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Processo n.º 685/07
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
 
 Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
 
 I – Relatório
 
 1. A., Lda deduziu, junto do Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Vila Real, 
 impugnação de uma liquidação feita pelo Centro Regional de Segurança Social de 
 Vila Real, no montante de 19.712$00, referente a contribuições para a Segurança 
 Social, tendo, entre o mais, sustentado a ilegalidade do Decreto Regulamentar 
 n.º 9/88, de 3 de Março, bem como a inconstitucionalidade do Despacho n.º 
 
 84/SESS/89, de 17 de Julho.
 Na sequência da contestação do representante da Fazenda Pública (fls. 27), foi 
 proferida sentença pelo juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, 
 julgando a impugnação improcedente (fls. 72 e seguintes).
 
 2. Desta sentença interpôs A., Lda recurso para a Secção de Contencioso 
 Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (fls. 85), tendo nas alegações 
 respectivas (fls. 94 e seguintes) concluído do seguinte modo:
 
 “I – OS AC. STA de 15/12/2004, AC. STA de 12/01/, AC. STA de 12/01/2005, AC. STA 
 de 26/01/2005 e AC. STA de 23/02/2005, bem como, ainda, os arestos de 16 de 
 Junho de 2004 e 13 de Outubro de 2004 nos recursos n.º 332/04, 3111/04 e 374/04, 
 decidiram que o n.º do artigo 4.º, do DR. 9/988, é ilegal por violação do 
 estatuído no DL 401/86, 
 II – Em completa discordância com aqueles, a decisão recorrida considera que o 
 n.º 2 do artigo 4º, do DR. 9/88, não viola o estatuído no DL 401/86, 
 designadamente nos n.º 5 e 6 daquele diploma legal. 
 III – Tal discrepância de posições determinou que no caso sub judice no processo 
 onde foi proferida a decisão recorrida, o acto de liquidação tenha sido julgado 
 legal, e a impugnação improcedente, enquanto que em todos os outros processos o 
 acto de liquidação, com as mesmas características, tenha sido, por via daquela 
 interpretação, julgado ilegal e, consequentemente, procedentes as impugnações 
 deduzidas. 
 IV – A decisão recorrida e os acórdãos citados versam sobre situações fácticas 
 idênticas e foram emanados estando vigente sempre a mesma legislação. 
 V – Por outro lado, todos os acórdãos fundamentos constituem decisões 
 transitadas em julgado 
 Nestes termos e nos melhores de Direito se requer a fixação da jurisprudência no 
 sentido dado pelo arestos invocados, considerando desta forma ilegal o n.º 2, do 
 artigo 4.º, do DR 9/88, por violação do artigo 5.º e 6.º, do DL 401/86, 
 revogando em conformidade a decisão recorrida com todos os efeitos legais daí 
 decorrentes.” 
 O Ministério Público, junto do Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no 
 sentido de que o recurso merecia provimento (fls. 114).
 
 3. Por decisão do então Relator de 5 de Fevereiro de 2007, confirmada por 
 acórdão de 2 de Maio de 2007, o Supremo Tribunal Administrativo decidiu conceder 
 provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, julgando procedente a 
 impugnação e anulando a liquidação impugnada na parte derivada da aplicação de 
 taxas superiores às previstas nos artigos 5.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 401/86, 
 de 2 de Dezembro. 
 A decisão do Supremo Tribunal Administrativo assentou no juízo de ilegalidade e 
 de inconstitucionalidade da norma do artigo único do Decreto regulamentar n.º 
 
 9/88, de 3 de Março. Lê-se nesse acórdão, na parte que agora interessa 
 considerar:
 
 “II. A questionada decisão do relator apresenta o seguinte teor integral:
 
  […]‘A questão da ilegalidade do n.° 2 do artigo 4.° do Decreto Regulamentar 
 
 9/88, por violação dos artigos 5.° e 6.°, do Decreto-Lei n.° 401/86, de 2 de 
 Dezembro tem sido apreciada e decidida por esta Secção do Supremo Tribunal 
 Administrativo, de forma reiterada, constante e estável, no mesmo sentido do 
 acórdão fundamento aqui apresentado (e constante de fls. 108 e seguintes). 
 E esse sentido é o de que o n.° 2 do artigo 4.° do Decreto Regulamentar n.° 
 
 75/86, de 30 de Dezembro, na redacção do Decreto Regulamentar n.° 9/88, de 3 de 
 Março, sofre de ilegalidade e de inconstitucionalidade (orgânica e material), 
 por violação do preceituado no n.° 2 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 401/86, de 
 
 2 de Dezembro, e do artigo 112.°, n.° 6, da Constituição da República Portuguesa 
 
 (anterior artigo 115.°, n.° 5). Pelo que, na medida em que se apresente fundada 
 na redacção do Decreto Regulamentar n.° 9/88, a liquidação de contribuições à 
 Segurança Social deve ser objecto de anulação, por inquinada de vício de 
 violação de lei – cf., entre muitos outros, v.g, o acórdão desta Secção do 
 Supremo Tribunal Administrativo, de 29-11-2006, proferido no recurso n.° 751/05. 
 
 
 No caso sub judicio, e consoante suficientemente se retira do probatório, a 
 impugnada liquidação foi operada na base de uma taxa superior àquela que deveria 
 resultar da aplicação ao caso do regime contributivo decorrente do disposto nos 
 artigos 5.º e 6.° do Decreto-Lei n.° 401/86, de 2 de Dezembro, e do n.° 2 do 
 artigo 4.° do Decreto Regulamentar n.° 75/86, de 30 de Dezembro, na redacção 
 anterior ao questionado Decreto Regulamentar n.° 9/88, de 3 de Março. 
 Deste modo, na medida (excessiva) em que foi operada com uma taxa superior à que 
 deflui destes referidos dispositivos legais, a liquidação em questão sofre de 
 vício de violação de lei, determinante da sua anulação. 
 Razão por que deve ser revogada a sentença recorrida que assim o não entendeu. 
 
 3. Termos em que se decide conceder provimento ao recurso, revogando-se a 
 sentença recorrida, julgando-se procedente a impugnação judicial, e anulando-se 
 a liquidação impugnada na parte derivada da aplicação de taxas superiores às 
 previstas nos artigos 5.° e 6.° do Decreto-Lei n.° 401/86 de 2 de Dezembro. 
 Registe e notifique. 
 Sem custas.’ 
 Julgamos dever aqui corroborar, e em síntese, que o n.° 2 do artigo 4.° do 
 Decreto Regulamentar n.° 75/86, de 30 de Dezembro, na redacção dada pelo Decreto 
 Regulamentar n.° 9/88, de 3 de Março, sofre de ilegalidade e de 
 inconstitucionalidade (orgânica e material), por violação do preceituado no n.° 
 
 2 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 401/86, de 2 de Dezembro, e do artigo 112.°, 
 n.° 6, da Constituição da República Portuguesa (anterior artigo 115.°, n.º5). 
 Pelo que, na medida em que se apresente fundada na redacção do Decreto 
 Regulamentar n.° 9/88, a liquidação de contribuições à Segurança Social deve ser 
 objecto de anulação, por inquinada de vício de violação de lei. 
 E, assim, é de confirmar a decisão do recurso pelo relator que, no sobredito 
 sentido, acolhe jurisprudência reiterada e constante. 
 III. Pelos fundamentos nela expostos, acorda-se confirmar a questionada decisão 
 do relator de fls. 140.”
 
 4. Deste acórdão recorreu o Ministério Público para o Tribunal Constitucional, 
 ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal 
 Constitucional, com fundamento na circunstância de, nesse acórdão, “se ter 
 recusado a aplicação, por inconstitucionalidade orgânica e material, da norma do 
 n.º 2 do artigo 4.º do Decreto Regulamentar n.º 75/86 de 30 de Dezembro, na 
 redacção dada pelo Decreto Regulamentar n.º 9/88, de 3 de Março, por violação do 
 artigo 112.º, n.º 6 da Constituição da República Portuguesa” (fls. 155).
 O recurso foi admitido por despacho de fls. 156.
 
 5. Nas alegações (fls. 161 e seguintes), concluiu assim o representante do 
 Ministério Público junto do Tribunal Constitucional:
 
 “1º
 A questão da ilegalidade de certa norma regulamentar, decorrente de o regime 
 nela prescrito colidir com certa norma legal, constante do decreto-lei 
 regulamentado, não se configura como questão de inconstitucionalidade normativa, 
 situada no âmbito dos poderes cognitivos do Tribunal Constitucional – sendo 
 deste modo indiscutível o juízo de ilegalidade formulado pelo Supremo Tribunal 
 Administrativo e que, só por si, dita a anulação do acto tributário impugnado. 
 
 2.º
 E sendo, deste modo, inútil a dirimição da questão de constitucionalidade, 
 subsidiariamente invocada no acórdão recorrido, quanto à mesma norma.” 
 Não houve contra-alegações. 
 Cumpre apreciar e decidir.
 II – Fundamentação 
 
 6. O objecto do presente recurso de constitucionalidade é a norma constante do 
 artigo único do Decreto Regulamentar n.º 9/88, de 3 de Março, na parte em que 
 altera o artigo 4.º do Decreto Regulamentar n.º 75/86, de 30 de Dezembro, 
 aditando-lhe um n.º 2, cuja aplicação foi recusada pelo tribunal recorrido, com 
 fundamento em violação do disposto no artigo 112.º, n.º 6 da Constituição da 
 Republica Portuguesa (anterior artigo 115.º, n.º 5).
 
 É a seguinte a redacção do artigo único do Decreto Regulamentar n.º 9/88, de 3 
 de Março, no segmento que importa considerar:
 
  “Artigo único. Os artigos 4º e 30 do Decreto Regulamentar n.º 75/86, de 30 de 
 Dezembro, passam a ter a seguinte redacção:
 Artigo 4º
 Actividades equiparadas a actividades agrícolas
 
 1 – Para efeitos do presente diploma, as actividades e explorações de 
 silvicultura, pecuária, horto-fruticultura, floricultura, avicultura e 
 apicultura, ainda que a terra tenha uma função de mero suporte de instalações, 
 são equiparadas a actividades e explorações agrícolas.
 
 2 – Não se consideram explorações agrícolas para os efeitos deste diploma as que 
 se destinem essencialmente à produção de matérias-primas para indústrias 
 transformadoras que constituam, em si mesmas, objectivos dessas empresas.
 
 […].”
 
 7. Nas alegações que apresentou neste Tribunal, o Ministério Público, ora, 
 Recorrente, coloca o problema de saber se tem utilidade a resolução da questão 
 de constitucionalidade submetida no presente recurso, afirmando que, qualquer 
 que fosse a decisão do Tribunal Constitucional sobre essa questão de 
 constitucionalidade, “sempre subsistiria incólume o juízo de «ilegalidade» que 
 ditou a anulação do acto tributário impugnado”, invocando, para tanto, o Acórdão 
 
  n.º 513/2006, deste Tribunal, disponível em www.tribunalconstitucional.pt, que 
 julgou questão estritamente idêntica à suscitada nos presentes autos.
 
 8. Para que o Tribunal Constitucional possa conhecer do objecto de um recurso de 
 constitucionalidade necessário se torna que a resolução da correspondente 
 questão de constitucionalidade apresente utilidade, ou seja, que de algum modo 
 se repercuta no sentido da decisão recorrida.
 A exigência de tal utilidade estende-se aos recursos interpostos ao abrigo da 
 alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (como é o 
 caso do presente recurso): é o que resulta, por exemplo, do Acórdão n.º 385/95, 
 de 27 de Junho (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), no qual estava em 
 causa a apreciação de um recurso com esse fundamento e em que o Tribunal 
 Constitucional, para concluir pelo não conhecimento do objecto do recurso, 
 partiu da seguinte orientação:
 
  […] os recursos de constitucionalidade desempenham uma função instrumental, 
 pelo que só se justifica que deles se conheça, se a sua decisão puder 
 repercutir-se utilmente sobre a questão que constitui objecto do processo de que 
 emerge o recurso.”
 No acórdão recorrido, o Supremo Tribunal Administrativo considerou que, além de 
 inconstitucional, é “ilegal o artigo único do decreto regulamentar n.º 9/88, de 
 
 3 de Março, no segmento em que, acrescentando um n.º 2 ao artigo 4º do decreto 
 regulamentar n.º 75/86, de 30 de Dezembro, o fez em contrariedade com o disposto 
 nos artigos 5º e 6º do decreto-lei n.º 401/86, de 2 de Dezembro.” 
 Ora, o Tribunal Constitucional não tem competência para sindicar a questão de 
 ilegalidade suscitada pelo Supremo Tribunal Administrativo, nem, de qualquer 
 modo, tal questão constitui objecto do presente recurso, como, aliás, resultou 
 decidido também no citado Acórdão n.º 513/2006, de 26 de Setembro
 Assim, qualquer que fosse a posição do Tribunal Constitucional sobre a 
 conformidade constitucional do artigo único do Decreto Regulamentar n.º 9/88, de 
 
 3 de Março, sempre o Tribunal recorrido manteria a sua decisão no sentido de 
 conceder provimento ao recurso de que lhe cumpria conhecer – julgando procedente 
 a correspondente impugnação judicial –, com fundamento no vício da ilegalidade 
 da mesma norma. 
 
 9. Conclui-se deste modo que a resolução da questão de constitucionalidade 
 submetida ao Tribunal Constitucional não apresenta qualquer utilidade, pelo que 
 não pode se conhecer do objecto do presente recurso.
 III – Decisão
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide 
 não tomar conhecimento do objecto do presente recurso.
 Sem custas.
 Lisboa, 14  de Novembro  de 2007
 José Borges Soeiro
 Gil Galvão
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Maria João Antunes
 Rui Manuel Moura Ramos