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Processo n.º 939/04
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
  
 
  
 
                         Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal 
 Constitucional,
 
  
 
  
 
                         1. Notificado do Acórdão n.º 92/2005, que indeferiu 
 reclamação de decisão sumária de não conhecimento do objecto de recurso 
 interposto para o Tribunal Constitucional, veio o recorrente A. “arguir 
 nulidade e manifesto erro de facto, nos seguintes termos”:
 
  
 
             “1 – No que diz respeito à primeira das arguições de 
 inconstitucionalidade, insiste o acórdão numa data de registo, a qual não está 
 de modo algum confirmada e é essa circunstância que causa a instabilidade do 
 Direito e aponta, sem qualquer tipo de dúvidas, para um sistema jurídico sem 
 Constituição.
 
             2 – Com efeito, diz a Lei Fundamental, ou parece dizê-lo, que o 
 cidadão tem direito a que a sua causa seja submetida a um tribunal imparcial, 
 terceiro distante das partes e que toma a causa como um objecto, isto é, com 
 autonomia perante o seu próprio envolvimento no fecho a dar-lhe.
 
             3 – Como pode ser assim se os prazos precludem direitos e as 
 interpretações normativas permitem o resultado de ser o tribunal a determinar 
 arbitrariamente os termos a partir dos quais contam.
 
             4 – Esta circunstância torna os tribunais parte, porque não 
 respeitam a distância perante a causa, distância que, justamente, só pode ser 
 dada por normas de processo que determinam objectivamente, pelo menos, as 
 balizas dos prazos a cumprir pelos litigantes.
 
             5 – Ora, estas questões, mais bem ou mal alegadas, estão lá e são 
 substanciais.
 
             6 – O que o reclamante pretende é não haver por parte do Tribunal 
 Constitucional uma demissão formalística, aberta a permitir o arbítrio 
 judiciário.
 
             7 – Decerto que o Direito só poderá ser uma ciência se responder 
 negativamente à pergunta:
 
             8 – É ou não direito o direito do «Terceiro Reich»?
 
             9 – Evidente é que aqui o Terceiro Reich é o arbítrio judiciário, 
 similar a qualquer arbítrio, arbítrio hipostasiado em ser direito apenas e 
 tão-só a vontade do «Führer».
 
             10 – Desculpe-se-nos o exagero argumentativo assumido, mas as 
 questões têm de ser postas perante os tribunais, que nos habituaram a 
 enfrentá-las com coragem e determinação, tal como foi até aqui o procedimento 
 comum do Tribunal Constitucional.
 
             11 – Nesta linha, que seria uma pena se viesse a ser inflectida, 
 muito por razões de acumulação de serviço que deriva só da falta de cuidado dos 
 Governos, o reclamante espera que seja de vez enfrentada a questão que colocou 
 efectivamente:
 
             – Declaração de inconstitucionalidade do acto normativo constituído 
 pelo artigo 254.º – congregado aos artigos 265.º-A, 266.º, n.ºs 1 e 4, e 
 
 266.º-A, todos do CPC, por violação dos artigos 13.° e 20.º, n.ºs 1, 4 e 5, da 
 CRP, na interpretação de bastar a tarjeta de leitura óptica e a aposição da data 
 pela secretaria nos envelopes da correspondência remetida pelo tribunal para o 
 destinatário estabelecer o dia do registo.
 
             12 – Em suma, que o Tribunal Constitucional responda à pergunta: 
 podem os tribunais manipular os inícios e fins de prazos processuais por 
 simples declaração?
 
             13 – No que diz respeito à segunda questão levantada, trata-se, 
 afinal de contas, do respeito pelo contraditório e, mais uma vez, das garantias 
 contra o arbítrio judiciário.
 
             14 – Neste particular, a decisão não considerou como interpretação 
 normativa criticada a circunstância de, no campo dos n.ºs 5 a 7 do artigo 145.º 
 do CPC, o tribunal ter incluído a supressão do tempo, adquirindo para a decisão 
 do caso apenas o obiter dictum de outra decisão anterior.
 
             15 – Ora, este problema estava posto e a ele não foi dada resposta: 
 daí a omissão.
 
             16 – E omissão que se torna frisante quando é mesmo o acesso ao 
 Direito e aos Tribunais que entra em crise com estes modelos de práticas ditas 
 jurídicas.
 
             17 – E que o Tribunal Constitucional está em risco de dizer que: 
 
 «Sim, senhor! São Direito!» – porque não podem ser criticadas do ponto de vista 
 do respeito pela Constituição Republicana.
 
             18 – É aqui que está no entender do reclamante o manifesto erro de 
 apreciação que justifica poder [ser] sobrestada a decisão.
 
             V. Ex.as, reapreciando os problemas, deferindo a arguição de 
 nulidade e erro manifesto, mandarão seguir o recurso para julgamento, como é de 
 Direito e Justiça.”
 
  
 
                         A recorrida não apresentou resposta.
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                         2. No acórdão ora impugnado, objecto de cognição por 
 parte da conferência era a correcção do entendimento, sustentado na decisão 
 sumária do relator, de que não era possível conhecer do objecto do recurso por 
 não terem sido aplicadas, na decisão recorrida, as dimensões normativas arguidas 
 de inconstitucionais.
 
                         A conferência apreciou essas questões, decidindo, quanto 
 
 à primeira questão de inconstitucionalidade suscitada, que a dimensão normativa 
 indicada pelo recorrente (interpretação segundo a qual se considera que uma 
 parte foi notificada em certa data, por via postal, do despacho que recebeu o 
 recurso, quando o envelope remetido continha apenas uma tarjeta de leitura 
 
 óptica, sem indicação de data de registo, de leitura difícil para a maior parte 
 dos advogados e dos cidadãos, porque só possível com instrumento próprio dos 
 correios ou através da Internet) não havia sido aplicada pela decisão recorrida, 
 pois nesta se entendeu, de acordo com os elementos documentados nos autos, que 
 a data do registo constava da parte frontal do sobrescrito e também do ofício 
 de notificação, ao que acrescia que o recorrente sempre poderia questionar a 
 correcção dessa data, embora, no caso, esta tarefa estivesse votada ao 
 insucesso, uma vez que a data constante do rosto do sobrescrito como sendo a do 
 registo correspondia de facto à data em que o registo fora efectivado, como se 
 comprovava pela guia fotocopiada a fls. 314. Não padece, assim, nesta parte, o 
 acórdão reclamado de qualquer nulidade (designadamente por omissão de 
 pronúncia) ou de erro de facto, sendo dificilmente compreensível que o 
 reclamante afirme não estar comprovada nos autos a data do registo.
 
                         Relativamente à segunda questão de inconstitucionalidade 
 suscitada, entendeu o acórdão ora atacado que, por um lado, o recorrente não 
 identificara, com precisão e clareza, como lhe competia, qual a interpretação 
 normativa que reputava inconstitucional; que, por outro lado, a violação dos 
 princípios constitucionais invocados era imputada directamente à conduta 
 processual das instâncias, o que não constituía objecto idóneo de recurso de 
 constitucionalidade; e que, finalmente, a decisão das instâncias foi no sentido 
 do não conhecimento do pedido de dispensa de pagamento da multa, por força da 
 existência de anterior decisão sobre a mesma questão transitada em julgado, o 
 que de novo determinava a não coincidência entre a dimensão normativa aplicada 
 na dimensão recorrida e a dimensão normativa cuja constitucionalidade o 
 recorrente pretendia ver apreciada. Também nesta parte o acórdão ora reclamado 
 não padece de qualquer nulidade (designadamente por omissão de pronúncia) ou de 
 erro de facto.
 
  
 
                         3. Termos em que se acorda em indeferir a presente 
 reclamação.
 
                         Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 
 
 15 (quinze) unidades de conta.
 Lisboa, 19 de Abril de 2005
 Mário José de Araújo Torres
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos