.º 2 estabelece o seguinte:
 
  
 Não é admissível a prova testemunhal, sem prejuízo de o juiz poder requisitar 
 qualquer pessoa para depor, sempre que o repute indispensável.
 
  
 Segundo os recorrentes, esta «inadmissibilidade da prova testemunhal em processo 
 expropriativo é uma restrição ou proibição inconstitucional, na medida em que se 
 opõe aos artigos 62.º, n.º 2, e 13.º da Lei Fundamental e ao artigo 82.º, n.º 1, 
 do Decreto-Lei n.º 845/76 que se refere a diligências de prova, no plural e não 
 no singular».  Violará também os artigos 12.º, n.º 1, 18.º, 20.º, n.º 1, 205.º, 
 n.º 2, e 207.º da Constituição.
 Deixando de lado a eventual contradição entre os artigos 73.º, n.º 2, e 82.º, 
 n.º 1, do diploma, por não se tratar de questão de inconstitucionalidade (não 
 tendo portanto o Tribunal Constitucional competência para sobre ela se 
 debruçar), examinemos a conformidade daquela primeira disposição com as 
 mencionadas normas constitucionais.
 
  
 
 7 — É preciso observar que aquela disposição não veda de todo a possibilidade de 
 produção de prova testemunhal.  Confere ao juiz a possibilidade de ouvir 
 qualquer depoimento, sempre que o considerar necessário.  Apenas impede que esse 
 depoimento seja obrigatoriamente produzido sempre que as partes lho requeiram.  
 Como se refere no acórdão recorrido, «a razão de ser do princípio ínsito no n.º 
 
 2 do artigo 73.º reside no facto de a avaliação ser o tipo de prova mais 
 indicado para determinação do valor dos bens a expropriar, uma vez que a 
 expropriação implica e exige a posse e capacidade de manejo de conhecimentos 
 especiais que, em regra, não se encontram ao alcance do comum das pessoas (cfr. 
 Acórdão da Relação de Évora de 25 de Junho de 1992, na Colectânea de 
 Jurisprudência, tomo iii, p. 343, que decidiu caso semelhante ao dos autos, e 
 Guia das Expropriações, de Goucha Soares e Sá Pereira, ed. de 1976, p. 75)».
 
  
 
 8 — Conforme este Tribunal Constitucional expôs no já citado Acórdão n.º 209/95:
 
  
 Na verdade, não se vê que o artigo 62.º, n.º 2, da Constituição, ou os artigos 
 
 13.º e 20.º, n.º 1, desta, tornem inconstitucional o n.º 2 do artigo 73.º do 
 referido Código das Expropriações.  No processo de expropriação litigiosa, o 
 legislador pretende que seja determinada com rigor a justa indemnização devida 
 ao expropriado.  O meio de prova por excelência para alcançar tal desiderato 
 há-de ser a prova pericial, na fase do recurso interposto da decisão arbitral, 
 proferida antes da remessa dos autos ao tribunal judicial.  Como se exprime o 
 artigo 388.º, 1.ª parte, do Código Civil, «[a] prova pericial tem por fim a 
 percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários 
 conhecimentos especiais que os julgadores não possuem […].
 
 […]
 Importa acentuar que o direito de acesso à justiça comporta indiscutivelmente o 
 direito à produção de prova (cfr. M. Teixeira de Sousa, As partes, o Objecto e a 
 Prova na Acção Declarativa, Lisboa, 1995, pp. 228 e segs.).  Tal não significa, 
 porém, que o direito subjectivo à prova implique a admissão de todos os meios de 
 prova permitidos em direito, em qualquer tipo de processo e relativamente a 
 qualquer objecto do litígio, ou que não sejam possíveis limitações quantitativas 
 na produção de certos meios de prova (por exemplo, limitações a um número máximo 
 de testemunhas arroladas por cada parte).
 Bastará percorrer as normas de direito probatório constantes do Código Civil ou 
 do Código de Processo Civil para verificar que há diversas proibições de 
 utilização de certos meios de prova cuja constitucionalidade nunca foi posta em 
 causa.  Assim, quanto à prova confessória, há casos em que a lei a considera 
 insuficiente para provar certos factos (por exemplo, um negócio jurídico solene 
 em que sejam exigidas formalidades ad substantiam) ou inadmissível (por exemplo, 
 por recair sobre facto cujo reconhecimento ou investigação a lei proíba ou sobre 
 factos relativos a direitos indisponíveis — artigo 354.º do Código Civil).  
 Também quanto à prova testemunhal, a mesma é considerada inadmissível quando a 
 declaração negocial tiver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada 
 por escrito, ou ainda quando o facto probando estiver «plenamente provado por 
 documento ou outro meio com força probatória plena» (artigo 393.º, n.º 2, do 
 Código Civil; vejam-se, porém, os artigos 393.º, n.º 3, e 394.º do mesmo 
 diploma).  Especialmente impressivo é o caso da prova do acordo simulatório e do 
 negócio simulado: a prova testemunhal só é admissível se for um terceiro a 
 arguir a simulação, mas já não é admissível quando esse acordo ou o negócio 
 simulado forem invocados pelos próprios simuladores (artigo 394.º, n.os 2 e 3, 
 do Código Civil).
 Em muitos destes casos, a inadmissibilidade, estabelecida pela lei, de prova 
 testemunhal tem como fundamento o juízo do legislador sobre as graves 
 consequências de um testemunho inverídico, dada a especial falibilidade desse 
 meio probatório.  Tais casos de inadmissibilidade têm, porém, natureza 
 excepcional e hão-de ter uma justificação racional.
 Ora, no processo expropriativo, o legislador entende que, havendo uma decisão 
 arbitral que fixa o valor da indemnização, no recurso dela interposto, a 
 impugnação do quantum indemnizatório implicará uma prova pericial exigente.  
 Estando em causa a fixação do valor do bem ou direito expropriados — fixação que 
 começou por ser feita na fase arbitral — o juiz há-de valorar em especial a 
 prova pericial, visto que os peritos são encarregados pelo tribunal de 
 transmitir a este informações que devem colher, nomeadamente utilizando certos 
 conhecimentos de natureza técnica (artigo 388.º do Código Civil).  Sabendo-se 
 que as testemunhas transmitem conhecimentos casualmente adquiridos, bem se 
 compreende a enorme falibilidade do respectivo testemunho, nomeadamente quando 
 está em causa a transmissão ao tribunal de informações sobre valores do mercado 
 imobiliário, devendo a prova desses valores assentar, por regra, em documentos 
 autênticos (como as alienações dos bens imóveis estão sujeitas a escritura 
 pública, os valores dos preços constam desses documentos; só quanto aos 
 contratos preliminares falta, em regra, a publicidade registral, podendo 
 admitir-se a vantagem de produção de prova testemunhal, ainda que muito falível, 
 dado o carácter reservado, ou mesmo confidencial, da celebração de muitos 
 contratos-promessas).
 A opção do legislador constante da norma impugnada não se afigura arbitrária ou 
 irrazoável.  Como a fixação do valor de avaliação do bem expropriado, necessária 
 para a atribuição do quantum indemnizatório, na fase de recurso há-de ser feita 
 pelo juiz, que assim vai apreciar criticamente o outro valor a que se chegou no 
 juízo arbitral, entendeu o legislador que os meios probatórios especialmente 
 atendíveis deveriam ser a perícia, os documentos e a própria inspecção judicial. 
 
  No que toca à prova pericial, o legislador entendeu que, em vez da opinião do 
 
 «homem comum» ou a do «bom pai de família» — opiniões expressas em depoimentos 
 de testemunhas — importava privilegiar a intervenção de peritos, por estes 
 disporem de conhecimentos especiais que os julgadores não possuem por regra.  
 Mas deixou, sempre, ao critério do juiz a audição de prova testemunhal.
 Acrescente-se que a prova testemunhal sobre o valor de mercado de um bem não 
 será susceptível, no comum dos casos, de esclarecer cabalmente o julgador, 
 atentos os outros meios probatórios a que pode recorrer (prova documental, prova 
 pericial e inspecção judicial).  Seja como for, a lei não veda em absoluto a 
 prova testemunhal no processo expropriativo.  Na verdade, a lei confere um poder 
 discricionário para ouvir o depoimento de pessoas que não sejam peritos, sempre 
 que o repute indispensável, podendo valorar livremente esses depoimentos, tal 
 como os laudos periciais (artigo 389.º do Código Civil).
 Considerada globalmente a regulamentação dos meios probatórios no processo de 
 expropriação, afigura-se que não é desproporcionada ou arbitrária a solução 
 limitativa constante do n.º 2 do artigo 73.º do Código das Expropriações de 
 
 1976, porque tem justificação material, atendendo à natureza do litígio em causa 
 e à fase processual de recurso em que não ocorre a mesma limitação.
 
  
 
 9 — A norma em apreço não viola, pois, os artigos 13.º, 20.º, n.º 1, e 62.º, n.º 
 
 2, da Constituição.  Também não se vê em que poderia violar os artigos 12.º, n.º 
 
 1 (princípio da universalidade dos direitos fundamentais), 18.º (força jurídica 
 respectiva), 205.º, n.º 2 (função jurisdicional), e 207.º (apreciação da 
 inconstitucionalidade pelos tribunais) — nem os recorrentes justificam tal 
 alegação.
 
  
 
 10 — Resta examinar a questão da litigância de má fé.
 O Ministério Público pede a condenação dos recorrentes por litigância de má fé, 
 por terem alegado perante o Tribunal que «os peritos designados judicialmente 
 receberam ‘ordens expressas’, ‘terminantes e antecipadas’ do Estado (DGEMN) para 
 só pagarem o terreno a 250$00/m2, limitando-se a fazer aquilo que a respectiva 
 Direcção-Geral lhes disse para fazer, de forma a atribuirem um valor irrisório e 
 ridículo aos terrenos».
 Na sua resposta, os recorrentes mantêm o teor das afirmações feitas, 
 acrescentando que «os peritos declararam, perante testemunhas, que o Estado lhes 
 impôs o preço de 250$00/metro quadrado», e pedindo que o Tribunal oiça tais 
 testemunhas.
 
  
 Diz-se litigante de má fé, nomeadamente, «o que tiver conscientemente alterado a 
 verdade dos factos ou omitido factos essenciais e o que tiver feito do processo 
 ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de 
 conseguir um objectivo ilegal ou de entorpecer a acção da justiça ou de impedir 
 a descoberta da verdade» — artigo 456.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
 Para tal condenação ser possível, necessário se torna que existam elementos no 
 processo que provem a prática dos factos previstos nesta norma.  Nem a lei 
 processual que regula este incidente nem a lei que regula a tramitação dos 
 recursos no Tribunal Constitucional comportam a possibilidade de se ordenar a 
 realização de diligências com vista ao apuramento desses factos, se eles não 
 estiverem suficientemente comprovados nos autos.
 O próprio Ministério Público, aliás, parece admitir essa insuficiência de 
 elementos, quando refere nas suas alegações que tal comportamento dos peritos «a 
 ter-se verificado, constituiria censurável violação dos seus deveres 
 deontológicos e processuais».
 Além de que não compete ao Tribunal Constitucional ajuizar da gravidade e 
 eventuais consequências das afirmações em causa, pois tal juízo está para além 
 da apreciação do objecto do presente recurso de constitucionalidade.
 Portanto, não havendo elementos nos autos suficientes para apreciar a questão, 
 nem cabendo na tramitação especial do presente incidente proceder à realização 
 de específicas diligências de prova para o efeito, é improcedente o pedido de 
 condenação dos recorrentes como litigantes de má fé.
 
  
 III — Decisão
 
  
 
 11 — Assim, e pelo exposto, decide-se:
 
  
 
        a)   Negar provimento ao recurso.
 
        b)   Não condenar os recorrentes por litigância de má fé.
 
  
 Lisboa, 8 de Novembro de 1995. — Luís Nunes de Almeida — Guilherme da Fonseca — 
 Messias Bento — José de Sousa e Brito — Bravo Serra (vencido quanto à primeira 
 questão prévia, nos termos da declaração de voto junta) — Fernando Alves Correia 
 
 (vencido.  Propendo, neste momento, a entender, quanto à primeira questão 
 prévia, pelo essencial dos fundamentos constantes da Acórdão da 1.ª Secção n.º 
 
 282/95 que, in casu, não houve exaustão dos recursos ordinários, pelo que não se 
 devia tomar conhecimento do recurso) — José Manuel Cardoso da Costa (Quanto à 
 primeira questão prévia, tomei posição diversa, da perfilhada no presente 
 aresto, no Acórdão n.º 8/88, embora já aí com alguma dúvida.  Dúvida que, não 
 tendo voltado a considerar detidamente o problema, não resolvi ainda — pelo 
 menos em termos de aderir definitivamente à solução adoptada).
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO  DE  VOTO
 
  
 Votei no sentido de se não tomar conhecimento do objecto do presente recurso, 
 por isso que, na minha óptica, tendo o recurso interposto pelos expropriados 
 para o Supremo Tribunal de Justiça sido julgado deserto e, consequentemente, não 
 se tendo aquele Alto Tribunal debruçado sobre o mesmo (ainda que eventualmente 
 no sentido de saber se ele seria ou não admissível), não poderia o recorrente 
 retomá-lo perante o Tribunal Constitucional.
 
 É que, na minha perspectiva, desenha-se aqui um caso de não exaustão dos 
 recursos ordinários.
 Não desconheço, certamente, a orientação jurisprudencial firmada por intermédio 
 do Acórdão n.º 8/88, citado no texto do Acórdão de que faz parte integrante a 
 presente declaração.
 Todavia, tal orientação, aliás contrariada no Acórdão n.º 282/95, não me parece 
 que deva ser a mais correcta.
 Para tanto, baseio-me, no essencial, quer na argumentação carreada na declaração 
 de voto aposta àquele Acórdão n.º 8/88 pelo Ex.mo Conselheiro Cardoso da Costa, 
 quer na exposição do Relator para que remete o Acórdão n.º 282/95.
 A essas argumentações adito que não me convencem considerações no sentido de o 
 recorrente que desiste do recurso ordinário ou que assume uma atitude que leva a 
 que esse recurso venha a ser julgado deserto (verbi gratia por falta de 
 apresentação de alegação ou por falta de pagamento de preparo) está, ao fim a ao 
 cabo, a renunciar a que o mérito da causa não mais venha a ser objecto de 
 reapreciação por banda da ordem dos tribunais das várias ordens judiciárias, 
 visto que aquilo que unicamente pretende saber é o desfecho sobre a questão de 
 constitucionalidade que suscitou e, consequentemente, nada obstaria a que se 
 aceitasse o recurso de constitucionalidade.
 Na verdade, tais considerações olvidam que, a ser decidida pelo Tribunal 
 Constitucional a questão de constitucionalidade em sentido favorável ao 
 recorrente, necessariamente a decisão do tribunal que se debruçou sobre o fundo 
 da causa terá de ser reformada em obediência com o juízo de 
 inconstitucionalidade que foi formulado pelo primeiro.  Ora, na sequência dessa 
 reforma, e porque se trata de uma nova decisão, torna-se claro que ao então 
 peticionante do recurso de constitucionalidade (e que neste obteve ganho de 
 causa) ainda é possível interpôr recurso quanto à causa e, desta sorte, obter 
 veredictos dos tribunais das superiores instâncias da ordem judiciária em 
 questão, que, anteriormente, foram, pelo mesmo recorrente e em virtude da sua 
 actuação (consistente em “desistir” do recurso ordinário antes de conseguir uma 
 decisão já definitiva, sobre a questão de constitucionalidade obter), 
 
 «despojados» do seu «dever/direito» de terem uma palavra sobre tal questão, 
 assim almejando que o Tribunal Constitucional viesse, quase em única via, a ter 
 a primeira palavra sobre essa mesma questão, o que equivale, na minha maneira de 
 ver as coisas, a defraudar objectivamente o que se estatui no n.º 2 do artigo 
 
 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.
 Estas, em mui em síntese, as razões que me levaram a votar pelo não conhecimento 
 do objecto do recurso. — Bravo Serra.
 
  
 
  
 
 (1)   Acórdão publicado no Diário da República, II Série, de 14 de Março de 
 
 1996.