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Processo n.º 94/08 
 
 2. ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
             Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
             1 – A., Lda., reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no 
 n.º 1 do art.º 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão 
 
 (LTC), da decisão sumária do relator que decidiu não conhecer do recurso de 
 constitucionalidade interposto do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) 
 que concedeu provimento ao recurso interposto da Relação de Lisboa.
 
  
 
             2 – Fundamentando a sua reclamação, argumenta a reclamante do 
 seguinte jeito:
 
  
 
                «A)      Teor da decisão sumária
 
  
 
 1. Considera a decisão ora reclamada que as duas interpretações consideradas 
 pela recorrente ofensivas da Constituição – melhor identificadas no requerimento 
 de interposição do recurso para este Tribunal – não foram suscitadas perante o 
 Tribunal a quo. Para este entendimento, a decisão baseia-se em dois parâmetros 
 de análise:
 
  
 a)      no teor das conclusões 15ª a 20ª da contra-alegação da ora recorrente, 
 perante o STJ;
 b)      no teor expresso pelo acórdão do STJ.
 
  
 Salvo o muito respeito, contudo, não pode aceitar-se esta compreensão quanto aos 
 pressupostos de admissibilidade deste recurso.
 
  
 B)           A apresentação ao STJ das duas questões de inconstitucionalidade
 
  
 
 2. A apreciação sobre se as duas questões de inconstitucionalidade foram ou não 
 suscitadas na instância a quo, atempadamente, não pode limitar-se ao teor da 
 síntese da contra-alegação levada pela ali recorrida às suas “conclusões”.
 
  
 Com efeito, ao contrário do que se passa com a alegação do recorrente, cujas 
 conclusões são condição sine qua non, quer da admissão do recurso, quer da sua 
 própria identificação material/objectiva – como resulta inequívoco do disposto 
 em art. 690º do CPC – quanto à contra-alegação do recorrido, em parte alguma 
 determina a lei que o mesmo esteja sujeito ao ónus de apresentar conclusões, 
 excepto em matéria de ampliação do objecto do recurso (art. 684º-A) e impugnação 
 da matéria de facto, o que não é o caso.
 
  
 Logo por aqui, importa concluir-se que, salvo o respeito devido, a decisão ora 
 reclamada peca, por defeito, ao limitar-se ao teor daquelas conclusões.
 
  
 Na verdade, a questão da interpretação inconstitucional do art. 3º nº 2 do 
 CE/91, no sentido que pode existir um processo (litigioso, como é óbvio), de 
 expropriação de um imóvel – o dos autos, é claro –, nunca sujeito a alguma 
 declaração de utilidade pública de expropriação (DUP), e a respectiva avaliação 
 e indemnização puderem ser substancialmente autónomas de uma expropriação, do 
 conjunto da unidade económica interdependente, vem suscitada na contra-alegação, 
 nos seus vários argumentos – para além do teor das “conclusões” citadas na 
 decisão ora reclamada. Assim:
 
  
 a)     Logo sob o cap. II daquela peça foi alegado que a expropriação destes 
 autos não corresponde à expropriação da totalidade da unidade económica, cujo 
 pedido de expropriação teria dado causa aos autos, mas apenas de um imóvel 
 
 (matéria incontroversa, e pressuposto do raciocínio sobre a 
 inconstitucionalidade);
 
  
 b)     Na sequência desta demonstração, e quanto àquela primeira questão de 
 inconstitucionalidade, os pontos 10.3 e 10.4 da contra-alegação concluem pela 
 inadmissibilidade de se sustentar o processo destes autos sem DUP, pois, de 
 outro modo, aplicar-se-ia uma interpretação «dos arts. 1º, 2º, nº 2, 10º nº1 e 2 
 do então Cód. das Exp. violadora dos arts. 62º nº 1 e 2, 17º e 18º da 
 Constituição» – matéria desenvolvida no ponto 10.4.
 
  
 
 3. Quanto à segunda questão de inconstitucionalidade, objecto deste recurso – 
 
 «interpretação das Bases XXVII e LXVIII do contrato de concessão aprovado pelo 
 DL 198/94, combinado com o disposto no art. 1º e art. 10º nºs 1 e 2 do CE/91, no 
 sentido de que, estando o prédio destinado legalmente a ser expropriado, o 
 pedido idêntico da expropriada afasta a necessidade de declaração de utilidade 
 pública da expropriação, mesmo em processo litigioso» – os pontos nºs 8 ao final 
 do 12 da contra-alegação da recorrida, evidenciam ter sido suscitado, naquela 
 instância, que a tese da ali recorrente, no sentido de ser revogado o acórdão da 
 Relação e ser afirmada a validade da expropriação e dos autos sem existência da 
 DUP, dizia-se, que tal tese só poderia prevalecer interpretando aqueles 
 preceitos no sentido de que, estando o imóvel destes autos – como estava e é 
 matéria assente – abrangido no dever expropriatório da “B.” (dever 
 legal-contratual perante o Estado/concedente), a exigência de DUP, em processo 
 litigioso, poderia ser excluída por um pedido idêntico formulado pela 
 exproprianda.
 
  
 Ou seja, o teor levado às 'conclusões' da contra-alegação – e a todas elas, que 
 não apenas às citadas na decisão ora reclamada – deve, necessária e legalmente 
 ser completado e entendido pelo texto daquela peça, concretamente nas partes 
 acima mencionadas. E assim, deve concluir-se no sentido de que ambas as questões 
 foram colocadas à apreciação do STJ.
 
  
 C)           A questão da inconstitucionalidade e as questões que o STJ estava 
 obrigado a apreciar
 
  
 
 4. É certo que o acórdão não se expressa, concretamente, sobre aquela matéria, 
 mas nem por isso tal circunstância impede a apreciação do mérito do recurso da 
 inconstitucionalidade.
 
  
 Como o STJ lembrou, no acórdão de resposta ao pedido de aclaração da ora 
 recorrente, quem a ele recorreu, da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa – 
 que anulou todo o processado por falta de declaração de utilidade pública da 
 expropriação do imóvel destes autos – dizia-se, quem recorreu foi a “B.”, pelo 
 que, como ali referiu o STJ, «o objecto do recurso se definiu pelo teor das 
 conclusões que [aquela] formulou – art. 684º nº 3 e 690º nº 1 do Código de 
 Processo Civil».
 
  
 Certamente que, o acórdão, para estar isento do vício de nulidade, por omissão 
 de pronúncia não tinha de apreciar “as questões” colocadas pela ali recorrida, 
 expropriada: assim, o determina o disposto em arts. 660º e 668 do CPC, pois é, 
 ou deve ser conhecida a distinção entre as questões que a decisão deve conhecer, 
 sob pena de nulidade, e os argumentos das partes na sua apreciação.
 
  
 Contudo, e salvo o devido respeito, manifestando um efectivo desrespeito pela 
 materialidade/efectividade do princípio do contraditório, o acórdão do STJ, como 
 pelo seu teor se verifica, face à contra-alegação da expropriada, desconheceu, 
 totalmente, a argumentação desta: “ouviu” a argumentação da ali recorrente, 
 apreciou-a na sua própria lógica, acolheu-a, sem contudo manifestar, no seu 
 raciocínio expresso, a mais leve “audição” da argumentação da expropriada.
 
  
 Ora, por duas razões fundamentais tinha o dever de apreciar as duas questões de 
 inconstitucionalidade:
 
  
 a) Em 1º lugar, porque o recurso subiu ao STJ como tendo por base «vício de 
 violação da lei substantiva por erro de interpretação e aplicação do artigo 3º 
 do Código das Expropriações» (resposta da 'B.' às 'dúvidas' do Exmo. 
 Conselheiro-Relator, de fls. 1659); e, neste mesmo sentido, o objecto do 
 recurso, foi delimitado pela ali recorrente ao sentido da interpretação do art. 
 
 3º nº 2 do CE/91, no teor das suas conclusões.
 
  
 Logo, por força do disposto no art. 690º nº 2, als. a), b) e c) do CPC, o STJ 
 tinha o dever de apreciar esta matéria;
 
  
 b) Em segundo lugar, não obstante o facto de a lei processual não estipular o 
 vício de nulidade para o caso de o acórdão não apreciar o mérito/demérito da 
 argumentação suscitada pela recorrida, a verdadeira densidade do princípio do 
 contraditório impunha que na formulação da decisão fossem atendidas as duas 
 questões de inconstitucionalidade suscitadas.
 
  
 Na verdade, «O princípio do contraditório, embora não formulado na Constituição 
 expressamente para o processo civil, não pode deixar de valer também neste 
 domínio. Ele traduz, com efeito, uma exigência própria da ideia de Estado de 
 direito» (cf., neste sentido, Acórdãos do Trib. Const., nºs 397/89, 62/91 e 
 
 284/91: Diário da República, 2ª série, de 14.11.1989, e de 24.10.91, o primeiro 
 e o último, e I série-A, de 19.4.1991, o segundo).
 
  
 De acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional (acórdãos nºs 1185/96 
 e 1193/96), e como refere JORGE MIRANDA/RUI MEDEIROS, deve, e adopta-se «um 
 entendimento amplo do contraditório, entendido como 'garantia de participação 
 efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a 
 possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, 
 provas, questões de direito)'» (AA. cit., Constituição Portuguesa Anotada, T. I, 
 p. 194, aqui a negrito).
 
  
 
 5. Por outro lado, numa leitura objectiva do acórdão do STJ verifica-se que se 
 pressupõe, no seu teor fundamentador essencial, duas compreensões normativas 
 violadoras da Constituição. Pois, ao revogar a decisão do Tribunal da Relação, 
 onde se concluíra pela extinção da instância por falta de DUP, considera:
 
  
 
 – que a ali agravada efectuou um pedido de «expropriação total que abrangeu a 
 parcela destes autos».
 
  
 
 – tal pedido não implicaria nova DUP, não obstante a sua exigência legal.
 Ora, assim, cabe questionar: quais as razões jurídicas deste entendimento? De 
 acordo com o dito e o não dito mas implícito da decisão:
 
  
 a)                        O art. 3º nº 2 do CE/91 pode interpretar-se no sentido 
 de que a autorizada expropriação da parte restante do imóvel, aqui prevista, 
 abrangido por DUP parcelar, vale igualmente para a expropriação, individual e 
 autónoma de outro imóvel, como é o caso dos autos, indicado pela expropriada 
 como integrado numa unidade económica da qual fazem parte as parcelas objecto de 
 DUP (isto mesmo se expressa, de alguma forma, na pág. 10 e na nota de pág. 11 do 
 acórdão) – ou seja, por outras palavras, no contexto decisório o STJ expressa o 
 sentido normativo de que, face ao art. 3º nº 2 do CE/91, não é necessário DUP, 
 no processo de expropriação litigiosa de um prédio, separado, e autonomizado em 
 termos avaliatórios, da unidade económica que fora justificadora da inclusão na 
 expropriação (pois, como é óbvio, não se trata nestes autos da expropriação 
 dessa totalidade!)
 
  
 b)                        Por outro lado, o acórdão, mesmo não se expressando 
 literalmente sobre o teor das Bases XXVII e LXVIII, do Dec.-Lei que aprova o 
 regime da concessão de construção e exploração da ponte, e as demais normas do 
 CE/91, incluídas na 2ª questão da inconstitucionalidade, as quais impõem o 
 principio de que não pode haver expropriação sem DUP, dizia-se, o acórdão 
 interpreta este principio no sentido de que, uma declaração da proprietária, 
 pedindo a expropriação pré-destinada naqueles preceitos, torna desnecessário o 
 respeito aquele princípio, até em processo litigioso, como é o destes autos.
 
  
 Ora, a actividade/intervenção procedimental do Tribunal Constitucional «deve ser 
 constitucionalmente adequada aos direitos (processuais) garantidos» às 
 partes/cidadãos (GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da 
 Constituição, p. 853), e há-de respeitar os princípios de um processo justo, 
 expurgado de meras formas ocas, de sofistica retórica negatória de acesso à sua 
 especifica tutela jurisdicional-constitucional (A. e ob. cit. p. 859).
 
  
 Neste sentido, parece chocante e processualmente pouco justo à ora reclamante, 
 que tendo ela suscitado na sua contra-alegação as questões de 
 inconstitucionalidade indicadas no requerimento de interposição do recurso para 
 este Tribunal, uma restritiva, mas não admissível interpretação da sua 
 contra-alegação e do acórdão em causa permitam que se mantenha na ordem jurídica 
 regras normativas que o STJ profere, implícita e expressamente, ofensivas da 
 tutela constitucional ao direito de propriedade.
 
  
 Crê-se que, a compreensão dos pressupostos de admissão no recurso destes autos 
 não pode partir de um pré-juízo excludente, mas deverá adoptar a mesma filosofia 
 
 “pró-admissibilidade” que em tantos outros acórdãos tem sido expressa, nomeada e 
 concretamente no aplicável ao caso sub judice, acórdão nº 318/90 (Rel. Cons. 
 ALVES CORREIA), no qual se considerou que, na linha de outra jurisprudência, o 
 facto de «uma eventualmente indevida “omissão de pronúncia”sobre a questão da 
 constitucionalidade, por parte dos restantes Tribunais» não pode servir de 
 impedimento à admissibilidade/reexame da questão de constitucionalidade colocada 
 pelo recorrente, concluindo-se que, «o não conhecimento daquela 
 inconstitucionalidade [...] deve ser considerado como equivalendo a aplicação 
 implícita daquela norma para o efeito de recurso para o Tribunal 
 Constitucional».
 
  
 TERMOS NOS QUAIS, E SALVO O MUITO RESPEITO, DEVERÁ ADMITIR-SE A PRESENTE 
 RECLAMAÇÃO, CONCLUINDO-SE PELO RECEBIMENTO DO RECURSO E PROSSECUÇÃO DOS SEUS 
 TERMOS».
 
  
 
             3 – A reclamada B., S.A. respondeu pugnando pelo indeferimento da 
 reclamação e dizendo:
 
  
 
          «1. A expropriada interpôs recurso do Acórdão do Supremo Tribunal de 
 Justiça (adiante “STJ”) de fls. … dos presentes autos de expropriação litigiosa, 
 em virtude de, alegadamente, este ter feito uma interpretação inconstitucional 
 do artigo 3º, nº 2 do Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei nº 
 
 438/91 de 9 de Novembro (doravante “CE de 91”), e das Bases XXVII e LXVIII do 
 contrato de concessão aprovado pelo Decreto-Lei nº 168/94 de 15 de Junho, 
 combinadas com o disposto nos artigos 1º e 10º, nºs 1 e 2, do CE de 91. 
 
  
 
 2.      O Excelentíssimo Senhor Conselheiro Relator decidiu, porém, não tomar 
 conhecimento do objecto do recurso interposto pela expropriada, já que, pura e 
 simplesmente, esta não suscitou perante o Tribunal a quo as acima referidas 
 inconstitucionalidades, ao que acresce que do Acórdão do STJ não resultam as 
 pretensas violações de artigos constitucionais. 
 
  
 
 3.      Vem a expropriada reclamar do acima mencionado Acórdão do Tribunal 
 Constitucional alegando que (I) “a apreciação sobre se as duas questões de 
 inconstitucionalidade foram ou não suscitadas na instância a quo (...) não pode 
 limitar-se ao teor da síntese das contra-alegações levada pela ali recorrida às 
 suas “conclusões” (ponto B) da reclamação ora em resposta), e ainda que (II) se 
 
 “É certo que o acórdão não se expressa, concretamente, sobre aquela matéria 
 
 (...) nem por isso tal circunstância impede a apreciação do mérito do recurso da 
 inconstitucionalidade” (ponto C) da reclamação). 
 
  
 
 4.      Não tem, porém, razão a expropriada, estando a sua reclamação condenada 
 ao insucesso. Senão vejamos. 
 
  
 
 (I) A SUPOSTA APRESENTAÇÃO AO STJ DAS DUAS QUESTÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE 
 
  
 
 5.      A expropriada tenta convencer V. Excelências de que o Senhor Conselheiro 
 Relator se quedou, na apreciação do requerimento de interposição de recurso da 
 aqui recorrente, pelo teor conclusões por si apresentadas no recurso para o STJ. 
 
 
 
  
 
 6.      Todavia, foi a própria recorrente que, no nº 3 do requerimento de 
 interposição de recurso, se socorreu das conclusões referidas pelo Senhor 
 Conselheiro Relator. A alegação de inconstitucionalidade estaria, segundo a 
 recorrente, “nomeadamente” nas acima referidas conclusões. 
 
  
 
 7.      E a verdade, porém, é que basta ler o Acórdão em causa para facilmente 
 se constatar que o Tribunal Constitucional analisou detalhada e criteriosamente 
 todo o conteúdo das contra-alegações da expropriada, não se ficando pelas 
 respectivas conclusões, senão veja-se: 
 
 “Como se constata, do exposto não resulta suscitada a inconstitucionalidade da 
 norma do art. 3º, nº 2, do Código das Expropriações, interpretada no sentido 
 segundo o qual pode existir um processo de expropriação de um imóvel, e 
 respectiva avaliação e indemnização substancialmente autónomos de uma alegada 
 expropriação «em conjunto [da] unidade económica independente», a qual de resto, 
 não pode considerar-se contida numa remissão genérica e indiferenciada para 
 aposição da parte contrária. Ademais, face aos fundamentos decisórios revelados 
 pelo Supremo, transparece que a referência ao conteúdo do acórdão do Tribunal da 
 Relação de Lisboa (constante da nota mencionada pela recorrente) apenas releva 
 de um plano ad ostentationem já que, no caso presente, se entendeu de forma 
 inquestionável que o pedido de expropriação total formulado pela recorrente 
 abrangia a parcela dos autos e que tal pretensão visava “a expropriação de 
 prédios que constituíam, no seu entender, uma unidade económica integrada na 
 parcela em questão”. Sendo que tal juízo, por importar do domínio aplicativo, se 
 impõe a este Tribunal como um dado aqui insindicável’ (cf. p. 23 do Acórdão ora 
 em litígio, ênfase nosso). 
 
  
 
 8.      E mais adiante acrescenta: 
 
 “Por outro lado, igual conclusão impõe-se, mutatis mutandis, quanto à 
 
 “interpretação das Bases XXVII e LXVIII do contrato de concessão aprovado pelo 
 DL. nº 198/94, combinado com o disposto no art. 1º e art. 10º nºs 1 e 2 do 
 CE/91, no sentido de que, estando o prédio destinado legalmente a ser 
 expropriado, o pedido idêntico da expropriada afasta a necessidade de declaração 
 de utilidade pública da expropriação, mesmo em processo litigioso”, por se 
 tratar de uma norma cuja inconstitucionalidade não foi suscitada durante o 
 processo.” (Ibidem). 
 
  
 
 9.      Aliás, não conseguimos descortinar a “fixação” da expropriada pelo teor 
 das suas alegações, pois, fazendo nossas as suas palavras, delas resultam apenas 
 e nada mais do que “pressuposto[s] do raciocínio sobre a inconstitucionalidade” 
 
 (cf. p. 3 da sua reclamação), remissões genéricas e indiferenciadas para a 
 posição da expropriante, e não verdadeiros problemas de constitucionalidade. 
 
  
 
 10.    Como recorda o Tribunal Constitucional “para que se possa dar como 
 cumprido o ónus de suscitação de um problema de constitucionalidade, será sempre 
 necessário que o recorrente impute o vício da inconstitucionalidade, de forma 
 directa e imediata, a uma norma mediante a explicitação da dimensão normativa 
 que, no seu entendimento, viola a lei fundamental não bastando para que possa 
 considerar-se suscitada uma questão de constitucionalidade a afirmação de que é 
 inconstitucional, qua tale, o entendimento sustentado por uma parte ou agente 
 processual” (in p. 20 do Acórdão, destaque nosso). 
 
  
 
 11.    E continua: 
 
 “Para tais efeitos, importa, pois colocar o tribunal perante o dever de 
 apreciação da constitucionalidade de uma norma legal individualizada, havendo de 
 concretizar-se o sentido desse preceito de modo a que, no caso de vir a ser 
 julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão em termos 
 de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os operadores do direito 
 ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual é o preceito e com que sentido 
 ele não deve ser aplicado por, desse modo violar a constituição.” (in p. 21 do 
 Acórdão). 
 
  
 
 12.    Ou seja, para que se considere que houve um suscitar da questão da 
 constitucionalidade de modo processualmente adequado, entenda se num sentido 
 funcional, não basta a afirmação abstracta que uma dada interpretação é 
 inconstitucional. 
 
  
 
 13.    E, no fundo, a expropriada mais não fez que isso mesmo. 
 
  
 
 14.    Face ao exposto, deve improceder todo o ponto B) da reclamação da 
 expropriada. 
 
  
 
 (II) A QUESTÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE E AS QUESTÕES QUE O STJ ESTAVA OBRIGADO 
 A APRECIAR 
 
  
 
 15.    Segundo a expropriada, o acórdão do STJ não se expressa sobre os alegados 
 vícios de inconstitucionalidade, mas nem por isso tal circunstância devia 
 impedir a apreciação do mérito do recurso em causa. 
 
  
 
 16.    Cumpre desde já dizer que, o acórdão acima referido não se expressa sobre 
 os supostos vícios de inconstitucionalidade, porque o STJ não fez uma 
 interpretação inconstitucional do artigo 3º, nº 2 do CE de 91, nem das Bases 
 XXVII e LXVIII do contrato de concessão aprovado pelo Decreto-Lei nº 168/94 de 
 
 15 de Junho, combinadas com o disposto nos artigos 1º, 10º, nºs 1 e 2, do CE de 
 
 91. 
 
  
 
 17.    É que como bem recordou o Senhor Conselheiro Relator “será sempre 
 necessário que a norma que se coloque à apreciação do Tribunal Constitucional 
 tenha sido, efectivamente, aplicada in casu, com a interpretação que se 
 considerou inconstitucional perante o tribunal recorrido — cf., nesse sentido, 
 entre outros, o acórdão nº 139/95, publicado nos Acórdãos do tribunal 
 constitucional, 30º volume, 1996, o Acórdão nº 197/97, publicado no Diário da 
 república, IIª Série, nº 299, de 29 de Dezembro de 1998 e, mais recentemente, o 
 acórdão nº 214/03, disponível em www.tribunalconstitucional.pt (in p. 21) 
 
  
 
 18.    Ora, o STJ não fez uma interpretação do artigo 3º, nº 2 do CE de 91 e do 
 Bases XXVII e LXVIII do contrato de concessão aprovado pelo Decreto-Lei nº 
 
 168/94 de 15 de Junho, no sentido de não ser necessária uma Declaração de 
 Utilidade Pública (adiante “DUP”) e um consentimento da expropriada, isso sim 
 seria violador dos mais elementares preceitos constitucionais. 
 
  
 
 19.    Por outras palavras, em momento algum o STJ considerou que não era 
 necessária uma DUP; o que ele decidiu é que não era exigível uma nova DUP, em 
 virtude de estarmos perante um pedido de expropriação total. 
 
  
 
 20.    Não obstante a expropriada já ter amplamente explicado esta questão em 
 sede das suas alegações de revista, cumpre referir novamente que houve uma DUP, 
 a que consta do Despacho do Senhor Ministro das Obras Públicas, Transportes e 
 Comunicações, publicado no DR nº 68, II Série de 23.03.1995. 
 
  
 
 21.    De facto, assim sucedeu, já que pelo referido Despacho foi declarada a 
 utilidade pública de expropriação de um conjunto de parcelas necessárias à 
 construção do troço da Nova Travessia sobre o Tejo, actual Ponte Vasco da Gama, 
 troço esse, denominado, “Viaduto Sul”, e que abrangeu diversos prédios da 
 expropriada nos presentes autos, mais precisamente, os correspondentes às 
 Parcelas 11.1, 12.1, 12.2, 12.3, 13.1 e 13.2, tudo cf. fls. 7 dos autos. 
 
  
 
 22.    Por sua vez, em virtude de um pedido de expropriação total da 
 expropriada, que abrangeu a parcela dos autos, entendeu o STJ que não se 
 afigurava necessária a existência de declaração de utilidade pública de 
 expropriação autónoma para a parcela em causa, por se poder “estender” ao prédio 
 em causa. 
 
  
 
 23.    É por isso inadmissível, que a expropriada venha agora subverter o 
 plasmado na decisão do STJ arguindo que não houve uma DUP e que tal seria 
 violador dos preceitos legais em apreço, apenas com o propósito de arranjar, a 
 todo o custo, fundamentos para recorrer para o Tribunal Constitucional. 
 
  
 
 24.    A aferição da existência da DUP é matéria de facto, que foi dada como 
 provada nas devidas instâncias, ou seja, pelos Tribunais Judiciais. 
 
  
 
 25.    A este propósito, não resistimos a transcrever o seguinte excerto do 
 acórdão do STJ: “A expropriação, como antes dissemos, está sujeita ao princípio 
 da proporcionalidade, com os integrantes sub-princípios de adequação, 
 necessidade, e proporcionalidade em sentido estrito, como logo decorre do art. 
 
 3º, nº 1 do CE/ 91 aplicável ao caso em apreço; 
 
  
 
 (...) 
 
  
 A faculdade do expropriado requerer a expropriação total — cfr. também art. 53º 
 do CE, constitui, no seu interesse que tem de ser fundamentado, uma excepção 
 
 àquele princípio, como decorre da redacção do nº 2 als. a) e b) (...). 
 O facto de a recorrida colocar em causa a expropriação total que ademais a 
 expropriante concedeu, exprime conduta contraditória sem causa justificativa 
 pelo que é abusiva de direito — art. 334º do Código Civil — não podendo ser 
 atendida, em salvaguarda dos princípios da boa-fé, dos bons costumes e do fim 
 económico e social do direito que pretendeu exercer.” (cf. pp. 9 e 10 do Acórdão 
 em apreço, a ênfase não é nossa). 
 
  
 
 26.        E mais adiante: 
 
 “Mas será que apesar de ter sido deferido o pedido de expropriação total isso 
 implicaria uma nova DUP? 
 
  
 Entendemos que não. 
 
  
 Desde logo, por não haver uma ablação forçada do direito expropriado, o que 
 retira o factor compulsivo e inexorável da expropriação fundada apenas no 
 interesse público reputado prevalente sobre o interesse privado; depois, porque 
 cumpre, em primeira linha à expropriante pronunciar-se no sentido de dar ou não 
 a sua concordância ao pedido — nº 2 do art. 53º do CE/91, finalmente, porque, 
 além de o pedido ser da iniciativa do particular expropriado, se a expropriação 
 total for concedida ela integra-se no âmbito da declaração expropriativa 
 inicial, que assim vê o seu campo alagado satisfazendo o interesse do 
 particular.” (cf. p. 10 do Acórdão sub iudice, destaque nosso). 
 
  
 
 27.    Aliás, tal propósito da expropriada foi contrariado pelo Acórdão do 
 Tribunal Constitucional quando decidiu da seguinte forma: 
 
 “Na verdade, do excurso argumentativo motivador da pretensão formulada junto do 
 Supremo resulta, com evidência, que a ora recorrente apenas controverteu a 
 hipótese de expropriação da parcela em causa sem declaração de utilidade pública 
 e sem o consentimento da expropriada, hipótese que foi expressis verbis afastada 
 por aquele Tribunal” (cf. p. 24, destaque nosso). 
 
  
 
 27.        E continua: 
 
 “A isto acresce, igualmente, a circunstância do Supremo Tribunal de Justiça ter 
 entendido, contrariamente ao alegado pela recorrente, e em relação a uma matéria 
 subtraída à esfera de competência cognitiva do Tribunal constitucional, que “a 
 declaração expropriativa e o despacho de adjudicação exarado na 1ª instância 
 contempla[va]m a parcela em causa”, nunca tendo admitido que o processo 
 expropriativo, a envolver “uma ablação forçada do direito expropriado” pudesse 
 ser feito sem a correspondente declaração de utilidade pública, razão pela qual, 
 também por este motivo, não se encontram preenchidos os pressupostos processuais 
 determinantes do conhecimento da referida questão de constitucionalidade” (cf. 
 p. 25). 
 
  
 
 29.    Logo, se dúvidas houvessem quanto a uma interpretação do STJ do artigo 
 
 3º, nº 2 do CE de 91 e das Bases XXVII e LXVIII do contrato de concessão 
 aprovado pelo Decreto-Lei nº 168/94 de 15 de Junho, no sentido de não ser 
 necessária uma DUP e um consentimento da expropriada, as mesmas ficaram 
 dissipadas. 
 
  
 
 30.        Face ao exposto, tudo quanto foi alegado pela expropriada no ponto C) 
 da sua reclamação deve também ser desconsiderado. 
 
  
 Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, deve a reclamação da 
 expropriada ser indeferida, e mantido o acórdão proferido, com as demais 
 consequências legais». 
 
  
 
             4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
 
  
 
             «1 – A., Lda., melhor identificada nos autos, recorre para o 
 Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), 
 da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual redacção (LTC), fazendo 
 constar do requerimento de interposição do recurso as seguintes indicações:
 
 “(...)
 
 1. No acórdão recorrido efectuou-se uma interpretação do art. 3º nº 2 do CE/91, 
 no sentido segundo o qual, pode existir um processo de expropriação de um 
 imóvel, e respectiva avaliação e indemnização, substancialmente autónomos de uma 
 alegada expropriação «em conjunto [da] unidade económica interdependente» (nota 
 
 3 pp. 10/11 do acórdão). 
 
 2. Para além disso, o acórdão expressa uma interpretação das Bases XXVII e 
 LXVIII do contrato de concessão aprovado pelo DL 198/94, combinado com o 
 disposto no art. 1° e art. 10° nºs 1 e 2 do CE/91, no sentido de que, estando o 
 prédio destinado legalmente a ser expropriado, o pedido idêntico da expropriada 
 afasta a necessidade de declaração de utilidade pública da expropriação, mesmo 
 em processo litigioso. 
 
 3. Sucede que sob a sua contra-alegação, nomeadamente nas conclusões 1 5a a ora 
 recorrente invocou a não aplicação destes sentidos normativos daqueles 
 preceitos, pois ofendem, como alegou ali, o disposto no art. 62° nº 2 e arts. 
 
 17° e 18° da CRP, bem como o art. 1º do protocolo nº 1 adicional à CEDH”. 
 
  
 
             2 – Com interesse para o caso sub judicio, importa relatar:
 
 2.1 – A recorrida B., S.A., na qualidade de concessionária da obra pública “Nova 
 Travessia Rodoviária sobre o Tejo em Lisboa”, invocando pedido de expropriação 
 total da expropriada, organizou processo de expropriação litigiosa referente à 
 
 “parcela nº116”, pertencente a A., Lda..
 
 2.2 – Relativamente a essa e outras “parcelas” foi publicado no D.R. II Série, 
 nº148, de 30/06/1997 um despacho do Senhor Secretário de Estado das Obras 
 Públicas, datado de 27 de Junho de 1997 autorizando a 'B.' “...nos termos dos 
 artigos 13º, nº2 e 17º, nº1 do Código das Expropriações, aprovado pelo 
 Decreto-Lei nº438/91, de 9 de Novembro, a tomar posse administrativa das 
 parcelas discriminadas no mapa em anexo, situadas na área das salinas do 
 Samouco, descritas na matriz predial da freguesia de Alcochete, propriedade da 
 A., Lda.”.
 
 2.3 – Recebido o processo no Tribunal Judicial do Montijo, foi proferido 
 despacho, com data de 05.07.1999, pelo qual – depois de considerar que “…Alega a 
 expropriante que a parcela nº116 a que se reportam os presentes autos é parte 
 integrante de um conjunto de prédios relativamente aos quais a expropriada 
 formulou pedido de expropriação total, na sequência de declaração de utilidade 
 pública de expropriação das parcelas do troço de “viaduto sul” identificadas 
 pelos nºs 11.1 a 13.2. Contudo, do despacho que autorizou a expropriante a tomar 
 posse administrativa das propriedades pertencentes à A., Lda., identificadas em 
 mapa anexo ao despacho, não resulta qualquer correspondência entre os prédios aí 
 identificados e o número da parcela ora em causa. Ressalta ainda que a parcela 
 nº116 ora em causa é denominada “Murtório” ou “Murtório pequeno”, sendo que no 
 referido mapa são discriminadas três salinas com número de artigo e descrição na 
 Conservatória do Montijo (e não Alcochete) – Murtório, Murtório Pequeno – 
 Murtório Grande” – se convidou a expropriante a dizer o que tivesse por 
 conveniente em dez dias.
 
 2.4 – Notificada, a “B.”, por requerimento de fls. 149, informou, além do mais, 
 que a parcela 116 corresponde ao prédio, marinha de sal, denominada “Murtório” 
 ou “Murtório Pequeno” e que a mesma se encontra, agora, descrita na 
 Conservatória do Registo Predial de Alcochete, que entrou e funcionamento em 19 
 de Maio de 1995, sob o art. 126, ficha 01700, a fls. 238 v, Livro B-1 – e art. 
 matricial nº 1837.
 
 2.5 – Na sequência, foi proferido despacho, com data de 21.07.1999, adjudicando 
 a propriedade da parcela à expropriante, o qual veio a ser rectificado a fls. 
 
 768 dos autos, por despacho proferido em 3.1.2001, do seguinte jaez: 
 
 “...devendo ler-se na decisão de adjudicação que a parcela nº116 é adjudicada ao 
 Estado Português, em vez de à expropriante”.
 
 2.6 – E este veio, novamente, a ser rectificado por despacho de 22/04/2004 (data 
 do despacho de sustentação do agravo e da prolação da sentença recorrida) nos 
 seguintes termos:
 
 «No despacho de adjudicação de propriedade vemos que foi referido que “por 
 despacho de 27/02/95, publicado no D. R. nº 68, II Série, o Sr. Ministro das 
 Obras Públicas, Transportes e Comunicações declarou a utilidade pública com 
 carácter de urgência da parcela nº 11.1 a 13.1, sem se fazer menção a que a 
 expropriada requereu a expropriação total e ao despacho do Secretário de Estado 
 das Obras Públicas, havendo já, naquele momento, elementos no processo que 
 permitem efectuar esta menção.
 Assim, nos termos do art. 667º do Código de Processo Civil, passo a rectificar o 
 despacho de adjudicação da propriedade no sentido de nele passar a constar o 
 seguinte:
 
 “II — Por despacho de 27 de Fevereiro de 1995, publicado no DR, nº 68 II série, 
 o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações declarou a 
 utilidade pública com carácter de urgência da expropriação das parcelas de 
 terreno da expropriada, localizadas na zona denominada Salinas do Samouco, tendo 
 a expropriação da parcela nº 116, que se mostra necessária à recuperação da área 
 daquelas salinas, resultado do deferimento do pedido de expropriação total da 
 expropriada, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 53º.° do CE, e 
 versou as parcelas de terreno correspondentes aos prédios identificados no 
 despacho nº 2928-A/97, de 27.06, do Senhor Secretário de Estado da Obras 
 Públicas, publicado no DR nº 148/94, de 30.06”». 
 
 2.7 – Inconformada com o despacho de 21/07/1999, a expropriada dele interpôs 
 recurso, para o Tribunal da Relação de Lisboa recebido como agravo, a subir com 
 o primeiro que, depois dele, deva subir imediatamente, com efeito meramente 
 devolutivo, pedindo a sua revogação.
 
 2.8 – O processo prosseguiu os seus termos e, a final, foi proferida decisão – 
 fls. 1208 a 1229, de 22.4.2004, que ajuizando sobre a indemnização, sentenciaram 
 improcedentes os recursos deduzidos pela expropriante AA e pela expropriada, A., 
 Lda., e, em consequência, foram fixados em Esc. 12.510.700S00 (doze milhões, 
 quinhentos e dez mil e setecentos escudos) ou 62.403,11 euros (sessenta e dois 
 mil quatrocentos e três euros e onze cêntimos), o montante da indemnização 
 devida pela expropriante, B. em virtude da expropriação que incidiu sobre a 
 parcela, a que foi atribuído o nº116 com a área de 21.600 m2 correspondente à 
 totalidade do prédio inscrito na matriz rústica sob o art.3º da secção T e 
 matriz urbana nº 1837 da freguesia e concelho de Alcochete, descrito na 
 Conservatória do Registo Predial do Alcochete sob o nº 126 a fls. 238 vº do 
 livro B-l. denominado Murtório, pertencente a A.. 
 
 2.9 – Desta decisão foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, 
 quer pela expropriante, quer pela expropriada, que pelo Acórdão de 10 de 
 Novembro de 2006, concedeu provimento ao recurso de agravo, interposto pela 
 expropriada e, consequentemente, revogou o despacho recorrido, denegando-se a 
 adjudicação da propriedade do prédio em causa, declarando extinta a instância. 
 
 2.10 – Discordando do decidido a “B.”, recorreu para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, perante o qual alegou, em síntese:
 
 “1. O presente Recurso de Revista vem interposto do Acórdão do Tribunal da 
 Relação de Lisboa que deu provimento ao Recurso de Agravo interposto pela 
 expropriada, revogando o despacho de adjudicação de propriedade da parcela 116 e 
 declarando extinta a instância por ausência de Declaração de Utilidade Pública 
 relativamente ao prédio dos autos, com as inerentes consequências quanto à 
 propriedade desse prédio e aos actos processuais praticados.
 
 2. O Acórdão em causa, como se viu atrás, padece, entre outros de vício de 
 violação de lei substantiva, por erro de interpretação do artigo 3º do Código 
 das Expropriações aprovado pelo Decreto-Lei n.º 438/91 de 9.11, contendo, ainda 
 uma errada interpretação dos factos, designadamente, da formulação pela 
 expropriada de um pedido de expropriação total e respectiva subsunção nas normas 
 jurídicas aplicáveis, a saber os artigos 3º e 53º do CE.
 
 3. A apreciação do mérito do presente recurso centra-se, assim, em duas questões 
 essenciais: (i) por um lado, e em primeiro lugar, saber se a expropriada 
 formulou um pedido de expropriação total no qual está incluído a parcela destes 
 autos, e por outro lado, (ii) se se afigurava necessária a existência de 
 declaração de utilidade pública de expropriação autónoma para a parcela em 
 causa, ou se a DUP que consta do Despacho MOPTC publicado no DR nº 68, II Série, 
 se “pode estender” ao prédio em causa.
 
 4. No que respeita à primeira questão, é por demais evidente que a resposta só 
 pode ser afirmativa, porque a expropriada formulou um pedido de expropriação 
 total que versou sobre diversos prédios que lhe pertenciam, entre os quais se 
 conta o prédio dos autos.
 
 5. Esta conclusão está claramente evidenciada no requerimento de expropriação 
 total da expropriada, mas também, na planta que juntou àquele como doc. nº14, e 
 sobretudo, no doc. nº 20 igualmente junto, no qual identificou de forma precisa 
 e clara o prédio dos presentes autos – “Marinha Murtório Pequeno”.
 
 6. Quanto à segunda questão – necessidade de nova DUP ou “extensão” da DUP 
 contida no despacho MOPTC de fls. 7 ao prédio que constitui a parcela 116 – 
 ficou amplamente demonstrado, que no caso não se impunha emissão de nova 
 declaração de utilidade pública, face à validade, legalidade e procedência do 
 pedido de expropriação total, no qual se insere a parcela 116, o que determina 
 que tal expropriação fique a “coberto” da declaração de utilidade pública 
 contida no despacho MOPTC de fls. 7.
 
 7. Tudo isto, porque resulta manifesto, em primeiro lugar, que na apreciação do 
 pedido de expropriação total, a expropriante efectuou uma correcta avaliação do 
 prejuízo do interesse económico que decorreria para a expropriada, caso apenas 
 fosse efectuada a expropriação parcelar, deferindo, em consequência, o pedido de 
 expropriação total formulado, em virtude de, no caso, se encontrarem verificados 
 os pressupostos que levam à aplicação do artigo 3º, n.º 2, alínea b) do CE de 
 
 91. 
 
 8. O citado normativo como amplamente se demonstrou nas presentes alegações, 
 permite que se verifique expropriação total sobre prédios distintos daquele 
 sobre o qual incidiu declaração de utilidade pública, desde que se verifiquem os 
 pressupostos elencados nas respectivas alíneas a) e b).
 
 9. É esta a correcta interpretação daquele artigo 3º, a qual se encontra 
 reflectida no Acórdão da Relação de Lisboa de 10 de Janeiro de 2006 aqui junto, 
 entre outros, nos termos que aqui destacamos:
 
 “Na verdade, o art. 3º, n.º 2 pretende tutelar o interesse do proprietário, 
 estabelecendo como que uma indivisibilidade económica do imóvel, que se traduz 
 em a parte deste não expropriada seguir o destino da parte expropriada, a pedido 
 do expropriado. 
 Ora, essa indivisibilidade económica pode ocorrer, também, relativamente a mais 
 do que um prédio, e se a finalidade da lei é proteger o proprietário afectado 
 pela diminuição dos cómodos da parte não expropriada, resultante do 
 fraccionamento, dento do seu destino económico efectivo, deve concluir-se, 
 logicamente, que a lei permite a expropriação total quer do prédio já 
 parcialmente expropriado, quer do prédio ou prédios que com aquele formem uma 
 unidade económica interdependente, ainda que não tenham sido objecto de 
 expropriação parcial.
 A tal conclusão também se poderá chegar, a nosso ver, através de uma 
 interpretação extensiva do preceito, se se entender que o legislador, ao 
 formular a norma, disse menos do que, efectivamente, pretendia dizer, havendo, 
 por isso, necessidade de estender as palavras da lei (cfr. art. 11.º, do C. 
 Civil).” 
 
 10. Acresce, ainda, que o instituto da expropriação total foi pensado e 
 legislativamente consagrado em benefício do expropriado (no sentido de que a 
 expropriação total é permitida no interesse do expropriado ver, por todos, 
 Marcello Caetano, “Manual de Direito Administrativo”, 7.ª Edição, página 650), 
 que poderá, em última análise, requerer a expropriação total de um conjunto de 
 prédios que funcionem como uma unidade económica, como sucedeu in casu, desde 
 que preenchidos os pressupostos materiais previstos na lei.
 
 11. De facto, se é certo que o artigo 3.º do CE não faz referência expressa à 
 possibilidade de uma expropriação afectar o interesse económico, não de um 
 prédio, mas de um conjunto de prédios que funcionam como uma unidade económica, 
 não é menos certo, que a ser diferido um pedido livremente formulado por um 
 expropriado numa situação de facto como a descrita, tal diferimento tem 
 necessariamente de ser visto como um benefício para o expropriado, configurando 
 abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, vir mais tarde 
 o expropriado “dar o pedido por não pedido” e alegar a inexistência de um 
 pressuposto nuclear do processo de expropriação: a declaração de utilidade 
 pública.
 
 12. Conclui-se, então, que o artigo 3º, nº2 do CE tem aplicação ao caso dos 
 presentes autos, contrariamente ao que entendeu o Tribunal recorrido, uma vez 
 que a expropriação total pode incidir sobre prédio diferente daquele que foi 
 objecto de expropriação parcial contida em DUP, porquanto, o que é relevante 
 para efeito da aplicação daquele normativo é o preenchimento dos pressupostos 
 nele enunciados – a perda de cómodos e o prejuízo do interesse económico da 
 parte não expropriada – dos quais poderá resultar uma afectação relevante do seu 
 direito de propriedade.
 
 13. Em face de quanto se expôs, verifica-se, então, que o Tribunal a quo ao 
 entender que no caso dos autos se afigurava necessária a emissão de declaração 
 de utilidade pública, errou na interpretação do artigo 3º, nº2, alínea b) do CE, 
 proferindo decisão violadora da lei substantiva aplicável.
 
 14. Ao decidir nessa conformidade, o Acórdão recorrido, está em manifesta 
 oposição com jurisprudência anteriormente firmada – a contida no Acórdão de 10 
 de Janeiro de 2006 que aqui se junta –, devendo por aplicação do disposto no 
 artigo 732-A do Código de Processo Civil, ser proferida decisão uniformizadora 
 de jurisprudência, já que as decisões contidas nos Acórdãos em questão, versaram 
 sobre a mesma legislação e questão fundamental de direito”.
 
  
 
 2.11 – Pugnando pelo decidido, a ora recorrente contra-alegou dizendo que:
 
 «1ª -       Do teor das conclusões ex adverso, resulta evidente que constitui 
 seu pressuposto essencial terem existido duas realidades jurídico-factuais: um 
 deferimento, ou aceitação, pela recorrente, de um pedido de expropriação total, 
 baseado no art. 3º nº 2 do então Cód. das Exp., do imóvel correspondente à 
 parcela 116; e que, os presentes autos sejam a execução desse pedido. 
 
 2ª-           Ao longo da sua motivação e das suas conclusões, a B. dá como 
 evidente que aquelas duas realidades sucedem nos presentes autos. 
 
  
 
 3ª -         Contudo, o teor da decisão, ou o deferimento, a que a recorrente 
 alude, consistiu no seguinte: «Reportamo-nos à carta de V Exas. de 20 de Julho 
 p.p., na qual é solicitada a expropriação total das parcelas de V. propriedade 
 sitas na área das Salinas do Samouco, a que se refere a Base LXVIII das Bases da 
 Concessão, aprovadas pelo DL nº 168/94, de 15 de Junho. Vimos pela presente 
 comunicar a V. Exa. que o pedido de expropriação total foi aceite pela B., 
 indo-se desencadear os mecanismos de expropriação da totalidade das mencionadas 
 parcelas, dentro dos limites da planta anexa ao Segundo Contrato de Concessão, 
 nos termos da citada Base LXVIII Em consequência, solicitamos a realização da 
 uma reunião com V. Exas., em data a acordar, com vista a dar conta do 
 procedimento a seguir.» - conforme consta no doc. 3 junto por ela ao Tribunal, 
 no seu requerimento inicial (e ora aqui anexo como doc. 2, por mera facilidade 
 de consulta). 
 
 4ª -          Ora, o sentido jurídico desta declaração pode e tem de ser objecto 
 de interpretação pelo STJ, quer por força da aplicação do art. 236º e ss. do 
 Cód. Civil, quer por se tratar de pura matéria de direito saber se a B., como 
 expropriante, isto é, revestida de poderes públicos, praticou ou não naquela 
 carta, um acto de aceitação de uma expropriação baseada no art. 3º nº 2 do Cód. 
 das Expropriações. 
 
 5ª -          Assim, interpretado também, por iguais razões, o sentido jurídico 
 da carta-declarações da expropriada, de 20.7.95 (doc. 2, fls. 10), resulta que 
 aquela formulou, ali, o pedido de cumprimento imediato do que alegou constituir 
 o dever contratual da B., perante o Estado, resultante, concretamente, do 
 disposto no DL 168/94, que aprovou as Bases da Concessão da actual Ponte Vasco 
 da Gama, nomeadamente as Bases XXVI a XXX, e LXVIII, ou seja, obrigação de 
 expropriar imposta ali à concessionária, por razões de protecção ambiental. 
 
 6ª -         No mesmo documento, a ora recorrida alegou que o imóvel, onde se 
 integrava a parcela 11.1, abrangida na DUP da expropriação, do MOPTC de 
 
 27.2.1995, deveria ser totalmente expropriado, nos termos do art. 3º nº 2 do 
 Cód. das Exp. por que, sem aquela parcela, como exploração piscícola que era, 
 não tinha interesse económico. 
 
 7ª -         E, no mesmo documento, peticionou quanto aos imóveis onde se 
 integravam as parcelas 12.1, 12.2, 12.3, 13.1 e 13.2, também estas objecto 
 daquela mesma DUP de expropriação, por integrarem, juntamente com outros 
 imóveis, uma unidade semi-mecanizada de sal, deveria ser objecto de expropriação 
 nos mesmos termos de art. 3º nº 2 do Cód. das Expropriações. 
 
 8ª -         Ora, confrontando as causas daqueles pedidos da ora recorrida e a 
 decisão da B. acima referida, resulta óbvio que, esta omite em absoluto qualquer 
 apreciação quanto a verificarem-se ou não os requisitos do art. 3º nº 2 do Cód. 
 das Exp., e, afinal, limita-se a reconhecer que irá cumprir as suas obrigações 
 de expropriar, nos termos da Base LXVIII (aprovada pelo já citado DL 168/94) – 
 cujo teor é o seguinte: «A concessionária obriga-se a expropriar e a recuperar 
 
 (…) a área designada “Salinas do Samouco”, indicada em planta anexa ao contrato 
 de concessão.». 
 
 9ª -         De resto, na data daquela decisão/resposta (29.9.95) já decorrera o 
 prazo legal (14 dias) para a expropriante se pronunciar favoravelmente, se fosse 
 o caso, sobre o pedido de expropriação nos termos do art. 3º nº 2 do Cód. das 
 Exp. – pois, o disposto em arts. 42º e 53º nº 2 deste diploma determinam que, 
 após aquele prazo (contado sobre a recepção da carta da expropriada de 20.7.95), 
 forma-se indeferimento tácito, podendo a expropriada requerer ao Tribunal a 
 avocação do pedido indeferido, para aí ser apreciada a verificação dos 
 requisitos do art. 3º nº 2. 
 
 10ª -       Acresce, por outro lado, quer do ponto de vista substancial – p. ex. 
 no plano da sua avaliação/indemnização – quer no plano do seu procedimento, que 
 os presentes autos mostram absoluta e total independência, quer quanto às duas 
 unidades económicas que a expropriada alegou na sua carta dita «pedido de 
 expropriação total», quer quanto ao processo administrativo e judicial de 
 expropriação das parcelas descritas na DUP de expropriação do MOPTC de 
 
 27.2.1995. 
 
 11ª -       Com efeito, lendo os autos, é manifesto que, no plano da arbitragem, 
 da avaliação e da sentença, é absoluto o desconhecimento de qualquer uma das 
 unidades económicas que a expropriada alegou serem destruídas pelas 
 expropriações parcelares, daquela DUP. 
 
 12ª -       E quanto ao procedimento, os autos mostram que não vêm instruídos 
 com uma arbitragem... de toda a unidade económica, isto é, da totalidade 
 económico-produtiva a que o imóvel pertenceria – procedimento processual único 
 que teria de existir, por força do disposto nos arts. 3º nº 2 e 42º do Cód. das 
 Expropriações, correspondente, afinal, à ratio legis da figura em causa, que é, 
 avaliar e indemnizar a totalidade de uma unidade económica, valorizando-a como 
 um todo. 
 
 13ª -        Mais: a própria junção, pela expropriante, de um acórdão relativo a 
 outro imóvel, mostra, sem lugar a dúvidas, que a expropriante não só não decidiu 
 alguma expropriação total nos termos do art. 3º nº 2 (isso já a sua resposta de 
 
 29.9.95, o mostra inequivocamente), como também, e em lógica coerência, não deu 
 o seguimento administrativo que seria legalmente devido – isto é, duas unidades 
 económicas, logo, duas respectivas arbitragens, de cada uma dessas totalidades – 
 caso afinal, a sua decisão, fosse ela referenciada ao art. 3º nº 2, teria de dar 
 lugar, nos termos do art. 42º do Cód. das Expropriações. 
 
 14ª -       Ora, na verdade, a «decisão» de expropriar que a B. expressamente 
 tomou (na carta de 29.9.95), e que afinal, tentou cumprir com estes autos – e os 
 demais que iniciou: um processo por imóvel, como o acórdão que anexou atesta – 
 representando o mero cumprimento do seu dever contratual, disposto naquela Base 
 LXVIII, não podia ser efectuado, litigiosamente, sem a DUP da expropriação – uma 
 vez que isso mesmo resulta, desde logo, na Base XXVII, onde se lê: «Compete ao 
 MOPTC a prática do acto que individualize os bens a expropriar nos termos do nº 
 
 2 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 438/91, de 9 de Novembro (Código das 
 Expropriações), o qual deverá conter a declaração de utilidade pública com 
 carácter de urgência no prazo de 45 dias a contar da apresentação pela 
 concessionária da documentação exigida para o efeito nos termos do Código das 
 Expropriações. Competirá à concessionária apresentar atempadamente ao concedente 
 todos os elementos e documentos necessários à prática do acto de declaração de 
 utilidade pública, de acordo com a legislação em vigor.». 
 
 15ª -       Portanto, com os presentes autos – e os demais, como o acórdão que 
 anexou – a B., ao contrário do que tenta impingir, não está a dar execução a um 
 pedido de expropriação baseado no art. 3º nº 2 do Cód. das Expropriações, mas, 
 apenas, ao seu dever de expropriar todos e quaisquer imóveis, nas «Salinas do 
 Samouco», propriedade ou não da ora recorrida, identificados ou não por esta – 
 mas sim, e como diz na sua carta/decisão de 29.9.95, a cumprir a Base LXVIII. 
 
 16ª -       Logo, a verdadeira questão em discussão neste recurso é e só pode 
 ser, saber-se se tal dever de expropriação pode ser cumprido sem DUP – questão 
 que, contudo, é expressamente respondida de modo negativo pelo teor da Base 
 XXVII, invocada no acórdão recorrido, como causa de procedência do agravo, 
 perante a factualidade que vinha provada. 
 
 17ª -       Mesmo que assim não fosse, o disposto nos arts. 1º e 10º nºs 1 e 2 
 do Cód. das Exp., combinado com o disposto no art. 62º nº 2 e art. 1º do 
 Protocolo nº 1 adicional à CEDH determinaria, sempre, que não pode existir 
 expropriação litigiosa – como é o caso dos autos – sem o acto público 
 administrativo da respectiva DUP. 
 
 18ª -       Na verdade, na falta de DUP, verificada factualmente pelo acórdão 
 recorrido, e sem o consentimento anterior, ou actual, da proprietária, não pode 
 esta ser privada, à força, deste direito de propriedade – pois, a sua natureza 
 de direito fundamental, face ao teor de arts. 62º e 17º da Constituição, e 
 
 1.308º do Cód. Civil determina que só nos casos tipificados na lei ele possa ser 
 ofendido, como decorre de art. 18º daquela Lei Fundamental. 
 
 19ª -       De resto, a interpretação por analogia, ou outra técnica, do art. 3º 
 nº 2 do Cód. das Exp., invocada pela recorrente, não poderia ter sucesso, pois 
 viola, também, frontalmente o art. 1º do Protocolo nº 1, adicional à CEDH, bem 
 como aquelas disposições da Constituição – para além da própria Base XXVII, nºs 
 
 1 e 2 do regime jurídico da concessão, aprovado pelo DL 198/94. 
 
  
 
 20ª -       Faltando a DUP ao processo expropriativo, a instância carece do seu 
 pressuposto processual, basilar, e inexiste causa (legal) de pedir, devendo 
 declarar-se extinta a instância, por impossibilidade legal – como bem se decidiu 
 no acórdão recorrido. 
 
 21ª -       Ao dar como demonstrado que aceitou e prosseguiu com estes autos uma 
 expropriação nos termos do art. 3º nº 2 do Cód. das Exp, alegando até que o fez 
 por ter ponderado os interesses económicos e os benefícios daí decorrentes para 
 a expropriada, a B. expressa refinada litigância dolosa – pois altera a verdade 
 e o teor expresso da sua carta de 29.9.95, a qual, ao dizer que vai expropriar, 
 não passa de uma inócua e irrelevante declaração de que... irá cumprir o que a 
 Base LXVIII já antes lhe impunha. Por isso, deve ser condenada em multa e 
 indemnização equitativamente fixada. 
 
 22ª -       Só se justificaria o julgamento do presente recurso nos termos do 
 art. 732º-A do CPC caso fosse vislumbrada hipótese de o Supremo abandonar a 
 jurisprudência que, em matéria de exigência de DUP da respectiva expropriação, 
 já fixou e tem reiteradamente seguido, desde o acórdão de 17.6.66 (BMJ, 158, p. 
 
 261) e a demais indicada acima e na alegação do agravo (identicamente, ac. do 
 STA de 31.3.98, melhor identificado acima), no sentido de ser imprescindível a 
 DUP da expropriação, como causa do processo judicial de expropriação. 
 
 23ª -       Pois, além do mais, no acórdão anexo pela recorrente fixou-se 
 matéria factual diferente da destes autos, nomeadamente, que aquele imóvel 
 integrava os prédios/parcelas abrangidos pela DUP – questão factual sobre a qual 
 o acórdão recorrido não efectuou julgamento ou aplicação do direito, por não 
 estar provada ou discutida. 
 
 24ª -       Portanto, sendo casos diferentes, factualidade diversa, as questões 
 fundamentais de direito são também diversas, faltando assim os requisitos 
 daquele procedimento decisório. 
 
  
 TERMOS NOS QUAIS DEVE CONCLUIR-SE PELA IMPROCEDÊNCIA DAS PRETENSÕES DA 
 RECORRENTE, CONDENANDO-SE A MESMA NAS CUSTAS, PROCURADORIA CONDIGNA, MULTA E 
 INDEMNIZAÇÃO EQUITATIVA POR LITIGÂNCIA DOLOSA, ASSIM FAZENDO, COMO SE PEDE E 
 CONFIA, 
 SÁBIA JUSTIÇA!» 
 
  
 
  
 
 2.12 – Por Acórdão de 2 de Outubro de 2007, o Supremo Tribunal de Justiça 
 decidiu conceder provimento ao recurso, revogando, em consequência, o Acórdão do 
 Tribunal da Relação.
 Tal conclusão foi suportada na motivação que se passa a transcrever:
 
 “(...)
 Sendo pelo teor das conclusões das alegações da recorrente que, em regra, se 
 delimita o objecto do recurso, afora as questões de conhecimento oficioso, a 
 questão consiste em saber se, ante o pedido de expropriação total formulado pela 
 expropriada, importaria que houvesse nova declaração de utilidade pública que 
 abrangesse os prédios compreendidos nesse pedido, ou se tal omissão, implica a 
 extinção da instância por falta da declaração expropriativa.
 Reconhecendo a Lei Fundamental – art. 62º – o direito à propriedade privada, a 
 expropriação só é possível mediante o pagamento de uma “justa indemnização”, de 
 modo a que os princípios da igualdade e da proporcionalidade não sejam 
 afrontados pela extinção forçada de tal direito.
 O art. 22, n.º1, do Código das Expropriações – DL 438/91, de 9 de Novembro (CE) 
 
 – aplicável ao recurso em apreciação, vista a data da declaração de utilidade 
 pública – dispõe: 
 
 “1 - A expropriação por utilidade pública de quaisquer bens ou direitos confere 
 ao expropriado o direito de receber o pagamento contemporâneo de uma justa 
 indemnização.
 
 2 - A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pelo 
 expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da 
 expropriação, medida pelo valor do bem expropriado, fixada por acordo ou 
 determinada objectivamente pelos árbitros ou por decisão judicial, tendo em 
 consideração as circunstâncias e as condições de facto existentes à data da 
 declaração de utilidade pública”.
 São, pressupostos de legitimidade de expropriação – o princípio da legalidade; o 
 da utilidade pública, o da proporcionalidade e o da justa indemnização.
 A Constituição da República, para lá de outros princípios de invocação não tão 
 pertinente, consagra os aqui convocáveis, da indispensabilidade, o da proibição 
 do excesso e da proporcionalidade.
 Como ensina “Jorge Reis Novais, in “Os Princípios Estruturantes da República 
 Portuguesa”, pág. 171:
 
 “Ainda que, por vezes, venham confundidos, há que distinguir entre o princípio 
 da proibição do excesso e o princípio da necessidade ou da indispensabilidade. 
 Enquanto que o primeiro, mais lato, proíbe que a restrição vá mais além do que o 
 estritamente necessário ou adequado para atingir um fim constitucionalmente 
 legítimo — o que envolve as diferentes exigências que estamos a considerar — o 
 princípio da necessidade, enquanto sub princípio ou elemento constitutivo 
 daquele, impõe que se recorra, para atingir esse fim, ao meio necessário, 
 exigível ou indispensável, no sentido do meio mais suave ou menos restritivo que 
 precise de ser utilizado para atingir o fim em vista” – sublinhámos. 
 E acerca do princípio da proporcionalidade: 
 
 “…Por sua vez, a observância ou a violação do princípio da proporcionalidade 
 dependerão da verificação da medida em que essa relação é avaliada como sendo 
 justa, adequada, razoável, proporcionada ou, noutra perspectiva, e dependendo da 
 intensidade e sentido atribuídos ao controlo, da medida em que ela não é 
 excessiva, desproporcionada, desrazoável. 
 Nesta aproximação de definição podem intuir-se, em primeiro lugar, a relativa 
 imprecisão e fungibilidade dos critérios de avaliação; em segundo lugar, o 
 permanente apelo que eles fazem a uma referência axiológica que funcione como 
 terceiro termo na relação e onde está sempre presente um sentido de justa 
 medida, de adequação material ou de razoabilidade, por último, a importância que 
 nesta avaliação assumem as questões competências, mormente o problema da margem 
 de livre decisão ou os limites funcionais que vinculam legislador, Administração 
 e juiz.” (pág. 178) [sublinhámos].
 O Acórdão recorrido revogou o despacho de adjudicação de propriedade da parcela 
 
 116, contemplando já a alteração proferida aquando do despacho de sustentação, 
 denegando a adjudicação da propriedade do prédio em causa e declarando extinta a 
 instância por ausência de Declaração de Utilidade Pública (doravante DUP).
 Antes de mais e de forma inquestionável há que afirmar que a agravada formulou 
 um pedido de expropriação total abrangendo a parcela dos autos. 
 A propósito releva o seguinte:
 
 - por Despacho do Senhor Ministro das Obras Públicas, Transportes e 
 Comunicações, publicado no DR n.º 68, II Série de 23.03.1995, foi declarada a 
 utilidade pública de expropriação de um conjunto de parcelas necessárias à 
 construção do troço da Nova Travessia sobre o Tejo, actual Ponte Vasco da Gama, 
 troço esse, denominado, “Viaduto Sul”, e que abrangeu diversos prédios da 
 expropriada nos presentes autos, mais precisamente, os correspondentes às 
 Parcelas 11.1, 12.1, 12.2, 12.3, 13.1 e 13.2 – cfr. fls. 7 dos autos;
 
 - após a publicação da DUP em questão, a expropriada, em 21 de Julho de 1995, 
 apresentou à expropriante um pedido de expropriação total cuja cópia se encontra 
 nos autos a fls. 10 a 42. 
 
  
 Instruiu tal pedido com 22 documentos, sendo de particular relevância os 
 seguintes:
 
 - o documento n.º 14 constituído por uma planta da zona denominada por “Salinas 
 do Samouco”, nas quais a expropriada delimitou a área das marinhas que estavam 
 integradas nas unidades de produção que fundamentaram o seu pedido;
 
 - o doc. nº 20 com a epígrafe “Marinhas de reservatório de alimentador primário 
 da marinha Providência”, no qual se encontram identificadas as marinhas que 
 estão afectas a tal unidade de produção, entre elas, a “Marinha Murtório 
 Pequeno”, que constitui a parcela 116 dos presentes autos e que actualmente 
 dispõe de descrição predial actualizada – ut. certidão junta como doc. nº 5 ao 
 requerimento de remessa do presente processo;
 
 - após análise do pedido da expropriada, a expropriante veio a deferi-lo em 29 
 de Setembro de 1995, tendo iniciado os procedimentos expropriativos relativos 
 aos prédios abrangidos pelo pedido de expropriação total, e que deram origem à 
 posterior individualização de 28 parcelas e cujos termos se encontram a correr 
 perante o Tribunal Judicial da Comarca do Montijo;
 
 - posteriormente ao deferimento do pedido de expropriação total em apreço, foi 
 proferido o Despacho SEOP (junto a fls. 137 e 138 dos autos) que contem a 
 autorização de posse administrativa, no qual, igualmente, se encontram 
 identificadas as marinhas abrangidas pelo pedido de expropriação, contando-se 
 entre elas a marinha “Murtório Pequeno” que constitui a parcela 116 dos 
 presentes autos.
 No Acórdão recorrido delimitou-se assim o objecto do recurso de agravo:
 
 “O cerne da questão situa-se em saber se a DUP, única e a que acima nos 
 referimos, se pode estender ao prédio em causa por força de um hipotético pedido 
 da própria agravante [expropriada, dizemos] nesse sentido, ou seja, no sentido 
 de a expropriação de outros prédios, de sua propriedade cuja DUP foi declarada, 
 valer também para este, ex-vi do disposto no art. 3º, nº2, al. a) e b) do CE”.
 Dos fundamentos apresentados pela expropriada para requerer a expropriação total 
 tem de concluir-se que visava com tal pretensão a expropriação de prédios que 
 constituíam, no seu entender, uma unidade económica integrada na parcela em 
 questão, acentuando o prejuízo que para si adviria se tal expropriação total não 
 ocorresse.
 Citam-se dos documentos com que instruiu tal pedido as seguintes afirmações:
 Desde logo de um dos documentos consta o título “Fundamentos para a Expropriação 
 Total”.
 A ora recorrida alegou que as parcelas 12.1, 12.2, 12.3, 13.1 e 13.2, 
 correspondentes aos imóveis expropriados ao abrigo da DUP contida no Despacho 
 MOPTC de fls. 7, “estão integrados desde 1980 numa unidade de exploração de sal, 
 semimecanizada, com tubagens, canalizações, respectivas motobombas e demais 
 estruturas aptas àquela produção, …” […] “Tal unidade está, do ponto de vista do 
 processo produtivo de sal, separada em duas áreas ou zonas: uma de recepção de 
 
 água do rio e 1ª fase de evaporação” e, “Zona final de cristalização, e 
 evaporação total até obtenção de sal” […] “O total destas marinhas, directamente 
 ligadas á área de cristalização é de 132.664 ha, conforme quadro anexo doc. 20 
 aí incluindo aquelas objecto parcial de expropriação”.
 Afirmou, ainda, que caso não ocorresse a expropriação total, esse facto 
 implicaria a “destruição” do seu direito de exploração económica da área total 
 de 158,024 ha prejudicando-se dessa forma o seu interesse económico.
 A recorrente conclui: “Ora, a parcela dos presentes autos está precisamente 
 incluída nos 132.664 hectares nos quais a expropriada afirmou exercer a 
 actividade salineira”.
 Esta conclusão tem apoio nos fundamentos da pretensão de expropriação total, 
 pois o que com ela visava a expropriada era que a expropriação inicial, não 
 mutilasse a sua exploração económica enquanto complexo produtivo que, se 
 amputado da parcela expropriada, deixaria de ter viabilidade económica.
 A expropriação, como antes dissemos, está sujeita ao princípio da 
 proporcionalidade[1], com os integrantes sub-princípios de adequação, 
 necessidade, e proporcionalidade em sentido estrito, como logo decorre do art. 
 
 3º,nº1, do CE/91 aplicável ao caso em apreço;
 
 “A expropriação deve limitar-se ao necessário para a realização do seu fim, 
 podendo, todavia, atender-se a exigências futuras, de acordo com um programa de 
 execução faseada…”.
 A faculdade do expropriado requerer a expropriação total – cfr. também art. 53º 
 do CE, constituiu, no seu interesse que tem de ser fundamentado, uma excepção 
 
 àquele princípio, como decorre da redacção do nº 2 als. a) e b) – “Quando não 
 seja necessário expropriar mais de uma parte de um prédio, pode o proprietário 
 requerer a expropriação total: a) Se a parte restante não assegurar, 
 proporcionalmente, os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio; b) Se os 
 cómodos assegurados pela parte restante não tiverem interesse económico para o 
 expropriante, determinado objectivamente”. 
 O facto de a recorrida colocar em causa a expropriação total, que ademais a 
 expropriante concedeu, exprime conduta contraditória sem causa justificativa 
 pelo que é abusiva do direito – art. 334º do Código Civil – não podendo ser 
 atendida, em salvaguarda dos princípios da boa-fé, dos bons costumes e do fim 
 económico e social do direito que pretendeu exercer.
 Mas será que apesar de ter sido deferido o pedido de expropriação total isso 
 implicaria uma nova DUP?
 Entendemos que não.
 Desde logo, por não haver uma ablação forçada do direito expropriado, o que 
 retira o factor compulsivo e inexorável da expropriação fundada apenas no 
 interesse público reputado prevalente sobre o interesse privado; depois, porque 
 cumpre, em primeira linha à expropriante pronunciar-se no sentido de dar ou não 
 a sua concordância ao pedido – nº 2 do art. 53º do CE/91; finalmente, porque, 
 além de o pedido ser da iniciativa do particular expropriado, se a expropriação 
 total for concedida ela integra-se no âmbito da declaração expropriativa 
 inicial, que assim vê o seu campo alargado satisfazendo o interesse do 
 particular.
 Se os prédios em relação aos quais se pretende a expropriação total se integram, 
 com o prédio inicialmente expropriado, numa unidade económica que sem a 
 expropriação total perderia a sua viabilidade económica, e se isso é reconhecido 
 pela expropriante, e a concordância com tal pedido não exorbita os seus poderes 
 de entidade expropriante enquanto concessionária, não carece a expropriante de 
 obter uma nova DUP para legitimar a “aquisição” desses prédios[2].
 Assim, e porque se considera que a declaração expropriativa e o despacho de 
 adjudicação exarado na 1ª instância contemplam a parcela em causa, não pode 
 subsistir o Acórdão recorrido.
 
 (...)”.
 
  
 
 2.13 – É desse Acórdão que vem interposto, nos termos supra descritos, o 
 presente recurso de constitucionalidade, o qual, por se integrar no âmbito 
 normativo delimitado pelo artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, e atento o disposto no 
 artigo 76.º, n.º 3, do mesmo diploma, passa a ser decidido nos termos que se 
 seguem.
 
  
 
 3.1 – Como é consabido, constitui requisito do recurso interposto ao abrigo do 
 disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280º da Constituição da República 
 Portuguesa (CRP) e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC – em cuja 
 categoria se insere o interposto pelo recorrente, e como decorre dos mesmos 
 preceitos quando falam de aplicação de norma cuja inconstitucionalidade haja 
 sido suscitada durante o processo, mas que encontra igualmente tradução no n.º 2 
 do artigo 75º-A da LTC –, que a questão de inconstitucionalidade da norma 
 efectivamente aplicada como ratio decidendi da decisão recorrida tenha sido 
 suscitada durante o processo.
 O sentido deste conceito tem sido esclarecido, por várias vezes, por este 
 Tribunal Constitucional. Assim, por exemplo, no Acórdão n.º 352/94, publicado no 
 Diário da República II Série, de 6 de Setembro de 1994, disse-se que esse 
 requisito deve ser entendido “não num sentido meramente formal (tal que a 
 inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância)”, mas 
 
 “num sentido funcional”, de tal modo que essa invocação haverá de ter sido feita 
 em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão, “antes de 
 esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que (a mesma questão de 
 constitucionalidade) respeita”. 
 Por seu lado, afirma-se, igualmente, no Acórdão n.º 560/94, publicado no Diário 
 da República II Série, de 10 de Janeiro de 1995, que «a exigência de um cabal 
 cumprimento do ónus de suscitação atempada - e processualmente adequada - da 
 questão de constitucionalidade não é [...] “uma mera questão de forma 
 secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal 
 recorrido deva pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade para o 
 Tribunal Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame da 
 questão (e não a um primeiro julgamento de tal questão». 
 Neste domínio há que acentuar que, nos processos de fiscalização concreta, a 
 intervenção do Tribunal Constitucional se limita ao reexame ou reapreciação da 
 questão de (in)constitucionalidade que o tribunal a quo apreciou ou devesse ter 
 apreciado. Ainda na mesma linha de pensamento podem ver-se, entre outros, o 
 Acórdão n.º 155/95, publicado no Diário da República II Série, de 20 de Junho de 
 
 1995, e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o Acórdão n.º 
 
 192/2000, publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de 2000 - sobre o 
 sentido de um tal requisito, cf. José Manuel Cardoso da Costa, «A jurisdição 
 constitucional em Portugal», separata dos Estudos em Homenagem ao Prof. Afonso 
 Queiró, 2ª edição, Coimbra, 1992, p. 51).
 
             É certo que nada impede que, ao invés de se suscitar a 
 inconstitucionalidade de um preceito legal se questione apenas um seu segmento 
 ou uma determinada dimensão normativa, contudo, para que se possa dar como 
 cumprido o ónus de suscitação de um problema de constitucionalidade, será sempre 
 necessário que o recorrente impute o vício da inconstitucionalidade, de forma 
 directa e imediata, a uma norma mediante a explicitação da dimensão normativa 
 que, no seu entendimento, viola a lei fundamental, não bastando para que possa 
 considerar-se suscitada uma questão de constitucionalidade a afirmação de que é 
 inconstitucional, qua tale, o entendimento sustentado por uma parte ou agente 
 processual. 
 Para tais efeitos, importa, pois, colocar o tribunal perante o dever de 
 apreciação da constitucionalidade de uma norma legal individualizada, havendo de 
 concretizar-se o sentido desse preceito de modo a que, no caso de vir a ser 
 julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua decisão em termos 
 de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os operadores do direito 
 ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual é o preceito e com que sentido 
 ele não deve ser aplicado por, desse modo, violar a Constituição.
 Alem disso, se nada impede que, ao invés de se suscitar a inconstitucionalidade 
 de um preceito legal, se questione apenas um seu segmento ou uma determinada 
 dimensão normativa, será sempre necessário que a norma que se coloca à 
 apreciação do Tribunal Constitucional tenha sido, efectivamente, aplicada in 
 casu com a interpretação que se considerou inconstitucional perante o tribunal 
 recorrido – cf., nesse sentido, entre outros, o Acórdão n.º 139/95, publicado 
 nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 30.º volume, 1995, o Acórdão n.º 
 
 197/97, publicado no Diário da República, IIª Série, n.º 299, de 29 de Dezembro 
 de 1998 e, mais recentemente, o Acórdão n.º 214/03, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt.
 
 3.2 – Precipitando estes criteria sobre o caso sub judicio, torna-se patente que 
 o Tribunal Constitucional não pode conhecer do objecto do presente recurso.
 Tal sucede porque a recorrente não suscitou perante o Tribunal a quo a 
 constitucionalidade dos preceitos sindicandos na exacta dimensão normativa com 
 que agora delimita o objecto do seu recurso, como se distrai do teor das 
 conclusões deduzidas junto do Supremo Tribunal de Justiça.
 Aí, na parte circunstancialmente em causa, sustentou a recorrente que:
 
 «15ª -      Portanto, com os presentes autos – e os demais, como o acórdão que 
 anexou – a B., ao contrário do que tenta impingir, não está a dar execução a um 
 pedido de expropriação baseado no art. 3º nº 2 do Cód. das Expropriações, mas, 
 apenas, ao seu dever de expropriar todos e quaisquer imóveis, nas «Salinas do 
 Samouco», propriedade ou não da ora recorrida, identificados ou não por esta – 
 mas sim, e como diz na sua carta/decisão de 29.9.95, a cumprir a Base LXVIII. 
 
 16ª -       Logo, a verdadeira questão em discussão neste recurso é e só pode 
 ser, saber-se se tal dever de expropriação pode ser cumprido sem DUP – questão 
 que, contudo, é expressamente respondida de modo negativo pelo teor da Base 
 XXVII, invocada no acórdão recorrido, como causa de procedência do agravo, 
 perante a factualidade que vinha provada. 
 
 17ª -       Mesmo que assim não fosse, o disposto nos arts. 1º e 10º nºs 1 e 2 
 do Cód. das Exp., combinado com o disposto no art. 62º nº 2 e art. 1º do 
 Protocolo nº 1 adicional à CEDH determinaria, sempre, que não pode existir 
 expropriação litigiosa – como é o caso dos autos – sem o acto público 
 administrativo da respectiva DUP. 
 
 18ª -       Na verdade, na falta de DUP, verificada factualmente pelo acórdão 
 recorrido, e sem o consentimento anterior, ou actual, da proprietária, não pode 
 esta ser privada, à força, deste direito de propriedade – pois, a sua natureza 
 de direito fundamental, face ao teor de arts. 62º e 17º da Constituição, e 
 
 1.308º do Cód. Civil determina que só nos casos tipificados na lei ele possa ser 
 ofendido, como decorre de art. 18º daquela Lei Fundamental. 
 
 19ª -       De resto, a interpretação por analogia, ou outra técnica, do art. 3º 
 nº 2 do Cód. das Exp., invocada pela recorrente, não poderia ter sucesso, pois 
 viola, também, frontalmente o art. 1º do Protocolo nº 1, adicional à CEDH, bem 
 como aquelas disposições da Constituição – para além da própria Base XXVII, nºs 
 
 1 e 2 do regime jurídico da concessão, aprovado pelo DL 198/94. 
 
 20ª -       Faltando a DUP ao processo expropriativo, a instância carece do seu 
 pressuposto processual, basilar, e inexiste causa (legal) de pedir, devendo 
 declarar-se extinta a instância, por impossibilidade legal – como bem se decidiu 
 no acórdão recorrido.» 
 Como se constata, do exposto não resulta suscitada a inconstitucionalidade da 
 norma do art. 3º, nº 2, do Código das Expropriações, interpretada no sentido 
 segundo o qual pode existir um processo de expropriação de um imóvel, e 
 respectiva avaliação e indemnização, substancialmente autónomos de uma alegada 
 expropriação «em conjunto [da] unidade económica interdependente», a qual, de 
 resto, não pode considerar-se contida numa remissão genérica e indiferenciada 
 para a posição da parte contrária.
 Ademais, face aos fundamentos decisórios revelados pelo Supremo, transparece que 
 a referência ao conteúdo do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (constante 
 da nota mencionada pela recorrente) apenas releva de um plano ad ostentationem 
 já que, no caso presente, se entendeu de forma inquestionável que o pedido de 
 expropriação total formulado pela recorrente abrangia a parcela dos autos e que 
 tal pretensão visava “a expropriação de prédios que constituíam, no seu 
 entender, uma unidade económica integrada na parcela em questão”, sendo que tal 
 juízo, por importar do domínio aplicativo, se impõe a este Tribunal como um dado 
 aqui insindicável.
 Por outro lado, igual conclusão impõe-se, mutatis mutandis, quanto à 
 
 “interpretação das Bases XXVII e LXVIII do contrato de concessão aprovado pelo 
 DL. n.º 198/94, combinado com o disposto no art. 1° e art. 10° nºs 1 e 2 do 
 CE/91, no sentido de que, estando o prédio destinado legalmente a ser 
 expropriado, o pedido idêntico da expropriada afasta a necessidade de declaração 
 de utilidade pública da expropriação, mesmo em processo litigioso”, por se 
 tratar de uma norma cuja inconstitucionalidade não foi suscitada durante o 
 processo.
 Na verdade, do excurso argumentativo motivador da pretensão formulada junto do 
 Supremo resulta, com evidência, que a ora recorrente apenas controverteu a 
 hipótese de expropriação da parcela em causa sem declaração de utilidade pública 
 e sem o consentimento da expropriada, hipótese que foi expressis verbis afastada 
 por aquele Tribunal.
 Ou seja, também aqui a recorrente não suscitou a constitucionalidade do critério 
 normativo no qual repousa a ratio decidendi do juízo recorrido.
 
  
 
 4 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar 
 conhecimento do objecto do recurso.
 
  
 Custas pela recorrente com 8 (oito) Ucs. de taxa de justiça.».
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
             5 – A argumentação da reclamação não logra abalar a bondade da 
 fundamentação da decisão reclamada.
 
             Na verdade, como bem nota a reclamada, o acórdão recorrido não fez 
 uma interpretação do art.º 3.º, n.º 2, do Código das Expropriações de 1991 e das 
 Bases XXVII e XLVIII do contrato de concessão aprovado pelo Decreto-Lei n.º 
 
 168/94, de 15 de Junho, no sentido de não ser necessária declaração de utilidade 
 pública e o consentimento da expropriada para a “expropriação de um imóvel, e 
 respectiva avaliação e indemnização, substancialmente autónomos de uma alegada 
 expropriação «em conjunto [da] unidade económica interdependente”. 
 
             O que o acórdão considerou foi que não era exigível uma nova 
 declaração de utilidade pública quando, como foi o caso, houvesse um pedido de 
 expropriação total dos prédios expropriados.
 
             Assim sendo – repete-se – não constituiu ratio decidendi a norma 
 pretendida sindicar constitucionalmente pela reclamante.
 
             Consequentemente, a reclamação não merece deferimento.
 
  
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide indeferir a reclamação e condenar a reclamante nas custas, fixando a taxa 
 de justiça em 20 Ucs.
 Lisboa, 30 de Abril de 2008
 Benjamim Rodrigues
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
             
 
  
 
             
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 [1] Segundo Alves Correia, “deste princípio estrutural podem ser extraídas duas 
 consequências. A primeira é de que só é legítimo realizar uma expropriação 
 quando esta se apresentar como necessária, isto é, quando não for possível 
 atingir o fim público com outras soluções que, sob o ponto de vista jurídico ou 
 económico, possam substituir a expropriação, nomeadamente a utilização de meios 
 contratuais de direito privado. A segunda é a de que, recorrendo-se à 
 expropriação, deve utilizar-se aquele meio que menor dano cause ao particular” – 
 
 “As Garantias Do Particular na Expropriação Por Utilidade Pública, Coimbra”, 
 
 1982, pp. 116 e 117.
 Refira-se, desde já, que não deixa de ser estranho que seja a própria 
 expropriada a colocar a questão e a defender que não pode existir expropriação, 
 quando é certo que foi ela quem a requereu, bem sabendo que o prédio em causa 
 
 (Misericórdia) não tinha sido objecto de expropriação parcial.
 O que configura uma situação de abuso do direito, na modalidade de «venire 
 contra factum proprium», a implicar a ilegitimidade do seu exercício – (cfr. o 
 art.334°, do C.Civil).
 De todo o modo, segundo cremos, atendendo ao elemento lógico e à ratio legis 
 
 (cfr. o art.9°, do C.Civil), é possível concluir que, em casos como o dos autos, 
 em que a expropriação das parcelas afectou, economicamente, não só os prédios 
 onde se inseriam, mas também os prédios vizinhos, pertencentes ao mesmo 
 proprietário, já que, uns e outros constituíam, em conjunto, uma unidade 
 económica interdependente, o proprietário tenha a faculdade de requerer a 
 expropriação total desses prédios, mesmo em relação àqueles que não foram 
 objecto de expropriação parcial.
 Na verdade, o art.3°, n°2, pretende tutelar o interesse do proprietário, 
 estabelecendo como que uma indivisibilidade económica do imóvel, que se traduz 
 em a parte deste não expropriada seguir o destino da parte expropriada, a pedido 
 do expropriado.
 Ora, essa indivisibilidade económica pode ocorrer, também, relativamente a mais 
 do que um prédio, e se a finalidade da lei é proteger o proprietário afectado 
 pela diminuição dos cómodos da parte não expropriada, resultante do 
 fraccionamento, dentro do seu destino económico efectivo, deve concluir-se, 
 logicamente, e a lei permite a expropriação total quer do prédio já parcialmente 
 expropriado, quer do prédio ou prédios que com aquele formem uma unidade 
 económica interdependente, ainda que não tenham sido objecto de expropriação 
 parcial. A tal conclusão também se poderá chegar, a nosso ver, através de uma 
 interpretação extensiva do preceito, se se entender que o legislador, ao 
 formular a norma, disse menos do que, efectivamente, pretendia dizer, havendo, 
 por isso, necessidade de estender as palavras da lei (cfr. o art. 11º do 
 C.Civil).
 Assim sendo, a circunstância de faltar declaração de utilidade pública relativa 
 ao imóvel em causa – «Misericórdia» – não acarreta quaisquer consequências, 
 porquanto, o mesmo foi expropriado em virtude de ter sido deferido o pedido 
 feito pela expropriada nesse sentido.
 Haverá, deste modo, que concluir que o despacho recorrido, proferido ao abrigo 
 do disposto no art.50°, n°4, que adjudicou ao expropriante a propriedade da 
 parcela n°119, identificada nos autos, não é ilegal, apesar de ter sido 
 proferido sem prévia audição da expropriada e de faltar declaração de utilidade 
 pública relativa ao imóvel”. No mesmo sentido decidiram os Acórdãos daquela 
 Relação de 23.1.2007 – fls. 1673 a 1710 – e de 13.3.2007 – fls. 1711 a 1720 
 verso.
 
  
 
 [2] No Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa citado pela recorrente e em caso 
 muito semelhantes entre as mesmas partes ponderou-se: “Constata-se, deste modo, 
 que, relativamente à marinha «Misericórdia» (parcela n°119), não houve 
 declaração de utilidade pública de expropriação parcial. Mas será que, por esse 
 motivo, não pode ter lugar a expropriação daquele prédio, a requerimento da 
 expropriada, com os fundamentos por esta invocados?