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Processo n.º 91/09
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
 
 
 EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
 
                                                                                  
 
                                       
 
 1. Inconformado com a decisão que, na Relação de Coimbra, lhe não admitiu o 
 recurso que pretendia interpor para o Supremo Tribunal de Justiça, A. reclamou 
 para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça nos seguinte termos:
 
  
 
 1.º O recorrente veio no âmbito da 2.ª instância interpor recurso do Acórdão 
 confirmativo. 
 
 2.º Tendo o Tribunal da Relação indeferido a sua interposição de recurso por 
 despacho datado de 06/10/2008. 
 
 3.º Entende o recorrente que o seu recurso é admissível. Senão vejamos: 
 
 4.º Os presentes autos começaram a ser tramitados em 2004. 
 
 5º Vigorando nessa data o disposto no artigo 400º, nº 1, alínea f) do Código 
 Penal, sendo admissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quando em 
 abstracto a pena fosse superior a 8 anos de prisão. 
 
 6.º Que é o que sucede nos presentes autos, pese embora o arguido não ter sido 
 condenado nessa pena. 
 
 7º Após a alteração do CPP, apenas se permite recurso de prisão efectiva para o 
 STJ, de penas superiores a 8 anos. 
 
 8º Entende que a alteração legislativa não abrange o presente caso, aplicando-se 
 o disposto no artigo 5º, nº 2, alínea a) do CPP, pois, 
 
 9º Ao não se permitir este recurso, está-se a vedar um direito que assistia ao 
 arguido de recorrer para o STJ. 
 
 10.º Sendo no presente caso mais desfavorável e inconstitucional a interpretação 
 em sentido contrário. 
 Em conclusão: 
 
 1) Deveria ter sido admitido o recurso apresentado pelo recorrente; 
 
 2) É admissível face ao disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea a) do CPP e 400º, 
 n.º 1, alínea f) na redacção anterior; 
 
 3) O tribunal recorrido violou as seguintes normas jurídicas: artigo 5.º, n.º 2, 
 alínea a) do CPP e 400º, n.º 1, alínea f) da redacção anterior. 
 Pelo exposto, requer que seja revogado o despacho que não admitiu o recurso do 
 recorrente.
 
  
 A reclamação foi indeferida por despacho do seguinte teor:
 
  
 
 1. O arguido A. interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça do 
 acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra que, na parte relevante, 
 manteve a decisão da a instância que o condenara nos seguintes termos: 
 
 - Como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos 
 artigos 217.º, n.º 1, e 218.º. n.º 2, alínea a), e n.º 3, do Código Penal, na 
 pena de 1 ano de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos 
 artigos 217.º. n.º 1, e 218.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 2 
 anos de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos 
 artigos 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, alínea b), do Código Penal, na pena de 2 
 anos de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de falsificação de documento, previsto e 
 punível pelos artigos 256.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, do Código Penal, na pena 
 de 9 meses de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punível pelo 
 art. 205.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 9 meses de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punível pelo 
 art. 205.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 9 meses de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de abuso de confiança agravado, previsto e 
 punível pelos artigos 205.º, n.º 1 e n.º 4, alínea b), do Código Penal, na pena 
 de 1 ano e 6 meses de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos 
 artigos 217.º, n.º 1, e 218.º, n.º 2, alínea b), do Código Penal, na pena de 2 
 anos de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de furto, previsto e punível pelo artigo 203.º 
 do Código Penal, na pena de 9 meses de prisão. 
 
 - Como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos 
 artigos 217.º, n.º 1, e 218º, n.º 2, alínea b), do Código Penal, na pena de 2 
 anos de prisão. 
 
 - Como autor material de catorze crimes de condução sem carta, previstos e 
 punidos pelas disposições conjugadas do artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2, do 
 Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro e artigos 121.º, n.º 1, 122.º, n.º 1 e 
 
 123.º, todos do Código da Estrada, na pena de 3 meses de prisão, relativamente a 
 cada um deles. 
 Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 4 anos e 10 meses 
 de prisão. 
 Por despacho do Ex.mo Desembargador Relator esse recurso não foi admitido, nos 
 termos dos arts. 432.º e 400.º, n.º 1, alínea f), ambos do CPP. 
 Inconformado com o assim decidido apresentou o recorrente reclamação dirigida ao 
 Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, onde sustenta que os presentes autos 
 começaram a ser tramitados em 2004, quando ainda vigorava o disposto no art. 
 
 400.º, n.º 1, alínea f). do CPP, na sua redacção anterior, sendo assim o recurso 
 admissível, face ao disposto nesta disposição legal e no art. 5.º, n.º 2, alínea 
 a), do CPP, por a alteração legislativa não abranger o presente caso; refere 
 ainda que outra interpretação é inconstitucional e que o tribunal recorrido 
 violou as referidas normas. 
 II. Cumpre apreciar e decidir. 
 No caso dos presentes autos, o recurso não é admissível para este Supremo 
 Tribunal nem ao abrigo da redacção anterior da alínea f) do n.º 1 do art. 400.º 
 do CPP nem da actual introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29/08, donde irrelevar 
 a opção por qualquer dos regimes e, em consequência, a suscitada 
 inconstitucionalidade. 
 Senão vejamos. 
 Em processo penal, para que seja admissível recurso para o Supremo Tribunal de 
 Justiça é necessário que se verifique alguma das situações previstas no art. 
 
 432.º do CPP. 
 Assim, impõe-se desde logo fazer apelo à alínea b) do referido art. 432.º, onde 
 se determina que se recorre para o STJ “de decisões que não sejam irrecorríveis 
 proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do art. 400.º “ E deste 
 preceito destaca-se a alínea t) do seu n.º 1, na redacção introduzida pela Lei 
 n.º 48/2007, de 29/08, que estabelece serem irrecorríveis os “acórdãos 
 condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 
 
 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos”. 
 Deste modo, nos termos da mencionada alínea f), o acórdão questionado é 
 insusceptível de recurso, tendo em conta a pena aplicada ao arguido em ambas as 
 instâncias. 
 E também o recurso não era admissível, como vem defendido, ao abrigo da anterior 
 redacção da alínea f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, por estarmos perante um 
 acórdão condenatório proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra em processo 
 em que a pena abstractamente aplicável a cada um dos crimes, em concurso, não é 
 superior a 8 anos. 
 Assim sendo, não é admissível recurso para este Supremo Tribunal de Justiça. 
 III. Pelo exposto, indefere-se a presente reclamação. 
 
  
 Inconformado, A. pretendeu recorrer desta decisão para o Tribunal 
 Constitucional, nos termos do seguinte requerimento:
 
  
 
 [...] 
 I– Fundamentos do Recurso: 
 
 1.º O recorrente, veio no âmbito da 2.ª instância interpor recurso do Acórdão 
 confirmativo. 
 
 2.º Tendo o Tribunal da Relação indeferido a sua interposição de recurso por 
 despacho datado de 06/10/2008. 
 
 3.º Entende o recorrente que o seu recurso é admissível. Senão vejamos; 
 
 4.º Os presentes autos começaram a ser tramitados em 2004. 
 
 5.º Vigorando nessa data o disposto no artigo 400º, nº 1. alínea f) do Código 
 Penal, sendo admissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, quando em 
 abstracto a pena fosse superior a 8 anos de prisão. 
 
 6º Que é o que sucede nos presentes autos, pese embora o arguido não ter sido 
 condenado nessa pena, interessando, apenas in casu, a recorribilidade em termos 
 de pena abstracta. 
 
 7º Após a alteração do CPP, apenas se permite recurso de prisão efectiva para o 
 STJ, de penas superiores a 8 anos. 
 
 8.º Entende que a alteração legislativa abrange o presente caso, aplicando-se o 
 disposto no artigo 5.º n.º 2 alínea a) do CPP, pois, 
 
 9.º Ao não se permitir este recurso, está-se a vedar um direito que assistia ao 
 arguido de recorrer para o STJ. 
 
 10º Sendo o presente caso mais desfavorável e inconstitucional a interpretação 
 em sentido contrário. 
 II - Pressupostos processuais do recurso 
 
 11.º A questão da interpretação do artigo 400º, n.º 1, alínea f) perfilhada nos 
 tribunais superiores é inconstitucional, por violação do princípio da aplicação 
 da lei mais favorável ao arguido, prevista no artigo 29º CRP: 
 
 12º Sendo o presente recurso para o Tribunal Constitucional interposto ao abrigo 
 do artigo 70º, n.º 1, alínea b) da Lei 28/82 de 15 de Novembro.
 
 13º O arguido pretende ver discutida a inconstitucionalidade da interpretação do 
 
 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP.
 
 14º Considerando que foram violados os artigos 13º, n.º 2 e 29.º da Constituição 
 da República Portuguesa. 
 
 15º A decisão proferida no âmbito destes autos, não é susceptível de outros 
 recursos, tendo o recorrente deduzido reclamação.
 Requer assim:
 Que seja admitido o presente recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 da Lei 28/82 de 15 de Novembro, nos termos do artigo 70.º n.º 1, alínea b). 
 
  
 Mas também esta pretensão lhe foi indeferida. Diz o despacho que tal decidiu:
 
  
 Através do requerimento de fls. 80 veio o recorrente A. interpor recurso para o 
 Tribunal Constitucional, nos termos do disposto no art. 70.º, no 1, alínea b), 
 da LTC, do despacho que indeferiu a reclamação para apreciação da 
 inconstitucionalidade do art. 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP, por violação dos 
 arts. 13.º, n.º 2 e 29.º da CRP 
 Vejamos pois. 
 Face ao disposto no n.º 2 do art. 72.º da LTC, o recurso previsto na alínea b) 
 do n.º 1 do art. 70º da LTC só pode ser interposto pela parte que haja suscitado 
 a questão da inconstitucionalidade “de modo processualmente adequado perante o 
 tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a 
 dela conhecer”. 
 Na reclamação apenas se disse que uma interpretação em sentido contrário ao nela 
 defendido era inconstitucional. 
 No Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 421/2001–DR, II Série de 14.11.2001 
 entendeu-se “...que uma questão de constitucionalidade normativa só se pode 
 considerar suscitada de modo processualmente adequado quando o recorrente 
 identifica a norma que considera inconstitucional, indica o princípio ou a norma 
 constitucional que considera violados e apresenta uma fundamentação, ainda que 
 sucinta, da inconstitucionalidade arguida. Não se considera assim suscitada uma 
 questão de constitucionalidade normativa quando o recorrente se limita a 
 afirmar, em abstracto, que uma dada interpretação é inconstitucional, sem 
 indicar a norma que enferma desse vício, ou quando imputa a 
 inconstitucionalidade a uma decisão ou a um acto administrativo”. 
 Segundo estes ensinamentos, não se considera suscitada qualquer questão de 
 inconstitucionalidade. 
 Pelo exposto, não se admite o recurso interposto para o Tribunal Constitucional. 
 
 
 
  
 Insatisfeito, A.  reclama para o Tribunal Constitucional, alegando:
 
  
 
 [...] 1º O recorrente, na segunda instância, arguiu a inconstitucionalidade do 
 artigo 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP na interpretação perfilhada pelo tribunal. 
 
 
 
 2º Tendo presente o acórdão do TC 421/2001, a verdade é que tal 
 inconstitucionalidade só poderá ser suscitada quando a questão surja. 
 
 3º O que nunca poderia acontecer na 1.ª instância. 
 
 4º No caso vertente, o arguido suscitou essa questão em sede de reclamação, por 
 ter sido indeferido o seu recurso da Relação para o STJ, sendo esse o momento 
 adequado e no antes. 
 
 5º Por sua vez e com o devido respeito, a posição sobre a aceitação e rejeição 
 do recurso para o Tribunal Constitucional, compete em exclusivo a este tribunal 
 e não ao tribunal de onde se recorre. 
 
 6º Pelo que a existir rejeição, será por parte do Tribunal Constitucional e não 
 do STJ. 
 Em conclusão: 
 
 1) Deveria ter sido admitido o recurso apresentado pelo recorrente; 
 
 2) É inconstitucional a norma prevista nos artigos 400.º, n.º 1, alínea f) do 
 CPP, na interpretação perfilhada pelo tribunal, tendo o recorrente suscitado 
 esta questão no momento em que a mesma surgiu processualmente.
 Pelo exposto, requer que seja revogado o despacho que não admitiu o recurso do 
 recorrente, sendo este notificado para apresentar as respectivas alegações. 
 
 [...]
 
  
 O representante do Ministério Público neste Tribunal, ouvido nos termos dos nºs 
 
 2 e 3 do artigo 77º da Lei do Tribunal Constitucional, entende que reclamação é 
 manifestamente improcedente, em virtude de o reclamante não haver suscitado, 'no 
 
 âmbito da reclamação que deduziu perante o Presidente do Supremo Tribunal de 
 Justiça, em termos processualmente adequados, qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa, susceptível de servir de base ao recurso que 
 interpôs para este Tribunal Constitucional'.
 
  
 
 2. Cumpre decidir.
 
  
 
             Constata-se que A. pretende, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, interpor recurso da decisão que, 
 no Supremo Tribunal de Justiça, lhe indeferiu a reclamação, visando obter a 
 fiscalização da desconformidade constitucional da norma da alínea f) do n.º 1 do 
 artigo 400º do Código de Processo Penal 'na interpretação perfilhada pelo 
 Tribunal' que, aliás, não explicita.
 
             Tal pedido foi indeferido no Supremo Tribunal de Justiça por se 
 haver entendido que, impondo o n.º 2 do artigo 72º da LTC a prévia suscitação da 
 questão perante o tribunal que profere a decisão recorrida, o recorrente não 
 suscitara 'qualquer questão de inconstitucionalidade'.
 
             Contrariando este entendimento, o reclamante sustenta, agora, que 
 suscitara a questão da inconstitucionalidade da norma no momento adequado. Além 
 disso, alega que 'a posição sobre a aceitação e rejeição do recurso para o 
 Tribunal Constitucional compete em exclusivo a este tribunal e não ao tribunal 
 de onde se recorre', querendo, com isto, certamente significar que o Tribunal 
 recorrido não tinha poderes para indeferir o seu requerimento de interposição do 
 recurso.
 
             Esta última questão assume carácter prévio por se traduzir na 
 invocação de nulidade processual, e por ela se começa. 
 Afirma o n.º 1 do artigo 76º da LTC: 'compete ao tribunal que tiver proferido a 
 decisão recorrida apreciar a admissão do respectivo recurso'. Ora, tendo a 
 decisão de que pretendia o ora reclamante recorrer sido proferida pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça, é a este Tribunal que compete, nos termos do aludido 
 preceito, 'apreciar' o requerimento de interposição do recurso, o que 
 efectivamente fez. Mais não é necessário dizer para poder concluir que o 
 reclamante carece, manifestamente, de razão ao invocar tal irregularidade.
 Sustenta, depois, que suscitou correctamente a questão perante o Tribunal 
 recorrido; mas também aqui não tem razão. A suscitação da questão de 
 inconstitucionalidade normativa deve materializar-se numa acusação devidamente 
 substanciada de desconformidade constitucional apontada à norma jurídica 
 aplicada pelo tribunal, em termos de este 'estar obrigado a dela conhecer' – n.º 
 
 2 do artigo 72º da LTC –, o que determina que a questão deva ser colocada ao 
 tribunal antes de este proferir a decisão que se pretende questionar. Ora, é 
 patente que, no presente caso, o reclamante teve plena oportunidade processual 
 de colocar a questão nestes termos, o que, todavia, não fez, pois só formalizou 
 aquela acusação no requerimento de interposição do recurso, numa altura em que o 
 Tribunal recorrido já não tinha oportunidade de conhecer da matéria. Tal é o 
 suficiente para reconhecer que o despacho reclamado, que, com este fundamento, 
 não admitiu o recurso, não enferma de qualquer vício.
 
  
 
 3. Neste termos, o Tribunal decide indeferir a reclamação. Custas pelo 
 reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 Lisboa, 11 de Março de 2009
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Gil Galvão