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Processo  n.º 532/09
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
             Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
             1 – A., Lda., vem reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto 
 no n.º 3 do artigo 78.º-A, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual 
 versão (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal 
 Constitucional, que decidiu não conhecer do recurso interposto de acórdão do 
 Tribunal Central Administrativo Norte.
 
  
 
             2 – Fundamentando a sua reclamação alega a reclamante:
 
  
 
 «[…]
 
 - dão-se aqui por reproduzidos os fundamentos anteriormente indicados pela 
 recorrente para a admissão do presente recurso e que foram os seguintes 
 
  
 
 - a ora recorrente quando foi proferido o douto acórdão do Tribunal Central 
 Administrativo Norte interpôs do mesmo recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, por oposição de acórdãos, e para o Tribunal Constitucional. Por douto 
 despacho proferido a fls... dos presentes autos foi decidido que o momento para 
 a interposição do recurso só poderia ser apreciado após a decisão proferida pelo 
 Supremo Tribunal Administrativo. 
 
  
 O presente recurso para este Venerando Tribunal visa a decisão proferida pelo 
 Tribunal Central Administrativo Norte. Na decisão proferida por este Tribunal 
 diz-se que “a douta sentença recorrida não viola qualquer norma constitucional 
 
 (igualdade e acesso ao direito ou proibição do princípio da indefesa...”. Nas 
 alegações para o Tribunal Central Administrativo Norte a ora recorrente alegou o 
 seguinte: item 18 “como ensina a doutrina se a administração tributária não 
 passar a certidão requerida (nos termos dos art.s 37 e 99 do CPPT) nem efectuar 
 a notificação dos requisitos omitidos, o acto notificado permanecerá ineficaz em 
 relação ao notificado irregularmente, não decorrendo o prazo para uso do meio de 
 impugnação graciosa ou contenciosa que se pretende utilizar (V. Código de 
 Procedimento e Processo Tributário - anotado por Jorge Lopes de Sousa - ano 2000 
 
 - pág.228); item 19 “por outro lado, o entendimento perfilhado na decisão do 
 Tribunal “ a quo” no que toca à interpretação que efectua ao disposto nos art.s 
 
 39 e 99, ambos do CPPT, é claramente violador dos princípios constitucionais do 
 Estado de Direito, igualdade e acesso ao direito – artºs 2, 9, 13 e 20, todos da 
 Constituição da República Portuguesa”. 
 
  
 O presente recurso é formulado ao abrigo do art. 70 nº 1 alínea b) e nº 2 da Lei 
 nº 28/82, de 15 de Novembro, porque, a interpretação efectuada pelo Tribunal 
 Central Administrativo Norte aos art.s 37 e 99, ambos do Código de Procedimento 
 e Processo Tributário, é no entender da ora recorrente, e salvo o devido 
 respeito por melhor opinião, claramente violador dos princípios constitucionais 
 do Estado de Direito, igualdade e acesso ao direito – art.s 2, 9, 13, 18 e 20, 
 todos da Constituição da República Portuguesa. A nossa Lei Fundamental consagra 
 como um dos pilares do Estado de Direito a possibilidade do exercício de 
 contraditório (proibição do principio da indefesa) – art. 20 da CRP. Este 
 princípio encontra tradução no seguinte: todo o processo que é iniciado deve 
 estar sujeito ao princípio do contraditório, ou seja, o demandado deve poder ser 
 
 “ouvido em juízo” e pode expor a sua verdade dos factos, de forma a poder ter um 
 
 “processo justo”. E o “processo justo” só pode ser aquele em que para além das 
 questões formais, o demandante ou recorrente possa discutir, também, as questões 
 materiais que estão subjacentes aos actos que limitam os seus direitos, 
 liberdades e garantias. A proibição da “indefesa” consiste na privação ou 
 limitação de direitos do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais 
 se discutem questões que lhe dizem respeito. “A violação do direito à tutela 
 judicial efectiva sob o ponto de vista da limitação do direito de defesa, 
 verificar-se-á sobretudo quando a não observância de normas processuais ou de 
 princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer 
 o seu direito de alegar, dai resultando prejuízos efectivos para os seus 
 interesses (v. Gomes Canotilho e Vital Moreira – CRP anotada, 1993, pp 163 e 
 
 164, e Fundamentos da Constituição, pág. 82 e 83). 
 
  
 O caso dos autos é manifestamente um caso em que o particular perante um erro e 
 omissão grave dos serviços da administração tributária se vê impedido de 
 discutir os aspectos materiais e fundamentos que estão subjacentes à emanação do 
 acto tributário. Sendo que, tal situação, ainda, se afigura mais grave quando a 
 ora recorrente conseguiu em sede de impugnação de IVA, relativamente ao mesmo 
 período de tempo, e através de decisão judicial do Tribunal Central 
 Administrativo Norte demonstrar que os critérios e os fundamentos utilizados 
 pela administração fiscal no relatório que conduziu à liquidação do acto 
 tributário não estavam correctos, e que os mesmos padeciam de vicio de lei e de 
 falta de fundamentação do acto tributário (v. acórdão junto aos autos a fls... 
 relativo ao IVA e proferido em 6-03-2008 pelo Tribunal Central Administrativo 
 Norte). 
 
  
 Para a ora recorrente, e salvo o devido respeito por melhor opinião, e como 
 supra se referiu a decisão do Tribunal Central Administrativo Norte fez 
 incorrecta interpretação da lei, e a interpretação efectuada em relação aos 
 art.s 37 e 99, ambos do CPPT e art.s 56 e 86 da Lei Geral Tributária está ferida 
 de inconstitucionalidade, porque violam o disposto nos art.s 2, 9, 13, 18 e 20, 
 todos da CRP, na medida em que estes permitem que qualquer cidadão ou empresa 
 possa discutir um juízo qualquer acto que ofenda os seus direitos, liberdades e 
 garantias, e sem que as questões de ordem formal se sobreponham às questões de 
 ordem material. Nomeadamente quando tal impedimento resulta de um erro e omissão 
 praticados pela própria Administração Tributária. No fundo trata-se de aplicar 
 ao presente caso uma das regras fundamentais do direito civil que é a proibição 
 do “venire contra factum proprium” – art. 334 do C.Civil. Não pode, pois, a 
 administração tributária beneficiar de um direito (liquidação do tributo) quando 
 foi ela própria que cometeu erro grave e omissão que impediu a ora recorrente de 
 poder fazer valer, atempadamente, os seus direitos em sede própria.
 
  
 Acresce, ainda, que, o presente recurso no entender da recorrente deve ser 
 admitido, dado que, o recurso efectuado por esta ao disposto no art. 37 do CPPT 
 ser um direito fundamental e a fundamentação expressa dos actos tributários ser 
 para além de uma imposição legal, é uma exigência constitucional – art. 268 nº 3 
 do CRP, o que para a recorrente não se verificou nos presentes autos pelas 
 razões já anteriormente aduzidas. Dado que, relativamente ao pedido de 
 esclarecimento solicitado pela ora recorrente perante a Administração Tributária 
 directamente relacionado com a situação que determinou as liquidações efectuadas 
 a nível de IRC e objecto de impugnação, foi manifesta intenção da AT em se 
 remeter ao silêncio, e consequentemente, desrespeitar os princípios da 
 cooperação e da boa fé que devem presidir às relações entre administradores e 
 administrados. A interpretação que faz do art. 37 do CPPT por parte do Tribunal 
 Central Administrativo Norte viola no entender da recorrente os preceitos 
 constitucionais supra indicados 
 
  
 Pelo exposto, a ora recorrente requer a V.Exªs. a admissão do presente recurso». 
 
 
 
  
 
             3 – A reclamada Fazenda Pública respondeu à reclamação sustentando 
 que a reclamante não só não refutou os fundamentos da decisão reclamada como 
 continua a discutir a correcção da decisão judicial recorrida para o Tribunal 
 Constitucional e a não enunciar uma questão de constitucionalidade normativa que 
 possa ser conhecida pelo Tribunal.
 
  
 
             4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
 
             
 
             «1 – A., L.da, com os demais sinais dos autos, recorre para o 
 Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), 
 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), pretendendo ver 
 sindicada a “inconstitucionalidade do artigo 37.º do CPPT, por esta norma, tal 
 como foi interpretada, violar os princípios constitucionais da igualdade e do 
 acesso ao direito – artigos 2.º, 9.º, 13.º, 18.º e 20.º da Constituição da 
 República Portuguesa”.
 
              2 – Respondendo ao convite feito pelo relator nos termos do artigo 
 
 75.º-A, n.º 5, da LTC, a recorrente disse o seguinte:
 
             “(...)
 
 - a ora recorrente quando foi proferido o douto acórdão do Tribunal Central 
 Administrativo Norte interpôs do mesmo recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, por oposição de acórdãos, e para o Tribunal Constitucional. Por douto 
 despacho proferido a fls... dos presentes autos foi decidido que o momento para 
 a interposição do recurso só poderia ser apreciado após a decisão proferida pelo 
 Supremo Tribunal Administrativo. 
 O presente recurso para este Venerando Tribunal visa a decisão proferida pelo 
 Tribunal Central Administrativo Norte. Na decisão proferida por este Tribunal 
 diz-se que “a douta sentença recorrida não viola qualquer norma constitucional 
 
 (igualdade e acesso ao direito ou proibição do principio da indefesa... “. Nas 
 alegações para o Tribunal Central Administrativo Norte a ora recorrente alegou o 
 seguinte : item 18 “como ensina a doutrina se a administração tributária não 
 passar a certidão requerida (nos termos dos artºs 37 e 99 do CPPT) nem efectuar 
 a notificação dos requisitos omitidos, o acto notificado permanecerá ineficaz em 
 relação ao notificado irregularmente , não decorrendo o prazo para uso do meio 
 de impugnação graciosa ou contenciosa que se pretende utilizar (V. Código de 
 Procedimento e Processo Tributário - anotado por Jorge Lopes de Sousa - ano 2000 
 
 - pág.228); item 19 “ por outro lado, o entendimento perfilhado na decisão do 
 Tribunal “ a quo” no que toca à interpretação que efectua ao disposto nos artºs 
 
 39 e 99, ambos do CPPT, é claramente violador dos princípios constitucionais do 
 Estado de Direito, igualdade e acesso ao direito – artºs 2, 9, 13 e 20, todos da 
 Constituição da República Portuguesa”. 
 O presente recurso é formulado ao abrigo do art. 70 nº 1 alínea b) e nº 2 da Lei 
 nº 28/82, de 15 de Novembro, porque, a interpretação efectuada pelo Tribunal 
 Central Administrativo Norte aos artºs 37 e 99, ambos do Código de Procedimento 
 e Processo Tributário, é no entender da ora recorrente, e salvo o devido 
 respeito por melhor opinião, claramente violador dos princípios constitucionais 
 do Estado de Direito, igualdade e acesso ao direito — artºs 2, 9, 13, 18 e 20, 
 todos da Constituição da República Portuguesa. A nossa Lei Fundamental consagra 
 como um dos pilares do Estado de Direito a possibilidade do exercício de 
 contraditório (proibição do princípio da indefesa) – art. 20 da CRP. Este 
 princípio encontra tradução no seguinte: todo o processo que é iniciado deve 
 estar sujeito ao princípio do contraditório, ou seja, o demandado deve poder ser 
 
 “ouvido em juízo “e pode expor a sua verdade dos factos, de forma a poder ter um 
 
 “processo justo”. E o “processo justo “só pode ser aquele em que para além das 
 questões formais, o demandante ou recorrente possa discutir, também, as questões 
 materiais que estão subjacentes aos actos que limitam os seus direitos, 
 liberdades e garantias. A proibição da “indefesa “consiste na privação ou 
 limitação de direitos do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais 
 se discutem questões que lhe dizem respeito. “A violação do direito à tutela 
 judicial efectiva sob o ponto de vista da limitação do direito de defesa, 
 verificar-se-á sobretudo quando a não observância de normas processuais ou de 
 princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer 
 o seu direito de alegar, dai resultando prejuízos efectivos para os seus 
 interesses (v. Gomes Canotilho e Vital Moreira - CRP anotada, 1993, pp 163 e 
 
 164, e Fundamentos da Constituição, pág. 82 e 83). 
 O caso dos autos é manifestamente um caso em que o particular perante um erro e 
 omissão grave dos serviços da administração tributária se vê impedido de 
 discutir os aspectos materiais e fundamentos que estão subjacentes à emanação do 
 acto tributário. Sendo que, tal situação, ainda, se afigura mais grave quando a 
 ora recorrente conseguiu em sede de impugnação de IVA, relativamente ao mesmo 
 período de tempo, e através de decisão judicial do Tribunal Central 
 Administrativo Norte demonstrar que os critérios e os fundamentos utilizados 
 pela administração fiscal no relatório que conduziu à liquidação do acto 
 tributário não estavam correctos, e que os mesmos padeciam de vicio de lei e de 
 falta de fundamentação do acto tributário (v. acórdão junto aos autos a fls... 
 relativo ao IVA e proferido em 6-03-2008 pelo Tribunal Central Administrativo 
 Norte). 
 Para a ora recorrente, e salvo o devido respeito por melhor opinião, e como 
 supra se referiu a decisão do Tribunal Central Administrativo Norte fez 
 incorrecta interpretação da lei, e a interpretação efectuada em relação aos 
 art2s 37 e 99, ambos do CPPT e arts 56 e 86 da Lei Geral Tributária está ferida 
 de inconstitucionalidade, porque violam o disposto nos art2s 2, 9, 13, 18 e 20, 
 todos da CRP, na medida em que estes permitem que qualquer cidadão ou empresa 
 possa discutir um juízo qualquer acto que ofenda os seus direitos, liberdades e 
 garantias, e sem que as questões de ordem formal se sobreponham às questões de 
 ordem material. Nomeadamente quando tal impedimento resulta de um erro e omissão 
 praticados pela própria Administração Tributária No fundo trata-se de aplicar ao 
 presente caso uma das regras fundamentais do direito civil que é a proibição do 
 
 “venire contra factum proprium” – art. 334 do C.Civil. Não pode, pois, a 
 administração tributária beneficiar de um direito (liquidação do tributo) quando 
 foi ela própria que cometeu erro grave e omissão que impediu a ora recorrente de 
 poder fazer valer, atempadamente, os seus direitos em sede própria (...)”.
 
  
 
             3 – Porque o caso sub judicio se enquadra no âmbito da hipótese 
 recortada no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, e igualmente atenta a disposição do 
 artigo 76.º, n.º 3, do mesmo diploma, passa a decidir-se, nos termos seguintes.
 
  
 
             4 – O presente recurso foi interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 
 
 1 do artigo 70.º da LTC, que admite, em sede de fiscalização concreta da 
 constitucionalidade, os recursos interpostos de decisão que apliquem, como ratio 
 decidendi, norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo.
 
  
 Para tais efeitos, importa, pois, colocar o tribunal recorrido perante o dever 
 de apreciação da constitucionalidade de uma norma legal individualizada, havendo 
 de concretizar-se o sentido desse preceito de modo a que, no caso de vir a ser 
 julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão em termos 
 de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os operadores do direito 
 ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual é o preceito e com que sentido 
 ele não deve ser aplicado por, desse modo, violar a Constituição.
 Em cumprimento desse desiderato, exige-se que em sede de recurso a questão de 
 constitucionalidade seja objectivada de modo claro, directo e objectivo (cf. 
 Acórdão n.º 1210/96, disponível em www.tribunalconstitucional.pt), nas 
 conclusões da motivação do recurso, uma vez que são estas que delimitam o âmbito 
 e o objecto do recurso, e, concretizando o sentido dessa exigência, tem este 
 Tribunal estabelecido que «“suscitar a inconstitucionalidade de uma norma 
 jurídica é fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é 
 colocada saiba que tem uma questão de constitucionalidade determinada para 
 decidir. Isto reclama, obviamente, que (...) tal se faça de modo claro e 
 perceptível, identificando a norma (ou um segmento dela ou uma dada 
 interpretação da mesma) que (no entender de quem suscita essa questão) viola a 
 Constituição; e reclama, bem assim, que se aponte o porquê dessa 
 incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao menos, a norma ou 
 princípio constitucional infringido.” Impugnar a constitucionalidade de uma 
 norma implica, pois, imputar a desconformidade com a Constituição não ao acto de 
 aplicação do Direito – concretizado num acto de administração ou numa decisão 
 dos tribunais – mas à própria norma, ou, quando muito, à norma numa determinada 
 interpretação que enformou tal acto ou decisão (cf. Acórdãos nºs 37/97, 680/96, 
 
 663/96 e 618/96, este publicado no Diário da República, II Série, de 
 
 15-05-1996). [§] É certo que não existem fórmulas sacramentais para formulação 
 dos pedidos, nem sequer para suscitação da questão de constitucionalidade. [§] 
 Esta tem, porém, de ocorrer de forma que deixe claro que se põe em causa a 
 conformidade à Constituição de uma norma (...)” – cf. o referido Acórdão n.º 
 
 618/98 e os acórdãos para os quais remete. 
 A justificação para tal reside no facto deste Tribunal, por mor das suas 
 particulares competências cognitivas e dos poderes que lhe estão consignados ex 
 constitutionis, não poder assumir-se como uma instância de amparo ao jeito da 
 Verfassungsbeschwerde alemã ou do recurso de amparo espanhol.
 De facto, sendo o objecto do recurso de fiscalização concreta de 
 constitucionalidade constituído por normas jurídicas, não pode sindicar-se, no 
 recurso de constitucionalidade, a decisão judicial em si própria, mesmo quando 
 esta faça aplicação directa de preceitos ou princípios constitucionais, quer no 
 que importa à correcção, no plano do direito infraconstitucional, da 
 interpretação normativa a que a mesma chegou, quer no que tange à forma como o 
 critério normativo previamente determinado foi aplicado às circunstâncias 
 específicas do caso concreto (correcção do juízo subsuntivo).
 
             Deste modo, é sempre forçoso que, no âmbito dos recursos interpostos 
 para o Tribunal Constitucional, se questione a (in)constitucionalidade de 
 normas, não sendo, assim, admissíveis os recursos que, ao jeito da 
 Verfassungsbeschwerde alemã ou do recurso de amparo espanhol, sindiquem, sub 
 specie constitutionis, a concreta aplicação do direito efectuada pelos demais 
 tribunais, em termos de se assacar ao acto judicial de “aplicação” a violação 
 
 (directa) dos parâmetros jurídico-constitucionais. 
 Ou seja, não cabe a este Tribunal apurar e sindicar a bondade e o mérito do 
 julgamento efectuado in concreto pelo tribunal a quo. A intervenção do Tribunal 
 Constitucional não incide sobre a correcção jurídica do concreto julgamento, mas 
 apenas sobre a conformidade constitucional das normas aplicadas pela decisão 
 recorrida, cabendo ao recorrente, como se disse, nos recursos interpostos ao 
 abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, o ónus de suscitar o problema de 
 constitucionalidade normativa num momento anterior ao da interposição de recurso 
 para o Tribunal Constitucional [cf. Acórdão n.º 199/88, publicado no Diário da 
 República II Série, de 28 de Março de 1989; Acórdão n.º 618/98, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, remetendo para jurisprudência anterior (por 
 exemplo, os Acórdãos nºs 178/95 - publicado no Diário da República II Série, de 
 
 21 de Junho de 1995 -, 521/95 e 1026/9, inéditos, e o Acórdão n.º 269/94, 
 publicado no Diário da República II Série, de 18 de Junho de 1994)].
 
             A este propósito escreve Carlos Lopes do Rego («O objecto idóneo dos 
 recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade: as interpretações 
 normativas sindicáveis pelo Tribunal Constitucional», in Jurisprudência 
 Constitucional, 3, p. 8) que “É, aliás, perceptível que, em numerosos casos – 
 embora sob a capa formal da invocação da inconstitucionalidade de certo preceito 
 legal tal como foi aplicado pela decisão recorrida – o que realmente se pretende 
 controverter é a concreta e casuística valoração pelo julgador das múltiplas e 
 específicas circunstâncias do caso sub judicio […]; a adequação e correcção do 
 juízo de valoração das provas e de fixação da matéria de facto provada na 
 sentença (…) ou a estrita qualificação jurídica dos factos relevantes para a 
 aplicação do direito […]».
 
  
 
             5 – No caso concreto, perscrutando os elementos constantes dos autos 
 e aí vertendo os explicitados critérios de admissibilidade do presente recurso, 
 resulta claro que não podem ter-se por verificados os pressupostos determinantes 
 do conhecimento do objecto da pretensão recursória aduzida neste Tribunal, por a 
 mesma traduzir recta via a sindicância do julgado na óptica da aplicação do 
 direito à realidade concreta e factual ponderada pelas instâncias, principaliter 
 o entendimento destas quanto ao juízo de que o “esclarecimento” pedido pela 
 recorrente não se enquadrava no âmbito do artigo 37.º do CPPT, razão pela qual 
 se concluiu, logo em primeira instância, que “se não estamos perante um pedido 
 de fundamentação justificado ao abrigo daquele normativo, o acto de fixação da 
 matéria tributável tem de se considerar eficaz relativamente à impugnante desde 
 a data da sua notificação”.
 
             Tal juízo, que determina a inidoneidade do objecto do presente 
 recurso, resulta igualmente confirmado pelo teor das alegações produzidas nos 
 autos, nas quais a recorrente nunca definiu, com base nos criteria referidos, 
 uma questão de constitucionalidade normativa antes controvertendo, nas suas 
 palavras, “o entendimento (...) de que o pedido de esclarecimento formulado por 
 esta (...) na 2.ª Repartição de Finanças de Vila Nova de Gaia, nos termos do 
 art.º 37.º do CPPT, não... se possa enquadrar no âmbito da fundamentação do acto 
 tributário legalmente exigida”, carecendo este Tribunal de poderes cognitivos 
 para apreciar a aplicação da lei que a recorrente contesta.
 
             
 
             6 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não 
 tomar conhecimento do objecto do recurso.
 
             Custas pela recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 7 (sete) 
 Ucs».
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
             4 – Como se distrai da argumentação tecida na reclamação, a 
 reclamante não rebate a bondade da fundamentação em que se abonou a decisão 
 sumária, nos termos da qual não se verificavam os pressupostos do recurso de 
 constitucionalidade, por a recorrente controverter o julgado «na óptica da 
 aplicação do direito à realidade concreta e factual ponderada pelas instâncias, 
 principaliter o entendimento destas quanto ao juízo de que o “esclarecimento” 
 pedido pela recorrente não se enquadrava no âmbito do artigo 37.º do CPPT, razão 
 pela qual se concluiu, logo em primeira instância, que “se não estamos perante 
 um pedido de fundamentação justificado ao abrigo daquele normativo, o acto de 
 fixação da matéria tributável tem de se considerar eficaz relativamente à 
 impugnante desde a data da sua notificação» e por nunca ter enunciado qualquer 
 questão de constitucionalidade normativa de que a instância recorrida houvesse 
 de conhecer.
 
  
 
             A reclamante continua a esgrimir contra a correcção da decisão 
 judicial pretendida recorrer, a se, por confronto directo, quer com o direito 
 infraconstitucional, quer com as normas e princípios constitucionais que 
 considera aplicáveis ao caso.
 
             Ora, como se disse, na decisão reclamada, não cabe no recurso de 
 constitucionalidade a apreciação da decisão nessa óptica.
 
             Ao Tribunal Constitucional apenas cabe apreciar, no tipo de recurso 
 em causa, questões de constitucionalidade relativas a normas de direito 
 infraconstitucional que tenham constituído fundamento normativo da decisão e que 
 hajam sido colocadas à consideração da instância recorrida.
 
  
 
             Sendo assim, a reclamação deve ser indeferida.
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             5 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide indeferir a reclamação.
 
             Custas pela reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 UCs.
 Lisboa, 18 de Novembro de 2009
 Benjamim Rodrigues
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos