 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Proc. nº 81/94           
 
 1ª Secção
 Rel. Cons. Monteiro Diniz
 
  
 Acordam no Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 I - A questão
 
  
 
             1 - No Tribunal do Trabalho de Coimbra, em acção emergente de 
 acidente de trabalho, por sentença de 8 de Março de 1993, foi condenada a 
 seguradora Companhia de Seguros A .... a pagar ao sinistrado M..., além do mais, 
 a pensão anual e vitalícia de 98.640$00, com efeitos desde 29 de Julho de 1992, 
 fixando-se então o valor da causa em 2.224.049$50 (98.640$00 x 22,537 + 
 
 1.000$00), valor que, depois veio a ser rectificado, por despacho de 29 de Março 
 de 1993 para 2.448.948$80 (98.640$00 x 24,817 + 1.000$00) por força da alteração 
 do respectivo coeficiente.
 
             2 - A companhia seguradora levou recurso daquela decisão, do 
 despacho que rectificou o valor da acção e de um outro que, em 15 de Abril de 
 
 1993, manteve o valor corrigido, ao Tribunal da Relação de Coimbra sustentando 
 que 'o acórdão nº 61/91, do Tribunal Constitucional restringe a 
 inconstitucionalidade decretada à alinea b), do artigo 3º, da Portaria nº 
 
 760/85, deixando incólume a alínea a), do mesmo artigo 3º, que se refere ao 
 cálculo das provisões matemáticas, equivalentes ao valor da causa de harmonia 
 com o artigo 123º, nº 1, do Código de Processo do Trabalho. Assim, o cálculo do 
 valor da causa deve ser efectuado de harmonia com a alínea a), do artigo 3º, da 
 Portaria 760/85, e da sua Tabela anexa' e não, como se fez na decisão recorrida, 
 com base na tabela anexa à Portaria nº 632/71, de 19 de Novembro.
 
  
 
             Por acórdão de 25 de Novembro de 1993, o Tribunal da Relação de 
 Coimbra negou provimento ao agravo mantendo a decisão recorrida.
 
  
 
             Para tanto, ateve-se, no essencial, à fundamentação que pode ser 
 assim condensada:
 
  
 
    - O Tribunal Constitucional no acórdão nº 61/91, apenas declarou a 
 inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da alínea b) do nº 3 da 
 Portaria nº 760/85, de 4 de Outubro, sendo certo que as razões ali invocadas são 
 de aplicar à norma da alínea a), a qual também viola o artigo 55º, alínea d), da 
 Constituição, na versão de 1982 (direito de participação dos trabalhadores na 
 legislação do trabalho) e artigos 115º, 201º, alínea a) e 202º, alínea c) da 
 Constituição (princípio da precedência de lei).
 
  
 
    - Face à declarada inconstitucionalidade da alínea b) do nº 3 da Portaria nº 
 
 760/85 e tendo em conta o fim a que se destinam as provisões matemáticas, também 
 se deve ter por inconstitucional a alínea a) do nº 3 da mesma portaria.
 
  
 
    - Assim sendo, a aplicação daquela norma sempre haveria de ser recusada em 
 virtude da sua inconstitucionalidade.
 
  
 
 *///*
 
  
 
             3 - Deste acórdão, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea 
 a) da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, trouxe o Ministério Público recurso 
 obrigatório a este Tribunal.
 
  
 
             Nas alegações depois oferecidas pelo senhor Procurador-Geral 
 Adjunto, formulou-se a seguinte conclusão:
 
  
 
    1º - É inconstitucional, por violação dos artigos 55º, alínea d), e 57º, nº 
 
 2, da Constituição (versão de 1982), a norma constante da alínea a), do nº 3, 
 conjugada com o nº 1, da Portaria nº 760/85, de 4 de Outubro, por, incidindo, 
 quer directamente quer através da determinação do montante do caucionamento 
 exigível às entidades patronais, sobre a garantia das pensões por acidentes de 
 trabalho, que integra o conceito de 'legislação do trabalho', ter sido emitida 
 sem se ter proporcionado a participação, na sua elaboração, às organizações 
 representativas dos trabalhadores;
 
  
 
    2º - Termos em que deve ser confirmada a decisão recorrida, na parte 
 impugnada.
 
  
 
             A recorrida Companhia de Seguros A .... não contralegou.
 
  
 
             Passados os vistos de lei, cabe apreciar e decidir.
 
  
 
             E decidir, concretamente, se a norma constante da alínea a), do nº 
 
 3, conjugada com o nº 1 da Portaria nº 760/85, de 4 de Outubro, viola qualquer 
 norma ou princípio constitucional, desde logo, o princípio da precedência de lei 
 e o direito de participação dos trabalhadores na elaboração da legislação do 
 trabalho, aos quais se reporta o acórdão recorrido.
 
  
 
 *///*
 
  
 II - A fundamentação
 
  
 
             1 - A Lei nº 2127, de 3 de Agosto de 1965, que veio estabelecer as 
 bases do novo regime jurídico dos danos emergentes de acidentes de trabalho e 
 doenças profissionais, dispunha no nº 1, da base XLIII (sistema e unidade do 
 seguro) que 'as entidades patronais são obrigadas a transferir a 
 responsabilidade pela reparação prevista na presente lei para entidades 
 legalmente autorizadas a realizar este seguro, salvo se lhes for reconhecida 
 capacidade económica para, por conta própria, cobrir os respectivos riscos'.
 
  
 
             Quando se verifica transferência dessa responsabilidade as entidades 
 seguradoras tomam sobre si o ónus correspondente, assumindo, directa e 
 imediatamente, para com os sinistrados, doentes ou beneficiários, a obrigação 
 de os indemnizar.
 
  
 
             A garantia de cumprimento desta obrigação é assegurada, além do 
 mais, pela constituição de reservas matemáticas, que se destinam a caucionar 
 especialmente os créditos dos segurados (cfr. artigos 19º a 23º do decreto com 
 força de Lei de 21 de Outubro de 1907).
 
  
 
             Ora, dispondo sobre o cálculo das reservas matemáticas das pensões 
 devidas por acidente de trabalho a cargo das companhias de seguros, o 
 Decreto-Lei nº 26095, de 23 de Novembro de 1935, para além de revogar o artigo 
 
 31º do decreto nº 5637, de Maio de 1919, que anteriormente regia sobre a 
 matéria, veio prescrever que tais reservas 'são calculadas à taxa de juro de 4 
 por cento e segundo as tabelas aprovadas por despacho ministerial, sobre parecer 
 fundamentado da Inspecção de Seguros, e serão integralmente aplicadas, de acordo 
 com a legislação especial das sociedades de seguros, até 30 de Abril de cada 
 ano' (artigo 1º).
 
  
 
             E ajuntava-se, complementarmente, que as bases adoptadas nos termos 
 deste artigo 'poderão ser revistas de dois em dois anos pela Inspecção de 
 Seguros, que proporá ao Ministro das Finanças a sua alteração' (§ único do 
 artigo 1º), sendo que até à aprovação das bases assim referidas, 'as reservas 
 matemáticas serão calculadas nos seguintes termos: (1º) Taxa de juro de 4,5 por 
 cento; (2º) Tábua de mortalidade R.F.; (3º) Carga de gerência 2 por cento' 
 
 (artigo 2º).
 
  
 
             Sob expressa invocação do § único do artigo 1º do Decreto-Lei nº 
 
 26095, foi publicada a Portaria nº 760/85, que, para melhor apreensão do tema em 
 apreço, se deixa integralmente transcrita. Assim:
 
  
 
     'Considerando que as provisões matemáticas do ramo `Acidentes de trabalho` 
 têm vindo a ser calculadas de acordo com o estabelecido na Portaria nº 632/71, 
 de 19 de Novembro;
 
      Verificando-se que as tábuas de mortalidade e as taxas de juro técnicas 
 constantes das tabelas anexas à referida portaria se encontram manifestamente 
 desadequadas:
 
      Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Secretário de Estado do 
 Tesouro, nos termos do § único do artigo 1º. do Decreto-Lei nº 26095, de 23 de 
 Novembro de 1935, o seguinte:
 
      1º. São aprovadas, pela presente portaria, as tabelas anexas relativas ao 
 cálculo das provisões matemáticas das pensões de acidentes de trabalho.
 
      2º. São utilizadas a tábua de mortalidade PF 1960-64, a taxa de juro 
 técnica de 6% e a carga de gerência de 4%.
 
      3º. As referidas tabelas são aplicáveis:
 
        a)  Ao cálculo das provisões matemáticas correspondentes às pensões 
 fixadas, quer a partir da data da entrada em vigor da presente portaria, quer 
 anteriormente;
 
        b)  Ao cálculo, nos termos legais em vigor, do valor do capital de 
 remições autorizadas a partir do primeiro dia do mês seguinte ao da data da 
 publicação da presente portaria.
 
      4º. As mesmas tabelas são igualmente aplicáveis, sem prejuízo do artigo 5º 
 do Decreto-Lei nº 668/75, de 24 de Novembro, nos casos de actualização de 
 pensões de acidentes de trabalho decorrentes do Decreto-Lei nº 668/75, de 24 de 
 Novembro, com as diversas redacções que lhe foram sucessivamente dadas.'
 
  
 
             Tendo presente o quadro normativo que vem de se expor, pode dizer-se 
 que a norma da alínea a) do nº 3, conjugada com o nº 1, da Portaria nº 760/85 - 
 e a ela se circunscreve o objecto do recurso -, ao contrário do decidido no 
 acórdão recorrido não viola o princípio constitucional da precedência da lei.
 
  
 
             É que, e inversamente à norma constante da alínea b) do nº 3 da 
 mesma portaria - o acórdão do Tribunal Constitucional nº 61/91, Diário da 
 República, I série-A, de 1 de Abril de 1991, declarou tal norma 
 inconstitucional, com força obrigatória geral, por violação do princípio da 
 precedência da lei, decorrente designadamente, dos nºs 6 e 7 do artigo 115º e do 
 artigo 202º, alínea c), e também por violação do artigo 201º, nº 1, alínea a), 
 todos da Constituição - o normativo ora em apreço não estabelece uma disciplina 
 inicial -, limitando-se a alterar as tabelas relativas ao cálculo das provisões 
 matemáticas das pensões de acidentes de trabalho, com base em habilitação legal 
 anterior, concretamente, o § único do artigo 1º do Decreto-Lei nº 26095.
 
  
 
             E assim sendo não se têm por transgredidos os nºs 6 e 7 do artigo 
 
 115º da Constituição.
 
  
 
 *///*
 
  
 
             2 - A decisão recorrida, num outro plano de impostação da matéria 
 controvertida, considerou a norma desaplicada como violadora dos preceitos 
 constitucionais que regem a participação das organizações representativas dos 
 trabalhadores na elaboração da legislação do trabalho.
 
  
 
             Será efectivamente assim?
 
  
 
             O direito constitucional de participação na elaboração da legislação 
 do trabalho configura-se como um direito institucional e orgânico de que são 
 titulares as comissões de trabalhadores e associações sindicais, não estando 
 assim em causa posições subjectivas individuais (cf. neste sentido, Jorge 
 Miranda, A Constituição de 1976, Lisboa, 1978, pp. 462 e 463, e Vieira de 
 Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Coimbra, 
 
 1983, pp. 91 e 92).
 
  
 
             A institucionalização do direito de participação na legislação do 
 trabalho tem a ver com processos de asseguramento de representações de 
 interesses, associando uma dimensão atinente a 'opções de organização do poder 
 político' (Vieira de Andrade) a uma dimensão de garantia dos direitos dos 
 trabalhadores, ligando-se ainda aquele direito à dimensão participativa 
 constitucionalmente assinalada (artigo 2º) no princípio democrático. Não é uma 
 participação vinculante para os órgãos de decisão política, assim se 
 compaginando com o princípio representativo, e a funcionalidade que desenvolve 
 ordena-se à conformação das opções legislativas, visando acautelar os direitos 
 dos trabalhadores (cf. Acórdão do Tribunal Constitucional nº 262/90, Diário da 
 República, I série, de 20 de Dezembro de 1990).
 
  
 
             Não existe na Constituição uma explícita caracterização daquele 
 conceito havendo porém a Lei nº 16/79, de 26 de Maio, que veio dispôr sobre a 
 participação das organizações de trabalhadores na elaboração da legislação de 
 trabalho, no seu artigo 2º, nº 1, estabelecido a seguinte definição:
 
  
 
    1 - Entende-se por legislação do trabalho a que vise regular as relações 
 individuais e colectivas de trabalho, bem como os direitos dos trabalhadores, 
 enquanto tais, e suas organizações, designadamente:
 
  
 
    a) Contrato individual de trabalho;
 
    b) Relações colectivas de trabalho;
 
    c) Comissões de trabalhadores, respectivas comissões
 
       coordenadoras e seus direitos;
 
    d) Associações sindicais e direitos sindicais;
 
    e) Exercício do direito à greve;
 
    f) Salário mínimo e máximo nacional e horário nacional de trabalho;
 
    g) Formação profissional;
 
    h) Acidentes de trabalho e doenças profissionais.
 
  
 
             E no nº 2 do mesmo preceito, considera-se igualmente matéria de 
 legislação do trabalho, para os efeitos do respectivo diploma, o processo de 
 aprovação para ratificação das convenções da Organização Internacional do 
 Trabalho (OIT).
 
  
 
             Não sendo esta definição, por si só, inteiramente esclarecedora 
 
 (desde logo, porque a enumeração que nela se contém é feita a título 
 exemplificativo), reveste-se, porém, de uma muito particular importância, 
 constituindo os dois vectores essenciais sobre que se suporta, quais sejam, a 
 regulação das relações individuais e colectivas de trabalho e a regulação dos 
 direitos dos trabalhadores, enquanto tais, e suas organizações, o núcleo 
 essencial do próprio conceito.
 
  
 
             Poderá mesmo afirmar-se, acompanhando os dizeres do Acórdão do 
 Tribunal Constitucional nº 15/88, Diário da República, I série, de 3 de 
 Fevereiro de 1988, que 'no artigo 2º deste diploma contém-se um enunciado do 
 conjunto de matérias integrantes da noção de legislação do trabalho para um 
 efeito, que, salvo demonstração em contrário, há-de considerar-se uma adequada 
 densificação legislativa do conceito constitucional'.
 
  
 
             Aliás, a jurisprudência constitucional definiu uma linha de 
 entendimento e interpretação daquela noção em termos de quase total similitude 
 com a caracterização que dela foi feita na referida lei.
 
  
 
             De harmonia com ela, e seguindo para sua explicitação, por todos, o 
 Acórdão nº 107/88, Diário da República, I série, de 21 de Junho de 1988, 'apesar 
 de o texto constitucional não definir o que seja `legislação do trabalho', pode 
 dizer-se que esta há-de ser `a que visa regular as relações individuais e 
 colectivas de trabalho, bem como os direitos dos trabalhadores, enquanto tais, e 
 suas organizações' (cf. parecer nº 17/81, Pareceres da Comissão Constitucional, 
 vol. 16º, p. 14), ou, se assim melhor se entender, há-de abranger `a legislação 
 regulamentar dos direitos fundamentais dos trabalhadores reconhecidos na 
 Constituição' (cf. Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 31/84, 451/87 e 
 
 15/88, Diário da República, I série, de, respectivamente, 17 de Abril de 1984, 
 
 14 de Dezembro de 1987 e 3 de Fevereiro de 1988)'.
 
  
 
 *///*
 
  
 
             3 - A matéria contida na norma desaplicada reporta-se a um direito 
 fundamental, o da segurança social, na específica perspectiva da protecção 
 contra a diminuição da capacidade para o trabalho, consubstanciado nas 
 incapacidades permanentes causadas por acidentes de trabalho ou por doenças 
 profissionais originadoras de direito a pensões e às respectivas remissões (cfr. 
 artigo 63º, nº 4, in fine, da Constituição).
 
  
 
             Ora, à luz das considerações atrás desenvolvidas, tal matéria, 
 expressamente elencada na alínea h), do nº 1, do artigo 2º da Lei nº 16/79, deve 
 considerar-se como integrada no conceito de 'legislação do trabalho' pese embora 
 o facto de aquela norma se inserir num mero acto regulamentar.
 
  
 
             Com efeito, como sustentam Gomes Canotilho e Vital Moreira, 
 Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra, 1993, p. 300, 'o 
 termo `legislação' não pode manifestamente ser lido no sentido de abranger 
 apenas os actos legislativos propriamente ditos, devendo ser entendido no seu 
 sentido amplo corrente de direito ou regulamentação do trabalho, de forma a 
 abarcar todo o diploma que contenha decisões de nível `legislativo' ou 
 equiparado. Hão-de conter-se aí naturalmente as várias modalidades de lei (as 
 leis de bases, as leis de autorização legislativa e as demais leis da AR, os 
 decretos-leis, os decretos legislativos regionais), as convenções internacionais 
 submetidas a aprovação, e ainda os diplomas regulamentares que não sejam 
 puramente executivos, isto é, que ainda contenham uma decisão substantiva sobre 
 algum aspecto que interesse ao estatuto jurídico dos trabalhadores'.
 
  
 
             Este entendimento não só encontra suporte na interpretação do texto 
 constitucional, bastando para tanto atribuir ao termo 'legislação' um sentido 
 amplo que o faça coincidir com 'normação' ou 'produção normativa', como também e 
 especialmente, é o único que vai ao encontro da razão de ser da participação das 
 organizações representativas  dos trabalhadores no processo de produção 
 normativo-laboral.
 
  
 
             A matéria contida em actos regulamentares que não sejam de mera 
 execução pode revestir-se muitas vezes, como aliás sucede na situação em 
 presença, de particular importância - o decreto-lei regulamentado contém uma 
 disposição sem conteúdo definido vindo a ser preenchida pela portaria em causa - 
 sendo inadmissível que em tais casos fosse recusado na elaboração dos diplomas 
 regulamentares, a intervenção das organizações representativas dos trabalhadores 
 
 (neste sentido, cfr. acórdão do Tribunal Constitucional, nº 232/90, Diário da 
 República, II série, de 22 de Janeiro de 1991).
 
  
 
             De facto, o § único do artigo 1º do Decreto-Lei nº 26095, norma que 
 serviu de habilitação à Portaria nº 760/85 limita-se a afirmar que 'as bases 
 adoptadas nos termos deste artigo poderão ser revistas de dois em dois anos pela 
 Inspecção de Seguros, que proporá ao Ministro das Finanças a sua alteração',  
 não fornecendo quaisquer critérios ou orientações a que deva obedecer aquela 
 revisão.
 
  
 
             E por outro lado, como bem assinala o senhor Procurador-Geral 
 Adjunto, 'da ausência total de critérios pré-definidos legalmente para a revisão 
 das `bases adoptadas', resulta que a Administração, através da sua actividade 
 normativa e sob proposta da Inspecção de Seguros, é livre na adopção desses 
 critérios, o que desde logo faz com que não estejamos perante uma questão 
 meramente técnica: aliás, a demonstração de que a regulamentação desta matéria 
 pressupõe opções relevantes da Administração radica na própria circunstância de, 
 na Portaria nº 760/85, terem sido adoptados critérios para o cálculo das 
 provisões matemáticas que levam a montantes de capital substancialmente mais 
 baixos do que os resultantes das utilização das tabelas anexas à Portaria nº 
 
 632/71, daí resultando, dados os fins para que relevam as reservas matemáticas, 
 um significativo agravamento da situação dos sinistrados'.
 
  
 
             Assim sendo, e na decorrência do exposto, conclui-se no sentido da 
 inconstitucionalidade da norma cuja aplicação foi recusada, por violação do 
 disposto nos  artigos 55º, alínea d) e 57º, nº 2 da Constituição (na versão 
 saída da revisão de 1982), pois que, incindindo directamente e através da 
 determinação do montante do caucionamento exigível às entidades patronais, sobre 
 a garantia das pensões por acidentes de trabalho, matéria que integra o conceito 
 de 'legislação do trabalho' foi emitida sem ter ocorrido na sua elaboração a 
 participação das organizações representativas dos trabalhadores - o diploma em 
 causa não faz qualquer referência a essa participação, sendo assim de 
 presumir-se a sua não efectivação (cfr. acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 
 
 451/87 e 15/88, Diário da República, I série, de, respectivamente, 14 de 
 Dezembro de 1987 e 3 de Fevereiro de 1988).
 
  
 
 *///*
 
  
 III - A decisão
 
  
 
             Nestes termos, decide-se negar provimento ao recurso e confirmar, 
 embora só em parte a decisão recorrida.
 
             Lisboa, 20 de Abril de 1995
 
             Ass) Antero Alves Monteiro Dinis
 Maria Fernanda Palma
 Viroe Nunes de Almeida
 Alberto Tavares da Costa
 Maria da Assunção Esteves (vencida, nos termos da declaração de voto aposta ao 
 acórdão nº 232/90, D.R., II Série, de 22.01.91)
 
                         Armindo Ribeiro Mendes (vencido nos termos da declaração 
 de voto junta)
 
                         Luis Nunes de Almeida (vencido, por entender que se não 
 está perante 'legislação de trabalho', uma vez que a norma em causa não regula 
 directamente matéria atinente a direitos dos trabalhadores)
 
  
 
  
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 
                 Votei vencido pelas razões que passo a referir.
 
  
 
                 A norma aplicada por remissão do artº 123º, nº 1, do Código de 
 Processo de Trabalho - constante da alínea a) do nº 3º da Portaria nº 760/85, 
 conjugada com o nº º1 da mesma Portaria - tem a ver com matéria processual, pelo 
 que não se considera que ela possa pôr directamente em causa os direitos dos 
 trabalhadores, tanto mais que o valor da causa é invariável quer a entidade 
 patronal haja transferido a sua responsabilidade pelo pagamento da pensão a uma 
 seguradora, quer não o tenha feito e haja caucionado o pagamento dessa pensão 
 
 (cfr.art. 70º do Decreto nº 360/71).
 
  
 
                 Contra esta posição não pode argumentar-se quer com  a redacção 
 do artº 8º, nº 1, alínea x), do Código das Custas Judiciais (nessa disposição 
 faz-se uma ligação entre as reservas matemáticas e a finalidade da sua 
 constituição 'para garantia das respectivas pensões', ligação que provinha da 
 redacção do artº 118º do Código de Processo de Trabalho de 1963, mas que se não 
 afigura de relevância para o presente recurso), quer com a necessidade de manter 
 uma solução unitária em matéria do valor do processo e em matéria de 
 constituição de caução. Tão-pouco se pode argumentar, no que toca à incidência 
 em concreto do cálculo do valor da acção, com a sua relação com as alçadas dos 
 tribunais de trabalho. Tenho por seguro que o valor das alçadas nunca pode 
 afectar directamente os direitos dos trabalhadores, não tendo,por isso, as suas 
 organizações de ser ouvidas sobre legislação atinente a esta matéria de natureza 
 processual e organizatória.
 
  
 
                 Alguma incongruência existe, no plano do direito ordinário, mas 
 não acarreta, em  minha opinião, qualquer juízo de desvalor constitucional no 
 que toca ao modo de fixação do valor das causas em matéria de acidentes de 
 trabalho, por não se ver qual a norma ou princípio constitucional violados por 
 tal norma de natureza processual.
 
                 As) Armindo Ribeiro Mendes