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Processo: nº 139/93.
 Plenário
 Relator: Conselheiro Ribeiro Mendes.
 
   
 
  
 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional:
 
  
 I
 
  
 
 1 — O Ministro da República para a Região Autónoma da Madeira veio requerer, em 
 
 2 de Março de 1993, a apreciação da legalidade, em processo de fiscalização 
 abstracta ao abrigo da alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição, das 
 normas constantes dos quatro artigos do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, 
 de 5 de Fevereiro, face ao disposto no artigo 28.º do Estatuto Político 
 Administrativo da Região Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 
 de Junho.
 Esse pedido apoia-se numa fundamentação contida nos cento e vinte e dois artigos 
 do respectivo requerimento, onde se analisam detalhadamente os regimes 
 remuneratórios dos Deputados à Assembleia da República e dos deputados 
 regionais.
 Transcreve-se apenas a síntese conclusiva do pedido:
 
  
 
        a)   O artigo 1.º do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M não 
 corresponde a uma adaptação, prevista no artigo 28.º do EPA [Estatuto 
 Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira], do regime legal do 
 estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da República — nomeadamente do 
 disposto no artigo 16.º da Lei n.º 4/85, de 9 de Abril — mas cria um estatuto 
 remuneratório próprio dos deputados regionais, incorrendo, assim, em vício de 
 ilegalidade, por violação do mencionado normativo do EPA.
 
        b)   O artigo 2.º ao criar, para os vice-presidentes da Assembleia 
 Legislativa Regional da Madeira, um vencimento mensal próprio, sem 
 correspondência no estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da 
 República, não procede à adaptação deste estatuto, e, por conseguinte, também 
 viola o disposto no artigo 28.º do EPA.
 
        c)   O n.º 1 do artigo 3.º, inobservando o enquadramento legislativo que 
 devia respeitar (nomeadamente o disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 15.º da Lei 
 n.º 3/85, de 13 de Março, na redacção dada pela Lei n.º 94/89, de 29 de 
 Novembro), não fixa nem estabelece qualquer conexão com as disposições legais 
 que determinam os subsídios dos Deputados à Assembleia da República, violando, 
 por isso, para além do normativo referenciado, ainda o artigo 28.º do EPA.
 
        d)   O n.º 2 do mesmo artigo 3.º, ao estatuir que os princípios gerais a 
 que obedece a atribuição dos subsídios aos deputados são fixados por deliberação 
 da Mesa da Assembleia Legislativa Regional, inobserva o quadro normativo atrás 
 citado, violando, da mesma forma, o artigo 28.º do EPA.
 
        e)   O artigo 4.º, ao atribuir o direito à remuneração, para o exercício 
 das funções de deputado na nova Assembleia Legislativa Regional, em relação a um 
 período em que ainda não se tinha dado início a tais funções, ofende o princípio 
 geral do direito à remuneração, consagrado no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 
 
 353-A/89, de 16 de Outubro, que, inevitavelmente, integra o estatuto 
 remuneratório dos Deputados à Assembleia da República, e, assim, viola o 
 estatuído no artigo 28.º do EPA.
 
        f)   E ainda que se defendesse que a adaptação a fazer não é a do 
 estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da República, no sentido 
 exposto, mas antes uma mera adaptação de resultado — quantidade remuneratória —, 
 também nessa óptica se afigura que, para além dos vícios já apontados, o 
 disposto nos artigos 1.º, 2.º e 3.º do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, 
 na forma como foram ali determinadas as componentes retributivas dos deputados 
 regionais, desrespeitou os princípios gerais da proporcionalidade, da equidade e 
 da harmonia remuneratória, integrantes daquele estatuto, violando, com isso, o 
 estatuído no artigo 28.º do EPA.
 
        g)   Aliás, mesmo a entender-se — o que parece de excluir — que o 
 disposto nos artigos 1.º e 2.º do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, pelo 
 seu teor, integra-se num campo legítimo de actuação, na medida em que 
 consubstancia uma definição do estatuto remuneratório dos deputados e dos 
 vice-presidentes da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, feita com base 
 na analogia ao regime legal vigente para a generalidade dos titulares de cargos 
 políticos, tal, porém, não caberia no âmbito da competência legislativa da 
 Assembleia Legislativa Regional, mas sim no do exercício do seu poder de 
 iniciativa estatutária, consagrado nos artigos 228.º, n.º 1, e 229.º, n.º 1, 
 alínea e), da Lei Fundamental. Consequentemente, a inclusão daquelas normas no 
 diploma legislativo regional, em ultrapassagem ao limite traçado pelo artigo 
 
 28.º do EPA da Região, ainda estaria a infringir o disposto na alínea l) do 
 artigo 167.º e no n.º 5 do artigo 233.º, ambos da Constituição, e, com isso, a 
 ofender a reserva absoluta de competência da Assembleia da República.
 
  
 Depois de concluir pedindo a declaração de ilegalidade, com força obrigatória 
 geral, do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, de 5 de Fevereiro, na 
 totalidade das suas normas, com fundamento na violação do artigo 28.º do 
 Estatuto Político-Administrativo desta Região, solicita a entidade peticionária 
 que seja ponderada a conveniência da utilização da faculdade prevista no n.º 4 
 do artigo 65.º da Lei do Tribunal Constitucional (determinação pelo Presidente 
 do Tribunal Constitucional do encurtamento até metade dos prazos para elaboração 
 do memorando pelo relator, para inscrição na ordem do dia e para elaboração do 
 acórdão definitivo do Tribunal), «tendo em atenção os graves reflexos de ordem 
 financeira que uma eventual declaração de ilegalidade necessariamente 
 acarretará».
 
  
 
 2 — A Assembleia Legislativa Regional da Madeira, através do seu Presidente, 
 respondeu, nos termos do artigo 54.º da Lei do Tribunal Constitucional, ao 
 pedido de declaração de ilegalidade acima transcrito, indicando as razões por 
 que entendia que o diploma em apreciação não sofria de ilegalidade.
 São, em síntese, os seguintes os fundamentos da posição do presidente do órgão 
 autor do diploma em apreciação:
 
  
 
 — A questão posta ao Tribunal Constitucional anda à volta da definição do 
 minimus e do maximus em que o legislador regional se deve mover ou colocar ao 
 aprovar um diploma que tenda a dar cumprimento ao artigo 28.º do EPA, tendo a 
 ver com a definição de dois conceitos de contornos de há muito discutidos e 
 debatidos, o de «adaptação legislativa» e o de «interesse específico regional»;
 
 — O legislador regional, face ao disposto no artigo 28.º do EPA, não está 
 impedido de reproduzir parcialmente o estatuto remuneratório dos Deputados à 
 Assembleia da República quando as normas reproduzidas sejam aplicáveis aos 
 deputados regionais, sem ofensa dos princípios diferenciadores dos dois órgãos e 
 sem que haja um interesse específico que justifique ou exija uma alteração 
 adaptadora do normativo;
 
 — O artigo 233.º, n.º 5, da Constituição refere que o estatuto dos titulares dos 
 
 órgãos de governo próprio das regiões autónomas é definido nos respectivos 
 estatutos político-administrativos, mas não resulta claro da Constituição 
 
 [artigos 120.º, 167.º, alínea l), 168.º, n.º 1, alínea g), e 233.º, n.º 5] ou da 
 lei qual o conteúdo exacto e a rigorosa extensão desse estatuto.  Acontece com 
 frequência, ao nível da legislação ordinária, que o estatuto dos titulares de um 
 cargo se não confunde com o estatuto remuneratório desses titulares (tal sucede, 
 no EPA, com o disposto nos artigos 18.º e seguintes, de um lado, e com o artigo 
 
 28.º, este último versando apenas o estatuto remuneratório dos deputados 
 regionais);
 
 — Acontece que, na versão da Constituição resultante da primeira revisão 
 constitucional, a então alínea g) do artigo 167.º considerava da exclusiva 
 competência da Assembleia da República o estatuto dos titulares dos órgãos de 
 soberania e do poder local, do Conselho de Estado e do Provedor de Justiça, 
 incluindo o regime das respectivas remunerações, ao passo que o artigo 233.º, 
 n.º 5, da Lei Fundamental não fazia qualquer referência ao regime remuneratório 
 dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas.  A ser assim, 
 o artigo 28.º do EPA seria, em termos constitucionais, um «mais» perfeitamente 
 dispensável;
 
 — A partir da segunda revisão constitucional, a alínea l) do artigo 167.º deixou 
 de fazer qualquer referência ao estatuto remuneratório dos titulares dos órgãos 
 de soberania e do poder local, bem como dos restantes órgãos constitucionais ou 
 eleitos por sufrágio directo e universal.  Seja qual for o sentido dessa 
 eliminação — não sendo o mesmo claro, quer ao nível dos trabalhos preparatórios 
 da segunda revisão, quer no plano dos comentários doutrinais — a discussão sobre 
 a questão é irrelevante para o caso sub judicio, pois que nunca será exigível 
 incluir na definição do estatuto de certo titular de cargo político mais do que 
 o regime ou critério geral das remunerações, obedecendo o artigo 28.º do EPA a 
 tal exigência;
 
 — O interesse específico a ter presente na adaptação do estatuto remuneratório 
 dos Deputados à Assembleia da República quanto aos deputados regionais pode e 
 deve ser visto em termos duma especialidade global que distingue a natureza 
 regional e de órgão não soberano da Assembleia Legislativa Regional face à 
 Assembleia da República, órgão de soberania.  Mas, a par disso, deve o mesmo 
 interesse específico ser visto em sentido restrito, em função de factos com 
 incidência e relevância próprias do funcionamento da Assembleia Legislativa 
 Regional e da Região em que ela se insere;
 
 — O artigo 1.º do diploma regional em apreciação não constitui a reprodução da 
 Lei n.º 4/85 e, designadamente, do seu artigo 16.º, n.º 1, não se percebendo a 
 crítica feita ao diploma regional por envolver, eventualmente, a adopção de 
 critérios estabelecidos para a generalidade dos titulares de cargos políticos.  
 De facto, esse artigo 1.º referencia o vencimento dos deputados regionais ao 
 vencimento do Presidente da República, estabelecendo uma percentagem (48,75%) 
 inferior à estabelecida para os Deputados à Assembleia da República (50%), o que 
 se justifica em função do interesse específico global que diferencia o órgão 
 regional de um órgão de soberania, evitando as dificuldades resultantes da 
 solução anterior (estabelecimento de uma diferença entre duas letras do regime 
 remuneratório da Função Pública, regime que veio a ser completamente alterado, 
 deixando de vigorar o sistema de letras correspondentes a vencimentos 
 diversificados);
 
 — O artigo 2.º do diploma regional não reproduziu a norma do artigo 16.º, n.º 2, 
 da Lei n.º 4/85, criando uma remuneração diversificada para os vice-presidentes 
 da Assembleia Legislativa Regional, solução que decorrerá da maior proximidade, 
 de facto e de direito, desses vice-presidentes em relação ao presidente do 
 referido órgão — por comparação com o que sucede com a Assembleia da República — 
 o que constitui uma especificidade diferenciadora.  Acresce que, na Assembleia 
 da República, há quatro vice-presidentes, ao passo que no parlamento regional há 
 só dois (daí resultando uma maior frequência nas substituições do presidente).  
 Tais vice-presidentes integram um conselho consultivo existente na Assembleia 
 Legislativa Regional, desempenhando um deles as funções de presidente daquele 
 conselho, com voto de qualidade (Decreto Legislativo Regional n.º 24/89/M, 
 alterado pelo Decreto Legislativo Regional n.º 2/93/M);
 
 — As diferenças indicadas determinam um interesse específico da Região que 
 justifica plenamente a diferenciação de vencimentos agora consagrada;
 
 — A matéria do artigo 3.º do diploma em apreciação não respeita ao estatuto 
 remuneratório, no sentido restrito e adequado da expressão, sendo certo que a 
 mesma matéria consta da Lei n.º 3/85 e não da Lei n.º 4/85.  Seja como for, 
 mesmo para os que defendem a inclusão da vertente remuneratória no núcleo do 
 estatuto do titular de certos cargos, tal matéria sempre extravasaria da 
 definição do regime geral ou dos critérios básicos de remuneração.  A Assembleia 
 Legislativa Regional é, por isso, livre de legislar nos termos que melhor 
 entender, inspirada ou não em leis da República, mas sem uma vinculação às 
 mesmas ou subordinação às suas soluções;
 
 — Em termos de rigor formal poder-se-ia ter por correcto o entendimento de que, 
 numa tarefa de adaptação dum estatuto remuneratório, não deveria o legislador 
 regional inserir, neste diploma, normas que saíssem do âmbito daquela adaptação. 
 
  Porém, não repugna que o órgão legislativo regional pudesse aproveitar o 
 diploma em apreciação para nele incluir matéria que, embora estranha a tal 
 adaptação, não deixasse de ter com ela conexão;
 
 — Não tem sentido interpretar a noção de subsídios no artigo 3.º de forma mais 
 ampla do que a constante do artigo 15.º da Lei n.º 3/85 — preceito que se refere 
 exclusivamente a subsídios de transporte — pois que resulta do n.º 3 desse 
 artigo 3.º que se manterão transitoriamente em vigor disposições que apenas 
 respeitam ao subsídio de transporte, às ajudas de custo e ao direito ao 
 transporte (que constitui uma modalidade adicional de subsídio específico devido 
 
 à sua justificação regional, tendo sido consagrado no Decreto Regional n.º 
 
 9/81/M, de 2 de Março).  Quer dizer, o n.º 3 do artigo 3.º só é compreensível na 
 medida em que o âmbito dos n.os 1 e 2 do mesmo artigo coincida com o daquele;
 
 — Tão-pouco parece ser ilegal o n.º 2 do artigo 3.º, visto o plenário da 
 Assembleia Legislativa Regional reunir com menos frequência do que o plenário da 
 Assembleia da República, pelo que solução de eficiência e celeridade sempre 
 justificaria e atribuição de competência à mesa para fixação dos subsídios.  
 Seja como for, tal matéria não integra o estatuto remuneratório dos deputados 
 regionais, constituindo antes uma franja menor que lhe é exterior e que não está 
 subordinada aos critérios e formas constantes de uma qualquer lei adaptanda, 
 acontecendo que sempre as especificidades já referidas constituiriam interesse 
 específico bastante para justificar as alterações operadas;
 
 — Como o direito à remuneração se constitui, de acordo com os princípios gerais, 
 com o início de funções dos deputados regionais, a atribuição de eficácia 
 retroactiva às disposições sobre matéria remuneratória, constante do artigo 4.º 
 do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, não sofre de nenhuma ilegalidade, 
 pois nem a retroactividade vai até um momento anterior à vigência do EPA de 
 
 1991, nem existe impedimento jurídico a que se abranjam os anteriores titulares 
 do órgão;
 
 — Ao pretender a entidade peticionária que o diploma em apreciação viola 
 princípios de equidade e de proporcionalidade constantes do Decreto-Lei n.º 
 
 184/89, de 2 de Junho, revela a mesma o erro de base de que enferma todo o seu 
 requerimento, ou seja, o de considerar a Assembleia Legislativa Regional um mero 
 
 órgão comum da Administração Pública, sujeito às leis administrativas sobre 
 funcionalismo público, sem atender a que se está perante titulares de um órgão 
 político regional;
 
 — No caso concreto dos autos e tendo em conta os resultados do labor 
 jurisprudencial e doutrinal sobre a noção de interesse específico regional, 
 sempre a existência de tal interesse se afigura indiscutível — para além do 
 disposto no artigo 28.º do EPA — por se estar perante uma matéria de interesse 
 exclusivo da região (só há deputados regionais nas Regiões Autónomas da Madeira 
 e dos Açores);
 
 — Por último, as tarefas de adaptação envolvem, necessariamente, alterações, tal 
 como acontece com o desenvolvimento de leis de bases, segundo o entendimento da 
 doutrina constitucionalista.
 
  
 
 3 — Não foi exercida pelo Presidente do Tribunal Constitucional a faculdade 
 prevista no n.º 4 do artigo 65.º da Lei do Tribunal Constitucional, não obstante 
 a sugestão feita pela entidade requerente.
 
  
 
 4 — Entretanto, na pendência deste processo e antes ainda de ter sido elaborado 
 e apresentado memorando pelo relator, deu entrada, em 26 de Novembro de 1993, na 
 secretaria do Tribunal Constitucional um pedido, formulado pelo Procurador-Geral 
 da República, de apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da 
 inconstitucionalidade da norma constante do artigo 28.º do Estatuto 
 Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei n.º 
 
 13/91, de 5 de Junho, bem como de todas as normas constantes do Decreto 
 Legislativo Regional n.º 1/93/M, de 5 de Fevereiro (Processo n.º 720/93).
 Atendendo a que, neste segundo processo, o seu objecto era parcialmente idêntico 
 ao do primeiro processo — em ambos se acham impugnadas as normas do Decreto 
 Legislativo Regional n.º 1/93/M, de 5 de Fevereiro — no despacho de admissão do 
 pedido o Presidente do Tribunal Constitucional determinou o seguinte:
 
  
 
 […] Recebidas as respostas [do Presidente da Assembleia da República e do 
 Presidente da Assembleia Legislativa Regional da Madeira], incorporem-se os 
 presentes autos [Processo n.º 720/93] no Processo n.º 139/93, ao abrigo do 
 disposto no artigo 64.º, n.º 1, daquela Lei [do Tribunal Constitucional] — do 
 que se advertirá, desde já, o Ex.mo Conselheiro Relator desse processo.  
 
 (Despacho de fls. 12, proferido em 2 de Dezembro de 1993).
 
  
 
 5 — O pedido do Procurador-Geral da República, incorporado nos presentes autos, 
 apresenta a seguinte fundamentação:
 
  
 
 — O regime do artigo 28.º do EPA, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de Junho — 
 ao dispor que a Assembleia Legislativa Regional adaptará, em função do interesse 
 específico da Região, o estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da 
 República aos deputados àquela assembleia — infringe o disposto no artigo 233.º, 
 n.º 5, da Constituição da República Portuguesa, visto que nesta última norma se 
 impõe que a definição do estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio 
 das regiões autónomas conste dos respectivos estatutos político-administrativos, 
 não sendo, desse modo, constitucionalmente legítima a devolução que, 
 relativamente à definição do estatuto remuneratório dos deputados, o preceito 
 questionado efectiva para a competência da Assembleia Legislativa Regional;
 
 — No sistema constitucional vigente, a definição (ou as alterações) do estatuto 
 dos titulares dos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas é matéria que 
 faz parte da reserva de lei estatutária (reserva de estatuto), como se julgou no 
 Acórdão n.º 92/92 do Tribunal Constitucional, proferido em sede de fiscalização 
 preventiva do diploma legislativo regional referente a «Alteração ao Estatuto do 
 Deputado».  Nesse arresto pode ler-se o seguinte: «[a] revisão constitucional de 
 
 1989, operada pela Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de Julho, continuou a 
 incluir na competência indelegável da Assembleia da República a aprovação dos 
 estatutos político-administrativos das Regiões Autónomas e, bem assim, a 
 alteração dos mesmos [cfr. artigos 164.º, alínea b), e 228.º, n.os 1 a 4].  
 Continuou também a cometer às assembleias legislativas regionais (antes 
 designadas por assembleias regionais) a elaboração dos respectivos projectos de 
 estatutos e das suas alterações [cfr. artigos 228.º, n.os 1 a 4, e 229.º, n.º 1, 
 alínea e) — alínea esta que foi acrescentada pela revisão de 1989].  E manteve a 
 exigência de que o estatuto dos titulares dos órgãos do governo regional seja 
 definido nos respectivos estatutos político-administrativos (cfr. artigo 233.º, 
 n.º 5)»;
 
 — No mesmo acórdão afirmou-se não restarem dúvidas de que «só a Assembleia da 
 República pode legislar sobre o estatuto (e suas alterações) dos titulares dos 
 
 órgãos de governo regional — maxime sobre o estatuto dos deputados regionais», 
 devendo a mesma matéria estatutária dos titulares de órgãos de governo regional 
 constar do respectivo Estatuto Político-Administrativo.  O estatuto desses 
 
 órgãos de governo regional «há-de versar ‘sobre os deveres, responsabilidades e 
 incompatibilidades’ dos titulares daqueles órgãos e, bem assim, ‘sobre os 
 respectivos direitos, regalias e imunidades’ (cfr. artigo 120.º, n.º 2)»;
 
 — Cumpre salientar que, no Acórdão n.º 92/92, foram julgados, por maioria, 
 inconstitucionais os próprios preceitos do diploma questionado pelo Ministro da 
 República que se reportavam ao estatuto remuneratório dos deputados à Assembleia 
 Legislativa Regional da Madeira, maxime os artigos 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 22.º, 
 e 24.º, n.º 2: o que bem revela que o Tribunal Constitucional entendeu ser 
 constitucionalmente inadmissível uma intervenção legislativa complementar da 
 Assembleia Legislativa Regional da Madeira, baseada precisamente no ora 
 impugnado artigo 28.º do Estatuto Político-Administrativo;
 
 — Do exposto, resulta serem também consequencialmente inconstitucionais todas as 
 normas constantes do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M — diploma que, como 
 resulta do respectivo preâmbulo, traduziu precisamente a actuação de «faculdade» 
 concedida à Assembleia Legislativa Regional da Madeira pelo citado artigo 28.º 
 do EPA: como se decidiu no Acórdão n.º 92/92 do Tribunal Constitucional, este 
 
 órgão legislativo regional não pode promover a definição ou alteração do 
 estatuto dos deputados regionais, incluindo a matéria respeitante ao respectivo 
 estatuto remuneratório, fazendo uso da sua competência legislativa «normal», já 
 que o preceito legal que serve de suporte ou de fundamento ao exercício de tal 
 faculdade está, ele próprio, viciado por inconstitucionalidade;
 
 — Mostram-se, assim, violadas as normas constantes dos artigos 164.º, alínea b), 
 
 228.º, n.os 1 a 4, 233.º, n.º 5, e 229.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da 
 República Portuguesa.
 
  
 
 5 — O Presidente da Assembleia da República limitou-se a oferecer o merecimento 
 dos autos, quanto à matéria do pedido do processo ora incorporado, respeitante 
 ao artigo 28.º do EPA, juntando os números dos Diários da Assembleia da 
 República relativos à discussão e aprovação da Lei n.º 13/91, de 5 de Junho.
 
  
 
 6 — O Presidente da Assembleia Legislativa Regional da Madeira veio, por seu 
 turno, responder, em 18 de Fevereiro de 1994, ao pedido de apreciação e 
 declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas 
 constantes dos artigos 1.º a 4.º do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, de 
 
 5 de Fevereiro, reeditando, de um modo geral, a argumentação anteriormente 
 apresentada no processo de fiscalização de legalidade em que é requerente o 
 Ministro da República para a Região Autónoma da Madeira.  Assim, reafirma-se 
 neste articulado e especificamente quanto à questão de constitucionalidade que o 
 ditame constitucional ínsito no n.º 5 do artigo 233.º da Constituição não pode, 
 de forma alguma, significar que o Estatuto Político-Administrativo da Região 
 tenha, ele próprio, de regular, por forma directa e total, a matéria atinente ao 
 estatuto remuneratório dos titulares do primeiro órgão de governo próprio desta 
 Região Autónoma, como foi posto em relevo em voto de vencido formulado pelo 
 Conselheiro António Vitorino relativamente à doutrina contida no Acórdão n.º 
 
 92/92 do Tribunal Constitucional.
 A partir do artigo 8.º da resposta do Presidente da Assembleia Legislativa 
 Regional, reproduz-se no essencial a argumentação anteriormente apresentada no 
 processo de fiscalização da legalidade, concluindo-se «pela inexistência dos 
 vícios de inconstitucionalidade que o Senhor Procurador-Geral da República no 
 seu requerimento imputa quer ao artigo 28.º do Estatuto Político-Administrativo 
 da Região Autónoma da Madeira quer ao Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, 
 não ocorrendo igualmente qualquer vício de ilegalidade relativamente às 
 disposições deste último diploma, entendendo assim a Assembleia Legislativa 
 Regional da Madeira que o Venerando Tribunal Constitucional deverá proferir 
 Acórdão que não se pronuncie pela inconstitucionalidade das disposições antes 
 citadas, atenta a sua adequação aos normativos constitucionais e legais 
 vigentes» (a fls. 213 dos autos).
 
  
 
 7 — Cumpre, pois, apreciar as normas que constituem objecto de ambos os 
 processos, por não haver razões que a tal obstem.
 
  
 II
 
  
 
 8 — Integram o objecto do pedido de apreciação e declaração, com força 
 obrigatória geral, de inconstitucionalidade formulado pelo Procurador-Geral da 
 República a norma do artigo 28.º do Estatuto Político-Administrativo da Região 
 Autónoma da Madeira, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de Junho, e as constantes 
 de todos os artigos do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, de 5 de 
 Fevereiro.
 O artigo 28.º daquele Estatuto Político Administrativo estatui o seguinte:
 
  
 A Assembleia Legislativa Regional adaptará, em função do interesse específico da 
 Região, o estatuto remuneratório dos deputados à Assembleia da República aos 
 deputados àquela Assembleia.
 
  
 Por seu turno, o Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, de 5 de Fevereiro, 
 elaborado nos termos do transcrito artigo 28.º daquele Estatuto, contém um 
 preâmbulo explicativo da disciplina constante dos seus quatro artigos.  Aí se 
 pode ler o seguinte:
 
  
 Prescreve o artigo 28.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma 
 da Madeira, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de Junho, que «a Assembleia 
 Legislativa Regional adaptará, em função do interesse específico da Região, o 
 estatuto remuneratório dos deputados à Assembleia da República aos deputados 
 
 àquela Assembleia».
 Na sequência dessa faculdade, e num sentido de maior harmonização, por um lado, 
 e clarificação da situação, por outro, é de todo o interesse e actualidade 
 rever, em matérias colaterais, alguns aspectos do estatuto remuneratório vigente 
 para os deputados desta Assembleia Legislativa.
 
  
 Os quatro artigos que compõem este diploma legislativo regional dispõem do 
 seguinte modo:
 
  
 Artigo 1.º
 
  
 Os deputados à Assembleia Legislativa Regional percebem mensalmente um 
 vencimento correspondente a 48,75% do vencimento do Presidente da República.
 
  
 Artigo 2.º
 
  
 Os Vice-Presidentes da Assembleia Legislativa Regional percebem mensalmente um 
 vencimento correspondente a 62,5% do vencimento do Presidente da República.
 
  
 Artigo 3.º
 
  
 
 1 — No exercício das suas funções, ou por causa delas, os deputados têm direito 
 a subsídios e ajudas de custo correspondentes.
 
 2 — Os princípios gerais a que obedecem os subsídios e ajudas de custo são 
 fixados por deliberação de Mesa da Assembleia, ouvida a conferência dos 
 presidentes dos grupos parlamentares e dos representantes dos partidos.
 
 3 — O disposto nos artigos 4.º do Decreto Legislativo Regional n.º 144/85/M, de 
 
 28 de Junho, e 12.º do Decreto Regional n.º 9/81/M, de 2 de Maio, mantem-se em 
 vigor até que a Assembleia delibere nos termos do número anterior.
 
  
 Artigo 4.º
 
  
 O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz 
 efeitos a partir do dia 1 de Novembro de 1992.
 
  
 
 9 — Impõe-se, de um ponto de vista lógico-jurídico, começar por abordar a 
 questão de constitucionalidade respeitante à norma do artigo 28.º do EPA.
 Na verdade, como este artigo 28.º é invocado pelo legislador regional como 
 fundamento do poder legislativo cujo exercício se traduziu na elaboração do 
 Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, a eventual declaração de 
 inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, daquela norma terá como 
 resultado a privação do fundamento invocado pelo legislador regional para a 
 edição deste último diploma.  Nessa eventualidade, caberá então apreciar a 
 questão da invocada inconstitucionalidade consequencial das normas dos 
 diferentes artigos do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M.
 Pelo contrário, se o Tribunal Constitucional vier a perfilhar um juízo de 
 conformidade constitucional relativamente ao artigo 28.º do EPA, pode   
 adiantar-se que a questão da eventual inconstitucionalidade dos quatro artigos 
 do Decreto Legislativo Regional perderá, em princípio, todo o interesse prático, 
 ainda que não se ignore a faculdade atribuída ao Tribunal Constitucional pelo 
 artigo 51.º, n.º 5, da Lei do Tribunal Constitucional.  De facto, o Decreto 
 Legislativo Regional pretende confessadamente adaptar o estatuto remuneratório 
 dos Deputados à Assembleia da República aos deputados à Assembleia Legislativa 
 Regional, «em função do interesse específico da Região».  Nessa medida, não 
 sendo inconstitucional o artigo 28.º do EPA, não se vê facilmente como poderiam 
 ser inconstitucionais os artigos do diploma regional, emanados do órgão 
 parlamentar regional, a menos que algumas soluções materiais possam ofender 
 princípios e normas constitucionais, nomeadamente os princípios da igualdade e 
 da proporcionalidade.  Por isso, haverá então que abordar a questão da eventual 
 ilegalidade destes artigos, questão que terá de ser apreciada à luz do parâmetro 
 contido na norma do artigo 28.º do EPA.  Neste caso, por não subsistir um vício 
 de inconstitucionalidade quanto às disposições do diploma regional, há que 
 apreciar os vícios de ilegalidade, determinando o grau de gravidade dos vícios 
 em presença a ordem de apreciação dos mesmos, como tem sido posto em relevo pela 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional (vejam-se os Acórdãos n.os 268/88 e 
 
 170/90, o primeiro publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 12.º Vol., 
 pp. 452 e segs., e o segundo no Diário da República, I Série, n.º 146, de 27 de 
 Junho de 1990).
 
  
 A — A questão de constitucionalidade do artigo 28.º do EPA
 
  
 
 10 — No Estatuto Provisório da Região Autónoma do Arquipélago da Madeira, 
 aprovado pelo Decreto-Lei n.º 318-D/76, de 30 de Abril, modificado pelo 
 Decreto-Lei n.º 427-F/76, de 1 de Junho, não se encontrava norma idêntica à 
 constante do artigo 28.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma 
 da Madeira, aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de Junho.
 Nesse Estatuto Provisório não estava, pois, regulamentada a matéria do estatuto 
 remuneratório dos deputados à Assembleia Regional, encontrando-se apenas uma 
 referência no sentido de que os mesmos tinham direito «aos subsídios a 
 determinar em decreto regional» (artigo 18.º, n.º 3, in fine).  Daí que tivesse 
 sido editada legislação regional na matéria (Decreto Regional n.º 3/76, de 29 de 
 Outubro).
 Este Estatuto Provisório iria ver prolongada a sua vigência até 1991 (cfr. 
 artigo 297.º da versão actual da Constituição), por se terem frustrado algumas 
 tentativas de aprovação de um Estatuto definitivo (sobre este ponto, veja-se 
 Carlos Blanco de Morais, A Autonomia Legislativa Regional, Lisboa, 1993, pp. 224 
 e segs.).
 
  
 
 11 — No Estatuto de 1991, o artigo 22.º estabelece que os deputados à Assembleia 
 Legislativa Regional da Madeira gozam, entre vários direitos e regalias, do de 
 percepção de «subsídios» que a lei prescreva [artigo 22.º, alínea d)].  Por seu 
 turno, o artigo 28.º do EPA estabelece a competência para a Assembleia 
 Legislativa Regional adaptar, em função do interesse específico da Região, o 
 estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da República aos deputados 
 
 àquela assembleia.
 Esta norma teve a sua origem no artigo 32.º da proposta de lei apresentada à 
 Assembleia da República pela Assembleia Legislativa Regional da Madeira sobre o 
 Estatuto Político-Administrativo da Região (Resolução n.º 3/90/M, de 22 de 
 Fevereiro, publicada no Diário da República, I Série, n.º 85, de 11 de Abril de 
 
 1990, e no Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 24, de 10 de Março 
 de 1990), com redacção praticamente idêntica.  Por seu turno, a norma deste 
 artigo 32.º da Proposta foi manifestamente inspirada pelo artigo 31.º do 
 Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, aprovado pela 
 Lei n.º 9/87, de 26 de Março, dele constituindo «reprodução fiel» (cfr. o 
 Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias 
 sobre a Proposta de lei n.º 134/V, apresentada pela Assembleia Legislativa 
 Regional da Madeira, in Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 43, 
 de 23 de Maio de 1990, p. 1347).
 No decurso dos trabalhos parlamentares em plenário não suscitou a mesma 
 disposição a intervenção de qualquer deputado (cfr. Diários da Assembleia da 
 República, I Série, n.º 8, de 1 de Junho de 1990, pp. 2663 e segs.; n.º 18, de 
 
 29 de Novembro de 1990, pp. 610 e segs.; n.º 42, de 15 de Fevereiro de 1991, pp. 
 
 1365 e segs.; n.º 68, de 26 de Abril de 1991, pp. 2297 e segs.).
 
  
 
 12 — Para avaliar a questão de constitucionalidade, importa atentar na evolução 
 da própria regulamentação constitucional, desde o texto primitivo da 
 Constituição de 1976.
 Na sua versão originária, a Constituição de 1976 não regulava em termos gerais o 
 estatuto dos titulares de cargos políticos.  No seu artigo 167.º, alínea u), 
 considerava matéria da exclusiva competência da Assembleia da República legislar 
 sobre a «remuneração do Presidente da República, dos Deputados, dos membros do 
 Governo e dos juízes dos tribunais superiores».  Nos termos do artigo 168.º da 
 mesma versão, a Assembleia da República podia conceder autorização ao Governo 
 para legislar sobre as matérias contempladas no artigo 167.º  Não existia, pois, 
 uma reserva absoluta e indelegável de competências legislativas da mesma 
 Assembleia, nem havia qualquer previsão para os titulares de cargos políticos 
 regionais.
 No comentário feito a esta disposição, os constitucionalistas Gomes Canotilho e 
 Vital Moreira limitavam-se a suscitar a esse propósito «a questão de saber se as 
 remunerações têm de ser fixadas por lei da AR ou se basta que esta defina as 
 regras de fixação das remunerações». (Constituição da República Portuguesa 
 Anotada, 1.ª ed., Coimbra, 1978, p. 335).
 
  
 
 13 — A partir de 1982, a primeira revisão constitucional (Lei Constitucional n.º 
 
 1/82, de 30 de Setembro) consagrou uma previsão detalhada sobre o conteúdo do 
 estatuto dos titulares de cargos políticos [cfr. Diário da Assembleia da 
 República, II Série, n.º 19 — Suplemento, pp. 432-(37) e 432(38)].
 O n.º 2 do artigo 120.º da Constituição, preceito aditado pela referida Lei 
 Constitucional n.º 1/82, passou a ter a seguinte redacção:
 
  
 A lei dispõe sobre os deveres, responsabilidades e incompatibilidades a que 
 estão sujeitos os titulares dos cargos políticos, bem como sobre os respectivos 
 direitos, regalias e imunidades.
 Reconhecendo ser complexa a densificação do conceito de «cargos políticos», 
 Gomes Canotilho e Vital Moreira sustentaram, em comentário a este novo preceito, 
 que tal conceito não podia reconduzir-se ao de «órgãos de soberania»: por um 
 lado, os titulares destes últimos «abrangem os titulares da função 
 jurisdicional, que parece não devem considerar-se titulares de cargos políticos; 
 por outro lado, os cargos políticos não se resumem aos órgãos de soberania, 
 visto que do artigo 121.º decorre que os cargos políticos não têm de ser 
 estaduais, podendo ser cargos das regiões autónomas ou do poder local». 
 
 (Constituição da República Portuguesa Anotada, 2.ª ed., 2.º vol., Coimbra, 1985, 
 p. 83).  Os mesmos constitucionalistas alertavam para o facto de que os 
 titulares de cargos políticos não eram «só aqueles que têm um estatuto 
 constitucionalmente definido de imunidades e prerrogativas; estas só vêm 
 definidas quanto aos titulares de alguns órgãos de soberania, sendo inequívoco 
 que nem só eles são titulares de cargos políticos.  A noção que melhor parece 
 corresponder à razão de ser deste preceito constitucional é aquela que considera 
 cargos políticos todos aqueles aos quais estão constitucionalmente confiadas 
 funções políticas (sobretudo as de direcção política)» (ob. cit., ibidem).
 Passou a ser, pois, isento de dúvidas que o Presidente da República, os 
 Deputados à Assembleia da República, os membros do Governo, os conselheiros de 
 Estado, os membros dos governos e das assembleias regionais, os Ministros da 
 República para as Regiões Autónomas e os membros de órgãos de poder local eram 
 qualificados como titulares de cargos políticos.  Não havia, assim, que fazer 
 apelo a normas de direito infraconstitucional para preencher esse conceito 
 
 (veja-se, por exemplo, a Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, sobre o controlo da 
 riqueza dos titulares dos cargos políticos).
 Este n.º 2 do artigo 120.º da Constituição consagrou, assim, uma «imposição 
 legiferante» (Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., 2.º vol., p. 85), no 
 sentido de os órgãos legislativos competentes concretizarem o estatuto dos 
 titulares de cargos políticos, relativamente aos aspectos indicados (deveres, 
 responsabilidades e incompatibilidades, direitos, regalias e imunidades).
 
  
 
 14 — A partir ainda da primeira revisão constitucional, a Constituição passou a 
 distinguir entre a competência exclusiva e indelegável da Assembleia da 
 República (reserva absoluta de competência legislativa) e a competência 
 exclusiva daquele órgão, mas delegável a favor do Governo, (reserva relativa de 
 competência legislativa).  O elenco dos casos de cada uma das reservas passou a 
 constar de artigos diferentes da Constituição (artigos 167.º e 168.º).
 No texto saído da primeira revisão constitucional, estabeleceu-se que integrava 
 a reserva absoluta de competência legislativa do órgão parlamentar da República 
 a edição de legislação sobre «estatuto dos titulares dos órgãos de soberania e 
 do poder local, do Conselho de Estado e do Provedor da Justiça, incluindo o 
 regime das respectivas remunerações» [artigo 167.º, alínea g)].
 Comentando este preceito, escreviam Gomes Canotilho e Vital Moreira:
 
  
 O âmbito da matéria da alínea g) surge claramente delimitado por referência aos 
 artigos 113.º e 120.º  Trata-se de definir o regime de responsabilidade dos 
 titulares dos cargos aí mencionados (nomeadamente da responsabilidade criminal), 
 bem como os deveres, responsabilidades e incompatibilidades e, reciprocamente, 
 os direitos, regalias e imunidades, incluindo o regime das remunerações (mas não 
 necessariamente a fixação do seu montante).  Curioso é notar a omissão da menção 
 dos titulares dos órgãos das regiões autónomas; todavia, o estatuto deles há-de 
 constar do respectivo estatuto regional (artigo 233.º, n.º 5), cuja aprovação 
 também pertence em exclusivo à AR [cfr. artigos 164.º, alínea b), e 228.º]. Ob. 
 cit. (2.ª ed., 2.º vol., p. 193, nota X ao artigo 167.º).
 
  
 Dos trabalhos preparatórios da primeira revisão constitucional pode retirar-se 
 que os constituintes não pretenderam incluir, na norma que iria passar a constar 
 da alínea g) do artigo 167.º da Constituição, os titulares dos órgãos das 
 Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, por entenderem que tal matéria 
 deveria antes constar dos estatutos políticos-administrativos dessas regiões, 
 também eles aprovados pela Assembleia da República, sendo embora a iniciativa 
 desses estatutos exclusivamente do órgão parlamentar regional [vejam-se as 
 intervenções dos Deputados Amândio de Azevedo e Nunes de Almeida na Comissão 
 Eventual de Revisão Constitucional, in Diário da Assembleia da República, II 
 Série, n.º 39, de 15 de Janeiro de 1982, p. 852-(65).  Passou a figurar no n.º 5 
 do artigo 233.º da Constituição, a partir de 1982 — cfr. Gomes Canotilho e Vital 
 Moreira, ob. cit., 2.º vol., pp. 353-354 e 375-376].
 A parte final da nova alínea g), relativa à inclusão na lei do «regime das 
 respectivas remunerações», provocou igualmente debate no seio da mesma Comissão 
 Eventual.  Na verdade, a proposta apresentada a esta Comissão referia a 
 expressão «incluindo as respectivas remunerações».  Suscitaram-se dúvidas entre 
 os Deputados sobre se a Assembleia da República tinha ou não de estar a fixar os 
 ordenados dos titulares de cargos políticos [confrontem-se as intervenções dos 
 Deputados Sousa Tavares, Jorge Miranda, Vital Moreira e Amândio de Azevedo 
 naquele número do Diário, pp. 852-(65) e 852-(66)].  Daí que viesse a ser 
 acolhida a proposta do Deputado Jorge Miranda de inclusão da palavra «regime» a 
 propósito das remunerações, o qual justificou a mesma, afirmando: «no estatuto 
 dos titulares compreende-se também o estatuto pecuniário, financeiro ou 
 económico.  Talvez desta forma se pudessem vencer as dificuldades.  Não se trata 
 de a Assembleia da República estar a fixar o quantitativo A, B ou C.  O que 
 interessa é que ela trace o quadro das remunerações.  Trace critério, enfim» 
 
 [mesmo Diário, p. 852-(65)].
 Após a primeira revisão constitucional foi publicada a Lei n.º 4/85, de 9 de 
 Abril, sobre o Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticos (quanto 
 
 à Madeira, veja-se o Decreto Legislativo Regional n.º 14/85/M, de 28 de Junho).
 
  
 
 15 — Na versão em vigor da Constituição, no texto resultante da segunda revisão 
 constitucional aprovada pela Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de Julho, o 
 artigo 120.º, n.º 2, manteve praticamente inalterada a anterior redacção, se se 
 descontar uma modificação de redacção num sentido simplificador (em vez de se 
 fazer referência aos deveres, responsabilidades e incompatibilidades a que estão 
 sujeitos os titulares de cargos políticos, indica-se agora os deveres, 
 responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos).
 No que toca à alínea g) do artigo 167.º da versão de 1982, a norma dessa alínea 
 passou para a alínea l) do mesmo artigo, havendo-se suprimido a referência à 
 matéria do regime remuneratório e aditado uma nova parte final:
 
  
 
 É da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as 
 seguintes matérias:
 
  
 
 ..............................................................
 
  
 l)  Estatuto dos titulares dos órgãos de soberania e do poder local, bem como 
 dos restantes órgãos constitucionais ou eleitos por sufrágio directo e 
 universal.
 
  
 Dos trabalhos preparatórios desta segunda revisão constitucional não se retira 
 que os constituintes hajam visado qualquer finalidade específica de corte com a 
 anterior solução através da supressão da referência ao regime remuneratório dos 
 titulares de cargos políticos.  Segundo a explicação do Deputado António 
 Vitorino, a redacção proposta pelo seu Partido pretendia encontrar uma 
 formulação abrangente e de ordem genérica para os titulares de cargos políticos, 
 evitando a anterior referência exemplificativa aos membros do Conselho de Estado 
 e ao Provedor de Justiça.  O mesmo Deputado reafirmou que esta alínea não 
 abrangia os titulares dos órgãos do governo das Regiões Autónomas, visto 
 competir a estas a elaboração da proposta do seu próprio estatuto (veja-se o 
 Diário da Assembleia da República, II Série, n.º 98-RC, de 8 de Maio de 1989, p. 
 
 2820; e o mesmo Diário, II Série, n.º 108-RC, de 22 de Março do mesmo ano, com 
 intervenções dos Deputados António Vitorino, Pedro Roseta, Rui Machete e José 
 Magalhães, este último chamando a atenção para o n.º 5 do artigo 233.º).  A 
 eliminação da frase «incluindo o regime das respectivas remunerações» não 
 parece, pois, revestir-se de qualquer relevância interpretativa, pois é 
 manifesto que o regime remuneratório se reconduz aos «direitos e regalias» 
 contemplados no n.º 2 do artigo 120.º [cfr. igualmente artigo 168.º, n.º 1, 
 alínea q), da Constituição].
 
 É por isso que Gomes Canotilho e Vital Moreira, ao comentarem esta alínea l) do 
 artigo 167.º da versão em vigor da Constituição, continuam a afirmar que a mesma 
 tem um âmbito «claramente delimitado por referência aos artigos 113.º e 120.º  
 Trata-se de definir o regime de responsabilidade dos titulares dos cargos aí 
 mencionados (nomeadamente da responsabilidade criminal), bem como os deveres, 
 responsabilidades e incompatibilidades e, reciprocamente, os direitos, regalias 
 e imunidades, incluindo o regime das remunerações (mas não necessariamente a 
 fixação do seu montante)».  (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª 
 ed., Coimbra, 1993, p. 666).
 
  
 
 16 — Relativamente aos titulares de cargos políticos do governo próprio das 
 Regiões Autónomas, é pacífico que a competência para a fixação do seu regime 
 estatutário não se acha prevista no artigo 167.º da Constituição, não obstante a 
 formulação extremamente abrangente da parte final de nova alínea l) («bem como 
 dos restantes órgãos constitucionais ou eleitos por sufrágio directo e 
 universal»).  A evolução do texto constitucional e a análise dos trabalhos 
 preparatórios das duas revisões constitucionais de 1982 e de 1989 fundamentam 
 esta afirmação.
 Tal competência cabe à Assembleia da República, é certo, mas a iniciativa 
 legislativa está atribuída em exclusivo às assembleias legislativas regionais — 
 
 é o que resulta dos artigos 164.º, alínea b), 228.º e 233.º, n.º 5, da Lei 
 Fundamental, como acima se referiu.
 Na verdade, o artigo 233.º da Constituição regula a matéria atinente aos órgãos 
 de governo próprio das duas regiões autónomas, esclarecendo que tais órgãos são 
 a assembleia legislativa regional e o governo regional (n.º 1).  O n.º 5 deste 
 artigo, por seu turno, estabelece que «o estatuto dos titulares dos órgãos de 
 governo próprio das regiões autónomas é definido nos respectivos estatutos 
 político-administrativos».
 Anotando este n.º 5 do artigo 233.º, escrevem Gomes Canotilho e Vital Moreira:
 
  
 O estatuto dos titulares dos órgãos de governo regional (membros da assembleia e 
 membros do governo) deve ser definido, naturalmente, pelo estatuto regional (n.º 
 
 5), respeitando os princípios constitucionais pertinentes (artigo 120.º), bem 
 como, com as devidas adaptações, os princípios deduzíveis do regime 
 constitucional dos deputados da AR e dos membros do Governo da República.  Ao 
 reservar explicitamente para o estatuto regional a definição do estatuto dos 
 titulares dos órgãos regionais, a Constituição não deixa por isso margem para 
 dúvidas de que tal matéria não cabe nem na competência legislativa reservada 
 comum da AR [v. artigo 167.º, alínea l], nem na competência legislativa 
 regional, através de decreto legislativo regional […].  Mas nada parece impedir 
 que os estatutos — que não podem «delegar» essa matéria para decreto regional — 
 sejam «regulamentados» por diploma regional.  (Constituição, 3.ª ed., pp. 
 
 873-874; vejam-se o 2.º vol. da 2.ª ed. desta obra, pp. 375-376, e Jorge 
 Miranda, Funções, Órgãos e Actos do Estado, Lisboa, 1990, pp. 84-85).
 
  
 
 17 — Resta, pois, inquirir se a norma do artigo 28.º do EPA é conforme ao 
 disposto no n.º 5 do artigo 233.º da Constituição, entendida esta última norma 
 em conexão com n.º 2 do artigo 120.º da Lei Fundamental.
 Para responder a tal interrogação, importa determinar se a fixação do regime 
 remuneratório dos titulares dos órgãos de governo próprio pode ser delegada pelo 
 próprio estatuto político-administrativo na assembleia legislativa regional, 
 através de decreto legislativo regional, sem consagração dos critérios 
 substanciais da futura fixação, limitando-se o estatuto a fazer uma referência 
 genérica ao estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da República, a 
 adaptar em função do interesse específico da Região.  A adaptação há-de ser 
 entendida aqui como a adequação ou o ajustamento de um certo modelo, aplicável a 
 certos titulares de cargos políticos, a outros titulares.
 Desde já afirma o Tribunal Constitucional que o artigo 28.º do EPA se acha 
 afectado de inconstitucionalidade.
 Com efeito, a Constituição exige que o estatuto desses titulares de órgãos de 
 governo próprio regional se ache definido no estatuto político-administrativo.  
 Há, pois, uma reserva de lei estatutária na matéria.  A definição desse estatuto 
 tem de abranger os deveres, as responsabilidades e incompatibilidades desses 
 titulares, bem como os respectivos direitos, regalias e imunidades.  O estatuto 
 remuneratório ou regime de remuneração abrange um conjunto de direitos e 
 regalias.  Por isso, a definição desse regime remuneratório há-de ser aprovada 
 pela Assembleia da República, por iniciativa do orgão legislativo regional, por 
 força dos artigos 164.º, alínea b), 228.º, e 233.º, n.º 5.
 Ora, a norma em apreciação não chega a definir o estatuto remuneratório dos 
 deputados à Assembleia Legislativa Regional da Madeira.
 De facto, pode desde logo entender-se que, no artigo 28.º do EPA, não procede o 
 legislador estatutário à indicação de um critério suficientemente preciso do 
 modo de determinação do quantum remuneratório a que têm direito os deputados 
 regionais, limitando-se a consagrar um certo modelo remuneratório concreto, a 
 partir do qual a legislação regional levará a cabo uma adaptação: trata-se do 
 modelo remuneratório dos Deputados à Assembleia da República, o que implica que 
 os deputados regionais terão direito a um vencimento mensal, a abonos para 
 despesas de representação, a ajudas de custo e aos demais abonos complementares 
 ou extraordinários estabelecidos no estatuto remuneratório dos titulares de 
 cargos políticos, hoje previsto na Lei n.º 4/85, de 9 de Abril, alterada pelas 
 Leis n.os 16/87, de 1 de Junho, 102/88, de 25 de Agosto, e 26/95, de 18 de 
 Agosto (vejam-se os artigos 2.º, n.os 1 e 2, 3.º, n.os 1 e 4, 16.º e 17.º desta 
 lei).
 Mas ainda que se leia a norma impugnada como uma remissão para o concreto 
 estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da República, apontando para 
 uma equiparação tendencial dos dois estatutos, embora susceptível de adaptações 
 
 à realidade regional a levar a cabo pelo órgão legislativo regional, nem assim 
 se pode salvar a constitucionalidade dessa norma.
 
 É que, ao estabelecer que a adaptação do modelo ou estatuto remuneratório dos 
 Deputados à Assembleia da República há-de ser feito em função do interesse 
 específico da região, a norma estatutária viola a Constituição, porque não pode 
 haver, nessa fixação do estatuto remuneratório, a consideração de um interesse 
 específico da Região, avaliado e definido pelo próprio órgão legislativo 
 regional.  Tal fixação há-de necessariamente ser estabelecida tendo em conta 
 globalmente o estatuto ou regime remuneratório dos titulares de cargos políticos 
 da República, fixado pela Assembleia da República por força da alínea l) do 
 artigo 167.º da Constituição, através de um juízo de adequação da Assembleia da 
 República, sob iniciativa da assembleia legislativa regional.  De outro modo, 
 poder-se-ia chegar a uma solução aberrante: sendo o estatuto remuneratório do 
 Ministro da República fixado pela Assembleia da República [artigos 120.º, n.º 2, 
 e 167.º, alínea l), da Constituição; artigos 1.º, n.º 2, alínea d), e 21.º da 
 Lei n.º 4/85, de 9 de Abril], a Assembleia Legislativa Regional da Madeira 
 poderia entender que a adaptação do estatuto remuneratório dos Deputados à 
 Assembleia da República relativamente aos deputados daquela assembleia, em 
 função do interesse específico regional, implicava que o vencimento dos 
 deputados regionais fosse fixado em montante superior ao dos Deputados da 
 República, em função de percentagem a determinar atendendo aos custos de 
 insularidade, ou da necessidade de serem tais remunerações superiores à do 
 Ministro da República na Região…
 Daqui se há-de concluir que, por um lado, a norma do artigo 28.º do EPA viola a 
 reserva de lei estatutária estabelecida no artigo 233.º, n.º 5, da Constituição, 
 ao delegar a competência para fixação desse estatuto remuneratório na Assembleia 
 Legislativa Regional, abstendo-se de definir suficientemente o respectivo regime 
 jurídico, e que, por outro lado, a mesma norma do artigo 28.º do EPA declina, a 
 favor da Assembleia Legislativa Regional, uma competência que, mesmo a ser 
 constitucionalmente válida tal delegação em certos limites, se tornaria inválida 
 na medida em que o exercício da mesma ficava sujeito a um critério, o do 
 interesse específico regional avaliado pelo órgão legislativo regional, para 
 adaptação do estatuto remuneratório, parâmetro que se revelava in casu 
 constitucionalmente ilegítimo, dado o órgão de onde proviria a determinação 
 desse interesse.
 Na verdade, e contrariamente ao afirmado nas duas respostas do Presidente da 
 Assembleia Legislativa Regional da Madeira, embora só haja deputados regionais 
 nas duas Regiões Autónomas, nem por isso se pode daí concluir que a matéria do 
 estatuto remuneratório desses deputados — ou a variação entre o minimus e o 
 maximus, para se utilizar uma expressão sugestiva — só diga respeito a cada uma 
 dessas regiões, de forma exclusiva.  Sendo Portugal um Estado unitário (artigo 
 
 6.º da Constituição), considera-se que a Constituição impõe que a fixação do 
 estatuto dos diferentes titulares de cargos políticos, da República e das 
 Regiões, deva obedecer a um mínimo de unidade, assegurada precisamente pela 
 intervenção da Assembleia da República na fixação dos diferenciados estatutos 
 
 [artigos 120.º, n.º 2, 167.º, alínea l), e 233.º, n.º 5].  Ora, a delegação 
 operada pelo artigo 28.º do EPA não se reveste do mínimo de densificação que 
 permita falar da fixação do núcleo essencial, que possibilitasse uma intervenção 
 legislativa complementar através de decreto legislativo regional, atenta a 
 autonomia político-administrativa, patrimonial, orçamental e financeira de que 
 gozam as regiões autónomas.
 
  
 
 20 — Este Tribunal teve, de resto, ocasião de se pronunciar, em processo de 
 fiscalização preventiva, pela inconstitucionalidade de normas de um diploma 
 enviado para assinatura ao Ministro da República da Região Autónoma da Madeira, 
 que contemplavam matéria do estatuto remuneratório dos deputados regionais 
 
 [artigos 13.º, n.º 1, alínea f), 14.º a 17.º, 22.º e 24.º, n.º 2, do diploma 
 aprovado em sessão plenária da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, em 11 
 de Fevereiro de 1992, sob o título «Alterações ao Estatuto de Deputado»].
 Pode ler-se no Acórdão n.º 92/92 deste Tribunal:
 
  
 Significa isto que as assembleias legislativas regionais, quando editarem 
 legislação ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 229.º da Constituição, se 
 hão-se mover dentro dos limites seguintes:
 
  
 a)... As matérias a tratar hão-de ser de interesse específico para a Região 
 
 (limite positivo);
 b)... Tais matérias não podem estar reservadas à competência própria dos órgãos 
 de soberania (limite negativo);
 
              c)   Ao tratar legislativamente essas matérias, as assembleias 
 legislativas regionais — para além de haverem de obedecer à Constituição — não 
 podem estabelecer disciplina que contrarie «leis gerais da República» […].
 
  
 Sendo isto assim, o que então importa saber é se a matéria — que constitui 
 objecto do diploma sub iudicio, relativa ao estatuto do deputado regional — está 
 
 (ou não) reservada à competência própria dos órgãos de soberania, maxime, à 
 competência legislativa da Assembleia da República, pois que ali «onde esteja 
 uma matéria reservada à «competência própria dos órgãos de soberania», […] não 
 há «interesse específico para as Regiões» que legitime o poder legislativo das 
 Regiões Autónomas» (cfr. Acórdão n.º 160/86, publicado no Diário da República, 
 II Série, de 1 de Agosto de 1986) […].
 
  
 Parece, pois, não restarem dúvidas de que:
 
  
 
                     a)    Só a Assembleia da República pode legislar sobre o 
 estatuto (e suas alterações) dos titulares dos órgãos de governo regional — 
 maxime sobre o estatuto dos deputados regionais (cfr. os artigos 228.º, n.º 1, e 
 
 233.º, n.º 5, da Constituição);
 
                     b)    Esse estatuto — ou seja, o estatuto dos órgãos de 
 governo regional — tem de constar do estatuto político-administrativo da 
 respectiva Região Autónoma (cfr. artigo 233.º, n.º 5);
 
                     c)    O mesmo estatuto há-de versar «sobre os deveres, 
 responsabilidades e incompatibilidades» dos titulares daqueles órgãos e, bem 
 assim, «sobre os respectivos direitos, regalias e imunidades» (cfr. artigo 
 
 120.º, n.º 2).
 
  
 O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas — 
 que deve ser moldado com respeito pelo que preceitua o artigo 120.º da 
 Constituição — é, pois, matéria que faz parte da reserva de lei estatutária 
 
 (reserva do estatuto).  E o mesmo se diga quanto às suas alterações.  (In Diário 
 da República, I Série-A, n.º 82, de 7 de Abril de 1992).
 
  
 Muito embora não fizesse obviamente parte do objecto desse processo de 
 fiscalização preventiva sobre diploma aprovado pela Assembleia Legislativa 
 Regional da Madeira o artigo 28.º do EPA, o Tribunal Constitucional afastou 
 implicitamente a aplicação de tal norma pelas mesmas razões por que se 
 pronunciou pela inconstitucionalidade das normas sobre o estatuto remuneratório 
 dos deputados regionais (vejam-se as declarações de voto de vencido dos 
 Conselheiros Alves Correia e António Vitorino).  Bastará dizer que uma das 
 normas abrangidas pelo juízo de inconstitucionalidade estabelecia o vencimento 
 dos vice-presidentes da Assembleia Legislativa, equiparando esse vencimento ao 
 dos vice-presidentes do Governo Regional (cfr. artigo 14.º do diploma; veja-se o 
 artigo 2.º do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M), ao passo que outra das 
 normas inconstitucionalizadas em 1992 se acha parcialmente reproduzida no artigo 
 
 3.º, n.º 3, do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M (cfr. artigo 22.º daquele 
 diploma).
 
  
 
 21 — Conclui-se, pois, que o artigo 28.º do EPA é inconstitucional, por violação 
 das disposições conjugadas dos artigos 164.º, alínea b), 228.º, n.os 1 a 4, e 
 
 233.º, n.º 5, da Constituição.
 
  
 B —   Questão de constitucionalidade das normas do Decreto Legislativo Regional 
 n.º 1/93/M, de 5 de Fevereiro
 
  
 
 22 — No pedido do Procurador-Geral da República, afirma-se que são «também 
 inconstitucionais todas as normas constantes do Decreto Legislativo Regional n.º 
 
 1/93/M — diploma que, como resulta do respectivo    preâmbulo, traduziu 
 precisamente a actuação da «faculdade» concedida à Assembleia Legislativa 
 Regional da Madeira pelo citado artigo 28.º do Estatuto Político Administrativo» 
 
 (a fls. 81 dos autos).
 Considera-se que é procedente o pedido também nesta parte.
 De facto, como não se acha suficientemente definido o estatuto remuneratório dos 
 deputados regionais no Estatuto Político-Administrativo em causa, não se pode 
 entender que as normas dos três primeiros artigos assumem um carácter meramente 
 executivo ou regulamentar de normação estatutária (cfr. J. Pereira Coutinho, A 
 Lei Regional e o Sistema das Fontes, Lisboa, 1988, policopiado, pp. 210 e 
 segs.). Trata-se, pelo contrário, de normação primária, editada com violação da 
 reserva de estatuto, ao abrigo do artigo 229.º, n.º 1, alínea a), da 
 Constituição.
 Bem pode dizer-se que o juízo de inconstitucionalidade do artigo 28.º do EPA se 
 alarga por identidade de razão a todas as normas do diploma regional, incluindo 
 o preceito sobre a entrada em vigor e os efeitos retroactivos (artigo 4.º).  
 Também aqui ocorre violação dos artigos 164.º, alínea b), 228.º, n.os 1 a 4, e 
 
 233.º, n.º 5, da Constituição e, autonomamente, do artigo 229.º, n.º 1, alínea 
 a), deste último diploma.
 
  
 
 23 — Alcançado o juízo de inconstitucionalidade quanto ao artigo 28.º do EPA e 
 quanto a todas as normas do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, deixa de se 
 revestir de qualquer sentido averiguar se as normas deste último diploma são 
 ilegais, face ao parâmetro constituído por um artigo do Estatuto 
 político-administrativo agora julgado inconstitucional.  A invalidade 
 constitucional da norma estatutária que servia de parâmetro ao juízo de 
 legalidade requerido priva de sentido a ulterior apreciação dessa questão de 
 legalidade.
 
  
 C —  Limitação de efeitos da inconstitucionalidade das normas do Decreto 
 Legislativo Regional n.º 1/93/M
 
  
 
 24 — O n.º 4 do artigo 282.º da Constituição confere a faculdade ao Tribunal 
 Constitucional de fixar os efeitos da inconstitucionalidade com alcance mais 
 restrito do que o previsto nos n.os 1 e 2 desse artigo, quando a segurança 
 jurídica, razões de equidade ou interesse público de excepcional relevo, que 
 deverá ser fundamentado, o exigirem.
 No presente processo, considera-se que a segurança jurídica exige que os efeitos 
 de inconstitucionalidade sejam limitados, produzindo-se apenas a partir da 
 publicação deste acórdão, a fim de evitar que tenha de haver reposição por 
 terceiros de prestações remuneratórias percebidas de boa fé.
 
  
 III
 
  
 
 25 — Deste modo e pelas razões expostas, decide o Tribunal Constitucional:
 
  
 
        a)   declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do 
 artigo 28.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, 
 aprovado pela Lei n.º 13/91, de 5 de Junho, com fundamento na violação das 
 disposições conjugadas dos artigos 164.º, alínea b), 228.º, n.os 1 a 4, e 233.º, 
 n.º 5, da Constituição, e, ainda, de todas as normas do Decreto Legislativo 
 Regional n.º 1/93/M, de 5 de Fevereiro, por violação daqueles artigos e também 
 do artigo 229.º, n.º 1, alínea a), da Constituição.
 
        b)   limitar os efeitos da inconstitucionalidade à data da publicação do 
 presente Acórdão no Diário da República.
 
  
 Lisboa, 15 de Novembro de 1995. — Armindo Ribeiro Mendes — Antero Alves Monteiro 
 Diniz — Messias Bento — Maria Fernanda Palma — José de Sousa e Brito — Maria da 
 Assunção Esteves — Alberto Tavares da Costa — Vítor Nunes de Almeida — Guilherme 
 da Fonseca — Bravo Serra (vencido de harmonia com a declaração de voto junta) — 
 Luís Nunes de Almeida.
 
  
 DECLARAÇÃO  DE  VOTO
 
  
 
  
 Na esteira da posição que assumi quanto à matéria tratada no Acórdão n.º 92/92 
 
 (publicado na I Série-A do Diário da República, de 7 de Abril de 1992), entendo 
 que, muito embora aquilo que diga respeito ao estatuto remuneratório seja 
 matéria integrante do estatuto remuneratório dos titulares de cargos políticos 
 nos termos e para os efeitos do artigo 120.º da Constituição, nem por isso 
 decorre do n.º 5 do artigo 233.º da mesma Lei Fundamental que os estatutos das 
 Regiões Autónomas tenham de regular directa e esgotantemente aquele estatuto 
 remuneratório.
 Bastará, no meu modo de ver as coisas, que em tais estatutos se definam as 
 grandes linhas base ou os critérios de fixação das remunerações a que o estatuto 
 remuneratório haja de obedecer, quer definindo-os expressamente, quer por 
 intermédio de remissão para outros vigentes estatutos, podendo, por isso e em 
 nome da autonomia política, administrativa, orçamental e financeira das Regiões, 
 intervir as respectivas assembleias legislativas no sentido de complementarem as 
 ditas linhas ou critérios, respeitado que seja o núcleo essencial que nelas ou 
 neles se contêm.
 Sendo esta a minha perspectiva, e porque leio o artigo 29.º do Estatuto 
 Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira no sentido de o critério 
 que aí se visou ser o de haver uma equiparação ou, se se quiser, uma 
 correspondência entre as remunerações dos deputados à Assembleia Legislativa 
 daquela Região e as remunerações dos deputados à Assembleia da República, com as 
 adaptações que se tornem necessárias impostas pela especificidade regional, o 
 que vale por dizer que unicamente se deixou por concretizar os valores dessas 
 remunerações — concretização que seria levada a efeito por diploma emanado da 
 Assembleia Legislativa Regional —, então sou levado a concluir que o falado 
 artigo 28.º não ofende qualquer norma ou princípio constitucional.
 Não havendo, na minha óptica, uma tal ofensa, não pude, como é óbvio, acompanhar 
 o acórdão a que a presente declaração se apendicula, tanto na vertente da 
 declaração de inconstitucionalidade da mencionada norma, como na vertente de o 
 Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, de 5 de Fevereiro, sofrer, por si e 
 também consequencialmente, de idêntico vício.
 Tenho para mim que, não padecendo o artigo 28.º do E.P.A.R.A.M. de 
 desconformidade com o Diploma Básico, nem por isso daí se segue que as normas do 
 Decreto Legislativo Regional em causa e por aquele preceito credenciado estejam 
 imunes ao vício de inconstitucionalidade.  Efectivamente, mister é que se saiba, 
 numa primeira linha, se tal corte normativa é, por si, contrária às normas e 
 princípios constitucionais e, numa segunda, se, alcançada que seja resposta 
 negativa a essa questão, se ela enferma de ilegalidade.
 Dado o modo, que acima indiquei, como interpreto o aludido artigo 28.º, 
 visionando agora os preceitos constantes do Decreto Legislativo Regional n.º 
 
 1/93/M, sou do entendimento de que o estatuído nos artigos 1.º, 3.º e 4.º mais 
 não reflecte do que uma correspondência, com a consequente concretização, entre 
 as remunerações a atribuir aos deputados à Assembleia Legislativa Regional da 
 Madeira e aqueloutras referentes aos deputados à Assembleia da República, não se 
 me afigurando que, atenta a especificidade referente à situação dos deputados 
 regionais a que o legislador regional se haveria de ater, ainda de acordo com o 
 comando constante do citado artigo, haja de efectuar qualquer censura ao que se 
 contém nos indicados artigos 1.º, 3.º e 4.º
 De outra banda, não descortino nestas disposições o que quer que seja que me 
 conduzisse a considerá-las como sofrendo de vício de ilegalidade, não me 
 convencendo, por isso, as razões adrede aduzidas pelo requerente.
 Todavia, não posso deixar de assinalar que, perante o desiderato que, no meu 
 entendimento, presidiu à edição da norma ínsita no artigo 28.º do E.P.A.R.A.M., 
 e que, como disse, não é para mim constitucionalmente       censurável, uma 
 norma, das constantes do Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M, se desenha 
 como não representando uma mera adequação ao padrão referência utilizado naquele 
 artigo 28.º
 Trata-se, como é bom de ver, do artigo 2.º daquele Decreto Legislativo.
 Tal disposição intentou, bem vistas as coisas, estabelecer uma remuneração 
 mensal específica para os vice-presidentes da Assembleia Legislativa Regional da 
 Madeira, os quais, desta arte, em razão das suas funções, não ficam limitados a 
 perceber quantitativo remuneratório principal igual ao dos restantes deputados 
 acrescido unicamente de um abono mensal para despesas de representação, 
 talqualmente sucede em relação aos vice-presidentes da Assembleia da República.
 Ora, se a intenção que presidiu ao artigo 28.º do E.P.A.R.A.M. foi aquela que já 
 deixei expressa — a de haver uma equiparação ou correspondência do estatuto 
 remuneratório dos deputados à Assembleia Legislativa Regional da Madeira com o 
 estatuto remuneratório dos deputados à Assembleia da República, deixando ao 
 
 órgão legislativo parlamentar regional a feitura da concretização valorativa 
 decorrente de meras adaptações atenta a especificidade regional —, então não é 
 para mim entendível que, em relação aos vice-presidentes da Assembleia 
 Legislativa Regional, atentos os limites que defluem da credencial estatutária, 
 se viesse a consagrar um estatuto remuneratório que difere do consagrado para a 
 Assembleia da República (cfr. artigo 16.º, n.º 2, da Lei n.º 4/85, de 9 de 
 Abril) e que, de todo em todo, não representa, a meu ver, uma mera concretização 
 de quantitativo ou uma mera adaptação do critério utilizado, quanto ao ponto, 
 para o órgão de soberania parlamentar.
 Significa isto que, para mim, ao prescrever o que prescreve, o artigo 2.º do 
 Decreto Legislativo Regional n.º 1/93/M desbordou a credencial estatutária e, 
 por isso, estatuiu em matéria que lhe não era consentida, pelo que incorreu em 
 ofensa do que se consagra nos artigos 164.º, alínea b), 228.º, n.os 1 a 4, 
 
 229.º, n.º 1, alínea a), e 233.º, n.º 5, todos da Constituição, sendo, pois, 
 aquela a única norma que, do meu ponto de vista deveria ter sido declarada 
 inconstitucional com força obrigatória geral. — Bravo Serra.
 
  
 
  
 
  
 
  
 
  
 
 (1)   Acórdão publicado no Diário da República, I Série-A, de 26 de Dezembro de 
 
 1995.