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Processo n.º 660/2010
 
 3ª Secção
 
 
 Relator: Conselheira Maria Lúcia Amaral
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 Acordam na 3ª secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 I – Relatório 
 
 
 
  
 
 
 
 1. A. intentou, junto do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, ação de investigação da paternidade contra B., pedindo que fosse declarado que é filha do réu. 
 
 
 Este contestou, invocando, além do mais, a caducidade da ação. 
 
 
 Em despacho saneador foi a exceção de caducidade julgada improcedente, por se ter entendido que seria inconstitucional que as ações de investigação de paternidade estivessem sujeitas a prazos de caducidade, quaisquer que eles fossem. 
 
 
 Inconformado, o réu apelou para a Relação, que confirmou a decisão da 1ª instância. Do Acórdão da Relação interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça que, julgando a 8 de junho de 2010, decidiu do seguinte modo: 
 
 
 
  
 
 
 Concluindo e sumariando: 
 
 
 
 1. O direito à identidade pessoal, constitucionalmente consagrado, no art. 26.º, n.º 1 da CRP, inclui, alem do mais, os vínculos de filiação, existindo um direito fundamental ao conhecimento e reconhecimento, desde logo, da paternidade, ou seja, das raízes de cada um. 
 
 
 
 2. Tal direito fundamental, do conhecimento da ascendência biológica, por banda do investigante, é um direito personalíssimo e imprescritível.
 
 
 
 3. Configurando os prazos de caducidade – sejam eles quais forem – uma restrição desproporcionada de tal citado direito à identidade pessoal ou à historicidade pessoal, violadora da Constituição da República.
 
 
 
 4. Sendo, assim, também inconstitucional, o novo prazo de investigação estabelecido pela atual Lei 14/2009, de 1 de abril.
 
 
 
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 Face a todo o exposto, acorda-se neste Supremo Tribunal de Justiça em se negar a revista, confirmando-se o acórdão recorrido na parte em que confirmou a sentença de 1ª instância. Não nos pronunciando quanto à recusa da aplicação, por inconstitucionalidade material, do art. 3.º da Lei 14/09, de 1 de abril, por tal questão ter ficado prejudicada pela decisão dada à outra.
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 
 2. Desta decisão interpôs B. recurso para o Tribunal Constitucional, dizendo: “[t]endo em atenção que o acórdão recorrido recusou a aplicação do artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, quer na redação anterior à Lei n.º 14/2009, de 1.94, quer na redação que esta Lei lhe deu, por entender que o direito à propositura da ação de investigação da paternidade é imprescritível ou insuscetível de caducidade, e que aquela norma é inconstitucional por violação do artigo 26.º, n.º 1, da CRP, o recorrente declara que o presente recurso para o Tribunal Constitucional é interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15.11.”
 
 
 Através de despacho, a relatora no Tribunal Constitucional circunscreveu o objeto do recurso à apreciação da constitucionalidade do critério normativo, extraído do artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de novembro, que admite a prescrição do direito a investigar a paternidade. 
 
 
 O recorrente alegou, sustentando fundamentalmente – e depois de ter recordado a história da evolução do direito português sobre a matéria – que, ao contrário do que entendera o acórdão recorrido, não resultava da Constituição que a única solução legislativa, juridicamente possível, fosse a da “imprescritibilidade” ou não caducidade das ações de investigação da paternidade. 
 
 
 Notificada para contra-alegar, a recorrida nada disse. 
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 Cumpre apreciar e decidir. 
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 II – Fundamentação
 
 
 
  
 
 
 
 3. Entendeu o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de que se interpôs recurso, que a Constituição proibia a fixação, por parte do legislador ordinário, de qualquer prazo de caducidade para as ações de investigação de paternidade. Foi por este motivo que, textualmente, o Supremo recusou a aplicação da norma contida no n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, quer na redação anterior quer na redação posterior à entrada em vigor da Lei n.º 14/2009. Assim, a “norma” que está em juízo no presente caso é a constante do referido preceito, na parte em que, ao fixar um prazo de caducidade da correspondente ação (qualquer que ele seja), admite a prescrição do direito a investigar a paternidade. Foi esta “norma” cuja aplicação o tribunal a quo recusou, por considerar que ela violaria o disposto no n.º 1 do artigo 26.º da CRP. 
 
 
 Contudo, e encontrando-se os autos já no Tribunal Constitucional, foi entretanto proferido em Plenário o Acórdão n.º 401/2011 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) que decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 1817.º, n.º 1, do Código Civil, na redação da Lei n.º 14/2008, de 1 de abril, na parte em que, aplicando-se às ações de investigação da paternidade, por força do artigo 1873.º, do mesmo Código, prevê um prazo de dez anos para a propositura da ação, contado da maioridade ou emancipação do investigante. 
 
 
 Ao decidir assim, julgou o Tribunal que não era inconstitucional o n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, na parte em que admite a prescrição do direito a investigar a paternidade.
 
 
 
 É, pois, em aplicação deste juízo que se profere para o presente caso idêntica solução de não inconstitucionalidade. 
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 III – Decisão 
 
 
 
  
 
 
 Termos em que se decide: 
 
 
 a)   Não julgar inconstitucional a norma contida no n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil, na parte em que admite a prescrição do direito a investigar a paternidade; e, 
 
 
 b)   Consequentemente, conceder provimento ao recurso, reformando-se a decisão recorrida quanto à questão de constitucionalidade.
 
 
 
  
 
 
 Sem custas.
 
 
 
  
 
 
 
  
 
 
 Lisboa, 6 de março de 2012.- Maria Lúcia Amaral – Carlos Fernandes Cadilha – Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Gil Galvão.