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Processo n.º 702/2005 
 Plenário 
 Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza 
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional: 
 
  
 
 1. A fls. 5113, foi proferido pelo juiz do Tribunal Judicial de Celorico da 
 Beira o despacho previsto no n.º 2 do artigo 25º da Lei Eleitoral dos Órgãos das 
 Autarquias Locais, aprovada pela Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto, no 
 processo relativo à apresentação de candidaturas às eleições autárquicas a 
 realizar no próximo dia 9 de Outubro para o concelho de Celorico da Beira.
 Notificado deste despacho, e apenas para o que agora interessa, o mandatário do 
 Partido Socialista veio, a fls. 5147, impugnar a elegibilidade de Carlos Morgado 
 Portugal, cabeça da lista de candidatos à Assembleia de Freguesia de Cortiçô da 
 Serra apresentada pelo Partido Social Democrata, porque “desempenha, ou é 
 titular, do cargo de Chefe de Divisão no Município de Celorico da Beira, 
 encontrando-se destacado no município de Almeida” (al. d) do n.º 1 do artigo 7º 
 da Lei Eleitoral).
 E veio ainda, a fls. 5148, impugnar a elegibilidade de Carlos Abel Gonçalves da 
 Silva Patrocínio, cabeça da lista de candidatos à Assembleia de Freguesia de 
 Açôres apresentada pelo Partido Social Democrata, alegando que o referido 
 candidato “desempenha funções de chefia da Empresa Municipal Celoricense 
 
 (EMCEL), (...) cujo capital social é detido a 100% pela Câmara Municipal de 
 Celorico da Beira”, e que não suspendeu o respectivo exercício (mesma al. d) do 
 n.º 1 do artigo 7º).
 Pelo despacho de 25 de Agosto, de fls. 5225, foram desatendidas ambas as 
 impugnações.
 Relativamente à elegibilidade de Carlos Morgado Portugal, o tribunal  entendeu 
 que
 
 “existem já elementos nos autos que permitem afirmar que o dito candidato exerce 
 funções de Director do Departamento Administrativo e Financeiro na Câmara 
 Municipal de Almeida, desde 20 de Novembro de 2001, em regime de comissão de 
 serviço.
 O artigo 7º, nºs 1, e 2, da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, 
 prevê inelegibilidades meramente locais ou territoriais (na terminologia de 
 Maria de Fátima Mendes & Jorge Miguéis, in Lei Eleitoral dos Órgãos das 
 Autarquias Locais, anotada e comentada, 2001, p. 15), que poderemos denominar 
 como inelegibilidades relativas por contraponto com as absolutas (previstas no 
 artigo 6º da Lei Eleitoral dos órgãos das Autarquias Locais).
 Se, nestes casos, a capacidade eleitoral passiva se encontra absolutamente 
 coarctada, não podendo nenhuma das pessoas aí previstas constituir-se como 
 candidatos a qualquer um dos órgãos autárquicos, na norma seguinte está em causa 
 um conjunto de indivíduos cuja incapacidade eleitoral passiva é delimitada por 
 um critério territorial: só não serão elegíveis para os órgãos das autarquias 
 locais dos círculos eleitorais onde exercem funções ou jurisdição.
 Cada círculo eleitoral identifica-se com o território de cada autarquia local, 
 sendo distintos os círculos eleitorais de Almeida e de Celorico da Beira.
 Assim, aparentemente, não se verificariam os fundamentos de inelegibilidade do 
 candidato.
 Sustenta, contudo, o Partido Socialista – PS que, atenta a transitoriedade do 
 destacamento, deverá ser aplicado o regime da inelegibilidade.
 Por ter especial interesse, passa-se a transcrever parte do Acórdão do Tribunal 
 Constitucional n.º 700/97, in http://www.tribunalconstitucional.pt «A questão do 
 
 âmbito de aplicação do conceito de «funcionário de órgão representativo da 
 freguesia ou do Município» põe-se especialmente nos casos em que se pode dizer 
 que tal funcionário exerce a sua actividade em alguma outra entidade pública, a 
 cujo serviço se encontra adstrito por requisição, mediante licença sem 
 vencimento de longa duração ou em comissão de serviço, por exemplo, ou de cujos 
 
 órgãos é titular. Deve então, para os fins da inelegibilidade da alínea c) do 
 artigo 4º, prevalecer o vínculo originário à autarquia ou o novo vínculo 
 funcional a que se encontra adstrito? Posta assim a questão, a jurisprudência 
 maioritária do Tribunal tem sobretudo atendido à força relativa de cada um dos 
 vínculos, como resulta do especial regime da dupla vinculação.
 
 (...)
 O regime da comissão de serviço tem entre outras, as seguintes características, 
 definidas no Decreto-Lei n.º. 323/89, de 26 de Setembro, modificado pelos 
 Decretos-Leis n.º  34/93, de 13 de Fevereiro, e 239/94, de 22 de Setembro, e 
 pela Lei n.º 13/97, de 23 de Maio: o provimento é feito por um período de três 
 anos renováveis por iguais períodos (artigo 5º, n.º1); a comissão de serviço 
 suspende-se no caso de exercício, entre outros, do cargo de presidente da câmara 
 municipal, suspende-se igualmente a contagem do prazo da comissão, embora o 
 período de suspensão conte, para todos os efeitos legais, como tempo de serviço 
 prestado no cargo dirigente de origem [isto é, na comissão de serviço] (artigo 
 
 6º, n.ºs 1, alínea c), 2 e 3); o tempo de serviço em cargos dirigentes conta, 
 para todos os efeitos legais designadamente para promoção, progressão na 
 carreira ecategoria em que cada funcionário se encontra integrado (artigo 18º, 
 n.º1, na redacção do Decreto-Lei n.º 34/93); os funcionários nomeados para 
 cargos dirigentes têm direito, finda a  comissão de serviço, ainda que seguida 
 de nova nomeação, ao provimento em categoria superior à que possuíam à data da 
 nomeação para dirigente, a atribuir em função do número de anos de exercício 
 continuado nestas funções, criando-se nos quadros de pessoal dos serviços ou 
 organismos de origem os lugares necessários para tanto (artigo 18º, nºs 2 e 6, 
 na redaçção do Decreto-Lei n.º 34/93); e isto mesmo sem prejuízo do direito de 
 se candidatarem aos concursos de acesso que ocorrerem na pendência da respectiva 
 comissão de serviço (artigo 18º, nº 5,  na redacção do Decreto-Lei n.º 34/93).
 
 (...) Por outro lado, se regressar ao serviço autárquico de origem (a comissão 
 de serviço não é necessariamente limitada no tempo, ao contrário da requisição, 
 podendo renovar-se indefinidamente) fá-lo-á para um novo lugar criado 
 especialmente ex novo, em categoria superior à que possuía à data da nomeação 
 para dirigente em comissão de serviço, a atribuir em função do número de anos de 
 exercício continuado nestas funções, agrupados de harmonia com os módulos de 
 promoção da carreira e em escalão a determinar, nos termos do Decreto-Lei nº 
 
 533-A/89, de 16 de Outubro (artigo 18º, nº 2, alínea a) do Decreto-lei n.º  
 
 323/89, na redacção do Decreto-Lei n.º 34/93).
 Valem, portanto, no essencial as razões que já levaram a maioria do Tribunal a 
 considerar que na hipótese de licença sem vencimento de longa duração não se 
 preenche o conceito da alínea c) do nº 1 do artigo 4º. Tanto mais assim quanto a 
 doutrina maioritária se tem apoiado na do acórdão n.º 244/85 (Acórdãos 6, pp. 
 
 211, ss; conforme nomeadamente a remissão do acórdão n.º 537/85, Acórdãos, 14, 
 p. 398): a razão pela qual o legislador estabelece a inelegibilidade consignada 
 na alínea c) do n.º 1 do artigo 4º é «evitar qualquer confusão – e antes 
 garantir uma clara “separação” – entre o nível, que se poderá dizer ainda 
 
 “político” da tomada das deliberações e decisões autárquicas e o nível puramente 
 
 “administrativo” da sua execução» (Acórdãos 6, p. 222). Essa separação está 
 garantida desde logo, pela suspensão da comissão de serviço, que se exerce fora 
 da autarquia, como consequência da eleição para Presidente da Câmara, e pelo 
 reingresso na mesma comissão e no mesmo cargo não autárquico, quando findar o 
 exercício do cargo electivo, pelo que não se justifica inelegibilidade.
 Pode, decerto questionar-se se a faculdade de os funcionários que exerçam 
 funções dirigentes em comissão de serviço se candidatarem aos concursos de 
 acesso que ocorrerem na pendência da respectiva comissão de serviço não implica 
 precisamente a confusão entre as funções políticas e as executivas que se 
 pretende evitar com a inelegibilidade. O candidato A., se eleito Presidente da 
 Câmara, poderia concorrer aos concursos de acesso que ocorressem na mesma Câmara 
 Municipal. É certo, mas não poderia integrar nem nomear o respectivo júri, sendo 
 interessado directo no concurso, como acontece com o funcionário nomeado pessoal 
 dirigente do mesmo Ministério (artigos 44º segs do Código do Procedimento 
 Administrativo). Não estaria, assim, em causa a independência e isenção no 
 exercício do cargo electivo.
 Ainda que se entenda que a independência e a isenção do exercício do cargo 
 electivo admite, na sequência do acórdão n.º 244/85, ineligibilidades destinadas 
 assegurar que o exercício referido daquele cargo se processe separado do 
 interesse na gestão dos lugares do cargo da autarquia, haverá que reconhecer que 
 tal interesse, na hipótese configurada pelo caso presente, não tem consistência 
 suficiente para justificar a ineligibilidade, no contexto dos outros aspectos 
 referidos no regime da comissão de serviço e da situação que se verifica na 
 comissão de serviço do recorrente.
 Também não se diga que estaria, assim, descoberto o meio de evitar a 
 inelegibilidade. O funcionário da autarquia só teria que conseguir ser nomeado 
 para lugar dirigente em comissão de serviço. O mesmo vale para a licença sem 
 vencimento de longa duração ou para a exoneração. Haverá, porventura desvio de 
 poder ou até crime de abuso de poder (artigo 382º do Código Penal) da autoridade 
 que, para fins de política autárquica, nomear em comissão de serviço, autorizar 
 a licença ou nomear o beneficiário dela para outro lugar, conceder ou recusar a 
 exoneração. Mas só é desejável que os melhores funcionários autárquicos possam 
 ser eleitos para cargos políticos, se afastarem, licitamente, é claro, os 
 obstáculos legais à elegibilidade».
 Após esta prolongada transcrição, não se justificam outras considerações, antes 
 se considerando ultrapassadas as dúvidas suscitadas a propósito da candidatura 
 de Carlos Morgado Portugal que se julga regular e válida, indeferindo a 
 impugnação formulada pelo Partido Socialista – PS.”
 
  
 Quanto a Carlos Alberto Gonçalves da Silva Patrocínio, a impugnação foi 
 igualmente desatendida porque “o impugnante não apresentou qualquer prova 
 relativamente aos factos invocados, sendo a ele que compete essa prova, dado 
 inexistir qualquer derrogação, nesta matéria, ao regime geral”.
 
  
 Foram, assim, admitidas ambas as candidaturas.
 
  
 
 2. A fls. 5274 e 5277, o mandatário do Partido Socialista veio reclamar do 
 despacho acabado de transcrever, no que toca à decisão de admissão das 
 candidaturas, respectivamente, de Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio e de 
 Carlos Morgado Portugal.
 Quanto ao primeiro, sustentou, em síntese, ser do “domínio público” que exerce 
 as funções que descreveu, que tentou obter “documentos relativos” à sua 
 candidatura, sem êxito, e que “o processo eleitoral em causa não se compadece 
 com delongas e negas da Câmara Municipal, razão pela qual não se juntaram os 
 elementos de prova.”
 Quanto a Carlos Morgado Portugal, sustentou que “o candidato em análise quando 
 quiser, ou mesmo sem o querer, após decorrido o acto eleitoral e na hipótese de 
 ser eleito, cessa de certeza funções no Município de Almeida e virá ocupar o 
 lugar que desempenha na Câmara Municipal de Cerlorico da Beira”.
 
  
 
 3. O PPD/PSD respondeu à reclamação a fls. 5287, pronunciando-se no sentido do 
 seu indeferimento. Juntou, como doc. 1., uma declaração do Presidente do 
 Conselho de Administração da EMCEL, na qual se afirma que Carlos Abel Gonçalves 
 da Silva Patrocínio é funcionário da empresa com a categoria de Sub-Chefe de 
 Estação (fls. 5289).
 A 2 de Setembro, a fls. 5297, foram indeferidas as reclamações, “mantendo-se, em 
 consequência, as decisões de admissão das candidaturas de Carlos Alberto 
 Gonçalves da Silva Patrocínio (...), Carlos Morgado Portugal (...)”.
 Para o que agora interessa, o tribunal  entendeu, quanto ao primeiro, que 
 
 “Efectivamente, inexiste qualquer norma que derrogue as regras gerais relativas 
 ao ónus da prova, o que se traduz na imposição desse ónus sobre aquele que 
 impugna a elegibilidade de um candidato, dela reclama ou recorre (neste sentido, 
 podemos invocar o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 688/97, de 20 de 
 Novembro, in http://www.tribunalconstitucional.pt, em que se sustentou que 
 incumbe ao recorrente o ónus da prova da dívida e da constituição em mora em que 
 funda a impugnação da elegibilidade do candidato, e o Acórdão do Tribunal 
 Constitucional n.º41/2005, de 26 de Janeiro, in 
 http://www.tribunalconstitucional.pt. no qual se sustentou, ainda que a 
 propósito de outros problemas, que 'em todo o caso, sempre seria ao apresentante 
 da candidatura que caberia o ónus de provar que a apresentação se realizou 
 dentro do prazo legalmente fixado para o efeito, por aplicação dos critérios 
 gerais de repartição do ónus da prova, já que é a ele que aproveita o facto em 
 dúvida; não tem qualquer cabimento a invocação, neste contexto, do princípio in 
 dubio pro reo', sendo de extrair, com relevo para a presente questão, a posição 
 que adopta as regras gerais do ónus da prova ao nível do processo eleitoral).” 
 
 (...) E, assim sendo, por um lado, as dificuldades da prova não se traduzem na 
 inversão do ónus. Por outro lado, a nosso ver, nada obstava que, atempadamente, 
 o ora reclamante tivesse feito prova das dificuldades na obtenção dos elementos 
 documentais necessários a provar os factos alegados, sugerindo a intervenção do 
 Tribunal na aquisição dos mesmos, o que não foi feito.
 Importa ainda referir que, de acordo com o artigo 514º, n.º 1, do Código de 
 Processo Civil, 'não carecem de prova a nem de alegação os factos notórios, 
 devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral'.
 
 É certo que o Partido Socialista – PS alega serem do domínio público os factos 
 que, alegadamente, conduziriam à inelegibilidade dos candidatos.
 Porém, temos de produzir uma interrogação: do domínio público de quem?
 Tal interrogação justifica-se pelo absoluto desconhecimento por parte do 
 Tribunal relativamente a tais factos, sendo de notar que 'um facto é notório 
 quando o juiz o conhece como tal, colocado na posição do cidadão comum, 
 regularmente informado, sem necessidade de recorrer a operações lógicas e 
 cognitivas, nem a juízos presuntivos' (conforme anotação de Abílio Neto, in 
 Código de Processo Civil anotado, 15ª ed., p. 705, ancorando-se na doutrina de 
 Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil anotado, vol. III, pp. 259 e segs; 
 Castro Mendes, in Do Conceito de Prova, pp. 711 e segs; e Vaz Serra, in Provas, 
 Boletim do Ministério da Justiça 110º, pp. 61 e segs).
 Encontra-se assim afastada a possibilidade de os factos invocados na reclamação 
 se considerarem notórios e, como tal, não carecerem de prova.
 Ainda que o reclamante não tenha produzido qualquer prova relevante, haverá que 
 atender aos elementos que possam resultar dos autos.
 Da declaração apresentada pelo PSD – Partido Social Democrata não resulta, antes 
 pelo contrário, que o candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio exerça 
 funções que se traduzam na sua inelegibilidade, isto é, exerça funções de 
 direcção na 'EMCEL – Empresa Municipal Celoricense – Gestão de Espaços Culturais 
 e Sociais, E.M.”.
 
 (...) 
 No que respeita à reclamação acerca da admissão da candidatura de Carlos Morgado 
 Portugal, o reclamante limitou-se a reafirmar o que antes havia alegado, não 
 aduzindo quaisquer argumentos novos, nem questionando directamente os 
 fundamentos que estiveram na base do despacho, fundamentos que, por 
 desnecessidade, não se repetirão, antes se relegando para o teor do despacho.”
 
  
 
  
 
 4. No mesmo dia 2 de Setembro, o mandatário do Partido Socialista recorreu para 
 o Tribunal Constitucional do despacho que indeferiu a reclamação, relativamente 
 aos dois candidatos agora em causa, nos seguintes termos:
 
 “A promiscuidade de interesses está bem reflectida nas Autarquias e até já  
 deixou há muito de ser um caso de polícia para se transformar num problema de 
 regime.
 Celorico da Beira, não foge à regra e eis que nas Listas do P.S.D. se constata a 
 inclusão de cerca de meia centena de funcionários autárquicos, o que diga-se em 
 abono da verdade ultrapassa as raias da subversão dos princípios éticos da 
 Democracia e denota-se também aqui que se trata de uma mera novela política que 
 em nada abona quem antes deveria pugnar pela licitude dos meios.
 Ora, vejamos:
 O candidato Carlos Morgado Portugal é funcionário qualificado e com funções 
 directivas no Município de Celorico da Beira, prestando uma comissão de serviço, 
 temporário, no Município de Almeida (mero alibi).
 Há muito que desempenhava as funções de Chefe de Divisão no Município de 
 Celorico da Beira e vem ocupar tal cargo, quando bem entender, dado que a 
 comissão de serviço é apenas de carácter temporário e termina quando a 
 ele-candidato o aprouver, o que se infere que isso suceda se o mesmo for eleito 
 Presidente da Junta de Freguesia de Cortiçô da Serra, onde efectivamente reside.
 Acrescenta-se que a esposa de tal candidato é também ela funcionária do 
 Município de Celorico da Beira, o que tudo bem revela a oportunidade do intróito 
 destas alegações;
 O candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, não suspendeu as funções, 
 que desempenha na EMCEL, como, aliás, fez o seu colega e também candidato Manuel 
 Alberto Almeida Cabral.
 Estão assim ambos feridos pelos normativos legais contemplados na Lei Eleitoral 
 e se não vejamos:
 
 – A doutrina firmada em múltiplos acórdãos nesse Venerando Tribunal resulta que, 
 tendo em conta o disposto no art. 251º da Constituição da República Portuguesa e 
 nos artigos 42º, n.º 1 e 24, n.º 1, 1ª parte da Lei n.º 169/99, em 18 de 
 Setembro, a candidatura no primeiro lugar da Lista a uma Assembleia de Freguesia 
 
 é simultaneamente uma candidatura à Assembleia Municipal, apesar de estarem em 
 causa duas autarquias distintas (conforme resulta do disposto no art. 236º, n.º 
 
 1 da Constituição da República Portuguesa e no art. 10º da Lei que regula a 
 eleição dos titulares dos Órgãos das Autarquias Locais).
 Por essa razão o candidato Carlos Morgado Portugal, com os sinais dos autos, 
 pela função que exerce no Município de Celorico da Beira se for candidato a uma 
 Assembleia de freguesia do respectivo Município, no primeiro lugar da Lista, 
 fica ferido da inelegibilidade prevista no art. 7º, n.º 1, alínea d), da Lei 
 Eleitoral;
 Da mesma forma o candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, pelas 
 funções que desempenhava e desempenha na Empresa Municipal Celoricense  (EMCEL), 
 com sede na vila de Celorico da Beira e cujo capital social é detido a 100% pela 
 Câmara Municipal de Celorico da Beira não pode ser candidato a cabeça de Lista 
 de uma Assembleia de Freguesia do mesmo Município, sem que tenha suspendido as 
 funções na data da propositura  da Candidatura, o que, efectivamente não 
 sucedeu, fica assim, também ferido da inelegibilidade prevista no art. 7º, n.º 
 
 1, alínea d) da Lei Eleitoral
 
                         Assim os Candidatos
 
 – Carlos Morgado Portugal, Chefe de Divisão do Município de Celorico da Beira 
 tendo sido proposto como cabeça de lista do P.S.D. deve ser declarado inelegível 
 para a Assembleia de Freguesia de Cortiçô da Serra (n.º 1, alínea d), do art. 7º 
 da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14/8); e
 
 – Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, funcionário com funções de chefia 
 na EMCEL, de Celorico da Beira, tendo sido proposto como cabeça de Lista do 
 P.S.D. deve ser declarado inelegível para a Assembleia de Freguesia de Açôres 
 
 (n.º 1, alínea d) do art. 7º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14/8).”
 
  
 Respondeu o PPD/PSD, sustentando, quanto a Carlos Abel Gonçalves da Silva 
 Patrocínio, que o mesmo não exerce qualquer cargo directivo e, quanto a Carlos 
 Morgado Portugal, que, tendo sido nomeado em comissão de serviço Director 
 Administrativo e Financeiro da Câmara de Almeida, cessou as funções de chefe de 
 divisão para as quais tinha sido nomeado, igualmente em comissão de serviço, na 
 Câmara Municipal de Celorico de Basto, mantendo apenas quanto a esta autarquia a 
 categoria profissional que tem, e que é a de técnico superior de 1ª classe. 
 Cessando a actual comissão de serviço, para a qual foi nomeado em 2001, 
 regressará ao exercício das funções correspondentes à categoria de técnico 
 superior, como resulta do artigo 29º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, na 
 redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 51/2005, de 30 de Agosto.
 E juntou, com a resposta, uma declaração do Presidente da Câmara de Celorico da 
 Beira, atestando que este candidato pertence ao quadro da autarquia com a 
 categoria de técnico superior  de 1º classe, tendo cessado as funções de chefe 
 de divisão em 19/11/2001 com a nomeação em comissão de serviço já referida.
 
  
 
 5. O recurso foi interposto por quem tem legitimidade e de uma “decisão final 
 relativa à apresentação de candidaturas”, ou seja, de uma decisão que indeferiu 
 a reclamação contra a admissão dos referidos candidatos apresentados pelo 
 PPD/PSD e foi interposto dentro do prazo (artigos 29º, n.º 1, 31º e 32º da Lei 
 Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais).
 Assenta, em ambos os casos, na alegação de verificação da inelegibilidade 
 prevista na al. d) do n.º 1 do artigo 7º da Lei Eleitoral, rectificado pela 
 declaração n.º 20-A/2001, de 17 de Outubro (Diário da República, I Série A, de  
 
 12 de Outubro, supl.) da qual, combinada com o corpo deste n.º 1, resulta que 
 
 “Não são elegíveis para os órgãos das autarquias locais dos círculos eleitorais 
 onde exercem funções ou jurisdição: (...) d) Os funcionários dos órgãos das 
 autarquias locais ou dos entes por estas constituídos ou em que detenham posição 
 maioritária, que exerçam funções de direcção, salvo no caso de suspensão 
 obrigatória de funções desde a data de entrega da lista de candidatura em que se 
 integrem”.
 Como o Tribunal Constitucional já por diversas vezes observou, esta 
 inelegibilidade – que em qualquer caso representa “uma restrição ao um direito 
 fundamental (à participação política) e, consequentemente, uma compressão (ou 
 limite negativo) da capacidade eleitoral passiva dos cidadãos por ela visados” 
 
 (Acórdão n.º 705/93, Diário da República, II série, de 14 de Fevereiro), tem 
 
 «por fundamento ou justificação decisiva (..)”, basicamente, a preservação da 
 
 “independência do exercício dos cargos electivos autárquicos” e a garantia de 
 que “os respectivos titulares desempenhem esses cargos com isenção e 
 
 ‘desinteresse’, ou seja, com ‘imparcialidade’» (acórdão n.º 515/2001, Diário da 
 República, II série, de 20 de Dezembro de 2001). 
 Tem, em consonância com tal objectivo, um âmbito de aplicação territorialmente 
 limitado à área da autarquia na qual os candidatos se apresentam à eleição. E 
 abrange, desde a Lei Eleitoral vigente, que neste ponto alterou o regime 
 anterior (artigo 4º, n.º1, c),  do Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro – 
 
 “funcionários dos órgãos representativos das freguesias e dos municípios”) 
 apenas os funcionários que tenham “funções de direcção”, embora possam exercer 
 funções, quer em “órgãos das autarquias locais”, quer em órgãos “dos entes por 
 estes constituídos ou em que detenham posição maioritária”.
 
  
 
 6. Verifica-se em ambos os casos que se trata de candidatos que ocupam a posição 
 de cabeça de lista à eleição para assembleias de freguesias do concelho de 
 Celorico da Beira, sendo certo que são invocados como fundamento de 
 inelegibilidade a titularidade de cargos municipais, no âmbito daquele 
 município.
 Ora, como o Tribunal Constitucional já por diversas vezes observou, e se 
 escreveu por exemplo no acórdão n.º 516/2001, o qual indica jurisprudência no 
 mesmo sentido, (Diário da República, II série, de 20 de Dezembro de 2001), “a 
 candidatura, no primeiro lugar da lista, a uma assembleia de freguesia é 
 simultaneamente uma candidatura à assembleia municipal – apesar de estarem em 
 causa duas autarquias distintas”. Assim decorre do disposto nos artigos 251º da 
 Constituição e 42º, n.º 1 e 24º, n.º 1, primeira parte da Lei n.º 169/99, de 18 
 de Setembro, alterada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro.
 Daqui resulta, desde já, que estaria preenchido o âmbito territorial abrangido 
 pela incompatibilidade em causa.
 
  
 
 7. Aqui chegados, importa distinguir.
 Relativamente a Carlos Morgado Portugal, a alegação de inelegibilidade assenta 
 num equívoco: o de que o candidato mantém a titularidade do cargo de chefe de 
 divisão no município de Celorico da Beira.
 
 É certo que o cargo de chefe de divisão municipal é expressamente qualificado 
 por lei como um cargo de direcção (artigo 2º, n.º 1, c), do Decreto-Lei n.º 
 
 93/2004, de 20 de Abril, que adaptou à administração local o regime definido 
 pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, entretanto alterada pela Lei n.º 51/2005, 
 de 30 de Agosto).
 Mas é igualmente certo que, ao ser nomeado em regime de comissão de serviço para 
 exercer as funções de Director de Departamento Administrativo e Financeiro na 
 Câmara Municipal de Almeida, cessaram as suas funções como chefe de divisão, 
 mantendo apenas como vínculo ao município de Celorico da Beira o que corresponde 
 ao lugar que ocupa no quadro de pessoal respectivo: técnico superior de 1ª 
 classe, como prova a declaração do respectivo presidente da Câmara, de fls. 
 
 5327, cargo que não é de direcção, como resulta da lista constante dos diplomas 
 acabados de citar.
 Não continuando a ser titular de um cargo dirigente no município de Celorico da 
 Beira, nem se torna necessário ir averiguar que efeito teria uma eventual 
 cessação da comissão de serviço no município onde actualmente presta funções, 
 contrariamente ao que o Tribunal Constitucional se viu forçado a investigar, por 
 exemplo, no seu acórdão n.º 700/97 (Diário da República, II série, de 14 de 
 Janeiro de 1998), amplamente transcrito no despacho de fls. 5225, para o qual 
 remeteu a decisão ora recorrida.
 
  
 
 8. Quanto ao candidato Carlos Abel Gonçalves da Silva Patrocínio, verifica-se, 
 como também se entendeu no despacho recorrido, que o recorrente não fez prova 
 quanto ao exercício de funções de direcção no âmbito da Empresa Municipal 
 Celoricense, EM.
 Com efeito, e admitindo-se como assente que o candidato é funcionário da 
 referida empresa, e que tem a categoria de Sub-Chefe de Estação, como aliás 
 afirma o Presidente do Conselho de Administração respectivo no documento de fls. 
 
 5289, a verdade é que, não só não está demonstrada nos autos a exacta relação da 
 empresa com o Município de Celorico da Beira nem, tão pouco, a que funções 
 corresponde o lugar de sub-chefe de estação, funções essas que naturalmente 
 dependerão da organização interna da empresa.
 Como o Tribunal Constitucional também já afirmou, é ao recorrente que incumbe o 
 
 ónus da prova dos factos constitutivos da inelegibilidade que invoca (cfr. 
 acórdão n.º 688/97, Diário da República, II série, de 9 de Janeiro de 1998), 
 como resulta das regras gerais vigentes em matéria de ónus da prova (artigo 342º 
 Código Civil).
 Não estando provado o desempenho de funções de chefia num “ente” constituído 
 pelo Município de Celorico da Beira ou no qual o mesmo Município tenha posição 
 maioritária, não pode o tribunal concluir pela sua inelegibilidade.
 Solução contrária só poderia decorrer da existência de uma presunção de 
 inelegibilidade, presunção que, nem existe, nem seria conforme com a natureza 
 atrás apontada para as inelegibilidades.
 
  
 
  
 
  
 
  
 
 9. Nestes termos, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão de 
 julgar elegíveis Carlos Morgado Portugal e Carlos Abel Gonçalves da Silva 
 Patrocínio.
 
  
 Lisboa, 16 de Setembro de 2005
 
  
 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
 Maria Helena Brito
 Paulo Mota Pinto
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Maria Fernanda Palma
 Mário José de Araújo Torres
 Vítor Gomes
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos
 Gil Galvão
 Bravo Serra
 
  Artur Maurício