 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 554/06
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I. Relatório
 
 1.Nos presentes autos, emergentes de um processo de falência em que era 
 requerida A. L.d.ª e requerente o Ministério Público foi, em 6 de Abril de 2006, 
 proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Évora, que recusou a aplicação das 
 normas dos artigos 31.º, n.º 5, alínea b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de 
 Dezembro, e 486.º-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, na medida em que 
 determinam que, havendo decisão negativa do serviço de segurança social, quanto 
 a pedido de apoio judiciário, o pagamento da taxa de justiça inicial do processo 
 judicial a que se referia esse pedido deve efectuar-se no prazo de 10 dias a 
 contar da notificação dessa decisão, com fundamento na sua 
 inconstitucionalidade. Consequentemente, o referido acórdão concedeu provimento 
 ao recurso interposto pela requerida e revogou o despacho de 2 de Novembro de 
 
 2004 do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Almeirim que determinara o pagamento 
 da taxa de justiça inicial antes da decisão do recurso da decisão denegatória de 
 apoio judiciário, e condenara a agravante em multa. Pode ler-se nesse aresto:
 
 «(...)
 A questão central do presente recurso consiste em saber se a agravante procedeu 
 ao pagamento da taxa de justiça inicial fora de prazo e se, consequentemente, 
 está obrigada ao pagamento da multa cominada pelo atraso. 
 Os factos a atender para o conhecimento e decisão do objecto do recurso são os 
 que se deixaram anteriormente extractados. 
 Vejamos, então: 
 A Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, vigente ao tempo da formulação do pedido 
 de apoio judiciário, atribuiu aos serviços de segurança social a competência 
 para proferir decisão administrativa sobre a matéria, impugnável, no caso de 
 indeferimento, para os tribunais judiciais (art.º 29.°). 
 Assim, no que respeita ao réu ou requerido na acção, se não houver ainda decisão 
 administrativa no momento em que deva ser efectuado o pagamento das custas e 
 encargos do processo, fica suspenso o respectivo prazo, até que a decisão seja 
 comunicada ao requerente – art.º 31.º, n.º 5, al. b). 
 No entanto, se já houver decisão negativa do serviço de segurança social, o 
 pagamento é devido desde a data da sua comunicação ao requerente do apoio 
 judiciário, de acordo com o disposto no Código das Custas Judiciais, sem 
 prejuízo do posterior reembolso das quantias pagas no caso de procedência do 
 recurso interposto daquela decisão – art.º 31.°, n.º 5, al. b). 
 Também o n.º 2 do artigo 486.°-A do CPC determina que o réu proceda ao pagamento 
 da taxa de justiça inicial no prazo de 10 dias a contar da notificação da 
 decisão que indefira o pedido de apoio judiciário. 
 Na falta de pagamento, é condenado em multa, de acordo com os n.ºs 3, 4 e 5 do 
 art.º 486.°-A, sendo depois mandada desentranhar a contestação, se persistir na 
 omissão do pagamento (n.º 6). 
 No caso em apreciação, a agravante não liquidou a taxa de justiça inicial no 
 prazo do n.º 2 do art.º 486.°-A do CPC, nem a multa, procedendo apenas ao 
 pagamento da taxa de justiça inicial após a decisão do Tribunal que lhe concedeu 
 o beneficio judiciário na modalidade de dispensa parcial (50%) do pagamento da 
 taxa de justiça e demais encargos.
 Por isso, a questão do desentranhamento da oposição, no processo de falência, 
 não chegou a colocar-se. 
 No entanto, a conjugação do regime do art.º 31.°, n.º 5, al. b), da Lei n.º 
 
 30-E/2000, de 20 de Dezembro, com o regime impositivo do n.º 2 do art.º 486.º-A 
 do CPC, na redacção do Dec.-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, ao tornar 
 exigível o pagamento da taxa de justiça inicial antes de julgado o recurso 
 judicial do despacho administrativo que indeferiu o pedido de apoio judiciário 
 relativo à dispensa total de taxa de justiça e demais encargos, viola de modo 
 intolerável o disposto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, que enuncia o 
 princípio do acesso ao direito e aos tribunais, impedindo a denegação de justiça 
 por insuficiência de meios económicos. 
 O que obsta a que seja aceitável que a decisão dos serviços da segurança social, 
 não definitiva, obrigue o requerente do apoio judiciário, carenciado 
 economicamente para fazer face às despesas do processo, a despender o montante 
 da taxa de justiça inicial nos 10 dias subsequentes à comunicação do 
 indeferimento da decisão administrativa, impossibilitando ou dificultando em 
 grau intolerável o efectivo acesso ao tribunal. 
 Por outro lado, o direito ao reembolso das quantias pagas no caso de procedência 
 do recurso interposto da decisão administrativa que denegou o apoio judiciário 
 
 (art.º 31.º, n.º 5, al. b), parte final), não constitui solução adequada ou, 
 sequer, satisfatória, pois não pode exigir-se a quem invoca insuficiência 
 económica que pague em momento anterior à da apreciação definitiva do recurso da 
 decisão administrativa. 
 Assim, acorda-se em desaplicar, por inconstitucionalidade material, as normas 
 dos artigos 31.°, n.º 5, al. b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 
 
 486.°-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, no segmento em que se determina 
 que, havendo decisão negativa do serviço de segurança social, o pagamento da 
 taxa de justiça inicial deve efectuar-se no prazo de 10 dias a contar da 
 notificação dessa decisão. 
 E, em consequência, conceder provimento ao agravo, embora por razões distintas 
 das alegadas, revogando-se o despacho que determinou o pagamento da taxa de 
 justiça inicial antes da decisão do recurso judicial e condenou a agravante em 
 multa. 
 Não são devidas custas (art.º 2.°, n.º 1, al. g), do CCJ).»
 Dessa decisão interpôs o Ministério Público recurso para o Tribunal 
 Constitucional, previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, para obter a 
 reapreciação da conformidade constitucional daquela norma.
 
 2.Admitido o recurso, foi determinada a produção de alegações que o 
 representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional encerrou 
 desta forma:
 
 «1 – O direito de acesso à justiça e aos tribunais constitui direito fundamental 
 que não pode ser afectado, na sua plenitude e efectividade, por uma situação de 
 carência económica do interessado, cabendo sempre ao tribunal – e não a uma 
 entidade administrativa – a ‘última palavra’ sobre a verificação dos 
 pressupostos do apoio judiciário pretendido pelo requerente que se não conforme 
 com a decisão negativa dos serviços de Segurança Social.
 
 2 – É inconstitucional, por violação do n.º 1 do artigo 20.º da Constituição da 
 República Portuguesa, a interpretação normativa, extraída dos artigos 31.º, n.º 
 
 5, alínea b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 486.º-A, n.º 2, do 
 Código de Processo Civil, segundo a qual é devido o pagamento da taxa de justiça 
 inicial nos 10 dias subsequentes à notificação da decisão negativa da Segurança 
 Social sobre o pretendido apoio judiciário, mesmo na pendência de impugnação 
 judicial de tal decisão, e sendo a ‘mora’ da parte sancionada, nos termos do 
 artigo 486.º-A, do Código de Processo Civil, nomeadamente, através da imposição 
 ao interessado de uma multa processual, independentemente da procedência (total 
 ou parcial) dessa impugnação judicial.»
 A recorrida não contra-alegou.
 Cumpre apreciar e dedicir.
 II. Fundamentos
 
 3.Com efeito, é a seguinte a redacção do artigo 31.°, n.º 5, alínea b), da Lei 
 n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro: 
 
 “Artigo 31.º
 
 (…)
 
 5 — Verificando-se que no momento em que deva ser efectuado o pagamento das 
 custas e encargos do processo judicial a que se refere o pedido de apoio 
 judiciário não é ainda conhecida a decisão final quanto a este, proceder-se-á do 
 seguinte modo:
 
 (…)
 b) Tendo havido já decisão negativa do serviço de segurança social, o pagamento 
 
 é devido desde a data da sua comunicação ao requerente, de acordo com o disposto 
 no Código das Custas Judiciais, sem prejuízo do posterior reembolso das quantias 
 pagas no caso de procedência do recurso interposto daquela decisão.”
 Por sua vez, o artigo 486.°-A, n.º 2, do Código de Processo Civil dispõe como se 
 segue:
 
 “Artigo 486.º-A 
 
 (Documento comprovativo do pagamento de taxa de justiça)
 
 (…)
 
 2. No caso previsto na parte final do número anterior, o réu deve juntar ao 
 processo o documento comprovativo do prévio pagamento de taxa de justiça inicial 
 no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão que indefira o pedido de 
 apoio judiciário.
 
 (…).”
 A decisão recorrida recusou expressamente, por inconstitucionalidade, a 
 aplicação dos transcritos preceitos quando comportem um sentido interpretativo 
 de acordo com o qual é devido o pagamento da taxa de justiça inicial nos 10 dias 
 subsequentes à notificação da decisão negativa do serviço de segurança social 
 sobre o pedido de apoio judiciário, mesmo na pendência de recurso interposto de 
 tal decisão.
 Por outro lado, como sublinha o Ministério Público nas suas alegações, na 
 presente aferição da compatibilidade constitucional está igualmente em causa a 
 dimensão normativa tocante ao regime sancionatório estatuído nos n.ºs 3, 4 e 5 
 do artigo 486.º-A do CPC, tendo havido recusa implícita de aplicação da 
 imposição do pagamento da multa aí prevista e associada ao atraso no pagamento 
 da taxa de justiça inicial, em consequência da recusa de aplicação normativa do 
 regime previsto nos artigos 31.°, n.º 5, alínea b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 
 de Dezembro, e 486.°-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, com o sentido 
 interpretativo atrás enunciado.
 
 É o seguinte o teor dos  n.ºs 3, 4 e 5 do artigo 486.º-A do CPC:
 
 “(…)
 
 3. Na falta de junção do documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça 
 no prazo de 10 dias a contar da apresentação da contestação, a secretaria 
 notifica o interessado para, em 10 dias, efectuar o pagamento omitido, com 
 acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 
 UC. 
 
 4. Após a verificação, por qualquer meio, do decurso do prazo referido no n.º 2, 
 sem que o documento aí mencionado tenha sido junto ao processo, a secretaria 
 notifica o réu para os efeitos previstos no número anterior. 
 
 5. Findos os articulados e sem prejuízo do prazo concedido no n.º 3, se não 
 tiver sido junto o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça 
 inicial e da multa por parte do réu, o juiz profere despacho nos termos da 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 508.º, convidando o réu a proceder, no prazo de 10 
 dias, ao pagamento da taxa de justiça e da multa em falta, acrescida de multa de 
 valor igual ao da taxa de justiça inicial, com o limite mínimo de 10 UC.
 
 (…).”
 Sendo assim, a dimensão normativa que integra o objecto do presente recurso pode 
 ser precisada como sendo a correspondente à interpretação dos artigos 31.°, n.º 
 
 5, alínea b), da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 486.°-A, n.ºs 2, 3, 4 e 
 
 5 do Código de Processo Civil, segundo a qual é devido o pagamento da taxa de 
 justiça inicial nos 10 dias subsequentes à notificação da decisão negativa do 
 serviço de segurança social sobre o pedido de apoio judiciário, mesmo na 
 pendência de recurso interposto de tal decisão, sendo o atraso no pagamento 
 cominado com multa.
 
 4.Segundo a interpretação adoptada pelo Tribunal a quo, a fixação de um efeito 
 não suspensivo para o recurso jurisdicional da decisão administrativa que 
 indeferiu o pedido de apoio judiciário viola o disposto no artigo 20.º, n.º 1, 
 da Constituição, que enuncia o princípio do acesso ao direito e aos tribunais, 
 implicando uma denegação de justiça por insuficiência de meios económicos, 
 decorrente da exigibilidade do pagamento da taxa de justiça inicial desde a data 
 da comunicação daquela decisão ao requerente.
 Vejamos se tal conclusão é de acompanhar.
 Sobre o direito fundamental consagrado no artigo 20.º da Constituição disse-se 
 recentemente no Acórdão n.º 602/2006 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt):
 
 «[…]
 Está constitucionalmente consagrado o princípio de que a todos é assegurado o 
 acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente 
 protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios 
 económicos (cfr. artigo 20.º, n.º 1, da Lei Fundamental).
 Variada tem sido a jurisprudência deste Tribunal emitida a respeito de um tal 
 princípio.
 Assim, e sempre enfrentando problemas em torno de normas (ou interpretações 
 normativas) de onde resulte uma impossibilidade ou uma acentuada dificuldade de 
 acesso à justiça motivada pela obrigação de pagamento de determinadas quantias 
 condicionadoras do exercício do acesso ao direito e aos tribunais, têm sido 
 múltiplos os juízos formulados a este respeito por este órgão de administração 
 de justiça.
 O fio condutor dessa jurisprudência, que não tem deixado de sublinhar que a 
 garantia que decorre do n.º 1 do art.º 20.º do Diploma Básico não pode ser 
 perspectivada como «uma mera ou simples afirmação proclamatória», poderá ser 
 condensado nas palavras utilizadas no Acórdão n.º 30/88 (in Diário da República, 
 I Série, de 10 de Fevereiro de 1988), citando o Parecer n.º 8/87 da Comissão 
 Constitucional, e segundo as quais a Constituição deveria ter-se “por violada 
 sempre que, por insuficiência de tais meios, o cidadão pudesse ver frustrado o 
 seu direito à justiça, tendo em conta o sistema jurídico‑económico em vigor para 
 o acesso aos tribunais na ordem jurídica portuguesa”, pois que aquele diploma 
 fundamental “indo além do mero reconhecimento de uma igualdade formal no acesso 
 aos tribunais”, propõe-se “afastar neste domínio a desigualdade real nascida da 
 insuficiência de meios económicos, determinando expressamente que tal 
 insuficiência não pode constituir motivo para denegação da justiça”.
 
 […].»
 Anteriormente, escreveu-se no Acórdão n.º 491/2003 (igualmente disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt):
 
 «[…]
 Como já tem sido reafirmado por várias vezes por este Tribunal, a nossa Lei 
 Fundamental não consagra o direito a uma justiça gratuita. Ao legislador 
 ordinário é lícito exigir o pagamento de custas judiciais, podendo optar por um 
 sistema de custas mais barato ou mais caro ou conceder o benefício do apoio 
 judiciário em termos mais ou menos generosos. Ponto é que, no delineamento do 
 sistema de custas judiciais, se não torne impossível ou particularmente oneroso 
 o direito de acesso aos tribunais, sob pena de violação deste direito 
 fundamental consagrado no art.º 20.º da CRP. 
 Tal baliza funciona como limite à restrição constitucionalmente permitida de tal 
 direito ou garantia fundamental, de acordo com o disposto no art.º 18.º, n.os 2 
 e 3 da CRP (cf., entre outros, os acórdãos n.os 352/91, 467/91 e 646/98, 
 publicados no D. R. II Série, respectivamente, de 17 de Dezembro de 1991, 2 de 
 Abril de 1992 e 3 de Março de 1999).
 
 […]».
 Sobre o tema afirmou-se também já no Acórdão n.º 467/91 (publicado no Diário da 
 República, II Série, de 2 de Abril de 1992) que a garantia constitucional do 
 acesso ao direito e aos tribunais possui uma dupla dimensão: uma dimensão de 
 defesa (defesa dos direitos através dos tribunais); e uma dimensão 
 
 “prestacional” (dever de o Estado assegurar meios tendentes a evitar a denegação 
 da justiça por insuficiência de meios económicos). Acrescentou-se de seguida que 
 essa irredutível dimensão de defesa da tutela jurisdicional dos direitos postula 
 soluções legislativas que assegurem um acesso igual e efectivo aos tribunais, 
 impedindo o legislador de adoptar soluções de tal modo onerosas que impeçam o 
 cidadão médio de aceder à justiça e obrigando-o a assegurar às pessoas 
 economicamente carenciadas formas de apoio que viabilizem a salvaguarda dos seus 
 direitos.
 Encarando o problema da conformidade constitucional da previsão do efeito do 
 desentranhamento da alegação apresentada e da impossibilidade de apreciação 
 jurisdicional da impugnação da decisão administrativa sobre a concessão de apoio 
 judiciário, uma vez verificada a falta do pagamento da taxa de justiça inicial, 
 o Acórdão n.º 420/2006 (também disponível em www.tribunalconstitucional.pt) veio 
 a julgar inconstitucionais as normas dos artigos 6.º, n.º 1, alínea o), 14.º, 
 n.º 1, alínea a), 23.º, n.º 1, 24.º, n.º 1, alínea c), 28.º e 29.º do Código das 
 Custas Judiciais, na redacção emergente do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de 
 Dezembro, quando interpretadas no sentido de que a impugnação judicial da 
 decisão administrativa sobre a concessão de apoio judiciário não está dispensada 
 do pagamento prévio da taxa de justiça inicial, calculada com referência ao 
 valor da causa principal, e determinando a omissão do pagamento o 
 desentranhamento da alegação apresentada e a preclusão da apreciação 
 jurisdicional da impugnação deduzida. Para chegar a tal conclusão, ponderou-se o 
 seguinte:
 
 “Na verdade, se a resolução da questão da insuficiência de meios económicos para 
 suportar os custos de um processo estiver, ela própria, condicionada ao 
 pagamento de uma taxa de justiça prévia, imperioso se torna concluir que os 
 requerentes de apoio judiciário que não possuam tais meios – e não pode 
 obviamente excluir-se a hipótese de existirem requerentes nessa situação, a quem 
 a Administração indevidamente negou o apoio judiciário – nunca têm acesso aos 
 tribunais, quer para discutir o acerto da decisão administrativa que lhes 
 indeferiu o pedido de apoio judiciário, quer para, em última análise, 
 sustentarem em juízo as suas pretensões.”
 Todavia, como salienta o Ministério Público nas suas alegações,
 
 «No caso ora em apreciação – e face ao teor do acórdão recorrido – não estará em 
 causa a produção de um efeito preclusivo (acentua-se expressamente que está fora 
 de questão o “desentranhamento da oposição” deduzida em processo de falência) – 
 apenas podendo conduzir a situação de “mora” no pagamento da taxa de justiça 
 inicial à imposição da multa já oportunamente liquidada nos autos, como 
 decorrência de não ter sido paga atempadamente a taxa de justiça inicial 
 correspondente à dedução de oposição à falência. 
 Ou seja: estará em causa, não propriamente uma preclusão processual – 
 consistente em denegar relevância ao acto processual de oposição praticado, com 
 base no não pagamento da taxa de justiça inicial que seria devida, mesmo na 
 pendência da impugnação judicial inserida no procedimento de apoio judiciário – 
 mas antes o sancionamento ou cominação de ordem tributária, associada a tal 
 situação de “mora”. 
 Note-se que, neste circunstancialismo, não se discute apenas a mera 
 exigibilidade antecipada do débito de custas, mas a legitimidade da imposição a 
 quem alega estar em situação de carência económica, questionando fundadamente a 
 decisão administrativa que a não reconheceu, de uma verdadeira sanção pecuniária 
 pelo não pagamento tempestivo da taxa de justiça inicial correspondente à 
 actividade processual desenvolvida pelo interessado.»
 Esta diferença não altera, porém, para o Ministério Público, o juízo a fazer 
 sobre a conformidade constitucional da norma, que entende ser igualmente de 
 inconstitucionalidade:
 
 «E é precisamente este quadro ou natureza sancionatória da multa processual que 
 nos parece incompatível com a plenitude do direito de acesso aos tribunais, 
 exercido necessariamente sem os constrangimentos decorrentes de uma possível 
 situação de carência económica da parte (aliás, em parte verificada 
 supervenientemente pelo tribunal): o carácter desproporcionado deste 
 sancionamento decorre, desde logo, da circunstância de o mecanismo do “direito 
 ao reembolso” das quantias pagas, previsto no citado artigo 29.º, n.º 5, alínea 
 b), não se configura como solução plenamente idónea e adequada, não abrangendo 
 possivelmente o valor cominado a título de multa processual e que o interessado 
 normalmente teria de satisfazer, sob pena de acabar por incorrer nas preclusões 
 processuais previstas para o incumprimento da sanção “tributária” inicialmente 
 imposta: assente que a obrigação de pagar a taxa de justiça inicial vincula 
 legitimamente a parte, devendo ser satisfeita nos 10 dias subsequentes à 
 notificação do indeferimento administrativo, é manifesto que a “causa” de tal 
 multa sempre seria de imputar a um comportamento voluntário da parte, nada 
 tendo, portanto, a ver com a restituição de quantias adiantadas a título de 
 custas por quem, afinal, por decisão judicial, se veio a verificar estar isento 
 ou dispensado do seu pagamento.»
 
 5.Com efeito, não pode deixar de se concordar com os termos da decisão 
 recorrida, no sentido da inconstitucionalidade, por violação do direito de 
 acesso ao direito e aos tribunais, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da 
 Constituição, da interpretação normativa dos artigos 31.°, n.º 5, alínea b), da 
 Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 486.°-A, n.ºs 2, 3, 4 e 5 do Código de 
 Processo Civil, segundo a qual é devido o pagamento da taxa de justiça inicial 
 nos 10 dias subsequentes à notificação da decisão negativa do serviço de 
 segurança social sobre o pedido de apoio judiciário, mesmo na pendência de 
 recurso interposto de tal decisão, sendo o atraso de pagamento sancionado com 
 multa.
 A garantia consagrada no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição impõe que o acesso 
 aos tribunais não seja vedado em função da condição económica das pessoas 
 
 (singulares e colectivas). É, porém, isto o que sucede quando a lei constrange a 
 parte em situação de insuficiência económica, e que interpôs recurso da decisão 
 negativa do serviço de segurança social, a pagar uma multa unicamente porque não 
 tem meios económicos para pagar logo a taxa de justiça inicial correspondente à 
 sua actividade processual.
 Para a conclusão de que a dimensão normativa assinalada viola o direito de 
 acesso aos tribunais consagrado naquele normativo da Lei Fundamental não pode 
 deixar, também de se ter presente o quantitativo concreto da taxa de justiça 
 devida – e em parte já paga, depois da decisão do Tribunal que concedeu o 
 benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa parcial (50%) do 
 pagamento da taxa de justiça e demais encargos) –, calculada com base no (novo e 
 elevado) valor atribuído à acção (de € 256.211, 01), bem como da multa exigida, 
 de € 890,00 (fl. 161 dos autos) e de  € 2.136,00 (fl. 162 dos autos), montantes 
 que podem ter como efeito impedir o recurso ao tribunal por parte de interessado 
 desprovido de condições económicas que lhe permitam efectuar o respectivo 
 pagamento.
 Admite-se que o direito a aceder ao tribunal para dele obter a solução jurídica 
 de uma situação de conflitualidade não impõe uma única solução do regime do 
 apoio judiciário, equacionável em termos rígidos. Mas a expectativa inicial do 
 provável “custo” da iniciativa, pela multa em que se pode ser condenado mesmo 
 tendo direito a apoio judiciário, é elemento de dissuasão da parte em situação 
 de insuficiência económica, podendo configurar-se como encargo impeditivo do 
 acesso ao tribunal a exigência de pagamento da taxa de justiça inicial logo nos 
 
 10 dias subsequentes à notificação da decisão negativa do serviço de segurança 
 social sobre o pedido de apoio judiciário, mesmo na pendência de recurso 
 interposto de tal decisão, e sendo o atraso no pagamento cominado com multa.
 Interessa, ademais, considerar que o “direito ao reembolso” das quantias pagas 
 no caso de procedência do recurso interposto da decisão negativa do serviço de 
 segurança social, previsto no artigo 31.°, n.º 5, alínea b), da Lei n.º 
 
 30-E/2000, de 20 de Dezembro, não abrangerá, possivelmente, o valor cominado a 
 título de multa, como bem salienta o Ministério Público nas suas alegações. Isto 
 mesmo se afirmou no Acórdão n.º 197/2006 (também disponível no sítio da Internet 
 
 www.tribunalconstitucional.pt):
 
 «[…]
 O facto de o interessado beneficiar de apoio judiciário não o dispensa do 
 pagamento das multas processuais que sejam condição de validade dos actos 
 praticados com inobservância dos prazos peremptórios, a que se refere o artigo 
 
 145.º do CPC. Efectivamente, como se afirma no acórdão n.º 17/91, publicado no 
 Boletim do Ministério da Justiça, n.º 404 (cfr. também, além do acórdão citado 
 no despacho reclamado, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Março 
 de 1994, Colectânea de Jurisprudência – Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, 
 ano II, tomo I, pág. 167), essa multa não cabe no conceito legal de custas 
 
 (artigo 1.º e artigo 74.º do Código das Custas Judiciais), nem está abrangida no 
 elenco de benefícios do apoio judiciário (artigo 15.º da Lei n.º 30-E/2000, de 
 
 20 de Dezembro).
 
  Contra este entendimento não milita o elemento teleológico de interpretação da 
 lei, nem o princípio da interpretação conforme à Constituição, designadamente o 
 direito de acesso aos tribunais e o direito a um processo equitativo (artigo 
 
 20.º, n.ºs 1 e 4, da Constituição). Uma vez obtida a concessão do apoio 
 judiciário, traduzido na dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o 
 processo, a parte com insuficiência económica não pode considerar-se impedida, 
 por causa dessa insuficiência, de defender judicialmente os seus direitos e 
 interesses legalmente protegidos. E fica colocada no mesmo plano de igualdade 
 que o interessado que possa suportar esses pagamentos. Ambas têm de se submeter 
 
 às regras processuais, nomeadamente quanto a prazos, só podendo praticar o acto 
 fora de prazo em caso de justo impedimento ou com multa. É certo que, no plano 
 fáctico, a multa pesa diferentemente em função da situação económica de quem a 
 suporta. Mas a multa é consequência da inobservância do prazo, pelo que, suposta 
 a razoabilidade deste, a parte se queixará de si própria. Resquício de objecções 
 que possam subsistir – e só poderão emanar de considerações relativas ao direito 
 a um processo equitativo, na vertente do princípio da igualdade – são corrigidas 
 pelo n.º 7 do artigo 145.º do CPC.
 
 […]».
 Estando constitucionalmente consagrado o princípio de que a todos é assegurado o 
 acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente 
 protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios 
 económicos, é patente que se a parte for considerada – como acabou por acontecer 
 no caso de onde emergiu o vertente recurso – como estando numa situação 
 económica tal que lhe não permita custear (pelo menos a totalidade das) despesas 
 processuais, a dimensão normativa em causa vai, em verdade, actuar como um 
 obstáculo ao acesso ao tribunal, vendo-se o interessado privado de praticar o 
 acto processual por insuficiência de meios económicos.
 
 6.Pelo que se expôs, é de concluir que a dimensão normativa cuja aplicação foi 
 recusada pela decisão recorrida, extraída dos artigos 31.°, n.º 5, alínea b), da 
 Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 486.°-A, n.ºs 2, 3, 4 e 5 do Código de 
 Processo Civil, segundo a qual é devido o pagamento da taxa de justiça inicial 
 nos 10 dias subsequentes à notificação da decisão negativa do serviço de 
 segurança social sobre o pedido de apoio judiciário, mesmo na pendência de 
 recurso interposto de tal decisão, e sendo o atraso no pagamento sancionado com 
 multa, não garante o acesso aos tribunais por parte daquele que carece de meios 
 económicos suficientes para suportar os encargos inerentes ao desenvolvimento do 
 processo judicial, designadamente taxa de justiça e multa.
 Conclui-se, assim, que é inconstitucional a dimensão normativa cuja aplicação 
 foi recusada na decisão recorrida, por ofensa da garantia de não denegação de 
 justiça por insuficiência de meios económicos, prevista no artigo 20º, n.º 1, da 
 Constituição.
 III. Decisão
 Com estes fundamentos, o Tribunal Constitucional decide:
 a)        Julgar inconstitucional, por violação do artigo 20.º, n.º 1, da 
 Constituição, a norma que resulta dos artigos 31.°, n.º 5, alínea b), da Lei n.º 
 
 30-E/2000, de 20 de Dezembro, e 486.°-A, n.ºs 2, 3, 4 e 5 do Código de Processo 
 Civil, na interpretação segundo a qual é devido o pagamento da taxa de justiça 
 inicial nos 10 dias subsequentes à notificação da decisão negativa do serviço de 
 segurança social sobre o respectivo pedido de apoio judiciário, mesmo na 
 pendência de recurso interposto de tal decisão, e sendo o atraso no pagamento 
 sancionado com multa processual.
 b)        Por conseguinte, confirmar o juízo de inconstitucionalidade constante 
 da decisão recorrida, negando provimento ao recurso.
 
  
 Lisboa, 8 de Março de 2007
 Paulo Mota Pinto
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Rodrigues
 Maria Fernanda Palma
 Rui Manuel Moura Ramos