 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo nº 317/07
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
         (Conselheiro  Benjamim Rodrigues)
 
                                                                   
 
  
 
           Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 Relatório
 Em acção, com a forma ordinária, com o valor de 1.598.350.814$00, proposta por 
 A., S.A., contra o Município de Lisboa, que correu termos na 3ª Secção do 
 Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, com o nº 1243/96, foi elaborada a 
 seguinte conta final de custas, da responsabilidade do demandante:
 
  
 
       - Taxas aplicáveis: 
 
              Incidente de apoio judiciário: € 19,984,42
 
              Processo:€ 39.968,85
 
              Recurso:€ 39.968,85
 
       - Reembolsos:€ 106,80
 
       - Procuradoria S.S.M.J.:€ 1.199,07
 
       - Procuradoria C.P.A.S.€ 22.782,24
 
       - Procuradoria à parte vencedora€ 15.987,57
 
         
 
       TOTAL -€ 139.997,80
 
       Taxas de justiça já pagas -€ 1.359,22
 
       Total a pagar -€ 138.638,58
 
 
 
  
 Tendo a Autora reclamado desta conta, foi proferido despacho que decidiu:
 
 “- Não aplicar a Tabela de Custas anexa ao C.C.J., aprovado pelo Dec.Lei nº 
 
 224-A/96, de 26 de Novembro, por padecer de inconstitucionalidade material, por 
 ofensa aos princípios da proporcionalidade e da igualdade (artº 13º, 18º, nº 2, 
 e 266º, nº 2, da C.R.P.);
 
 - Determinar a reforma da conta nos termos previstos no artº 27º, do C.C.J., na 
 redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei nº 324-2003, de 27-12, 
 aplicando-se a respectiva Tabela de taxa de justiça.”
 
  
 Desta decisão interpôs o Ministério Público recurso para o Tribunal 
 Constitucional, nos termos do artº 70.º, nº 1, a), e 72.º, nº 3, da LTC.
 
  
 Respondendo a convite do relator, no Tribunal Constitucional, o recorrente 
 indicou como constituindo objecto do recurso de constitucionalidade a seguinte 
 interpretação normativa:
 
 “A norma que constava do artigo 13.º, n.º 1, CCJ, na versão emergente do 
 Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26/11, conjugada com a tabela constante do anexo I, 
 interpretada em termos de o montante das custas decorrente do decaimento nas 
 acções, incidentes e recursos – por referência a uma acção ordinária de € 
 
 7.972.540,25 – ser calculado em função de tal valor, sem que se preveja a 
 aplicação de qualquer limite máximo e havendo lugar ao pagamento do montante 
 remanescente das custas, mesmo que o processo termine antes de concluída a fase 
 de discussão e julgamento da causa”.
 
  
 O recorrente concluiu do seguinte modo as suas alegações de recurso:
 
 “A norma constante do artigo 13° nº 1, Código das Custas Judiciais, na versão 
 emergente do Decreto-Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro, conjugada com a tabela 
 constante do anexo I, interpretada em termos de o montante das custas decorrente 
 do decaimento numa acção visando efectivar a responsabilidade civil de uma 
 autarquia e respectivos incidentes e recursos – por referência a uma acção 
 ordinária de €7.972.540,25 – ser calculado em função de tal valor, sem que se 
 preveja a aplicação de qualquer limite máximo e havendo lugar ao pagamento do 
 remanescente das custas, mesmo que o processo termine antes de concluída a fase 
 de discussão e julgamento (implicando tributação da parte vencida em 
 
 €138.638,58), não viola os princípios da proporcionalidade e do acesso aos 
 tribunais. 
 Na verdade, tal tributação dessas acções de valor consideravelmente elevado não 
 implica quebra da estrutura bilateral ou sinalagmática das taxas, representando 
 a ponderação – não apenas do valor de custo do serviço em causa – mas também do 
 valor presumivelmente resultante da utilidade obtida através do recurso ao 
 tribunal e da normal complexidade e delicadeza que está subjacente à 
 generalidade dos litígios que envolvem valores dessa natureza.
 Não funcionando o princípio da igualdade em termos diacrónicos, não é possível 
 realizar uma comparação entre tal regime, decorrente da versão de 1996 do Código 
 das Custas Judiciais, e o actualmente estabelecido no artigo 27º, representando 
 uma ponderação inovatória e constitutiva do legislador que não pressupõe a 
 inconstitucionalidade da solução que constava da lei anteriormente vigente.
 Termos em que deverá proceder o presente recurso.”
 
  
 Por sua vez, A., S.A., concluiu, do seguinte modo, as suas contra-alegações:
 
 “O valor das custas liquidado à recorrida por aplicação do artigo 13º do Código 
 das Custas Judiciais, na versão emergente do Decreto-Lei nº224-A/96, de 26 de 
 Novembro, conjugado com a Tabela Anexo I do mesmo Código – cerca de € 140.000, 
 numa acção sem complexidade e que findou no saneador – é manifestamente 
 desproporcional e alheio aos custos que a tramitação com o processo envolve para 
 o Tribunal, configurando um verdadeiro imposto.
 Não constando a Tabela Anexa ao C.C.J. de qualquer Decreto-Lei emitido a coberto 
 de autorização legislativa da Assembleia da República, a mesma tabela e os 
 normativos que determinam a sua aplicação enfermam de inconstitucionalidade 
 orgânica, ex vi do disposto nos artigos 103º e 165º/1/i) da Constituição. 
 O artigo 13º nº 1 do Código das Custas Judiciais, na versão emergente do 
 Decreto-Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro, conjugado com a Tabela Anexo I, 
 interpretado no sentido do montante das custas decorrente do decaimento de uma 
 acção de responsabilidade civil de um Município julgada improcedente antes da 
 realização da audiência de discussão e julgamento dever ser calculado em função 
 do valor da acção sem limite máximo e havendo lugar ao pagamento do remanescente 
 das custas (implicando no caso a liquidação da quantia de 138.638,58 €), é 
 materialmente inconstitucional por ofensa aos princípios da justiça, 
 proporcionalidade e da igualdade (v. arts. 13º, 18º/2 e 266º/2 da Constituição), 
 pelo que não deve ser aplicado, como muito bem se entendeu nos autos ex vi do 
 disposto no artigo 204º da CRP. 
 A aplicação dos normativos da Tabela de C.C.J. que o Tribunal de 1ª Instância se 
 recusou aplicar com fundamento na sua inconstitucionalidade, conduz – em 
 situações como a patenteada nos autos – a resultados manifestamente 
 desproporcionados atendendo à actividade judicial desenvolvida, estando por isso 
 ainda em causa a violação do princípio da igualdade, bastando atentar a 
 situações em tudo idênticas em termos de prestação de serviço (v.g. acções 
 administrativas de responsabilidade civil extracontratual de valor inferior). 
 A fixação do valor da acção como critério de incidência da taxa judicial a 
 cobrar resulta igualmente na violação dos princípios da justiça, da 
 uniformidade, e da igualdade tributária, conduzindo à liquidação de taxas muito 
 elevadas nuns casos e irrisórias noutros, em processos de igual complexidade 
 processual. 
 A Tabela de Custas do Código das Custas Judiciais, aprovado pelo DL nº 224-A/96, 
 de 26 de Novembro e os normativos que determinam a sua aplicação, ao tributarem 
 os incidentes de pedidos de apoio judiciário unicamente em função do valor 
 formulado na acção e sem qualquer limite máximo, enfermam de 
 inconstitucionalidade material também, por violação dos princípios 
 constitucionais do acesso ao direito e à justiça (v. arts. 20º e 268º/4 da 
 Constituição), pelo que não deveriam, também por essa razão, ser aplicados ex vi 
 do disposto no artigo 204º da Constituição.”
 Houve mudança de relator
 
                                                       *
 Fundamentação
 
 1. Do objecto do recurso
 O tribunal recorrido recusou “a aplicação da Tabela de Custas anexa ao C.C.J., 
 aprovado pelo Dec.Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro, por padecer de 
 inconstitucionalidade material, por ofensa aos princípios da proporcionalidade e 
 da igualdade”.
 
 É desta recusa, com fundamento em inconstitucionalidade material, que foi 
 interposto o presente recurso.
 Foi a seguinte a fundamentação da decisão recorrida:
 
 «A questão sub judice resulta, em síntese, do apuramento de uma conta de custas 
 cujo montante a A. entende ser manifestamente desproporcionado em função da 
 actividade judicial desenvolvida e também da aplicação de regras de custas aos 
 pedidos de apoio judiciário que, no argumentário da A., dissuadem os cidadãos a 
 peticionar tal pedido. 
 A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem sido chamada a pronunciar-se 
 sobre esta matéria, concluindo que o direito de acesso aos tribunais não inclui 
 o direito a litigar gratuitamente, uma vez que inexiste qualquer princípio 
 constitucional de gratuitidade no acesso à justiça, gozando o legislador de 
 ampla margem de liberdade na fixação dos montantes das custas judiciais, podendo 
 optar por uma justiça mais cara ou mais barata. 
 Porém, o instituto do apoio judiciário, visando temperar os malefícios de um 
 sistema assente na onerosidade da justiça, tal como está construído permite 
 extrair duas conclusões: em primeiro lugar que os economicamente carenciados não 
 podem ver ser posto em causa o acesso ao direito e aos tribunais, daí se 
 justificando a dispensa de pagamento, total ou parcial, das custas judiciais e 
 até dos honorários dos advogados. Em segundo lugar, se assim é para os 
 economicamente desfavorecidos, então os demais cidadãos não devem suportar 
 custas judiciais desproporcionadas em relação ao custo do serviço de que 
 usufruíram sob pena de grave distorção e desequilíbrio gerador de violação dos 
 princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade (art. 13º, e 
 
 266º, nº 2, da CRP). 
 Nesta perspectiva o montante das custas judiciais a pagar em cada caso concreto 
 deveria ser legislativamente determinado em função dos rendimentos do 
 responsável pelo seu pagamento, do trabalho a que deu causa e da complexidade 
 das matérias que submeteu a juízo e não, como sucede no sistema actual, através 
 de critérios que apenas têm em conta o valor da acção, pese embora atenuados com 
 mecanismos de redução segundo a fase processual em que terminam os autos. 
 Mas esse sistema ideal não é, como se compreende, facilmente implementável, o 
 que tem levado o Tribunal Constitucional a ser particularmente cauteloso na 
 abordagem desta questão, apenas admitindo a inconstitucionalidade das normas que 
 densificam os critérios de fixação dos montantes das ajudas de custo quando da 
 aplicação das mesmas resulta tomar-se incomportável o custo da demanda para o 
 utente em concreto, isto é, quando se torna insuportável ou especialmente 
 gravoso o acesso aos tribunais. 
 
 É que, se por um lado o estabelecimento de custas tem por finalidade evitar que 
 os encargos decorrentes do funcionamento da máquina judiciária sejam subtraídos 
 dos impostos, pondo em causa outros custos sociais relevantes (v. g. saúde e 
 educação), não é menos verdade que o direito, constitucionalmente consagrado, do 
 acesso ao direito e aos tribunais, não pode ser travado em função de critérios 
 de taxação concretamente desrazoáveis ou desequilibrados. 
 Dito de modo mais simplista, a conformação constitucional das normas que regem 
 em matéria de custas tem de ser aferida em função de uma justiça não gratuita, 
 mas com limites na sua onerosidade. 
 No caso vertente há que ponderar que a acção findou na fase do saneador (pese 
 embora o recurso interposto deste), ou seja, nem sequer se realizou julgamento; 
 por outro lado o conhecimento de mérito não apresentou qualquer especial 
 complexidade em relação a muitas outras acções já decididas neste TAF e em 
 particular pelo signatário. 
 Porém, o montante apurado das custas diverge significativamente, para mais, do 
 que foi exigido na esmagadora maioria delas. Por isso, não pode deixar de se 
 concluir que o montante final apurado – cerca de € 140.000 – não tem qualquer 
 relação com a actividade judicial desenvolvida, sendo manifestamente exagerado, 
 inclusive em função das disponibilidades financeiras evidenciadas pela A..
 Há, de facto, uma evidente desproporção entre o volume e o custo da actividade 
 judicial a que a propositura da acção deu lugar, e o custo a que a A. é chamada 
 a pagar. 
 Essa desproporção é ainda mais evidente no que concerne ao pedido de apoio 
 judiciário. De facto, como bem refere a A., a exigência de quantias exorbitantes 
 em caso de indeferimento do pedido de apoio judiciário – quando, como é sabido, 
 a tramitação deste incidente e o apuramento da base factual é extremamente 
 simplificada – constitui um freio para quem pretende beneficiar de tal apoio, ou 
 seja, consubstancia um verdadeiro desincentivo legislativamente consagrado. 
 Neste enfoque pode afirmar-se que as normas da Tabela de Custas, aplicadas ao 
 caso sub judice são claramente inconstitucionais por ofensa aos princípios da 
 igualdade e da proporcionalidade. Mas não sofrem, a nosso ver, de 
 inconstitucionalidade orgânica como defende a autora porque, bem vistas as 
 coisas, “A base funcional da distinção entre taxas e imposto não impõe, uma 
 sinalagmaticidade pré-jurídica, mas sim uma sinalagmaticidade construída 
 juridicamente e um sentido de correspectividade susceptível de ser entendido e 
 aceite como tal pelos cidadãos atingidos”.”
 Da leitura dos fundamentos da decisão recorrida resulta que se entendeu que o 
 valor das taxas apuradas neste processo, por força da aplicação da tabela de 
 custas então vigente, o qual resultava do disposto nos artº 13.º, nº 1, 15.º, nº 
 
 1, o), e 18.º, nº 2, todos do C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de 
 Novembro, era manifestamente desproporcionado relativamente ao grau de 
 complexidade do processo taxado. E essa desproporção resultava da inexistência 
 de um limite máximo da taxa de justiça, fixada proporcionalmente ao valor da 
 causa, e do facto de não ser permitido ao tribunal limitar o valor concreto 
 dessa taxa, tendo em conta, designadamente, a natureza e complexidade do 
 processo, o que violava o princípio constitucional da proporcionalidade e o 
 direito constitucional ao acesso aos tribunais.
 
 É este juízo de inconstitucionalidade que importa aqui verificar, sendo certo 
 que a redacção do C.C.J. que irá estar sob análise é a que resultou do D.L. nº 
 
 224-A/96, de 26 de Novembro, apesar de, entretanto, as disposições deste Código 
 terem sido posteriormente alteradas pelo D.L. nº 324/2003, de 27 de Dezembro.
 Esta alteração não prejudica, porém, o conhecimento da questão de 
 constitucionalidade sub iudice, uma vez que, tendo a situação tributária da 
 recorrida sido definida com fundamento na recusa, por inconstitucionalidade, das 
 normas do C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro, terá de se 
 conhecer da sua validade, de modo a ser possível a reforma da respectiva 
 decisão, no caso de não proceder o juízo de inconstitucionalidade em que esta se 
 baseou.
 Como é evidente, já escapa ao controlo do Tribunal Constitucional a apreciação 
 da bondade do critério infraconstitucional de tributação que a decisão 
 recorrida adoptou como sendo o aplicável ao caso, depois de ter afastado a 
 aplicação das normas com fundamento na sua inconstitucionalidade.
 
  
 
 2. Do mérito do recurso
 No nosso sistema judiciário os processos, em regra, estão sujeitos a custas 
 
 (artº 1.º, nº 2, do C.C.J, na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro). 
 As custas de um processo judicial compreendem a taxa de justiça (anteriormente 
 designada de imposto de justiça) e os encargos (artº 1.º, nº 1 do C.C.J., na 
 redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro).
 Enquanto os encargos compreendem os reembolsos das despesas efectuadas directa e 
 exclusivamente com a tramitação do processo em causa, pelo tribunal, por 
 intervenientes incidentais e pela parte vencedora, enumeradas no artº 32.º, do 
 C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro, a taxa de justiça 
 corresponde à contrapartida pecuniária devida ao Estado pela utilização dos 
 tribunais para resolução de conflitos.
 Como o seu próprio nome indica, dentro das receitas públicas, a “taxa de 
 justiça” é uma taxa, enquanto “quantia coactivamente paga pela utilização 
 individualizada de bens semi-públicos, ou como o preço autoritariamente fixado 
 de tal utilização”, utilizando as definições de TEIXEIRA RIBEIRO (em “Noção 
 jurídica de taxa”, na R.L.J., Ano 117º, pág. 294).
 Nesta categoria também se deve incluir a procuradoria, na parte em que revertia 
 para o Conselho Geral da Ordem dos Advogados (15%), para o Conselho Geral da 
 Câmara dos Solicitadores (2%), para a Caixa de Previdência dos Advogados e 
 Solicitadores (40%) e para os Serviços Sociais do Ministério da Justiça (3%), 
 nos termos do artº 42.º, do C.C.J., na redacção do D.L. nº 224/96, de 26 de 
 Novembro. 
 Na verdade, a enumeração dos encargos constante do artº 32.º, do C.C.J., na 
 redacção do D.L. nº 224/96, de 26 de Novembro, apenas incluía na sua alínea g) a 
 procuradoria, enquanto reembolso à parte vencedora do despêndio com o mandato 
 judicial, não correspondendo a parte restante a qualquer reembolso de quantia 
 gasta com o processo, o que se traduzia numa taxa encoberta pela rubrica em que 
 se inseria.
 O pagamento desta parte da procuradoria foi entretanto extinto pelo Decreto-lei 
 nº 324/2003, de 27 de Dezembro, tendo-se escrito no seu preâmbulo o seguinte, a 
 propósito desta matéria:
 
 “Introduzem-se também profundas alterações em sede de procuradoria, 
 designadamente através da consagração da regra de que o seu montante reverte, 
 integralmente para a parte vencedora. Restitui-se, assim, à procuradoria a sua 
 originária e verdadeira função de compensação dos encargos suportados com o 
 processo pelas partes, função essa que foi objecto de progressivo 
 desvirtuamento, ao ponto de se estipular que as partes, embora possam abdicar da 
 procuradoria, não podem prescindir da parcela que reverte para terceiras 
 entidades.
 Assim, deixam de ser as partes a financiar, directamente e com prejuízo do 
 montante a que teriam direito a receber a título de procuradoria, as entidades 
 que, atendendo às relevantes funções sociais que desempenham, beneficiam do 
 sistema de cobrança de custas judiciais. Tal encargo passa, pois, a ser 
 assegurado pelo Estado, designadamente através de parte das quantias cobradas a 
 título de taxa de justiça.”
 Assim, a parte da procuradoria que se destinava a subsidiar outras entidades, 
 uma vez que não correspondia ao reembolso de qualquer quantia despendida por 
 elas com o processo, deve, conjuntamente com a taxa de justiça, ser englobada na 
 contraprestação devida pelo particular ao Estado pela utilização dos serviços 
 públicos de justiça.
 Apesar da fixação de taxas ter como pressuposto uma relação material de 
 sinalagmaticidade entre uma prestação pecuniária do sujeito passivo e uma 
 contrapartida qualitativa de utilização de um bem ou serviço público, isso não 
 significa que a esta equivalência jurídica tenha de corresponder uma 
 equivalência económica (vide, nesse sentido, ALBERTO XAVIER, em “Manual de 
 direito fiscal”, pág. 43-44, da ed. de 1974, e CARLOS BAPTISTA LOBO, em 
 
 “Reflexões sobre a (necessária) equivalência económica das taxas”, em “Estudos 
 jurídicos e económicos em homenagem ao Prof. Doutor António de Sousa Franco”, 
 pág. 409 e seg.).
 Além de, na maior parte dos casos, não existir um mercado que permita determinar 
 o valor da prestação pública, de, muitas vezes, a fixação do montante das taxas 
 visar finalidades extra-financeiras, e de, frequentemente, serem prestadas 
 utilidades indivisíveis a uma pluralidade de beneficiários, considerando que as 
 taxas têm uma função essencialmente redíticia, no que diz respeito à definição 
 do seu montante vigora o princípio da liberdade de conformação pelo legislador 
 ordinário.
 Como refere CARLOS BAPTISTA LOBO “…a configuração da equivalência económica que 
 se estabelece entre a prestação do sujeito passivo e a contraprestação do Estado 
 será necessariamente de “geometria variável”. Tal significa que a definição da 
 prestação pecuniária do sujeito passivo dependerá em larga medida do fundamento 
 que legitima a exigência da taxa.
 Numa primeira aproximação, assente em padrões generalistas, poderá referir-se 
 que na ausência de qualquer preocupação ou finalidade extra-financeira 
 legalmente consagrada, e uma vez que a taxa tem como objectivo principal a 
 angariação de receita pública, a doutrina tem sistematicamente avançado a ideia 
 de que não é exigível que ocorra uma equivalência económica entre as prestações 
 dos particulares e os serviços públicos prestados” (na ob. cit. pág. 441).
 Esta liberdade de definição do montante das taxas terá, contudo, como limite 
 superior o princípio constitucional estruturante da proibição do excesso, 
 corolário do Estado de direito democrático (artº 2.º, da C.R.P.), o qual 
 impedirá a fixação de valores manifestamente desproporcionados ao serviço 
 prestado, o que, a suceder, porá em causa a própria equivalência jurídica das 
 prestações (vide, neste sentido CARLOS BAPTISTA LOBO, na ob. cit., pág. 442, e 
 os acórdãos do Tribunal Constitucional nº 640/95, em “Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional”, 32º vol., pág. 185, nº 1108/96, no Diário da República, II 
 Série, de 12-12-1996, nº 1140/96, em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 35º 
 vol., pág. 317, nº 354/98, em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 40º vol., 
 pág. 219, nº 410/00, em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 48º vol., pág. 
 
 141, 115/02, em “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, 52º vol., pág. 515, e 
 
 227/07, no Diário da República, II Série, de 22-5-07).
 Podem ser utilizados os mais variados critérios para a fixação das taxas devidas 
 pela tramitação de processo judicial, sendo os mais utilizados os seguintes: 
 
 - taxa fixa prevista na lei para cada acto processual, sendo o número e o tipo 
 de actos praticados em cada processo que determinará o seu custo final;
 
 - taxa fixada pelo juiz, com limites previamente estabelecidos na lei;
 
 - taxa fixa prevista na lei, proporcional ao valor da causa.
 O primeiro dos sistemas vigorou entre nós até à aprovação do D.L. nº 25.882, de 
 
 1 de Outubro de 1935 (vide, sobre as deficiências deste sistema a opinião da 
 R.L.J., no Ano 69º, pág. 84-86), o qual generalizou a aplicação do critério da 
 taxa fixa prevista na lei, proporcional ao valor da causa, que já havia sido 
 introduzido, mas com aplicação parcial, pelos Decretos-Lei nº 22780, de 29 de 
 Junho de 1933, e nº 24.090, de 29 de Junho de 1934, sendo ainda este o critério 
 actualmente utilizado pelo legislador para estabelecer o montante da taxa de 
 justiça devida para os processos civis, assim como para os processos 
 administrativos e tributários (artº 13.º e  73.º - A, do C.C.J., na redacção do 
 D.L. nº 324/2003, de 27 de Dezembro).
 O C.C.J., na redacção do Decreto-Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro, previa no 
 seu artº 13.º, nº 1, que “a taxa de justiça era a constante da tabela anexa, 
 sendo calculada sobre o valor das acções, dos incidentes ou dos recursos”, pelo 
 que a taxa fixa, proporcional ao valor da causa, não era necessariamente uma 
 taxa global do processo, podendo ser um somatório das taxas devidas pela acção, 
 pelos incidentes e pelos recursos, desde que as respectivas tramitações se 
 verificassem.
 A procuradoria, na parte em que também constituía uma taxa, era fixada tendo 
 como ponto de referência o valor da taxa de justiça, nos termos do artº 41.º, do 
 C.C.J., na redacção do Decreto-Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro:
 
 “1. A procuradoria é arbitrada pelo tribunal, tendo em atenção o valor e a 
 complexidade da causa, entre um quarto e metade da taxa de justiça devida.
 
 2. Quando o tribunal a não arbitre, a procuradoria é igual a metade da taxa de 
 justiça devida”.
 A tabela anexa ao C.C.J. previa expressamente valores situados entre 30.000$00 e 
 
 10.000.000$00, com taxas proporcionalmente correspondentes entre 6.000$00 e 
 
 136.000$00, respectivamente, acrescentando a seguinte regra de cálculo – “para 
 além de 10.000.000$00: por cada 1.000.000$00 ou fracção – 10.000$00 de taxa de 
 justiça” (as quantias referidas neste parágrafo em escudos foram convertidas em 
 euros, por força do disposto no Decreto-Lei nº 136/2002, de 16 de Maio).
 Apesar da complexidade processual ter alguma conexão com o valor da causa e do 
 resultado puro do critério adoptado se encontrar atenuado por várias normas que 
 previam a redução da taxa de justiça, em função da natureza das espécies 
 processuais (artº 14.º e 15.º, do C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 
 de Novembro), da hierarquia do tribunal onde se processavam (artº 18.º, do 
 C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro), ou da fase em que 
 terminavam (artº 17.º, do C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de 
 Novembro), o facto do valor da taxa de justiça acompanhar automática e 
 ilimitadamente o aumento do valor da causa, permitia que se atingissem taxas de 
 justiça de elevadíssimo montante, flagrantemente desproporcionadas relativamente 
 ao custo do serviço prestado, não podendo as mesmas, em regra, ser aferidas com 
 o benefício obtido, uma vez que no nosso sistema processual, em matéria de 
 responsabilidade pelo pagamento de custas, vigora o princípio da causalidade, 
 segundo o qual quem paga as custas é quem não obtém vencimento na causa, dela 
 não retirando qualquer benefício.
 O C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro, não previa 
 mecanismos, como a fixação de um limite máximo para a taxa de justiça ou a 
 possibilidade do juiz, a partir de determinado valor, reduzir o seu montante, 
 atendendo ao grau de complexidade da causa, os quais só foram posteriormente 
 introduzidos pelo Decreto-Lei nº 324/2003, de 27 de Dezembro (artº 73.º-A e 
 
 27.º, nº 3), que permitem evitar a cobrança de taxas desproporcionadas.
 Mas a cobrança de taxas elevadas pela prestação dos serviços de justiça, não só 
 pode determinar a sua desproporcionalidade, afrontando o princípio 
 constitucional estruturante da proibição do excesso, como também pode pôr em 
 risco o próprio direito fundamental dos cidadãos de acesso aos tribunais para 
 defesa dos seus direitos (artº 20.º, nº 1, da C.R.P.).
 Na verdade, quando as taxas de justiça atingem um montante de tal modo elevado 
 que dificultem, de modo inexigível, a generalidade dos cidadãos de recorrer aos 
 tribunais para defesa dos seus direitos, estamos perante inequívocas violações 
 daquele direito constitucional.
 Como escrevem JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS:
 
 “A lei não pode…adoptar soluções de tal modo onerosas que na prática, impeçam o 
 cidadão médio de aceder à justiça. Ou seja, salvaguardada a protecção jurídica 
 para os mais carenciados, as custas não devem ser incomportáveis em face da 
 capacidade contributiva do cidadão médio, não sendo constitucionalmente 
 admissível a adopção de soluções em matéria de custas que, designadamente nos 
 casos de maior incerteza sobre o resultado do processo, inibam os interessados 
 de aceder à justiça…
 Concretamente, se é certo que nada impede que o montante das custas seja 
 variável, a verdade é que o estabelecimento de um sistema de custas cujo 
 montante aumente directamente e sem limite na proporção do valor da acção coloca 
 pelo menos, dois tipos de problemas.
 Por um lado, não está excluído que, rompida a proporcionalidade entre as custas 
 cobradas e o serviço de administração da justiça prestado, se deixe de estar 
 perante verdadeiras taxas e se entre, pelo contrário, no domínio dos impostos.
 Por outro lado, no plano estritamente material, a solução em causa pode, na 
 prática, consubstanciar-se na imposição de um sistema de custas excessivas 
 inaceitável em face do artº 20.º.” (Em “Constituição Portuguesa anotada”, tomo 
 I, pág. 183, da ed. de 2005, da Coimbra Editora).
 E GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA:
 
 “O reconhecimento do direito ao acesso ao direito e aos tribunais seria 
 meramente teórico para muitas pessoas se não se garantisse que o direito à 
 justiça não pode ser prejudicado por insuficiência de meios económicos (nº 1, in 
 fine)… Incumbe à lei assegurar a concretização desta norma, não podendo, por 
 exemplo, o regime das custas judiciais ser de tal modo gravoso que torne 
 insuportável o acesso aos tribunais…
 A Constituição não determina a gratuitidade dos serviços de justiça, como sucede 
 em termos tendenciais, com os serviços de saúde (artº 64.º - 2/a) e o ensino 
 básico universal (artº 74º - 2 /a). Mas o direito de acesso à justiça proíbe 
 seguramente que eles sejam tão onerosos que dificultem, de forma considerável, o 
 acesso aos tribunais.” (Em “Constituição da República Portuguesa anotada”, vol 
 I, da 4ª ed., da Coimbra Editora).
 E a consagração de um sistema de apoio judiciário a quem tem uma situação 
 económica insuficiente para fazer face aos custos duma acção, através da 
 concessão de dispensa do pagamento total ou parcial das custas, não basta para 
 garantir o acesso aos tribunais, quando o regime de custas permite a cobrança de 
 valores muito elevados.
 Na verdade, quando estas atingem valores exagerados, não são só aqueles que não 
 têm meios para os pagar que, se não forem dispensados de o fazer, se inibem de 
 solicitar a intervenção do tribunal, mas também os que, apesar de disporem duma 
 situação económica que lhes permite satisfazer tais montantes sem pôr em causa a 
 sua sobrevivência condigna, igualmente se abstêm de recorrer ao tribunal, 
 perante o risco de poderem ter de despender uma quantia exorbitante em custas.
 Como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional nº 339/90 (pub. em 
 
 “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, vol. 17º, pág. 349):
 
 “Estes preceitos (referindo-se às normas da assistência judiciária) deveriam 
 entender-se no sentido de que o critério de insuficiência económica era a 
 impossibilidade para o requerente, tendo em vista o seu rendimento…, de custear 
 as despesas normais do pleito para que era pedida a assistência. Não implicavam 
 a admissão, por parte do requerente, da sua indigência, ou incapacidade de 
 custear qualquer pleito.
 Tal não bastará, contudo, para concluir, sem mais, que a legislação aplicável no 
 caso garante o acesso ao direito e aos tribunais. A garantia não deverá 
 considerar-se efectiva, se o sistema da assistência ou apoio, tendo sido 
 legislativamente concebido para prover a casos excepcionais de insuficiência 
 económica, tiver que ser aplicado em regra, por consequência do carácter 
 desproporcionado das custas. É então de prever, não só que o cidadão médio tenha 
 que recorrer à assistência para a generalidade dos processos, mas que então o 
 sistema de assistência não tenha capacidade de resposta efectiva, por não ter 
 sido concebido como forma generalizada de acesso. A Constituição não garante 
 melhor acesso ao cidadão médio do que ao pobre, mas garante a todos acesso 
 efectivo. E essa efectividade num sistema de assistência como remédio 
 excepcional não é garantida por custas que o cidadão em regra interessado em 
 processo de certo montante não possa suportar”. 
 Ou ainda no acórdão nº 495/96 (pub. em “Acórdãos do Tribunal Constitucional, 33º 
 vol., pág. 655):
 
 “O instituto do apoio judiciário não é, pois, um instrumento generalizado, ou 
 pressuposto primário de acesso ao direito: é, antes, um remédio, uma solução a 
 utilizar, de forma excepcional, apenas pelos cidadãos economicamente carenciados 
 ou desfavorecidos, e não de forma indiscriminada pela globalidade dos cidadãos. 
 Isto implica, necessariamente, que também o sistema das custas judiciais tenha 
 que ser um sistema proporcional e justo, que não torne insuportável ou 
 inacessível para a generalidade das pessoas o acesso aos tribunais.”
 O sistema de apoio judiciário não é, pois, suficiente para garantir o acesso 
 generalizado aos tribunais, nos casos em que se fixam taxas de justiça 
 exorbitantes face ao nível económico médio dos cidadãos.
 Assim se conclui que o sistema de fixação das taxas de justiça do C.C.J., na 
 redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro, acima exposto, permitia a 
 cobrança de taxas de justiça, cujo montante, exageradamente elevado, podia 
 atentar contra os referidos parâmetros constitucionais da proibição do excesso e 
 do direito de acesso aos tribunais.
 Apesar de não caber a este Tribunal aferir qual o concreto patamar em que se 
 situa o limite em que a prestação pública se desliga dos custos da respectiva 
 actividade ou em que o cidadão fica inibido de recorrer aos tribunais, por força 
 do valor das custas, deve, contudo, velar pelo respeito pelos referidos 
 parâmetros constitucionais, perante o concreto valor das taxas cobrada num 
 determinado processo, como resultado da aplicação da tabela legal, segundo o 
 princípio do controlo da evidência.
 Foi este controlo que o Tribunal Constitucional efectuou com resultados 
 diferentes, entre outros, nos acórdãos nº 1182/96 (em “Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional”, 35º vol., pág. 447), nº 521/99 (em “Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional”, 44º vol., pág. 793), nº 349/2002 (em “Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional”, 53º vol., pág. 693), e nº 227/07 (no Diário da República, II 
 Série, de 22-5-07).
 
  
 Na presente acção, que tinha o valor tributário de 1.598.350.814$00, foram 
 contadas à recorrida custas no montante de € 139.997,80, respeitando € 
 
 123.903,43 a taxas, correspondendo € 19.984,42, à taxa do incidente de apoio 
 judiciário, reduzida a ¼, nos termos do artº 15.º, nº 1, do C.C.J., na redacção 
 do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro,  € 39.968,85, à taxa de justiça da 
 acção, reduzida a ½, nos termos do artº 17.º, nº 2, do C.C.J., na redacção do 
 D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro, € 39.968,85, à taxa de justiça do recurso, 
 reduzida a ½, nos termos do artº 18.º, nº 2, do C.C.J., na redacção do D.L. nº 
 
 224-A/96, de 26 de Novembro, e € 23.981,31, à procuradoria com natureza de taxa.
 Foi a seguinte a tramitação desta acção:
 
 - Em 13-11-1996 a recorrida propôs no Tribunal Administrativo do Círculo de 
 Lisboa acção, sob a forma ordinária, em que deduziu um pedido indemnizatório 
 contra o Município de Lisboa, no valor de 1.598.350.814$00, por atraso na 
 emissão de um alvará de loteamento. Requereu ainda que lhe fosse concedido apoio 
 judiciário, “na modalidade de dispensa prévia de pagamento de preparos e 
 custas”.
 
 - Em 19-11-1996 foi proferido despacho que admitiu liminarmente o pedido de 
 apoio judiciário e ordenou a citação do demandado.
 
 - Em 19-12-1996 o Município de Lisboa apresentou contestação.
 
 - Em 7-1-1997 a Autora apresentou réplica.
 
 - Realizou-se instrução documental relativamente ao pedido de apoio judiciário.
 
 - Em 8-10-2002 foi proferida em simultâneo decisão sobre o mérito do pedido de 
 apoio judiciário e da acção, tendo ambos sido julgados improcedentes.
 
 - Em 24-10-2002 a Autora interpôs recurso para o STA, o qual foi admitido como 
 de agravo, com subida imediata, nos próprios autos, com efeito suspensivo.
 
 - Em 4-12-2002 e 16-1-2003, respectivamente, foram apresentadas alegações e 
 contra-alegações de recurso, tendo a recorrente suscitado a nulidade da 
 sentença proferida.
 
 - Em 19-2-2003 o tribunal recorrido proferiu despacho, considerando improcedente 
 a arguição da nulidade.
 
 - Após emissão de parecer pelo M.P. e recolha dos vistos no S.T.A., foi 
 proferido acórdão em 15-6-2004, em subsecção, na 1ª Secção do S.T.A., que negou 
 provimento ao recurso.
 Tendo em consideração a linearidade da tramitação da acção acima descrita e a 
 fase em que a mesma terminou na 1ª instância, a contagem de € 123.903,43 de 
 taxas é manifestamente desproporcionada às características do serviço público 
 concreto prestado, atendendo ao custo de vida em Portugal. Na verdade, este 
 montante exagerado resulta apenas do elevado valor da acção, sem qualquer 
 tradução na complexidade do processo, o qual decorreu com uma tramitação 
 simples, não existindo qualquer correspondência entre os custos dos meios do 
 Estado envolvidos e o valor total das taxas cobradas.
 Só a ausência de previsão de um limite máximo ou da possibilidade da intervenção 
 moderadora do juiz na fixação do valor das taxas devidas pela tramitação 
 ocorrida permitiu que estas atingissem aquele valor manifestamente 
 desproporcionado e injustificadamente inibidor da utilização dos serviços 
 públicos de justiça.
 Essa desproporção flagrante e o exagero daquela quantia viola não só o principio 
 estruturante constitucional da proibição do excesso, como também o direito de 
 acesso aos tribunais, previsto no artº 20.º, nº 1, do C.R.P., pelo que deve 
 confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade efectuado pela decisão recorrida, 
 julgando-se improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público.
 
  
 
                                                       *
 
  
 Decisão
 Pelo exposto, decide-se:
 a) julgar inconstitucional, por violação do direito de acesso aos tribunais, 
 consagrado no artº 20.º, da C.R.P., conjugado com o princípio da proibição do 
 excesso, decorrente do artº 2.º, da C.R.P., a norma que se extrai da conjugação 
 do disposto nos artigos 13.º, nº 1, 15.º, nº 1, o), 18.º, nº 2, e tabela anexa 
 do C.C.J., na redacção do D.L. nº 224-A/96, de 26 de Novembro, na  parte  em  
 que  dela resulta que as taxas de justiça devidas por um processo, comportando 
 um incidente de apoio judiciário e um recurso para o tribunal superior, ascendem 
 ao montante global de € 123.903,43, determinado exclusivamente em função do 
 valor da acção, sem o estabelecimento de qualquer limite máximo, e na medida em 
 que não se permite que o tribunal reduza o montante da taxa de justiça devida no 
 caso concreto, tendo em conta, designadamente, a natureza e complexidade do 
 processo e o carácter manifestamente desproporcionado desse montante;
 b) Confirmar o juízo de inconstitucionalidade feito pela decisão recorrida e, 
 consequentemente, negar provimento ao recurso.
 
  
 
                                                       *
 Sem custas.
 
  
 
                                                       *
 
  
 Lisboa, 25 de Setembro de 2007
 João Cura Mariano
 Joaquim Sousa Ribeiro
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Rodrigues (vencido
 de acordo com a declaração anexa)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 Votei vencido, por não acompanhar o juízo de desproporcionalidade em que se 
 abona a decisão de inconstitucionalidade. Fundamentando conclusão diferente que 
 não mereceu acolhimento, e respigando apenas algumas das partes, escrevemos como 
 primitivo relator do processo:
 
  
 
             «8. 5 – Mas, uma das mais complexas problemáticas que a teoria das 
 taxas tem enfrentado é a da definição dos termos e dos seus limites que são 
 demandados pela garantia jurídico-constitucional a que estão subordinadas, 
 
 ínsita na relação de bilateralidade ou de sinaglamaticidade entre as prestações. 
 
 
 
             Ora, a este respeito têm sido convocados, basicamente, dois 
 princípios: o princípio da equivalência jurídica (Aequivalenzprinzip) e o 
 princípio dos custos (Kostendeckungsprinzip). 
 
             Segundo o primeiro, não poderá deixar de existir entre as prestações 
 em presença uma equivalência jurídica.
 
             Como diz Benjamim Rodrigues (op. cit. p. 187), “no mínimo, ao 
 conformar a taxa o legislador tributário não pode deixar de se orientar por um 
 pré-juízo abstractamente formulado sobre a existência dessa equivalência de 
 valoração jurídica entre ambas as prestações e fixar a taxa apenas no ponto em 
 que figure existir essa. 
 
             Enquanto paridade de valoração enformada pelas mais diversas 
 condicionantes, desde as éticas, morais, económicas, contenção ou impulso no 
 acesso ao tipo de bens em causa, essa equivalência terá forçosamente parâmetros 
 muito elásticos, os quais tornarão quase impossível surpreender um caso de 
 violação”.
 
             De acordo com o segundo, a fixação das taxas deverá seguir um 
 princípio da cobertura dos custos: as taxas devem ser fixadas segundo critérios 
 que garantam a cobertura dos custos, com respeito pelos princípios da igualdade 
 e da proporcionalidade.
 
             Qualquer que seja o critério dominante, só poderá falar-se, porém, 
 de qualquer modo, de taxa onde seja possível surpreender, ainda, a existência de 
 uma relação de proporção adequada ou ajustada entre as duas prestações, sob uma 
 perspectiva económica. 
 
             E é sob o ponto de vista económico que a aferição se deve fazer, 
 porque a prestação da entidade pública se traduz em bens satisfazentes de 
 necessidades humanas individuais ou individualizáves, surgindo o montante de 
 taxa enquanto contrapartida que tem de pagar-se pelo acesso ou uso desses bens.
 
             Mas estando em causa, por um lado, bens “públicos”, e, por outro, 
 prosseguindo o fornecimento desses bens, em ultima ratio, interesses públicos 
 ou, no mínimo, gerais, é forçoso admitir que o equilíbrio entre as prestações 
 exigido pela garantia não tenha forçosamente de se situar, sempre, num patamar 
 equivalente ao do seu custo de produção. 
 
             Sendo assim, o montante da taxa, sob pena de se perder a relação 
 garantística decorrente da sua bilateralidade, nunca poderá alhear-se, quer do 
 valor de custo do serviço prestado, quer de uma ponderação, presente no momento 
 da sua fixação, sobre o grau possível ou desejável de satisfação das finalidades 
 sociais que justificam, sob tal via jurídica, o acesso ou o uso individualizado 
 a esse tipo de bens.
 
             É a reflexão sobre este momento que justifica que o montante das 
 taxas possa ser fixado, pelo legislador, com intuitos de incentivo ao acesso e 
 uso dos bens públicos, ou, ao contrário, de desincentivo.
 
             De qualquer jeito, nunca, nessa ponderação, o legislador pode 
 abandonar o critério de uma conexão necessária, razoável e adequada entre o 
 valor de custo para o ente público dos bens ou serviços que presta aos 
 particulares e a contrapartida que estes pagam.
 
             A ausência de um tal referente deslocaria a causa jurídica da taxa 
 para o domínio, puro e simples, da capacidade de pagar o tributo fixado em tal 
 nível, ou seja para o domínio da capacidade contributiva de pagar tributos, e 
 que é totalmente alheia ao grau de utilização que se faça dos bens públicos 
 propiciados com os gastos dessas receitas.
 
             Determinante, no controlo da relação de bilateralidade do tributo, 
 
 é, como não pode deixar de ser, a fundamentação aduzida pelo legislador ou pela 
 administração para fixar as taxas nos níveis elegidos.
 
             O princípio da legalidade, a que as taxas estão sujeitas, não pode 
 deixar, assim, de reflectir os momentos de tensão e de reflexão sobre os 
 referidos elementos, devendo o controlo a efectuar pelos tribunais, respeitar “a 
 leitura” deles feita pelo legislador, salvo se a mesma for manifestamente 
 desadequada ou desproporcionada.
 
             Embora, cingindo-se ao âmbito da administração local e às taxas das 
 autarquias locais, o legislador nacional orientou-se pelo princípio dos custos, 
 ao proceder à definição do regime geral das taxas das autarquias locais no art.º 
 
 4.º da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, matizando-o, de algum modo, com o 
 princípio da equivalência jurídica.
 
             Na verdade, e, precisamente sob a epígrafe “princípio da 
 equivalência jurídica”, este preceito dispõe:
 
             “1 – O valor das taxas das autarquias locais é fixado de acordo com 
 o princípio da proporcionalidade e não deve ultrapassar o custo da actividade 
 pública local ou o benefício auferido pelo particular.
 
             2 – O valor das taxas, respeitando a necessária proporcionalidade, 
 pode ser fixado com base em critérios de desincentivo à prática de certos actos 
 ou operações”.
 
             E densificando, ainda, princípios susceptíveis de reflectir-se na 
 determinação das taxas, o mesmo legislador estabeleceu, no art.º 5.º do mesmo 
 diploma, e sob o título “princípio da justa repartição dos encargos públicos” 
 que:
 
             “1 – A criação de taxas pelas autarquias locais respeita o princípio 
 da prossecução do interesse público local e visa a satisfação das necessidades 
 financeiras das autarquias locais e a promoção de finalidades sociais e de 
 qualificação urbanística, territorial e ambiental.
 
             2 – As autarquias locais podem criar taxas para financiamento de 
 utilidades geradas pela realização de despesa pública local, quando desta 
 resultem utilidades divisíveis que beneficiem um grupo certo e determinado de 
 sujeitos, independentemente da sua vontade”.
 
             Na enunciação do recente regime geral das taxas das autarquias 
 locais, o legislador continuou, ao fim e ao cabo, a trilhar o caminho que havia 
 começado a adoptar com a edição do Plano Oficial de Contabilidade das Autarquias 
 Locais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 54-A/99, de 22 de Fevereiro), onde passou 
 a prever a obrigatoriedade de custos por funções como instrumento de gestão 
 financeira para a “determinação dos custos subjacentes à fixação das tarifas e 
 dos preços” (ponto 1.5) e ao dispor que “a contabilidade de custos é obrigatória 
 no apuramento dos custos das funções e dos custos subjacentes à fixação das 
 tarifas e preços de bens e serviços” (ponto 2.8.3.1), devendo esses custos “ser 
 apurados em função dos custos directos e indirectos relacionados com a produção, 
 distribuição, administração geral e financeiros” (ponto 2.8.3.2) e sendo a 
 
 “imputação de custos indirectos efectuado após o apuramento dos custos directos 
 por funções através de coeficientes” (ponto 2.8.3.3).
 
             Caminho esse que, mais tarde, veio a prosseguir nas exigências 
 postas para a fixação da taxa pela realização, manutenção e reforço das 
 infraestruturas urbanísticas, no art.º 116.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 555/99, 
 de 16 de Dezembro, relativo ao regime jurídico da urbanização e da edificação, 
 dispondo que os projectos de regulamento municipal “devem ser acompanhados da 
 fundamentação do cálculo das taxas previstas”, tendo em conta, designadamente, 
 os elementos que refere (cf. Benjamim Rodrigues, op. cit. p. 191).
 
             Pode, no entanto, dizer-se que a ideia de uma proporção adequada com 
 o custo do serviço e com a sua utilidade para o utente, nos termos acolhidos 
 pelo regime geral das taxas das autarquias locais, corresponde ao sentido de 
 grande parte da doutrina e da jurisprudência constitucional.
 
             Assim – e, cingindo-nos apenas a alguns dos autores que já se 
 referiram – José Casalta Nabais (Direito Fiscal, 2.ª edição, 2003, cit. pp. 2º e 
 segs.) depois de falar de uma “verdadeira ‘summa divisio’, (…) divisão 
 dicotómica ou binária dos tributos, sendo estes, independentemente do nome que 
 ostentam, ou tributos unilaterais que integram a figura dos impostos, ou 
 tributos bilaterais que se reconduzem à figura das taxas”, defende que, “perante 
 um tributo, para sabermos se, do ponto de vista jurídico-constitucional, estamos 
 perante um tributo unilateral ou um imposto, ou perante um tributo bilateral ou 
 uma taxa, o que há a fazer é o teste da sua medida ou do seu critério, estando 
 pois perante um imposto se apenas pode ser medido ou aferido com base na 
 capacidade contributiva do contribuinte, ou perante uma taxa se é susceptível de 
 ser medido ou aferido com base na referida ideia de proporcionalidade” – 
 acrescentando (nota 38) que, “[e]m rigor há aqui dois testes: o da 
 bi/unilateralidade do tributo e, se neste se concluir pelo seu carácter 
 bilateral, o da sua medida ou critério de justiça, muito embora seja este último 
 teste o decisivo, já que, se a proporcionalidade entre o tributo e a respectiva 
 contraprestação específica estiver ausente, então estaremos perante um tributo 
 cujo regime constitucional não pode deixar de ser o dos impostos.” 
 
             Também, José G. Xavier de Basto e António Lobo Xavier (“Ainda a 
 distinção entre taxa e imposto: a inconstitucionalidade dos emolumentos 
 notariais e registrais devidos pela constituição de sociedades e pelas 
 modificações dos respectivos contratos”, Revista de Direito e de Estudos 
 Sociais, ano XXXVI, 1994, nºs. 1-2-3, esp. págs. 6 e segs.), defendem ser 
 essencial identificar a prestação pública que justifica o pagamento da taxa e a 
 existência de uma proporção adequada entre o montante desta e o valor daquele 
 serviço, sustentando deverem considerar-se impostos, para o efeito da aplicação 
 do princípio da legalidade tributária, “as receitas coactivas que, cobradas 
 aquando da prestação de serviços públicos individualizados, não se relacionam, 
 na determinação do seu montante, nem com o custo nem com o valor desse serviço, 
 antes com elementos relativos à capacidade contributiva dos utentes”.
 
             No que importa à jurisprudência do Tribunal Constitucional, cabe 
 notar que, por exemplo, o Acórdão n.º 640/95 (in DR II Série, de 20 de Janeiro 
 de 1996), a propósito das portagens na ponte 25 de Abril, interrogou-se sobre se 
 
 “num caso de uma taxa de valor manifestamente desproporcionado, completamente 
 alheio ao custo do serviço prestado, não deverá entender-se que tal taxa há-de 
 ser tratada, de um ponto de vista jurídico-constitucional, como um verdadeiro 
 imposto, de tal forma que tenha de ser o órgão parlamentar a decidir sobre o seu 
 quantum”, e, havendo prosseguido a indagação para avaliar se se verificava tal 
 desproporção manifesta, concluiu pela negativa (num sentido de ponderação das 
 prestações, cf., também, os Acórdãos nºs 410/2000, 1108/96, 1140/96 e 354/98, 
 publicados respectivamente em DR II Série, nºs 270, de 22 de Novembro de 2000, 
 
 294, de 20 de Dezembro de 1996, 34, de 10 de Fevereiro de 1997, e 161, de 15 de 
 Julho de 1998). 
 
             Na mesma linha, escreveu-se no Acórdão n.º 200/2001, publicado nos 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 50.º, pp. 326-327:
 
  
 
             “Na distinção entre taxa e imposto, o Tribunal Constitucional tem, 
 pois, seguido o critério da sinalagmaticidade: a taxa constitui, não uma receita 
 unilateral, mas um preço, autoritariamente fixado, correspondente a um bem ou 
 serviço, e mesmo que este seja de procura obrigatória (v., como exemplos 
 referidos em J. J. Teixeira Ribeiro, Lições de finanças públicas, 5ª ed., 
 Coimbra, 1995, pp. 255-257, a hipótese das propinas no ensino obrigatório e o 
 caso dos emolumentos dos serviços de registo e do notariado, mesmo quando a sua 
 procura é obrigatória); o imposto constitui uma receita coactiva unilateral do 
 Estado, sem correspectividade num bem ou serviço. 
 Tal distinção não implica, porém, que o valor da taxa haja de corresponder 
 economicamente ao valor ou ao custo do bem ou serviço em questão — que tenha que 
 existir tal correspectividade económica para se poder afirmar a bilateralidade 
 da receita, enquanto taxa. 
 
             Na verdade, através da imposição de uma taxa podem prosseguir-se 
 finalidades de interesse público (como a limitação da procura de um bem) 
 conducentes a um montante diverso do correspondente a tal valor ou custo. E 
 ainda nesta hipótese ao pagamento da taxa corresponde a contraprestação de um 
 bem ou serviço por parte do Estado. Daí que, como escrevia Teixeira Ribeiro (op. 
 cit., p. 258), «quando a taxa exceda o custo dos bens, nem por isso tenhamos 
 imposto na parte sobrante, uma vez que, apesar de ser coactiva, ela mantém o seu 
 carácter de prestação bilateral». 
 
             Aliás, mesmo sem se excluir que a forma de determinação do montante 
 do tributo em causa possa funcionar como indício para a sua qualificação como 
 taxa ou imposto, entende este Tribunal que apenas a manifesta 
 desproporcionalidade entre o montante do tributo, por essa forma determinado, e 
 o custo do serviço público (o carácter «completamente alheio» a este) poderá 
 levar a que o tributo em questão deva ser encarado, de um ponto de vista 
 jurídico-constitucional, como verdadeiro imposto. Foi justamente isto que, 
 afirmando a desnecessidade de correspondência económica entre o custo do serviço 
 e o montante da taxa, este Tribunal disse também no citado Acórdão n° 410/2000 
 
 [publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 48º vol., pp. 141-163]: 
 
  
 
             «para a função da taxa pode ser menos relevante o custo e, por 
 exemplo, mais relevante a contenção da utilização de um serviço — o que 
 significa (e a jurisprudência constitucional tem-se comprometido nesse sentido) 
 que o carácter sinalagmático da taxa não exige a correspondência do seu montante 
 ao custo do bem ou serviço prestado: a bilateralidade que a caracteriza 
 mantém-se, mesmo na parte excedente ao custo (cfr., v. g., o Acórdão n° 205/87, 
 publicado no Diário da República, I Série, de 3 de Julho de 1987); não é, por si 
 só, de qualificar a taxa como imposto, ou de lhe conceder tratamento 
 constitucional de imposto, se o respectivo montante exceder o custo dos bens e 
 serviços prestados ao utente (cfr., v. g., o Acórdão n° 640/95, publicado 
 naquele Jornal Oficial, II Série, de 20 de Janeiro de 1996).
 
  
 
             Já se o valor da taxa for manifestamente desproporcionado, 
 
 «completamente alheio ao custo do serviço prestado», então pode duvidar-se se a 
 taxa não há-de ser encarada de um ponto de vista jurídico-constitucional, como 
 verdadeiro imposto (citado Acórdão n° 640/95), porque desse modo, e nessa 
 medida, se afectaria a correspectividade. Assim, a desproporcionalidade, 
 desvirtuante da correspectividade, lesaria o critério legitimante da taxa, 
 enquanto a adequação à capacidade contributiva é característica do imposto (cfr. 
 Acórdão n° 1108/96).  
 
             Ou seja – e para acompanhar mais uma vez este último aresto – «[a] 
 base funcional da distinção entre taxa e imposto não impõe […] uma 
 sinalagmaticidade pré-jurídica, mas sim uma sinalagmaticidade construída 
 juridicamente e um sentido de correspectividade susceptível de ser entendido e 
 aceite como tal pelos cidadãos atingidos».
 
  
 
             Tal entendimento do Tribunal mostra-se igualmente reflectido nos 
 diversos arestos que se debruçaram sobre a matéria da definição do montante das 
 taxas de justiça. 
 
             Também neles, se reconheceu que o legislador dispõe, nesse âmbito, 
 de uma larga margem de liberdade constitutiva, advertindo-se, no entanto, que 
 
 “essa liberdade não implica que as normas definidoras dos critérios de cálculo 
 sejam imunes a um controlo de constitucionalidade, quer no que toca à sua 
 aferição segundo regras de proporcionalidade, decorrentes do princípio do Estado 
 de Direito (artigo 2.º da Constituição), quer no que respeita à sua apreciação à 
 luz da tutela constitucional do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da 
 Constituição); em qualquer dos casos, sob a cominação de inconstitucionalidade 
 material” (Acórdãos nºs 1182/96, 352/91 e 349/02, publicados, respectivamente, 
 nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 35.º, pp. 447-454, Diário da 
 República II Série, de 17 de Dezembro de 1991 e de 15 de Novembro de 2002). 
 
             
 
             Discorrendo sobre a apreciação da questão de constitucionalidade do 
 art.º 7.º, alínea h), do Código das Custas Judiciais, “na interpretação de que o 
 referido artigo deve ser aplicado independentemente do valor da acção para 
 efeito de custas e da maior ou menor actividade jurisdicional envolvida pela 
 acção, incidente ou recurso”, e relativamente a um caso em que a taxa de justiça 
 era do montante de 836.183.000$00, respeitante a um processo de jurisdição 
 voluntária de um pedido de autorização judicial para a redução do capital social 
 de 192.229.088.784$00 para 24.996.857.746$00, e no qual chegou a um juízo de não 
 inconstitucionalidade, o referido Acórdão n.º 349/02 discreteou do seguinte 
 modo:
 
             
 
           «[…] 'o que é exigível é que, de um ponto de vista jurídico, o 
 pagamento do tributo tenha a sua causa e justificação – material, e não 
 meramente formal – na percepção de um dado serviço (cfr., designadamente, o 
 acórdão nº 1108/96, já citado).
 
           Assim, não basta uma qualquer desproporção entre a quantia a pagar e o 
 valor do serviço prestado, para que ao tributo falte o carácter sinalagmático. 
 Será necessário que essa desproporção seja manifesta e comprometa, de modo 
 inequívoco, a correspectividade pressuposta na relação sinalagmática.
 
           Como se escreveu recentemente no acórdão nº 115/02 – que acompanhou, 
 nesta parte, o que ponderado foi no acórdão nº 640/95, publicado no Diário da 
 República, II Série, de 20 de Janeiro de 1996 – 'pode assim dizer-se que o 
 Tribunal Constitucional rejeita o entendimento de que uma taxa cujo montante 
 exceda o custo dos bens e serviços prestados ao utente se deve qualificar como 
 imposto ou de que deve ter o tratamento constitucional de imposto: quando se 
 verifica a correspectividade ou o carácter sinalagmático entre a imposição e um 
 serviço divisível prestado não se está perante um imposto'.
 
           14. Por outro lado, se é certo que o Tribunal já disse que a 
 existência de uma clara desproporção pode afectar a qualificação de um tributo 
 como taxa, também é verdade que sempre acrescentou que a clara desproporção que 
 afecta o carácter sinalagmático de um tributo não pode relacionar-se apenas com 
 o carácter fortemente excessivo da quantia a pagar relativamente ao custo do 
 serviço; ela há-de igualmente ser aferida em função de outros factores, 
 designadamente da utilidade do serviço para quem deve pagar o tributo (cfr. os 
 acórdãos nºs 1140/96 e 115/02, já citados). 
 
           Para demonstrar este ponto, escreveu-se recentemente no acórdão n.º 
 
 115/02:
 
  
 
           '(...) E, o Tribunal Constitucional tem sido, no entanto, cauteloso na 
 apreciação dos excessos indicadores de uma falta de proporcionalidade enquanto 
 desvirtuantes da correspectividade.
 
           Assim, para a função da taxa pode ser menos relevante o custo e, por 
 exemplo, mais relevante a contenção da utilização de um serviço – o que 
 significa (e a jurisprudência constitucional tem-se comprometido nesse sentido) 
 que o carácter sinalagmático da taxa não exige a correspondência do seu montante 
 ao custo do bem ou serviço prestado: a bilateralidade que a caracteriza 
 mantém-se, mesmo na parte excedente ao custo (cfr., v. g., o acórdão n.º 205/87, 
 publicado no Diário da República, I Série, de 3 de Julho de 1987); não é, por si 
 só, de qualificar a taxa como imposto, ou de lhe conceder tratamento 
 constitucional de imposto, se o respectivo montante exceder o custo dos bens e 
 serviços prestados ao utente (cfr., v.g., o acórdão n.º 640/95, publicado 
 naquele jornal oficial, II Série, de 20 de Janeiro de 1996).
 
  
 
 (...)'
 
  
 
           Como, então, mais se ponderou, em termos que ora interessa reter (e 
 reflectindo, de certo modo, o exposto precedentemente), '[a] base funcional da 
 distinção entre taxa e imposto não impõe, todavia, uma sinalagmaticidade 
 construída juridicamente e um sentido de correspectividade susceptível de ser 
 entendido e aceite como tal pelos cidadãos atingidos'.
 
           Daí se retira que 'a consignação financeira de uma tal prestação 
 económica que surge como uma elevação de um preço estabelecido em convenção 
 poderá não afectar a natureza de taxa da referida prestação, na medida em que se 
 entenda que a elevação do preço tem o seu fundamento (a sua causa) num 
 determinado modo de relacionamento dos cidadãos com os custos (benefícios ou 
 utilidades) e a própria elevação do preço seja aceitável racionalmente como 
 contrapartida de um benefício'.».
 
  
 
             8.6 – Neste domínio das custas judiciais, não pode, pois, o 
 legislador deixar de ponderar, dentro da referida avaliação das finalidades 
 públicas a satisfazer, a sua vinculação constitucional decorrente da previsão de 
 um direito fundamental de acesso aos tribunais constante do art.º 20.º da 
 Constituição.
 
             É que em causa está um bem ou serviço público que visa satisfazer um 
 direito fundamental no Estado de direito democrático: a obtenção de tutela 
 judicial efectiva e plena dos direitos subjectivos e interesses legalmente 
 protegidos das pessoas.
 
             Não se trata apenas de um serviço de utilização obrigatória, em 
 certos casos, mas de um bem essencial à própria realização e efectivação do 
 Estado de direito democrático, na sua expressão de garantia de resolução, 
 através dos tribunais, das controvérsias da vida em sociedade apenas segundo o 
 direito.
 
             Debruçando-se sobre este ângulo da questão, escreveu-se o seguinte 
 no referido Acórdão n.º 352/91, que aqui se reitera:
 
  
 
             «[…]
 
             O direito de acesso aos tribunais não compreende [...] um direito a 
 litigar gratuitamente, pois [...] não existe um princípio constitucional de 
 gratuitidade no acesso à justiça (cfr., neste sentido, também o Acórdão n.º 
 
 307/90, Diário da República, 2ª Série, de 4 de Março de 1991).
 
             O legislador pode, assim, exigir o pagamento de custas judiciais, 
 sem que, com isso, esteja a restringir o direito de acesso aos tribunais. E, na 
 fixação do montante das custas, goza ele de grande liberdade, pois é a si que 
 cabe optar por uma justiça mais cara ou mais barata.
 
             Essa liberdade constitutiva do legislador tem, no entanto, um limite 
 
 – limite que é o de a justiça ser realmente acessível à generalidade dos 
 cidadãos sem terem que recorrer ao sistema de apoio judiciário.
 
             É que o nosso ordenamento jurídico concebe o sistema de apoio 
 judiciário como algo que apenas visa garantir o acesso aos tribunais aos 
 economicamente carenciados, e não como um instrumento ao serviço também das 
 pessoas de médios rendimentos (salvo, naturalmente, se estas houverem de 
 intervir em acções de muito elevado valor).
 
             Na fixação das custas judiciais, há-de, pois, o legislador ter 
 sempre na devida conta o nível geral dos rendimentos dos cidadãos de modo a não 
 tornar incomportável para o comum das pessoas o custeio de uma demanda judicial, 
 pois se tal suceder, se o acesso aos tribunais se tornar insuportável ou 
 especialmente gravoso, violar-se-á o direito em causa.
 
 […]
 
             Como todas as decisões legislativas, as decisões que o legislador 
 toma em matéria de custas no que concerne ao quantum delas, são, obviamente, 
 sindicáveis sub specie constitucionis. Mas, ao menos em geral, (...) tais 
 decisões só haverão de ser taxadas de constitucionalmente ilegítimas quando 
 inviabilizem ou tornem particularmente oneroso o acesso aos tribunais para o 
 cidadão médio.».
 
             
 
             E laborando dentro do mesmo pensamento, disse-se, também, no Acórdão 
 n.º 467/91, publicado no Diário da República II Série, de 2 de Abril de 1992:
 
  
 
             «[…] esse espaço de conformação [o espaço de conformação do 
 legislador em matéria de custas] tem os limites que são dados pela irredutível 
 dimensão de defesa da tutela jurisdicional dos direitos, postulando soluções 
 legislativas que assegurem um acesso igual e efectivo aos tribunais. Então, o 
 princípio da proporcionalidade vem aqui «alicerçar um controlo 
 jurídico-constitucional da liberdade de conformação do legislador e situar 
 constitucionalmente o espaço de prognose legislativa» (J. J. Gomes Canotilho, 
 Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, Coimbra 1982, p. 274).
 
             O asseguramento da garantia do acesso aos tribunais subentende uma 
 programação racional e constitucionalmente adequada dos custos da justiça: o 
 legislador não pode adoptar soluções de tal modo onerosas que impeçam o cidadão 
 médio de aceder à justiça.».
 
  
 
             Face ao que vem de dizer-se, há-de convir-se que o legislador, no 
 estabelecimento do critério de determinação da taxa de justiça, não pode ir além 
 dos limites postulados pela garantia da bilateralidade.
 
             Mas sendo assim, no estabelecimento das taxas de justiça, o sistema 
 não deve deixar de atender aos custos reais de administração de justiça e as 
 taxas fixadas não devem, também, deixar de corresponder, com observância do 
 princípio da igualdade na aplicação do critério, a uma refracção desses custos 
 reais. 
 
             É que o Estado pode optar por uma justiça mais barata ou mais cara, 
 desde que não ultrapasse os custos de uma tal função.
 
             Mas, por outro lado, há, também, que não esquecer que incumbe, ao 
 Estado, a realização de um “equilíbrio entre a consagração do direito de acesso 
 ao direito e aos tribunais [em condições de igualdade] e os custos inerentes a 
 tal exercício” (Acórdão n.º 608/99, publicado no Diário da República II Série, 
 de 16 de Março de 2000).
 
             Todavia, nada obriga a que esse equilíbrio, que forçosamente deve 
 assegurar uma igualdade das partes no acesso à justiça, haja de ser conseguido 
 exclusivamente através da adopção de uma grelha de taxas de justiça, até porque 
 a facilidade em as pagar anda na razão inversa dos meios de fortuna que se 
 tenha.  
 
             A concretização de uma igualdade material, no acesso aos bens 
 públicos, passará, antes, pela previsão de mecanismos de isenção ou de redução 
 das taxas de justiça ou de concessão de apoios ou de benefícios financeiros a 
 quem não possa suportar as custas reflectoras do sistema mais caro ou mais 
 barato de administração de justiça por que o legislador optou, aí acautelando os 
 referidos interesses públicos e o direito fundamental de acesso aos tribunais.
 
             Quer isto dizer que o grau de tributação das custas judiciais, que 
 será, ainda, tolerável, de acordo com um critério de exigibilidade de uma 
 relação de bilateralidade, apenas terá de ser afastado, para realizar o acesso à 
 justiça em condições de igualdade, quando esse acesso não esteja assegurado 
 mediante a previsão de um sistema de mecanismos de apoio judiciário ou em que o 
 nível de tributação adoptado, conjugadamente com a existência desses meios de 
 apoio, inviabilize ou torne particularmente oneroso ou inibidor, segundo uma 
 regra de controlo de evidência, o acesso aos tribunais para o cidadão médio, 
 garantido pelo art.º 20.º da CRP.
 
             Por outro lado, sendo, embora, certo que prestação de administração 
 de justiça se consubstancia na obtenção de uma decisão judicial, não se segue 
 daí que o legislador não possa adoptar como critério conformador das taxas 
 judiciais um princípio assente sobre a consideração do valor da causa, seja por 
 patamares, seja recorrendo ao simples método proporcional, com isso entrando em 
 linha de conta com o valor mediato da prestação de justiça, como acontece na 
 norma constitucionalmente impugnada. 
 
             É que não há dúvida que a utilidade sentida pelo utilizador do 
 serviço de administração de justiça reside, essencialmente, no valor dos 
 direitos ou interesses que são reconhecidos pela decisão judicial e não tanto na 
 decisão judicial em si própria, sendo que, numa perspectiva económica, a 
 prestação pública vale pelos direitos ou bens que garante.
 
             Nesta medida, não pode considerar-se desadequada a opção do 
 legislador em erigir o valor da acção ou da sucumbência no recurso em elemento 
 base de construção do critério de tributação ou enquanto regra de repartição, 
 com respeito pelo princípio da igualdade, dos custos públicos com a obtenção do 
 reconhecimento judicial desses direitos e interesses legítimos.
 
             Ponto é que o montante das taxas de justiça, nele relevado o valor 
 dos benefícios, não vá além dos custos de administração de justiça e que seja 
 estabelecido com respeito pelos princípios de igualdade material e de 
 proporcionalidade, em termos tais que se não se perca a relação de conexão 
 material entre as prestações, passando o sujeito a ser tributado, antes, em 
 função da sua capacidade contributiva.
 
             A consideração do valor da causa ou da sucumbência no recurso 
 mostram-se ainda justificados, materialmente, perante outras circunstâncias do 
 sistema legal, como sejam o facto de as formas das acções judiciais, a 
 admissibilidade dos recursos e as alçadas dos tribunais serem, por regra geral, 
 estabelecidos em função de tais elementos e de estes induzirem maiores ou 
 menores custos da actividade de prestação de justiça.
 
             Por outro lado, não pode, ainda, ignorar-se que o bem público 
 utilizado pode demandar uma maior ou menor actividade do órgão jurisdicional, 
 que seja fundada não só na maior ou menor complexidade da causa, mas também nos 
 comportamentos dos particulares na acção e nos recursos. 
 
             Não se trata, pois, de uma prestação cuja utilização aconteça, 
 sempre, dentro do mesmo estádio de formação dos custos de administração da 
 justiça, nem que satisfaça, sempre, de um modo definitivo as necessidades de 
 tutela quem recorre aos tribunais.
 
             Na ausência da demonstração de qual o concreto patamar em que a 
 prestação pública se desliga dos custos da respectiva actividade, o Tribunal 
 Constitucional apenas poderá operar com o princípio da proporcionalidade, na sua 
 dimensão de respeito por uma justa medida ou de justiça material, e segundo um 
 princípio de controlo de evidência, repudiando o critério de tributação apenas 
 nos casos em que, para o cidadão médio, ele se apresente objectivamente como 
 intoleravelmente inibidor ou constrangente do acesso à justiça, principalmente 
 nos casos de maior incerteza sobre o resultado do processo, de defesa de 
 direitos fundamentais ou de direitos próprios perante o próprio credor da taxa 
 de justiça, etc.
 
             Ora, no caso em apreço, não pode considerar-se violar o princípio da 
 proporcionalidade o critério normativo de cuja aplicação resultou que, numa 
 pronúncia judicial prolatada em duas instâncias, numa acção ordinária, sobre um 
 pedido de indemnização, no valor de € 7.972.540,25, a título de responsabilidade 
 civil de um município por actos de gestão pública, o montante de custas devidas 
 se quedou pelo valor de €120.013,38 (sejam €139.997,80 de custas totais da 
 acção, menos €19.984,42 correspondentes às custas do incidente de apoio 
 judiciário que está fora do objecto do recurso).
 
             Na verdade, não se vê que, não obstante a ausência de 
 estabelecimento, no sistema de taxas de justiça, de um limite de tributação que 
 corresponda à quebra da relação de bilateralidade de prestações ínsita na taxa, 
 o critério normativo se apresente manifestamente desproporcionado, de modo a 
 fazer prevalecer o juízo do Tribunal Constitucional sobre o juízo do legislador. 
 
   
 
             A ausência de um limite no estabelecimento da grelha das taxas de 
 justiça não postula que as taxas estabelecidas sejam inexoravelmente violadoras 
 da Lei fundamental e que a concreta taxa de justiça não se situe dentro desse 
 limite tolerável. 
 
             A questão está em saber se as taxas exigidas ultrapassam os custos 
 de administração de justiça, se o montante de custas exigido é de tal modo 
 elevado que se possa afirmar inexistir uma relação material entre as duas 
 prestações ou se é razoavelmente de admitir a existência de efeito inibidor 
 situado fora de uma qualquer atitude do demandante claramente temerária.
 
             Ora, nenhuma destas situações pode ser afirmada, sem reserva de 
 dúvida. 
 
             Na verdade, o nosso sistema de administração de justiça é altamente 
 deficitário, representando as custas cobradas apenas uma pequena parcela dos 
 seus custos.
 
             Por outro lado, quedando-se as custas da acção apenas por cerca de 
 
 1/50 avos do valor da acção, correspondendo este à utilidade que dela poderia 
 retirar a parte vencida, e não sendo caso para considerar, até por lhe ter sido 
 desatendido o pedido de apoio judiciário, que as taxas estabelecidas 
 inviabilizaram ou impediram, por qualquer jeito, a devedora das custas de aceder 
 aos tribunais para fazer valer os direitos que entendia ter, não pode 
 concluir-se em outro sentido que não seja a da presunção da sua conformidade 
 constitucional.
 
             A este propósito, deve, ainda, ter-se presente que, nas situações em 
 que a avaliação da limitação ou restrição pelo critério da proporcionalidade se 
 revele complexa, como é o caso, o Tribunal Constitucional tem reconhecido ao 
 legislador uma prerrogativa de avaliação ou crédito de confiança, reservando a 
 sua intervenção apenas para as situações de ultima ratio.
 
  
 
                  Escreveu-se, com efeito, no Acórdão n.º 187/01, publicado no 
 Diário da República II Série, de 26 de Junho de 2001:
 
             
 
             «[…] não pode deixar de reconhecer-se ao legislador – diversamente 
 da administração – […] uma “prerrogativa de avaliação”, como que um “crédito de 
 confiança”, na apreciação, por vezes difícil e complexa, das relações empíricas 
 entre o estado que é criado através de uma determinada medida e aquele que dela 
 resulta e que considera correspondente, em maior ou menor medida, à consecução 
 dos objectivos visados com a medida […]. Tal prerrogativa da competência do 
 legislador na definição dos objectivos e nessa avaliação […] afigura-se 
 importante sobretudo em casos duvidosos, ou em que a relação medida-objectivo é 
 social ou economicamente complexa, e a objectividade dos juízos que se podem 
 fazer (ou suas hipotéticas alternativas) difícil de estabelecer.
 
  
 
             […] 
 
             em casos destes, em princípio, o Tribunal não deve substituir uma 
 sua avaliação da relação, social e economicamente complexa, entre o teor e os 
 efeitos das medidas, à que é efectuada pelo legislador, e que as controvérsias 
 geradoras de dúvida sobre tal relação não devem, salvo erro manifesto de 
 apreciação – como é, designadamente (mas não só), o caso de as medidas não serem 
 sequer compatíveis com a finalidade prosseguida –, ser resolvidas contra a 
 posição do legislador.
 
  
 
             […] 
 
             a própria averiguação jurisdicional da existência de uma 
 inconstitucionalidade, por violação do princípio da proporcionalidade por uma 
 determinada norma, depende justamente de se poder detectar um erro manifesto de 
 apreciação da relação entre a medida e seus efeitos, pois aquém desse erro deve 
 deixar-se na competência do legislador a avaliação de tal relação, social e 
 economicamente complexa.».
 
  
 
             Foi um juízo destes que suportou, ao fim e ao cabo, o julgamento de 
 não inconstitucionalidade prolatado no referido Acórdão n.º 349/02, em que 
 estava em causa uma taxa de justiça de valor muitíssimo superior.
 
             A circunstância de o legislador ter actualmente estabelecido um 
 critério de tributação mais favorável não quer dizer que esse seja o patamar em 
 que o montante de custas se deve considerar conectado com a utilidade da 
 prestação.
 
             Basta notar que o legislador pode, sem converter a administração de 
 justiça em uma actividade lucrativa, o que lhe estará constitucionalmente 
 vedado, suportar em maior medida os custos de justiça, desonerando quem a ele 
 acede.
 Benjamim Rodrigues