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Processo nº 56/09
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
 
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
 
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso para o 
 Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei da 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).
 
  
 
 2. Em 16 de Fevereiro de 2009, foi proferida decisão sumária, ao abrigo do 
 disposto no artigo 78º-A, nº 1, da LTC, com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «Do requerimento de interposição de recurso para este Tribunal resulta que o 
 recorrente não satisfez um dos requisitos do artigo 75º-A da LTC: não indica a 
 norma cuja inconstitucionalidade pretende que o Tribunal aprecie, uma vez que 
 não identifica a interpretação dada às normas constantes nos artigos 50º do 
 Código Penal e 14º do Regime Geral das Infracções Tributárias (parte final do nº 
 
 1 do artigo 75º-A).
 Não se justifica, porém, convidar o recorrente para o efeito previsto no nº 6 do 
 artigo 75º-A da LTC, uma vez que subsistiriam sempre razões para não conhecer do 
 objecto do recurso interposto. Quer se entenda que o recurso de 
 constitucionalidade foi interposto do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 
 
 18 de Dezembro de 2008 quer se entenda que foi interposto do acórdão do Tribunal 
 da Relação de Lisboa de 19 de Junho de 2008.    
 
 1. Constitui requisito do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do 
 artigo 70º da LTC a aplicação, pela decisão recorrida, como ratio decidendi, da 
 norma cuja inconstitucionalidade o recorrente pretende que o Tribunal 
 Constitucional aprecie. 
 Nos presentes autos, é manifesto que o Supremo Tribunal de Justiça não aplicou 
 qualquer norma extraída dos preceitos indicados no requerimento de interposição 
 do recurso (artigos 50º do Código Penal e 14º do Regime Geral das Infracções 
 Tributárias). O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça apreciou e decidiu a 
 questão da recorribilidade da decisão do Tribunal da Relação de 19 de Junho de 
 
 2008, aplicando, por conseguinte, normas atinentes a esta matéria.
 Como não se pode dar como verificado um dos requisitos do recurso de 
 constitucionalidade interposto, seria sempre de concluir pelo não conhecimento 
 do objecto do recurso.
 
 2. O artigo 76º, nº 1, da LTC estabelece que compete ao tribunal que tiver 
 proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do recurso de 
 constitucionalidade. Como o recurso para o Tribunal Constitucional foi admitido 
 no Supremo Tribunal de Justiça, tal obstaria sempre ao conhecimento do objecto 
 do recurso, caso tenha sido interposto do acórdão do Tribunal da Relação de 
 Lisboa. 
 Ainda que assim não se entenda, seria sempre de concluir pelo não conhecimento 
 do respectivo objecto. Não se pode dar como verificado o requisito da suscitação 
 adequada, durante o processo, da questão de inconstitucionalidade (cf. artigo 
 
 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da LTC).
 Se é certo que o recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do nº 1 do 
 artigo 70º da LTC pode ter por objecto uma interpretação normativa, importa 
 porém ter presente que, para se poder conhecer do objecto do recurso, é 
 necessário que o recorrente tenha suscitado, durante o processo, de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em 
 termos de este estar obrigado a dela conhecer, a questão de 
 inconstitucionalidade normativa (artigo 72º, nº 2, da LTC). Conforme 
 jurisprudência reiterada do Tribunal Constitucional «o cumprimento do ónus a que 
 se refere o artigo 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional não se basta 
 
 (…) com a mera afirmação, perante o tribunal recorrido, de que certa 
 interpretação normativa, não concretizada, é inconstitucional, pois que tal não 
 traduz a invocação de uma verdadeira questão de inconstitucionalidade: o 
 preceito vai mais longe, impondo ao recorrente a delimitação dessa questão, de 
 forma a possibilitar ao tribunal recorrido a sua cabal compreensão e, portanto, 
 a sua efectiva decisão» (Acórdão nº 361/2006, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 Da motivação do recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa resulta que a 
 questão de inconstitucionalidade não foi suscitada de forma adequada, durante o 
 processo, ou seja, dando cumprimento ao ónus a que se refere o nº 2 do artigo 
 
 72º da LTC. O recorrente refere apenas a interpretação dada às normas dos 
 artigos 50º do Código Penal e 14º do Regime Geral das Infracções Tributárias, 
 sem a concretizar».
 
  
 
 3. Desta decisão vem agora o recorrente reclamar para a conferência, invocando o 
 seguinte:
 
  
 
 «O recorrente entende que interpôs convenientemente recurso para esse Tribunal, 
 ou seja, indicando todos os elementos previstos, sendo, s.m.o., incorrecta a 
 tese constante na decisão reclamanda. 
 Em segundo lugar, caso assim se não entendesse, haveria sempre lugar à aplicação 
 dos n°s 5 e 6 do art° 75°-A da LTC. 
 TERMOS EM QUE, e demais do douto suprimento dessa conferência, deve ser dado 
 provimento à presente reclamação e, por via dela, a douta decisão da Ex.mª 
 Senhora Juíza Conselheira-Relatora de fls. revogada e substituída por acórdão 
 que admita o recurso interposto para esse Tribunal Constitucional ou, em 
 alternativa, que convide o reclamante a prestar as indicações em falta, tudo 
 como JUSTIÇA».
 
  
 
  
 
 4. Notificado da reclamação, o Ministério Público respondeu nestes termos:
 
  
 
 «1º
 A presente reclamação carece manifestamente de fundamento. 
 
 2°
 Na verdade, face à inverificação dos pressupostos do recurso, justificava-se de 
 pleno a prolação da decisão ora reclamada, que deve ser inteiramente 
 confirmada».
 
  
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 Na decisão reclamada conclui-se que o requerimento de interposição de recurso 
 não satisfez um dos requisitos do artigo 75º-A da LTC – a indicação da norma 
 cuja apreciação foi requerida. Não se justificando, porém, convidar o recorrente 
 para o efeito previsto no nº 6 do artigo 75º-A da LTC, uma vez que subsistiriam 
 sempre razões para não conhecer do objecto do recurso interposto. Concretamente, 
 porque não se podem dar como verificados, no caso, os requisitos do recurso 
 interposto (artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da LTC). 
 Sem questionar a parte da decisão que conclui pela não verificação destes 
 requisitos, o reclamante sustenta, por um lado, que interpôs convenientemente o 
 recurso, indicando todos os elementos; e, por outro, que haveria sempre lugar à 
 aplicação dos n°s 5 e 6 do artigo 75°-A da LTC. 
 Contrariando esta argumentação, importa reafirmar que o recorrente não satisfez, 
 de facto, um dos requisitos do artigo 75º-A da LTC: não indicou a norma cuja 
 inconstitucionalidade pretendia que o Tribunal apreciasse, uma vez que não 
 identificou a interpretação dada às normas constantes dos artigos 50º do Código 
 Penal e 14º do Regime Geral das Infracções Tributárias (parte final do nº 1 do 
 artigo 75º-A). É entendimento reiterado deste Tribunal que o recorrente pode 
 requerer a apreciação de uma norma, considerada esta na sua totalidade, em 
 determinado segmento ou segundo certa interpretação (cf., entre muitos, o 
 Acórdão do Tribunal Constitucional nº 232/2002, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt). Mas neste último caso tem “o ónus de enunciar, 
 de forma clara e perceptível, o exacto sentido normativo do preceito que 
 considera inconstitucional” (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 21/2006, 
 disponível em www.tribunalconstitucional.pt), uma vez que o objecto do recurso é 
 definido no requerimento de interposição de recurso (cfr., entre outros, os 
 Acórdãos dos Tribunal Constitucional nºs 286/00 e 293/07, disponíveis em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt).
 Por outro lado, o convite a que se refere o nº 6 do artigo 75º-A da LTC “só é 
 possível se a omissão for sanável, ou seja, se consistir numa falta do próprio 
 requerimento, não tendo cabimento para o suprimento de falta de pressupostos de 
 admissibilidade do recurso que seja insanável” (Acórdão nº 99/2000, disponível 
 em www.tribunalconstitucinal.pt). Ora, no caso, faltavam, precisamente, 
 pressupostos de admissibilidade do recurso, o que, de resto, não foi contrariado 
 pelo reclamante.
 Resta, pois, confirmar a decisão de não conhecimento do objecto do recurso 
 interposto.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 
  
 Lisboa,  11 de Março de 2009
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão