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Processo n.º 596/07                            
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins 
 
  
 Acordam, na 3ª Secção, do Tribunal Constitucional
 
  
 I – RELATÓRIO
 
  
 
  
 
 1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrido o MINISTÉRIO PÚBLICO, 
 o primeiro vem interpor recurso, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da 
 Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, do 
 Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 17 de Abril de 2007 (fls. 130 a 
 
 144), que recusou conhecer do objecto de recurso interposto pelo recorrente, 
 relativo a decisão que julgou improcedente acção de impugnação da decisão 
 administrativa que indeferiu pedido de apoio judiciário, “por se considerar o 
 mesmo não admissível nos termos do estatuído nos artºs 27º e 28º da Lei n.º 
 
 34/2004, de 29/VII, conjugados com os artºs 400º, nº 1, al. g) 414º nº 2 e 420º 
 nº 1, ambos do C.P.P.” (fls. 143).
 
  
 
             2. Notificado para alegar, o recorrente apresentou as suas 
 alegações, cujas conclusões foram as seguintes:
 
  
 
                         “1ª       A apreciação de petição do instituto de 
 Protecção Jurídica não configura bagatela jurídica, antes se apresenta como 
 questão essencial por, a montante da questão principal trazida a juízo, poder 
 cercear ou impedir o acesso ao direito e aos tribunais pelo cidadão 
 economicamente carenciado.
 
  
 
 2ª         O recurso da decisão judicial tirada sobre a impugnação do acto 
 administrativo que tenha indeferido a concessão desse instituto é, na realidade, 
 o primeiro e único recurso jurisdicional.
 
  
 
 3ª         A sua admissibilidade não está vedada por lei, nem nas excepções 
 previstas no art.º 400.º do Código de Processo Penal, nem no n.º 1 do art.° 28.° 
 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, não podendo existir qualquer razão para 
 interpretar esta norma de modo diverso do que a sua letra expressa, por absoluta 
 omissão.
 
  
 
 4ª         Sendo a regra geral, a do art.º 399.º da aludida lei adjectiva penal, 
 a aplicável pois que a irrecorribilidade tem que estar expressa taxativamente. 
 
  
 
 5ª         Sem que sequer se possam esgrimir quaisquer outros motivos, 
 designadamente de índole histórico ou de celeridade, que obstem a esta 
 interpretação.
 
  
 
 6ª         Muito menos a expressão “Alcance da decisão final” plasmada a artº 
 
 29.º da mesma Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, pode ser entendida noutro sentido 
 que não como sendo a definitiva, a que já não admite recurso judicial, a 
 transitada em julgado.
 
  
 
 7ª         É, pois, recorrível por nada estar expresso nessas normas legais no 
 sentido contrário, devendo estar se o não fosse, segundo a regra do citado art.º 
 
 399.º do Código de Processo Penal.
 
  
 
 8ª         A interpretação legislativa das normas arguidas plasmada pelo 
 Tribunal a quo viola o direito do cidadão carenciado a aceder de forma célere e 
 equitativa ao direito e aos tribunais, sindicando as decisões judiciais que se 
 lhe afigurem de erradas e/ou ilegais, competindo aos tribunais, em primeira 
 linha, tutelar tais direitos, assegurando o seu exercício, em submissão à lei, 
 seja qual for a posição desse cidadão na acção a dirimir.
 
  
 
 9ª         Devendo, em conformidade, ser declarada a inconstitucionalidade das 
 normas dos artigos 28.º, n.º 1 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, e do art.º 
 
 399.º do Código de Processo Penal, na interpretação dada, contrária ao sentido 
 emergente da norma do n.º 2 do art.º 9.º do Código Civil, de que a decisão 
 judicial tirada da impugnação do acto administrativo é irrecorrível por violar 
 os imperativos dos artigo 20.º, n.º s 1, 4 e 5, e artigo 32.º, n.º s 1 e 7, sem 
 perder de vista o que acrescentado”. (fls. 157 a 163)
 
  
 
  
 
 3. Por sua vez, o Ministério Público veio contra-alegar o seguinte:
 
  
 
 “O presente recurso vem interposto pelo recorrente A. do acórdão, proferido pelo 
 Tribunal da Relação, que considerou irrecorrível, nos termos dos artigos 27º e 
 
 28º da Lei nº 34/2004, a decisão, proferida pela 1ª instância, que havia julgado 
 improcedente a impugnação deduzida contra a decisão da Segurança Social que 
 tinha indeferido o pedido de protecção jurídica.
 
  
 Note-se liminarmente que é dificilmente compreensível a delimitação do objecto 
 do recurso, realizada pelo recorrente — não se entendendo a inclusão — para além 
 das normas da Lei nº 3 4/04 que efectivamente foram aplicadas como limitativas 
 do direito ao recurso, no caso de indeferimento do peticionado apoio judiciário 
 
 — dos artigos 9º do Código Civil e 399º do Código Processo Penal. 
 
  
 Como é evidente, a “questão” que se pretende suscitar em torno do primeiro de 
 tais preceitos é manifestamente desprovida de natureza “normativa”: em termos 
 substanciais, o que o recorrente sustenta é que a decisão recorrida teria 
 violado, ao interpretar o nº 1 do artigo 28º da Lei nº 34/04, os cânones 
 interpretativos consagrados no Código Civil: ora, como é evidente e 
 incontroverso, não compete ao Tribunal Constitucional sindicar da “correcção” da 
 interpretação que as instâncias fazem dos preceitos de direito 
 infraconstitucional — mas tão somente verificar se essa interpretação — bem ou 
 mal alcançada — viola, porventura, algum preceito ou princípio da Lei 
 Fundamental.
 
  
 Do mesmo modo, não faz sentido a inclusão no objecto do recurso da norma 
 constante do artigo 399º do Código Processo Penal: para além de esta não 
 constituir “ratio decidendi” do acórdão recorrido, não se vê como poderia ser 
 
 “inconstitucional” um regime legal que estabelece, como regra, a admissibilidade 
 do recurso em processo penal: na verdade, o que poderá seguramente afrontar a 
 garantia do duplo grau de jurisdição serão naturalmente os regimes especiais ou 
 excepcionais que contrariam tal regra da recorribilidade, consagrada 
 explicitamente no referido artigo 399º. Aliás, se bem entendemos a argumentação 
 do recorrente, o que ele pretenderá questionar é a limitação do direito ao 
 recurso, relativamente às decisões judiciais que, em primeira instância, 
 deneguem à “parte” o apoio judiciário, quando o interessado tiver a posição de 
 assistente em processo penal. 
 
  
 Só que — mesmo com tal especificação — é evidente que o “direito ao recurso” não 
 está — face ao entendimento reiterado da jurisprudência constitucional sobre o 
 tema — garantido, já que não estamos confrontados com a impugnação de decisão 
 
 “condenatória” ou incidente sobre medidas privativas ou restritivas da liberdade 
 do arguido (cf. sobre questão exactamente idêntica, o decidido no recente 
 acórdão nº 427/07).
 
  
 Por outro lado, é manifestamente improcedente a invocação, como parâmetros de 
 aferição da constitucionalidade — e para além de tal “direito ao recurso, ínsito 
 no artigo 32º, nº 7, da Lei Fundamental — do direito de acesso aos tribunais 
 
 (que seguramente não comporta a atribuição de um generalizado acesso ao duplo 
 grau de jurisdição) — e dos artigos 202º e 203º da Constituição da República 
 Portuguesa (sendo, aliás, ininteligível a conexão do referido “direito ao 
 recurso” com o conteúdo e independência do exercício da função jurisdicional 
 pelos tribunais).
 
  
 
 2. Conclusão
 
  
 Nestes termos e pelo exposto conclui-se: 
 
  
 
 1º
 
  
 A norma constante do artigo 28º, nº 1, da Lei nº 34/04, interpretada em termos 
 de consagrar a irrecorribilidade da decisão, proferida pelo tribunal de 1ª 
 instância, que haja julgado improcedente a impugnação deduzida pelo interessado 
 em obter o apoio judiciário, não viola qualquer preceito ou princípio 
 constitucional.
 
  
 
 2°
 
  
 Termos em deverá improceder o presente recurso.” (fls. 165 a 167)
 
  
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II – FUNDAMENTAÇÃO
 
  
 
  
 
 4. Importa começar por determinar o objecto preciso deste recurso. Conforme bem 
 notado pelo Ministério Público, o artigo 9º do Código Civil e o artigo 399º do 
 Código de Processo Penal não foram aplicados pela decisão recorrida como “ratio 
 decidendi”, pelo que, conforme jurisprudência uniforme neste Tribunal, não pode 
 conhecer-se do objecto das mesmas (neste sentido, a mero título de exemplo, ver 
 Acórdãos n.º 327/07, de 29 de Maio de 2007, e n.º 495/07, de 08 de Outubro de 
 
 2007, ambos disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt). O que sucede é que o 
 recorrente optou por invocar aqueles preceitos enquanto mero instrumento do 
 raciocínio interpretativo que expende a propósito do n.º 1 do artigo 28º da Lei 
 n.º 34/2004, ainda que aquelas normas não tenham sido efectivamente aplicadas 
 pelo tribunal “a quo”.
 
  
 
 5. Aliás, ao longo das suas alegações perante este Tribunal, o recorrente parece 
 descurar os limites dos poderes que a Constituição e a lei atribuem a este órgão 
 jurisdicional concentrado de garantia da Constituição da República Portuguesa. 
 Com efeito, o recorrente apenas aponta uma alegada violação de preceitos 
 constitucionais no 2º parágrafo das alegações e na respectiva 8ª conclusão. Em 
 todo o restante articulado de alegações, limita-se a questionar e a contestar a 
 interpretação do Direito infra-constitucional aplicado pela decisão recorrida, 
 não apontando qualquer inconstitucionalidade específica.
 
  
 Sucede, porém, que este Tribunal apenas dispõe poderes para sindicar a 
 constitucionalidade de normas jurídicas, mas não já a bondade dos juízos 
 hermenêuticos levados a cabo pelos tribunais comuns, a propósito da aplicação do 
 Direito infra-constitucional. Por outras palavras, este Tribunal não pode – nem 
 pretende – colocar em causa o juízo interpretativo da decisão recorrida sobre a 
 norma contida nos artigos 27º e 28º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, 
 determinando se aqueles preceitos legais obstam ou não à interposição de 
 recurso.
 
  
 
 6. Salvo, bem entendido, se o mesmo tivesse implicado o desrespeito de normas ou 
 de princípios constitucionais. O recorrente não logrou, contudo, demonstrar que 
 a interpretação adoptada pela decisão recorrida tivesse colocado em causa 
 qualquer parâmetro de validade constitucionalmente consagrado.
 
  
 Em primeiro lugar, os nºs 1, 4 e 5 do artigo 20º da CRP não atribuem aos 
 particulares qualquer direito absoluto a que uma decisão proferida por um 
 tribunal de primeira instância seja aferida por uma instância de recurso. 
 Conforme jurisprudência consolidada deste Tribunal, o direito à tutela 
 jurisdicional efectiva não garante – necessária e obrigatoriamente – um direito 
 ao recurso:
 
  
 
 “Sobre o direito de acesso à justiça tem o Tribunal Constitucional firmado uma 
 extensa jurisprudência, interpretando-o no sentido de que ele é ‘um direito à 
 solução dos conflitos por banda de um órgão independente e imparcial face ao que 
 concerne à apresentação das respectivas perspectivas, não decorrendo desse 
 direito (nomeadamente, no que ora releva, se em causa estiver a litigância civil 
 obrigacional) o asseguramento às partes da garantia de recurso das decisões que 
 lhes sejam desfavoráveis (cf, por todos, o Acórdão nº 210/92, publicado na II 
 Série do Diário da República, de 12 de Setembro de 1992)’ (Acórdão n.° 208/93, 
 in Diário da República, II Série, de 28 de Maio de 1993). 
 A este propósito, lê-se também no Acórdão n.º 501/96, in Diário da República, II 
 Série, de 3 de Julho de 1996: 
 
 «O Tribunal Constitucional tem entendido que a garantia judiciária (...) engloba 
 o próprio direito de defesa contra actos jurisdicionais (Acórdão n.º 287/90, in 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, 17.° vol., 1990, pp. 159 e segs.; 
 identicamente, GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, ob. cit., p. 162). E este 
 direito só pode ser exercido mediante o recurso para (outros) tribunais. Por 
 outro lado, a expressa previsão da existência de tribunais de 1ª instância e de 
 recurso também fornece um argumento a favor da dignidade constitucional do 
 direito de recurso (assim, Acórdão n.º 287/90, citado, e RIBEIRO MENDES, Direito 
 Processual Civil – Recursos, 2. ed., 1992, p. 100). 
 
  
 Todavia, não se pode concluir que haja, na ordem jurídica portuguesa, um 
 ilimitado direito de recurso, o que implicaria, por exemplo, a 
 inconstitucionalidade do instituto das alçadas judiciais. O Tribunal 
 Constitucional tem entendido – tal como já sustentara a Comissão Constitucional 
 
 – que o direito de recurso não é absoluto ou irrestringível (Acórdãos nºs 31/87 
 e 65/88, in Diário da República, II série, de 1 de Abril de 1987 e 20 de Agosto 
 de 1988, respectivamente, e parecer n.º 9/82, in Pareceres da Comissão 
 Constitucional, 19. ° vol., pp. 29 e segs.).» (cfr. Acórdão n.º 83/99, de 09 de 
 Fevereiro de 1999, disponível in www.tribunalconstitucional.pt)
 
  
 
  
 Ora, no caso concreto em apreço, o recorrente não conseguiu demonstrar que o 
 direito à tutela jurisdicional efectiva, decorrente do n.º 1 do artigo 20º da 
 CRP ficasse irremediavelmente prejudicado, por força da não permissão de recurso 
 de uma decisão proferida por um tribunal de primeira instância, independente e 
 imparcial, sobre um acto administrativo de recusa de concessão de apoio 
 judiciário.
 
  
 Em segundo lugar, apenas em sede de processo penal se garante um direito ao 
 recurso (cfr. artigo 32º, n.º 1 da CRP), o qual, aliás, de acordo com a 
 jurisprudência assente do Tribunal Constitucional, não determina a sua concepção 
 enquanto direito absoluto e irrestringível.
 
  
 Com efeito, como este Tribunal tem repetidamente afirmado, o direito fundamental 
 consagrado (e enfatizado, pela revisão constitucional de 1997) no n.º 1 do 
 artigo 32º da CRP não gera qualquer direito a um duplo grau de recurso ou sequer 
 um direito irrestringível a recorrer de toda e qualquer decisão jurisdicional, 
 mas apenas daquelas que impliquem a adopção de medidas restritivas da liberdade 
 ou de outros direitos fundamentais do arguido. A este propósito, acompanha-se 
 integralmente a jurisprudência consolidada neste Tribunal que ora se reproduz, a 
 mero título de exemplo:
 
  
 
                   a)        Acórdão n.º 265/94, in «Diário da República», IIª 
 Série, n.º 165, 19 de Julho de 1994, pp. 7239 e segs.
 
  
 
 “7. A Constituição da República não estabelece em nenhuma das suas normas a 
 garantia de existência de um duplo grau de jurisdição para todos os processos 
 das diferentes espécies.
 
  
 
 É certo que a Constituição garante a todos 'o acesso ao direito e aos tribunais 
 para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, não podendo a justiça ser 
 denegada por insuficiência de meios económicos' (art. 20º, nº 1) e, em matéria 
 penal, afirma que 'o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa' 
 
 (art. 32º, nº 1). Destas normas, porém, não retira a jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional a regra de que há-de ser assegurado o duplo grau de jurisdição 
 quanto a todas as decisões proferidas em processo penal.
 
  
 A garantia do duplo grau de jurisdição existe quanto as decisões penais 
 condenatórias e ainda quanto às decisões penais respeitantes à situação do 
 arguido face à privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros 
 direitos fundamentais.
 
  
 Sendo embora a faculdade de recorrer em processo penal uma tradução da expressão 
 do direito de defesa (veja-se nesse sentido o acórdão nº 8/87 do Tribunal 
 Constitucional, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9º volume, pág. 235), a 
 verdade é que, como se escreveu no acórdão nº 31/87 do mesmo Tribunal, 'se há-de 
 admitir que essa faculdade de recorrer seja restringida ou limitada em certas 
 fases do processo e que, relativamente a certos actos do juiz, possa mesmo não 
 existir, desde que, dessa forma, se não atinja o conteúdo essencial dessa mesma 
 faculdade, ou seja, o direito de defesa do arguido.' E, mais à frente, lê-se no 
 mesmo aresto:
 
  
 
 «Ora, a salvaguarda desse direito de defesa impõe seguramente que se consagre a 
 faculdade de recorrer da sentença condenatória, como se determina, aliás, de 
 forma expressa no nº 5 do artigo 14º do Pacto Internacional sobre os Direitos 
 Civis e Políticos, aprovado para ratificação pela Lei nº 29/78, de 12 de Junho: 
 
 «Qualquer pessoa declarada culpada de crime terá o direito de fazer examinar por 
 uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade e a sentença, em 
 conformidade com a lei»; como imporá, também, que a lei preveja o recurso dos 
 actos judiciais que, durante o processo, tenham como efeito a privação ou a 
 restrição da liberdade ou de outros direitos fundamentais do arguido. Mas já não 
 impõe que se possibilite o recurso de todo e qualquer acto do juiz'. (in 
 Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9º vol. págs. 467-468; no mesmo sentido, 
 veja-se o acórdão nº 178/88, in Acórdãos, vol. 12º, págs. 569 e seguintes)».
 
  
 b)        Acórdão n.º 189/2001, in «Acórdãos do Tribunal Constitucional», n.º 
 
 50, pp. 285 e segs.
 
 “Porém, mesmo aqui e face a este específico fundamento da garantia do segundo 
 grau de jurisdição no âmbito penal, não pode decorrer desse fundamento que os 
 sujeitos processuais tenham o direito de impugnar todo e qualquer acto do juiz 
 nas diversas fases processuais: a garantia do duplo grau existe quanto às 
 decisões penais condenatórias e também quanto às respeitantes à situação do 
 arguido face à privação ou restrição da liberdade ou a quaisquer outros 
 direitos fundamentais (veja‑se, neste sentido, o Acórdão n.º 265/94, in Acórdãos 
 do Tribunal Constitucional, 27.º vol., pág. 751 e seguintes).
 
  
 Embora o direito de recurso conste hoje expressamente do texto constitucional, 
 o recurso continua a ser uma tradução das garantias de defesa consagradas no 
 n.º 1 do artigo 32.º (O processo criminal assegura todas as garantias de 
 defesa, incluindo o recurso). Daí que o Tribunal Constitucional não só tenha 
 vindo a considerar como conformes à Constituição determinadas normas 
 processuais penais que denegam a possibilidade de o arguido recorrer de 
 determinados despachos ou decisões proferidas na pendência do processo (v. g., 
 quer de despachos interlocutórios, quer de outras decisões, Acórdãos nºs 
 
 118/90, 259/88 e 353/91, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 15.º, pág. 
 
 397, vol. 12.º, pág. 735, e vol. 19.º, pág. 563, respectivamente, e Acórdão n.º 
 
 30/2001, sobre a irrecorribilidade da decisão instrutória que pronuncie o 
 arguido pelos factos constantes da acusação particular quando o Ministério 
 Público acompanhe tal acusação, ainda inédito), como também tenha já entendido 
 que, mesmo quanto às decisões condenatórias, não tem que estar necessariamente 
 assegurado um triplo grau de jurisdição, assim se garantindo a todos os 
 arguidos a possibilidade de apreciação da condenação pelo STJ (veja‑se, neste 
 sentido, o Acórdão n.º 209/90, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 16.º 
 vol., pág. 553).
 
  
 Uma tal limitação da possibilidade de recorrer tem em vista impedir que a 
 instância superior da ordem judiciária accionada fique avassalada com questões 
 de diminuta repercussão e que já foram apreciadas em duas instâncias. Esta 
 limitação à recorribilidade das decisões penais condenatórias tem, assim, um 
 fundamento razoável.” 
 
  
 
             No mesmo sentido, ver ainda:
 
  
 
 “Salientando que não lhe cabe a apreciação do acerto da decisão no plano da mera 
 interpretação da alínea f) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal, 
 o Tribunal lembra que, em conformidade com a jurisprudência posta em evidência 
 na decisão reclamada, toda no sentido de que o artigo 32.º, n.º 1, da 
 Constituição, quando estabelece que “o processo criminal assegura todas as 
 garantias de defesa, incluindo o recurso”, não consagra a garantia de um triplo 
 grau de jurisdição em relação a quaisquer decisões penais condenatórias, o que 
 tem de perguntar-se é se será desrazoável, arbitrário ou desproporcionado não 
 admitir o recurso para o Supremo nos casos, como o dos autos, em que a Relação 
 mantém os factos provados e a qualificação jurídica, não obstante reduzir a 
 medida concreta das penas parcelares e unitária (esta última para sete anos), 
 revogando parcialmente a decisão de 1.ª instância.
 
  
 Ora a menor certeza na aplicação do direito ao caso que possa imputar-se à 
 inexistência de uma rígida 'dupla conforme' nas instâncias não tem 
 constitucionalmente que ser superada pelo acesso ao Supremo Tribunal de Justiça. 
 Não podendo essa garantia ser reconhecida em todos os casos, tal resolução exige 
 necessariamente a ponderação da razoabilidade, arbitrariedade ou 
 desproporcionalidade da não admissão desse terceiro grau, na hipótese normativa 
 considerada. E, repete-se, não é constitucionalmente censurável que a exclusão 
 do terceiro grau de jurisdição resulte de se “qualificar como confirmatório da 
 decisão condenatória, proferida em 1ª instância, o acórdão da Relação que – sem 
 qualquer alteração ou convolação dos fundamentos essenciais ou substanciais – se 
 limite, em mera «redução quantitativa», a atenuar a medida concreta da pena 
 aplicada ao arguido, reduzindo a que lhe havia sido cominada na 1ª instância, 
 por diversa reponderação do quadro de circunstâncias atenuantes. Não é 
 desrazoável, quer reservar a possibilidade de recurso para Supremo para os casos 
 mais graves em função da medida da pena quer, num sistema assim concebido, 
 tratar do mesmo modo os casos em que a Relação, aplicando pena não superior a 
 oito anos, confirma totalmente a decisão da 1.ª instância e os casos em que a 
 Relação, aplicando pena não superior a oito anos, reduz a pena aplicada pela 1.ª 
 instância” (Acórdão n.º 20/2007, acessível in www.tribunalconstitucional.pt).
 
  
 
             Acresce a tudo isto que, nos autos recorridos, o ora recorrente 
 assume a função processual de assistente e não de arguido. Ora, como é bom de 
 ver, o n.º 1 do artigo 32º da CRP apenas assegura o direito ao recurso enquanto 
 
 “garantia[s] de defesa” e não como garantia de qualquer uma das partes no 
 processo penal. Razão pela qual o recorrente não pode invocar aquela norma em 
 seu favor.
 
  
 
             Já quanto à norma constante do n.º 7 do artigo 32º da CRP, não se 
 vislumbra de que modo é que a impossibilidade de recurso para uma segunda 
 instância poderá impedir o assistente de intervir no processo penal, visto que 
 quer a Segurança Social quer o tribunal “a quo” confirmaram – questão que ora 
 não se discute, nem se reabre – que o recorrente dispõe dos meios económicos 
 suficientes para suportar os custos da lide processual.
 
  
 Por último, é manifestamente incompreensível a alegada violação dos artigos 
 
 202º, nºs 1 e 2, e 203º da CRP pela interpretação normativa vertida na decisão 
 recorrida, visto que o recorrente a esgrime sem densificar as razões pelas quais 
 essas normas exigiriam interpretação diversa. Note-se, contudo, que não se 
 vislumbram quaisquer razões para aquelas normas serem interpretadas no sentido 
 de exigirem a possibilidade de recurso da decisão de um tribunal de primeira 
 instância que julgue improcedente acção de impugnação de decisão administrativa 
 de indeferimento de pedido de apoio judiciário.
 
  
 
  
 III – DECISÃO
 
  
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se:
 
  
 a)                          Não julgar inconstitucional a norma constante do n.º 
 
 1 do artigo 28º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, quando interpretada no 
 sentido de que não é admissível recurso da decisão judicial tirada sobre 
 impugnação de decisão administrativa que indefere requerimento de apoio 
 judiciário.
 
  
 b)                          Não conceder provimento ao recurso. 
 
  
 Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 UC´s, nos 
 termos do n.º 1 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
 
  
 Lisboa, 28 de Novembro de 2007
 Ana Maria Guerra Martins
 Maria Lúcia Amaral
 Vítor Gomes
 Carlos Fernandes Cadilha
 Gil Galvão