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Processo n.º 806/07
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
 
 
 
  
 Acordam em conferência na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
  
 
 1. Relatório
 
  
 
  
 A. e mulher interpuseram, a fls. 350 e seguintes, recurso de agravo para o 
 Supremo Tribunal de Justiça de um acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra que 
 lhes havia negado provimento a um anterior recurso de um despacho do tribunal de 
 
 1ª instância, tendo nas alegações respectivas (fls. 360 e seguintes) concluído, 
 entre o mais, que “[a] interpretação sustentada pelo Tribunal “a quo”, 
 relativamente à presunção disposta no n.º 4 do artigo 233º e no n.º 1 do artigo 
 
 238º, ambos do CPC, é inconstitucional, por violadora dos direitos de acesso à 
 justiça e à tutela jurisdicional efectiva (cfr. artº 20º da CRP), e do princípio 
 da igualdade, consignado no artigo 13º do mesmo Diploma Fundamental, o que 
 expressamente se invoca” (cfr. conclusão 30ª).
 
  
 Por despacho de fls. 429, o Exmo. Conselheiro Relator no Supremo Tribunal de 
 Justiça, atendendo a que “[n]ão foram evidenciadas as contradições entre 
 acórdãos nem se vislumbra possibilidade de conhecer do objecto do recurso”, 
 ordenou a notificação das partes nos termos e para os efeitos do artigo 704º, 
 n.º 1, do Código de Processo Civil.
 Os recorrentes responderam, pugnando pela viabilidade da interposição do recurso 
 e do conhecimento do seu objecto (fls. 430 e seguinte).
 
  
 Por decisão de 14 de Fevereiro de 2007, o Exmo. Conselheiro Relator no Supremo 
 Tribunal de Justiça (fls. 436 e seguintes) julgou findo o recurso, entendendo 
 ser de não conhecer do seu objecto. Considerou, em síntese, que mesmo que não se 
 entendesse que o recurso não devia ter sido admitido - por não terem os 
 recorrentes requerido, logo no requerimento de interposição, o julgamento 
 alargado ao abrigo do disposto nos artigos 732º-A e 732º-B do Código de Processo 
 Civil -, sempre se haveria de concluir que não podia conhecer-se do objecto do 
 recurso, “uma vez que o seu objecto não se enquadra em qualquer das situações 
 previstas nos n.º s 2 e 3 do artigo 754º do CPC”.
 
  
 A. e mulher deduziram então reclamação para a conferência (fls. 442), que foi 
 indeferida por acórdão de 30 de Maio de 2007 (fls. 450 e seguintes). 
 
  
 Considerou o Supremo Tribunal de Justiça, em síntese, “não poder o presente 
 agravo ser objecto de apreciação, uma vez que o seu objecto não se enquadra em 
 qualquer das situações previstas nos n.º s 2 e 3 do artigo 754º do CPC. Com 
 efeito, sendo o agravo interposto com fundamento na ressalva do n.º 2 do artigo 
 
 754º - existência de oposição de julgados –, os recorrentes, para além da 
 identificação dos acórdãos da Relação de Guimarães e deste STJ 
 
 (acórdão-fundamento) que, na sua óptica, estão em oposição com o acórdão 
 recorrido, deviam referir os pontos concretos que, em seu entender, se mostram 
 em oposição e não se limitarem a referir aspectos gerais constantes dos acórdãos 
 referidos. […]. […] vistos e comparados os aludidos acórdãos, não se vislumbra 
 que deles resulte qualquer contradição […]. Sendo assim, o recurso não é 
 admissível, como decorre do disposto na parte inicial do n.º 2 do artigo 754º do 
 Código de Processo Civil”.
 
  
 Deste acórdão recorreram A. e mulher para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, 
 pretendendo a apreciação da “interpretação dos artigos 233º, n.º 4, e 238º, n.º 
 
 1, ambos do CPC, que torna virtualmente impossível a ilisão da presunção que 
 anda associada à citação efectuada na terceira pessoa, ínsita naqueles artigos”, 
 por violação do disposto nos artigos 13º e 20º da Constituição (fls. 471 e 
 seguinte).
 
  
 O recurso de constitucionalidade foi admitido no tribunal recorrido por despacho 
 de fls. 476.  
 
  
 No Tribunal Constitucional, por decisão sumária nos termos do artigo 78º-A da 
 Lei do Tribunal Constitucional (fls. 482 e seguintes), não se tomou conhecimento 
 do recurso de constitucionalidade, pelos seguintes fundamentos:
 
  
 
 “Não obstante os recorrentes não concretizarem, no requerimento de interposição 
 do presente recurso, a interpretação normativa cuja conformidade constitucional 
 pretendem que o Tribunal Constitucional aprecie - o que é exigido pelo n.º 1 do 
 artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional -, não se justifica o 
 proferimento de despacho de aperfeiçoamento pelo ora relator, ao abrigo do 
 disposto no n.º 6 do mesmo preceito legal, atendendo a que é, desde já, evidente 
 que não é possível o conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade.
 Na verdade, seja qual for a concreta interpretação normativa que os recorrentes 
 pretendem que o Tribunal Constitucional aprecie, certo é que a mesma se reporta 
 aos artigos 233º, n.º 4, e 238º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (os 
 preceitos legais que os recorrentes identificam), e certo é também que estes 
 preceitos legais não foram aplicados na decisão recorrida, tendo-o sido, antes, 
 o artigo 754º, n.º s 2 e 3, do mesmo Código.
 Ora, um dos pressupostos processuais do presente recurso de constitucionalidade 
 
 – que foi interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do 
 Tribunal Constitucional – é, como decorre deste mesmo preceito, a aplicação, na 
 decisão recorrida, da norma ou interpretação normativa cuja conformidade 
 constitucional se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie.
 Não estando preenchido um dos pressupostos processuais do presente recurso, não 
 pode conhecer-se do respectivo objecto”.
 
  
 A. e mulher vêm agora reclamar desta decisão sumária para a conferência, ao 
 abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, 
 nos seguintes termos (fls. 492 e seguinte):
 
  
 
 “[…] o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de fls.[…], confirmou a decisão 
 do Tribunal da Relação de Coimbra. 
 A decisão deste Tribunal alicerça-se numa interpretação equívoca, 
 constitucionalmente equívoca, do disposto nos artigos 233°, n° 4 e 238°, n° 1, 
 ambos do CPC. 
 Tal decisão era recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do 
 artigo 754°, n° 2, do CPC. 
 Nesse conspecto, os recorrentes tinham que suscitar a intervenção do Supremo 
 Tribunal de Justiça, de forma a que se formasse decisão irrecorrível, isto é, 
 não susceptível de recurso ordinário, nos termos e para os efeitos do disposto 
 no art° 72°, n° 2, da Lei do Tribunal Constitucional. 
 Tanto mais que não era necessário que os recorrentes interpusessem recurso para 
 fixação de jurisprudência. 
 Assim, a rejeição do recurso por parte do Supremo Tribunal de Justiça, com o 
 fundamento, eminentemente formal, de (alegadamente) não haver contradição de 
 acórdãos para os efeitos do disposto no art° 754°, n° 2 do CPC, mais não traduz 
 que a confirmação da decisão do Tribunal da Relação de Coimbra, onde grassa a 
 supra citada interpretação da lei positiva que os recorrentes reputam de 
 inconstitucional. 
 Assim, salvo o devido respeito, que muito é, a tutela efectiva dos direitos 
 constitucionais dos recorrentes, reclama, respeitosamente, que se tome 
 conhecimento do recurso, com todas as legais consequências”.
 
  
 O recorrido não respondeu (fls. 494).  
 
  
 
  
 
 2. Fundamentação
 
  
 
  
 Como se referiu na decisão sumária reclamada, um dos pressupostos processuais do 
 recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da 
 Lei do Tribunal Constitucional – a alínea ao abrigo da qual os recorrentes 
 interpuseram o presente recurso – é a aplicação, na decisão recorrida, da norma 
 ou interpretação normativa que é submetida à apreciação do Tribunal 
 Constitucional.
 
  
 Tendo os recorrentes interposto recurso para o Tribunal Constitucional do 
 acórdão do Supremo Tribunal de Justiça – como claramente afirmam no requerimento 
 de interposição do presente recurso (cfr. fls. 471 e seguinte) -, para que se 
 pudesse conhecer do respectivo objecto era necessário que, nesse acórdão, 
 tivesse sido aplicada a interpretação dos artigos 233º, n.º 4, e 238º, n.º 1, 
 ambos do Código de Processo Civil, que os recorrentes censuram e pretendem 
 submeter à apreciação do Tribunal Constitucional. 
 
  
 Tal interpretação não foi aplicada nesse acórdão, como se explicou na decisão 
 sumária (a norma aí aplicada foi, antes, a do artigo 754º, n.ºs 2 e 3, do mesmo 
 Código), pelo que não é possível ficcionar que tal acórdão é confirmatório do 
 Tribunal da Relação de Coimbra para efeito de se conhecer do objecto do recurso 
 de constitucionalidade.
 
  
 Se a interpretação censurada pelos recorrentes/reclamantes foi aplicada no 
 acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, como também afirmam os reclamantes, 
 seria desse acórdão que deviam ter interposto recurso para o Tribunal 
 Constitucional e não do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.
 
  
 Na verdade, a regra do esgotamento dos recursos ordinários, consagrada no artigo 
 
 70º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional, não derroga a regra do artigo 
 
 70º, n.º 1, alínea b), da mesma Lei, que exige, para o conhecimento do objecto 
 do recurso de constitucionalidade, a aplicação, na decisão recorrida, da norma 
 ou interpretação normativa que constitui o objecto do recurso de 
 constitucionalidade.
 
  
 Por outro lado, a interposição de um recurso para uniformização de 
 jurisprudência - como foi o caso, em que interpôs um recurso de agravo de 2ª 
 instância com fundamento no disposto no artigo 754º, n.º 2, do Código de 
 Processo Civil -, não impede que o interessado, quando esse recurso não seja 
 admitido por irrecorribilidade da decisão, venha ainda a recorrer dessa decisão 
 para o Tribunal Constitucional, contando-se então o respectivo prazo a partir do 
 momento em que se torna definitiva a decisão que não admite o recurso (artigo 
 
 75º, n.º 2, da LTC).
 
  
 Nada obstava, portanto, a que o recorrente viesse impugnar o acórdão do Tribunal 
 da Relação de Coimbra com fundamento numa interpretação inconstitucional das 
 normas dos artigos 233º, n.º 4, e 238º, n.º 1, do CPP, mesmo após a prolação do 
 acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que não admitiu o recurso por oposição de 
 julgados.
 
  
 Só que o recurso de constitucionalidade efectivamente interposto pelo recorrente 
 tem por objecto, não o aludido acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, mas o 
 acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que, por não ter admitido o recurso para 
 uniformização de jurisprudência, acabou por não fazer qualquer aplicação das 
 normas em causa.
 
  
 Improcede, assim, a argumentação dos reclamantes.
 
  
 
  
 
 3. Decisão
 
  
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, desatende-se a presente reclamação, 
 mantendo-se a decisão sumária de fls. 482 e seguintes.
 
  
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 
  
 Lisboa, 28 de Novembro de 2007
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão