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Processo n.º 460/07
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
 
  
 Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
 
                   
 I - Relatório    
 
  
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 recorrente A., S.A. e recorrida B., foi interposto recurso de fiscalização 
 concreta de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º 
 da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão do Supremo Tribunal de 
 Justiça de 22.02.2007 (fls. 248/260 dos autos).
 
  
 
 2. Em 7 de Maio de 2007, foi proferida decisão sumária no sentido do não 
 conhecimento do objecto do recurso (fls. 268/270), com o seguinte teor:
 
  
 
 «I
 Relatório
 
 1.                           A., S.A., instaurou, em 2 de Fevereiro de 2006, 
 contra B., juíza de Direito em funções no Tribunal de Trabalho das Caldas da 
 Rainha, acção declarativa de simples apreciação, que recebeu o nº 1629-06. 
 
                   A autora pediu que fosse declarado que lhe assiste o direito 
 de instaurar acção judicial contra a ré, para obter reparação civil dos danos 
 causados por acções ou omissões por ela praticadas no exercício das suas funções 
 judiciais. Refere-se tal pretensão ao processo de execução de sentença nº 
 
 433-A/2001, que corre termos no Tribunal de Trabalho das Caldas da Rainha e em 
 que são exequente C. e executada A., S.A..
 
                   Ao propor a acção, a autora sustentou a inconstitucionalidade 
 da norma do nº 3 do artigo 5º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, aprovado 
 pela Lei nº 21/85, de 30 de Julho. Tal norma estabelece que a responsabilidade 
 civil contra magistrados judiciais apenas pode ser efectivada mediante acção de 
 regresso do Estado com fundamento em dolo ou culpa grave.
 
                   Por decisão de 14 de Fevereiro de 2006, o Tribunal da Relação 
 de Lisboa indeferiu liminarmente a petição inicial, considerando não ocorrer a 
 alegada inconstitucionalidade. A autora reclamou desta decisão sumária, arguindo 
 a respectiva nulidade. O Tribunal da Relação de Lisboa indeferiu a reclamação 
 por acórdão de 20 de Junho de 2006. A autora e a ré arguiram a nulidade deste 
 acórdão, por omissão de pronúncia. O Tribunal da Relação de Lisboa indeferiu 
 ambas as arguições de nulidade por acórdão de 21 de Novembro de 2006.
 
 2.                           A., S.A., interpôs recurso para o Supremo Tribunal 
 de Justiça, sustentando, mais uma vez, a inconstitucionalidade da norma do nº 3 
 do artigo 5º do Estatuto dos Magistrados Judiciais e do artigo 1085º do Código 
 de Processo Civil.
 
                   O Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 22 de Fevereiro 
 de 2007, considerou que faltava à autora interesse em agir. Por outro lado, o 
 Supremo realçou que a alternativa à conclusão pela falta de interesse em agir 
 seria o indeferimento liminar da petição, como havia decidido o Tribunal da 
 Relação de Lisboa, por não se verificarem as inconstitucionalidades normativas 
 alegadas pela autora. O tribunal a quo decidiu, por todas estas razões, negar 
 provimento ao recurso.
 
 3.                           A., S.A., interpôs então recurso de 
 constitucionalidade, ao abrigo dos artigos 280º, nº 1, alínea b), da 
 Constituição e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para 
 apreciação da conformidade constitucional das normas do nº 3 do artigo 5º do 
 Estatuto dos Magistrados Judiciais e do artigo 1085º do Código de Processo 
 Civil.
 
                   A recorrente entende que as normas em crise violam os 
 princípios do Estado de direito democrático e da igualdade (artigos 2º e 13º da 
 Constituição) e a norma do artigo 22º da Constituição (responsabilidade das 
 entidades públicas).
 
     Cumpre agora apreciar e decidir.
 II
 Fundamentação
 
 4.             A recorrente pretende submeter à apreciação do Tribunal 
 Constitucional a norma que consagra o modo de efectivação da responsabilidade 
 civil dos magistrados judiciais e a norma que permite o indeferimento liminar da 
 petição da acção. O Supremo Tribunal de Justiça considerou que a autora não 
 possuía interesse em agir. Mas considerou, paralelamente, que existiam 
 fundamentos para o indeferimento liminar da petição inicial.
 
                   Assim, no contexto da decisão recorrida, a improcedência da 
 pretensão da autora sempre se pode fundamentar, de modo suficiente, na falta de 
 interesse em agir. Verifica-se, pois, que a decisão recorrida contém 
 fundamentação alternativa em relação à qual a recorrente não suscitou qualquer 
 questão de inconstitucionalidade normativa.
 
 5.              Deste modo, qualquer juízo que o Tribunal Constitucional viesse 
 a formular sobre o objecto do presente recurso não poderia alterar a decisão 
 recorrida. Esta decisão subsistiria, como se sustentou, com fundamento na falta 
 de interesse em agir da autora e ora recorrente.
 
                   Pelas razões enunciadas, a apreciação do presente recurso é 
 inútil, não se tomando, por conseguinte, conhecimento do seu objecto.
 III
 Decisão
 
 6.                           Ante o exposto, decide-se não tomar conhecimento do 
 objecto do presente recurso de constitucionalidade.»
 
  
 
 3. Notificada desta decisão, a recorrente veio reclamar para a conferência, ao 
 abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3 da LTC, com os seguintes fundamentos:
 
 «II
 O acórdão do STJ, embora considere que falta interesse em agir à Autora, 
 confirmou a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa. E, ao fazê-lo, sufragou, 
 como fundamento decisório do acórdão que proferiu, os fundamentos da decisão do 
 Tribunal da Relação de Lisboa.
 Ora, a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, que o STJ confirmou, indeferiu 
 liminarmente a petição inicial, por ter considerado que, não sendo 
 inconstitucional a norma do n.° 3 do art. 5° do Estatuto dos Magistrados 
 Judiciais, cuja inconstitucionalidade a Autora logo invocou e alegou, na petição 
 inicial, a Ré não poderia ser demandada, civilmente, por actos que praticou, 
 como juiz, no processo de execução n.° 433-A/2001 do Tribunal do Trabalho de 
 Caldas da Rainha.
 A confirmação da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa com os fundamentos que 
 a integram está, expressamente, declarada, nos seguintes trechos do acórdão do 
 STJ:
 
 - “Em suma: nenhuma censura, pois, a fazer ao caminho processual seguido no 
 Tribunal da Relação de Lisboa.” – cfr. fls. 12, penúltimo parágrafo.
 
 - “Como nenhuma censura, de fundo, há a fazer ao decidido. Porque, de fundo, se 
 pode afirmar sem margem para dúvidas a constitucionalidade do disposto no art. 
 
 5º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
 
 - (...) Se a autora se julga com direito a qualquer reparação civil por actos 
 praticados pela Ex. ma Juíza, do Estado a exigirá. E tê-la-á (n)a íntegra, se a 
 acção proceder.
 
 - Mas contra esta, directamente, não pode a autora propor qualquer acção.
 
 - Bem andou a Relação de Lisboa, bem andou antes o seu Ex.mo Desembargador.” – 
 cfr. fls. 13 do acórdão do STJ.
 
 É, pois, inegável que a ratio decidendi do acórdão do STJ, assenta na ratio 
 decidendi da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou, ou seja, no 
 indeferimento liminar da petição inicial, por se ter entendido que, face ao 
 disposto no n.°3 do art. 5° do EMJ, cuja inconstitucionalidade se rejeitou, a 
 Autora não pode demandar, civilmente, a Ré, por actos praticados no exercício 
 das funções de juiz e por causa de tal exercício.
 As considerações que são expendidas no acórdão do STJ sobre a falta de interesse 
 em agir da Autora constituem obter dicta, isto é, considerações que, no dizer do 
 acórdão do STJ, também poderiam conduzir ao insucesso da pretensão da Autora, 
 mas que, na realidade, não conduziram, pois o acórdão do STJ não alterou nem o 
 fundamento, nem a própria decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, pois que, se 
 o tivesse feito, teria que ter absolvido a Ré da instância com fundamento no que 
 considerou, como falta de interesse em agir da Autora, o que é manifesto que não 
 fez, dado que a falta de interesse em agir integra uma excepção dilatória que dá 
 lugar à absolvição da instância, como resulta do disposto no n.° 2 do art. 493º 
 do CPC, e não ao indeferimento liminar de uma petição inicial.
 Sobre a distinção que é feita, no Direito Inglês, entre ratio decidendi e obter 
 dictum ou, no plural, obter dicta, cfr., entre muitos outros, Konrad Zweigert e 
 Hein Kötz, An Introduction to Comparative Law, Vol I: The Framework, North 
 Holland Publishing Comapany, 1977, pág. 263 e segs.; Colin F. Padfield of Gray’s 
 Inn, Barrister (revisão de F.E. Smith of Gray’s Inn, Barrister), Law Made 
 Simple, Heineman, Londres, Janeiro 1983, pág. 26.
 Por isso, o que permanece como decisão é o indeferimento liminar da petição 
 inicial, com o fundamento determinante e decisivo de que a Ré não pode ser, 
 civilmente, demandada, por actos praticados no exercício da sua função de juiz e 
 por causa de tal exercício, em virtude da norma contida no n.° 3 do art. 5º do 
 EMJ, cuja inconstitucionalidade, apesar de suscitada ab initio, foi rejeitada, 
 constituindo o juízo de não inconstitucionalidade da referida norma a ratio em 
 que assentou a decisão de indeferimento liminar.
 Acresce que, não obstante o devido respeito pelas considerações feitas, no 
 acórdão do STJ, sobre a pretendida falta de interesse em agir da Autora, tal 
 falta também não se verifica in, casu, como se demonstrará, mais abaixo.
 Mas ainda que tal falta de interesse em agir se verificasse, ainda assim essa 
 falta de interesse também nunca poderia conduzir, sem mais, à absolvição da Ré 
 da instância, pois, nos termos do disposto nas alíneas a) e b) do n.°1 do art. 
 
 508° do CPC, o juiz sempre estaria obrigado a providenciar pelo suprimento de 
 excepções dilatórias, nos termos do n.°2 do art. 265° do mesmo Código, e/ou a 
 convidar a Autora ao aperfeiçoamento da petição inicial, no sentido de 
 concretizar o respectivo interesse em agir.
 Por isso, o recurso de constitucionalidade não é inútil, como se considerou, na 
 decisão sumária ora reclamada, dado que o acórdão recorrido do STJ, tomou, como 
 sua própria ratio decidendi, a do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que 
 confirmou.
 III
 A decisão sumária de que se reclama, ao não conhecer do objecto do recurso de 
 constitucionalidade, com o fundamento que foi sufragar nas considerações feitas, 
 no acórdão do STJ, sobre a falta de interesse em agir da Autora, apreciou e 
 tomou posição sobre uma questão processual da acção que não é de 
 constitucionalidade.
 Porém, nos termos do disposto no n.° 1 do art. 71° da Lei de Organização e 
 Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, “Os recursos de decisões 
 judiciais para o Tribunal Constitucional são restritos à questão da 
 inconstitucionalidade ou da ilegalidade suscitada.”, o que vale dizer que está 
 vedado ao Tribunal Constitucional socorrer-se e louvar-se em considerações 
 feitas, pelas instâncias judiciais, a propósito de outras questões processuais, 
 que para mais não constituem a ratio decidendi da decisão ora em recurso, para 
 fundar as suas próprias decisões sobre os recursos de constitucionalidade, 
 maxime para se desobrigar de conhecer do respectivo objecto.
 Mas, porque a decisão sumária reclamada fundou a respectiva ratio decidendi para 
 o não conhecimento do objecto do recurso, na falta de interesse em agir, não 
 pode a Autora deixar passar em claro esta questão, sem sobre a mesma se 
 pronunciar, já que o STJ nem sequer lhe deu oportunidade para tal e que o 
 próprio Tribunal Constitucional também dela se serviu, para, em decisão sumária, 
 justificar o não conhecimento do objecto do recurso, também sem ter dado 
 oportunidade à Autora, para sobre ela se pronunciar.
 Em primeiro lugar e salvo o devido respeito, não é verdade, como, com simplismo 
 e exagero, se diz no acórdão do STJ, que “O que a autora pede a um tribunal – no 
 caso ao tribunal da Relação de Lisboa – é que lhe diga qual o direito.” – cfr. 
 fls. 8 do acórdão do STJ, penúltimo parágrafo.
 
 É manifesto que a Autora não solicitou qualquer consulta ou parecer jurídico ao 
 Tribunal da Relação de Lisboa, bastando ler a petição inicial, para constatar 
 que nela é pedido que seja “declarado que à Autora assiste o direito de 
 instaurar acção judicial contra a Senhora Juiz aqui Ré, para obter reparação 
 civil dos danos que, nessa acção, se vierem a provar, como causados à Autora, 
 por acções ou omissões praticadas, pela Senhora Juiz aqui Ré, no exercício das 
 suas funções de juiz e por causa de tal exercício, no âmbito do processo de 
 execução de sentença que corre termos sob o Proc. 433-A/2001 no Tribunal de 
 Trabalho de Caldas da Rainha, e em que é exequente C. e executada a aqui A., A. 
 SA.”.
 E pede a declaração de tal direito, porquê?
 Porque, conforme alega, na petição inicial, no direito ordinário existe a norma 
 do n.°3 do art. 5° do EMJ que, em oposição ao estatuído no art. 22° da 
 Constituição, impede o cidadão lesado de demandar civilmente o juiz, por danos 
 que este lhe tenha causado, no exercício das respectivas funções e por causa de 
 tal exercício.
 Fazer de conta que o pedido de declaração de um direito, cujo reconhecimento 
 depende de se considerar ou não, como inconstitucional, a norma de direito 
 ordinário que o impede, não introduz uma certa dose objectiva de incerteza e de 
 controvérsia sobre a existência de tal direito e que, em face dessa margem de 
 incerteza, considerar que a Autora não tem qualquer interesse em agir, para, em 
 acção declarativa de simples apreciação, pedir que seja declarado que lhe 
 assiste o direito de instaurar acção judicial contra a Senhora Juiz aqui Ré, 
 corresponde, salvo o devido respeito, à negação de uma evidência.
 E a prova do interesse em agir da Autora está bem demonstrada, pelas próprias 
 decisões proferidas, quer pela Relação de Lisboa, quer pelo STJ, nas quais a 
 norma do n.°3 do art. 5º do EMJ foi considerada, logo à partida, como 
 justificação bastante, para se impedir a observância da devida e legal 
 tramitação processual da acção, pois o despacho de indeferimento liminar foi 
 proferido, com frontal violação da norma do n.° 1 do art. 234°-A do CPC, a qual 
 não permite que haja lugar, in casu, à prolação de despacho de indeferimento 
 liminar, atento que, nos termos do disposto no n.° 4 do art. 234° do CPC, a 
 citação da Ré não estava sujeita a prévio despacho judicial, chegando-se ao 
 cúmulo de se admitir a intervenção da Ré, ao longo deste processo, sem a mesma 
 nunca ter sido citada.
 Mas mais, as considerações sobre a falta de interesse em agir da Autora integram 
 uma questão que nunca antes tinha sido suscitada, no processo, até ao momento em 
 que veio a ser proferido o acórdão do STJ.
 Diz o n.° 3 do art. 3° do CPC que não é lícito ao juiz, salvo caso de manifesta 
 desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de 
 conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a oportunidade de sobre 
 elas se pronunciarem.
 
 É patente, perante as considerações feitas, no acórdão do STJ, sobre a suposta 
 falta de interesse em agir da Autora, que a esta última também nunca foi dada 
 qualquer oportunidade, para sobre elas se pronunciar.
 Diz o ditado popular que ninguém é bom juiz em causa própria e, no caso, só a 
 circunstância de a Ré ser juiz e estar a ser demandada, civilmente, por actos 
 praticados, no exercício das suas funções e por causa de tal exercício, permite 
 compreender, mas não justificar ou aceitar, que o presente processo tenha 
 sofrido tantos entorses e desvios, em relação à marcha processual legalmente 
 prescrita, continuando assim, em aberto e por resolver, a velha questão de saber 
 
 “quem guarda os guardas”.
 Em face do exposto, deverá ser julgada procedente a presente reclamação e ser 
 proferida decisão que mande conhecer do objecto do recurso de 
 constitucionalidade, como é de Direito e Justiça.»
 
  
 
 4. Notificada do requerimento de reclamação para a conferência, a recorrida 
 pronunciou-se no sentido da confirmação da decisão sumária.
 
  
 
  Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II – Fundamentação
 
  
 
 5. Como reiteradamente se tem afirmado na jurisprudência deste Tribunal, um dos 
 requisitos do recurso de constitucionalidade é a «aplicação pelo tribunal 
 recorrido, como ratio decidendi, de norma cuja constitucionalidade haja sido 
 suscitada durante o processo, considerada esta norma na sua totalidade, em 
 determinado segmento ou segundo certa interpretação, mediatizada pela decisão 
 recorrida.» (v., entre muitos outros, o Acórdão n.º 232/02 deste Tribunal). 
 Esta exigência de que a norma aplicada constitua o fundamento da decisão 
 recorrida resulta da natureza instrumental dos recursos de fiscalização concreta 
 da constitucionalidade. Ou seja, de estes só se revestirem de utilidade caso a 
 decisão tomada se possa, utilmente, repercutir na causa de onde os mesmos 
 emergiram. 
 No caso de a decisão recorrida se apoiar em mais do que um fundamento, cada um 
 deles, por si só, bastante para justificar a decisão, a utilidade da intervenção 
 fiscalizadora do Tribunal Constitucional só ficará salvaguardada se todos eles 
 forem objecto de apreciação.
 No caso em apreço, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 22.02.2007, ora 
 recorrido, apresenta, como claramente resulta da respectiva leitura, dois 
 fundamentos distintos: por um lado, considerou haver falta de interesse em agir 
 da autora, ora recorrente; por outro, entendeu, confirmando o decidido pela 
 Relação, que havia fundamento para o indeferimento liminar. É o que 
 expressamente se conclui na referida decisão: 
 
 « (…) poderia dizer-se que, de um ou outro modo, a presente acção arrasta 
 consigo, desde a nascença, o estigma do seu próprio destino: ou o indeferimento 
 liminar, como vem decidido pela Relação; ou a absolvição do pedido, se acaso a 
 falta de interesse em agir só no despacho saneador viesse a ser detectada (…)».
 Este último fundamento não se apresenta, na economia da decisão, como conclusão 
 meramente hipotética ou provisória, mas antes constitui um juízo efectivo e 
 definitivo sobre a falta de interesse em agir da autora, afirmando-se, 
 nomeadamente, o seguinte: 
 
 «O que a autora pede a um tribunal — no caso ao tribunal da Relação de Lisboa — 
 
 é que lhe diga qual o direito. 
 Mas por quê? Qual a razão concreta, objectiva, qual o real conflito ou 
 controvérsia que já se estabeleceu entre a autora e a Exma Juíza ré, que faça 
 nascer, que tenha feito nascer na autora o interesse — um “objectivo” interesse 
 
 — em definir desde já o direito aplicável? 
 Não há. Transparentemente não há. Não vem alegado qualquer facto ou razão sobre 
 o qual repouse um interesse ... em agir. 
 Então, 
 quando a autora, em momento ulterior, quiser instaurar a anunciada acção 
 judicial contra a Exma Juíza, 
 instaura-la-á como o faz todo e qualquer potencial litigante: alinhando os 
 factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção — art.467°, n°1, 
 al. d ) do CPCivil. 
 Falta à autora, aqui, neste momento e nesta acção, o chamado interesse em agir.»
 
  Assim, assentando a decisão naqueles dois fundamentos alternativos e não tendo 
 sido suscitada qualquer questão de constitucionalidade relativamente à falta de 
 interesse em agir, é quanto basta para manter incólume o decidido e, 
 consequentemente, concluir pela inutilidade da apreciação da questão da 
 constitucionalidade do n.º 3 do art. 5.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais e 
 do art.1085.º do Código de Processo Civil.
 Em suma, como se salienta, com inteira pertinência, na decisão sumária 
 reclamada, «qualquer juízo que o Tribunal Constitucional viesse a formular sobre 
 o objecto do presente recurso não poderia alterar a decisão recorrida. Esta 
 decisão subsistiria, como se sustentou, com fundamento na falta de interesse em 
 agir da autora e ora recorrente».
 
 É essa uma razão impeditiva do conhecimento do objecto do recurso, mostrando-se 
 manifestamente fora do âmbito de apreciação do Tribunal as demais considerações 
 tecidas na reclamação, nomeadamente quanto à alegada verificação, na acção, do 
 interesse em agir da ora recorrente.
 
  
 III. Decisão
 
  
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação, confirmando-se a 
 decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso.
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 25 Setembro de 2007
 Joaquim José Sousa Ribeiro
 Benjamim Rodrigues
 Rui Manuel Moura Ramos