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Processo n.º 626/09
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
 
 Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
 
 I – Relatório
 
 1. A., S.A, inconformada com a decisão sumária proferida em 24 de Setembro de 
 
 2009, vem dela reclamar dizendo o seguinte:
 
 “- Nota prévia 
 
 1) A Recorrente foi notificada da decisão sumária, proferida nos termos do 
 artigo 78° A, n.° 1, da Lei 28/82, de 15 de Novembro (adiante LTC), no dia 
 
 23/09/2009, muito embora a mencionada decisão tenha data posterior. 
 
 2) De acordo com o artigo 69° da LTC, aplicam-se as regras do Código de Processo 
 Civil (adiante CPC) à tramitação dos recursos para o Tribunal Constitucional. 
 
 3) Nestes termos, atendendo ao disposto no artigo 254° n.° 3 e 688° n.° 2 ambos 
 do CPC, é a presente reclamação tempestiva. 
 II - Factos 
 
 4) A ora Recorrente foi notificada, em 26/12/2006, para o pagamento de taxa 
 designada como ‘28 Factos Diversos Licenciados’, no valor de €896,84 — Cfr. Doc. 
 n.° 1 cuja cópia se junta para todos os efeitos legais. 
 
 5) Á cautela, e atendendo ao disposto no artigo 16° da Lei n.° 53-E/2006, de 29 
 de Dezembro, a Recorrente apresentou Reclamação Graciosa onde arguiu, desde 
 logo, a falta de clareza da notificação que, no entender da Recorrente, 
 acarretaria desde logo a invalidade da mesma. 
 
 6) Isto porque não era indicada qualquer legislação que sustentasse a liquidação 
 de taxa, bem como a fundamentação da mesma, nem tampouco era claramente indicada 
 qual o objecto da tributação. 
 
 7) A documentação anexa à liquidação fazia crer que estávamos perante taxas 
 devidas pela exibição de publicidade em veículos utilizados pela Recorrente na 
 sua actividade. 
 
 8) Ora, tal realidade foi confirmada pela Câmara Municipal de Oeiras quando, em 
 resposta à reclamação graciosa apresentada pela Recorrente, explicita que a taxa 
 era efectivamente cobrada pela exibição de logótipos nas viaturas utilizadas 
 pela Recorrente. 
 
 9) Contudo, nunca foi indicado pela Câmara Municipal de Oeiras qual a norma do 
 regulamento e tabela de taxas e outras receitas que estava a ser efectivamente 
 aplicado — Cfr. Doc. n.° 2 cuja cópia se junta para todos os efeitos legais. 
 
 10) Assim, quando apresentou, em 16/03/2007, a impugnação judicial que subjaz 
 aos presentes autos, a Recorrente continuava a não ter a identificação da norma 
 do regulamento e tabela de taxas e outras receitas que lhe estaria a ser 
 aplicado. 
 
 11) E tal foi arguido, mais uma vez, em sede de p.i. — Cfr. Doc. n.° 3 cuja 
 cópia se junta para todos os efeitos legais. 
 
 12) Sucede que a Câmara Municipal de Oeiras não contestou e o Tribunal 
 Administrativo e Fiscal de Sintra proferiu sentença — aparentemente nos termos 
 do artigo 113.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário — sem que se 
 tivessem realizado diligências de prova ou dada a possibilidade de alegações de 
 facto e de direito (conforme dispõe o artigo 120.º do CPPT). 
 
 13) Nestes termos, após a apensação do processo administrativo aos autos, a 
 Recorrente não teve qualquer oportunidade processual de voltar a invocar a 
 inconstitucionalidade da norma do regulamento municipal que terá sido aplicada. 
 
 14) Nem nunca teve conhecimento de qual seria essa norma, mesmo quando instou a 
 Câmara Municipal de Oeiras a esclarecer tal facto. 
 III - Direito 
 
 15) Veio a decisão sumária invocar o disposto no artigo 72° n.° 2 da LTC, para 
 concluir que a Recorrente, na sua petição inicial de impugnação judicial, ‘não 
 indicou o preceito regulamentar que reputa de inconstitucional, tendo-o feito 
 apenas quando interpôs o recurso para este Tribunal Constitucional’. 
 
 16) Considerou, pois, este Tribunal que a Recorrente não concretizou, perante o 
 tribunal recorrido, qual a norma e os fundamentos da desconformidade da mesma 
 com a Constituição da República Portuguesa (adiante CRP). 
 
 17) Contudo, como acima se expôs, a Recorrente nunca soube, até mesmo com a 
 sentença recorrida, qual a norma que estava em causa, nem teve, anteriormente, 
 oportunidade processual de indicar expressamente qual a norma que considerava 
 desconforme à CRP. 
 
 18) Conforme refere Fernando Amâncio Ferreira, in ‘Manual dos Recursos em 
 Processo Civil’, 2.ª Edição, Almedina, explanando a opinião de Ribeiro Mendes, 
 
 ‘A arguição (da inconstitucionalidade) tem de ser feita de modo processualmente 
 idóneo. Considera-se, porém, que esta doutrina não vale para os casos em que o 
 recorrente não haja tido oportunidade de suscitar a questão antes da decisão que 
 se pretende recorrer’. 
 
 19) Assim, parece à Recorrente que, a inconstitucionalidade foi suscitada em 
 momento próprio — logo na p.i. — com os meios e informação que a Recorrente 
 tinha ao seu dispor. 
 
 20) Os fundamentos da desconformidade da taxa aplicada com a CRP foram 
 claramente invocados, sendo que não foi directamente invocada a norma do 
 regulamento municipal que enferma desse vício porque a mesma nunca foi 
 devidamente identificada ao longo de todo o processo de impugnação judicial. 
 
 21) Não tendo a Recorrente possibilidade de alegar de facto e de direito, não 
 existia qualquer outra fase processual onde pudesse suprir a falta de indicação 
 da norma inquinada. 
 
 22) Assim, fê-lo no aquando da interposição de recurso em virtude de, em momento 
 anterior, não ter sido possível — nem seria processualmente legítimo — indicar a 
 norma do regulamento que é, no entender da Recorrente e como desde cedo 
 defendeu, violadora da CRP. 
 
 23) Nestes termos, considera a Recorrente que deve a presente Reclamação ser 
 apreciada favoravelmente, devendo o Recurso interposto ser admitido e apreciado, 
 seguindo os seus trâmites legais.” 
 
  
 
 2. A decisão reclamada, e no que ora importa, tem o seguinte teor:
 
 “3. É de proferir decisão sumária nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1 da LTC por 
 não se verificar requisito essencial ao conhecimento do recurso. Como resulta do 
 artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição bem como do artigo 70.º, n.º 1, 
 alínea b), da LTC, para que se possa lançar mão do recurso de fiscalização 
 concreta da constitucionalidade ali previsto é necessária a suscitação de uma 
 questão de inconstitucionalidade normativa. Tal suscitação deve ocorrer, nos 
 termos do artigo 72.º, n.º 2, da LTC, de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida. Exige-se assim que, perante o 
 tribunal recorrido, se indique a norma ou normas cujas inconstitucionalidade se 
 discute, concretizando, ainda que sumariamente, os fundamentos de tal 
 desconformidade. Este ónus de especificação justifica-se pelo facto de que 
 compete ao recorrente constitucional, em recursos deste tipo, a delimitação do 
 objecto do recurso.
 
 4. Tal ónus não foi, no entanto, cumprido pela Recorrente que, na impugnação que 
 deduziu junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, não indicou o 
 preceito regulamentar que reputa de inconstitucional, tendo-o feito apenas 
 quando interpôs o recurso para este Tribunal Constitucional. Esse não é, no 
 entanto, o momento considerado adequado na medida em que os pressupostos do 
 recurso de fiscalização concreta tentado interpor devem ser satisfeitos durante 
 o processo (i.e., antes de proferida a decisão final do tribunal a quo). Este 
 pressuposto apenas é dispensável em casos-limite em que se afere a 
 impossibilidade de cumprimento de tal ónus em momento anterior. Tal 
 excepcionalidade, no entanto, não se verifica nos autos em apreço.”
 
  
 
 3. O Reclamado Município de Oeiras, notificado da reclamação, não respondeu. 
 Cumpre apreciar e decidir.
 II – Fundamentação
 
 4. A reclamação deduzida carece de fundamento. Com efeito, a argumentação da 
 Reclamante em nada abala a fundamentação da decisão sumária reclamada. O 
 conhecimento de recursos interpostos ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), 
 da Lei do Tribunal Constitucional, como sucede nos autos, depende da prévia 
 verificação de vários requisitos, nomeadamente a suscitação, pelo recorrente, de 
 inconstitucionalidade de uma norma durante o processo, constituindo essa norma 
 fundamento (ratio decidendi) da decisão recorrida, bem como o prévio esgotamento 
 dos recursos ordinários. 
 
 5. Tem razão a Reclamante quando refere que, em determinadas situações 
 excepcionais, não é exigível ao recorrente constitucional a suscitação, durante 
 o processo, da questão de constitucionalidade nomeadamente nos tais moldes 
 processualmente adequados. Isso sucede quando, atentas as circunstâncias, não 
 lhe assistiu, de todo, oportunidade processual para tal. Sustenta a Reclamante 
 que a situação configurada nos autos constitui, precisamente, uma dessas 
 excepções. Invoca, assim, que não só em sede administrativa e graciosa nunca foi 
 especificada a norma regulamentar ao abrigo da qual estariam a ser liquidadas as 
 taxas em apreço, como a mesma nem sequer resulta da própria decisão recorrida. 
 
 5.1. Ora, a ser assim, então o certo é que continuaria a não estar em condições 
 de, no momento em que recorre, especificar o referido preceito regulamentar, 
 como efectivamente o fez no requerimento de recurso para este Tribunal. 
 
 5.2. Ainda assim, e porque este ónus não se satisfaz com meras suposições acerca 
 de qual teria sido, efectivamente, o preceito aplicado a título de fundamento da 
 decisão, deveria a Reclamante ter lançado mão de mecanismos processuais que lhe 
 assistem, nomeadamente a arguição de nulidade da decisão, para, na sequência da 
 mesma, provocar o tribunal a quo a indicar aquele mesmo preceito. Poderia 
 subsistir, ainda assim, a possibilidade de o tribunal não proceder a tal 
 indicação. Mas só em tal situação se entenderia que o recorrente constitucional, 
 neste caso a Reclamante, havia esgotado todos os meios processuais que estão ao 
 seu alcance para dar satisfação ao cumprimentos dos ónus – de verificação 
 obrigatória – que impendem sobre o conhecimento de recursos de 
 constitucionalidade interpostos ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da 
 Lei do Tribunal Constitucional.
 
 5.3. Aliás, a decisão a quo indica que existia outro mecanismo processual de que 
 a Reclamante não se socorreu ainda em fase graciosa. Com efeito, e perante a 
 aparente insuficiente notificação do acto tributário, poderia aquela ter 
 invocado o artigo 37.º do CPPT, de modo a que a autoridade administrativa 
 procedesse à especificação do preceito regulamentar ao abrigo da qual estava a 
 ser liquidada a taxa de renovação. O que não fez.
 
 5.4. Deste modo, a especificação do preceito cuja constitucionalidade pretende 
 ver apreciada surge apenas no requerimento pelo qual a Reclamante deduziu 
 recurso para o Tribunal Constitucional. Não sendo este o momento adequado para 
 tal indicação, e tendo sido omitidos momentos processuais que a lei 
 disponibiliza para a devida reacção em momento anterior, não se pode deixar de 
 concluir que não se encontram preenchidos os pressupostos para admissão do 
 recurso.
 III – Decisão
 
 6. Assim, acordam, em conferência, indeferir a presente reclamação e, em 
 consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido de não tomar conhecimento 
 do recurso.
 Custas pela Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 17 de Novembro de 2009
 José Borges Soeiro
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos