 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 928/08
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
  
 Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 I – Relatório
 
 1. A., S.A, inconformada com a decisão sumária proferida a 13 de Janeiro de 2009 
 que determinou o não conhecimento do recurso de constitucionalidade que havia 
 interposto, vem dela reclamar nomeadamente nos seguintes termos:
 
 “1. A aliás douta decisão que justifica a presente reclamação fundamenta-se na 
 insusceptibilidade do recurso ‘produzir reflexo útil nos autos’, já que o 
 Supremo Tribunal de Justiça teria o entendimento de que ‘a decisão de facto se 
 encontra convenientemente motivada’, o que precludiria a aplicação dos 
 normativos constantes nos n.ºs 5 e 6 do art.° 712.° do Código do Processo Civil, 
 e não daria espaço para a apreciação da inconstitucionalidade invocada pela 
 recorrente. 
 
 2. A recorrente suscitou perante o Tribunal Constitucional as seguintes duas 
 questões: 
 a) A inconstitucionalidade da norma contida no n.° 6 do art.° 712.° do Código do 
 Processo Civil, quando interpretada no sentido de que está vedado ao Supremo 
 Tribunal de Justiça sindicar a decisão do Tribunal de Relação que não ordena a 
 remessa do processo à 1.ª Instância com base na alegada impossibilidade de obter 
 do Juiz da causa a fundamentação em falta 
 b) A inconstitucionalidade da norma contida no segundo segmento do n.° 5 do 
 art.° 712.° do mesmo diploma, de acordo com a qual, havendo impossibilidade de o 
 Juiz da causa fundamentar a decisão sobre a matéria de facto, basta que 
 justifique a razão dessa impossibilidade, permanecendo assim infundamentada 
 aquela decisão. 
 
 3. O Supremo Tribunal de Justiça entendeu que nenhuma das apontadas 
 inconstitucionalidades se verifica na medida em que, citamos, ‘a garantia da via 
 judiciária não envolve, necessariamente, o direito a um duplo grau de 
 jurisdição’, sendo ‘manifesto que a interpretação dada no art.° 712.°, n.° 6 — 
 de modo a que nele se inclui a decisão da Relação nos termos do seu precedente 
 n.° 5 — não afronta o texto Fundamental’ e que, “afirmada a irrecorribilidade do 
 segmento decisório que, interpretando e aplicando aquele art.° 712.° n.° 5, 
 decide a questão da alegada omissão motivatória das respostas negativas, 
 prejudicado se mostra o conhecimento desta específica inconstitucionalidade’ 
 
 (cit. Aresto). 
 
 4. Por aqui se julga, salvo o devido respeito e que é muito pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça, haver fundamento para a intervenção e juízo do Tribunal 
 Constitucional: trata-se de apreciar se a interpretação acolhida por aquele alto 
 Tribunal indicados se adequa ou não com a Constituição da República Portuguesa. 
 
 5. Todavia, o Supremo Tribunal de Justiça não deixou de referir, adicionalmente, 
 que, ‘no caso dos autos, a instância com poder para decidir a matéria de facto 
 fundamentou devidamente as respostas de conteúdo negativo: reportamo-nos ao 
 Acórdão em conferência da Relação, que completou a fundamentação emergente do 
 seu primitivo Acórdão’; e que ‘embora não totalmente oriunda da 1.ª instância, a 
 decisão fáctica proferida nos autos mostra-se convenientemente motivada, em 
 conformidade com o que prescrevem os arts. 563.° n.° 2 do C.P.C. e 205.° n.° 1 
 da Constituição”. Ora, 
 
 6. O Acórdão (da Relação do Porto) que importa ter presente nesta matéria é o 
 que julga a apelação e não o que se debruça sobre a invocada nulidade. Com 
 efeito, e conforme se pode ver dos autos, 
 
 7. A deficiente fundamentação da matéria de facto não provada sustentou duas 
 decisões do mesmo Tribunal e que não são, salvo o devido respeito e com muito 
 modesta opinião, coerentes. 
 
 8. O Tribunal da Relação do Porto proferiu uma primeira decisão sobre a nulidade 
 invocada em separado pela recorrente (em obediência ao preceituado no Código de 
 Processo do Trabalho), na qual, admitindo haver dúvidas quanto à fundamentação 
 das respostas negativas aos quesitos, substituiu-se ao Tribunal de 1.ª Instância 
 na repetição do acto nulo. Ora, 
 
 9. Não há norma que permita ao tribunal ad quem, perante o qual não foi feita a 
 prova, substituir-se ao tribunal a quo na repetição do acto nulo. 
 
 10. A recorrente suscitou também essa questão nas alegações de revista, tendo o 
 Tribunal da Relação, ignorando o primeiro Aresto, julgado o caso fora do quadro 
 das nulidades e optado por lançar mão no art.° 712.°, n.° 5, do CPC. 
 
 11. Posto isto, pode extrair-se a conclusão de que o Tribunal da Relação do 
 Porto, tendo na sua posse todos os elementos necessários para conhecer da 
 nulidade e da restante motivação da apelação, quis proferir sobre aquela questão 
 a decisão comunicada no segundo Aresto, isto é na que decidiu a apelação. 
 
 12. De outro modo, estaríamos a admitir que um tribunal pudesse julgar a mesma 
 questão de modo diferente: uma vez suprindo a falta acometida à 1.ª Instância; 
 noutra, constatando a ascensão do Senhor Juiz da causa ao quadro de Juízes desse 
 próprio Tribunal, invocando, em nome deste, a impossibilidade prevista e 
 regulada no segundo segmento do n.° 5 do art.° 712.° do CPC. 
 
 13. Parece, em função dos princípios gerais de direito, que o primeiro Aresto, 
 porque fundamentando em nome de outrem (o juiz da causa) as respostas de teor 
 negativo dadas aos quesitos, não apenas não deve prevalecer sobre o segundo, 
 que, conhecendo do pedido, e ignorando aquele primeiro Aresto, se acolhe numa 
 dada interpretação do segundo segmento do n.° 5 do art.° 712.° do CPC (que a 
 recorrente considera inconstitucional nessa dita interpretação), como deixou de 
 ter relevância decisória. 
 
 14. Assim, não pode essa primeira decisão prevalecer sobre a segunda e 
 fundamentar o juízo de que a ‘decisão fáctica’ se encontra ‘convenientemente 
 motivada’. 
 
 15. A aliás douta decisão sob reclamação encontra assento nesse juízo e não 
 deve, pela mesma razão, manter-se.” 
 
 2. A decisão reclamada, e no que ora importa, tem o seguinte teor:
 
 “Entende-se ser de proferir decisão sumária ex vi do artigo 78.º-A, n.º 1, da 
 Lei do Tribunal Constitucional, na medida em que se verifica a ausência de 
 pressuposto essencial ao conhecimento do objecto do recurso. 
 Tendo o recurso sido interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), do 
 citado diploma, é essencial que as normas (ou interpretações normativas) cuja 
 constitucionalidade vem questionada constituam a ratio decidendi da decisão 
 recorrida. A intervenção do Tribunal Constitucional em sede de fiscalização 
 concreta impõe a utilidade, nos autos, da sua pronúncia. Isto é, a decisão 
 proferida pela mais alta instância da justiça constitucional deve ser útil, no 
 sentido de lhe assistir a virtualidade de influir na decisão que, a final, virá 
 a ser produzida nos autos. No caso em apreço, no entanto, tal não se verifica.
 Relativamente às duas questões de constitucionalidade invocadas pelo Recorrente 
 
 – e mesmo assumindo que ambas, reportadas às normas contidas no artigo 712.º, 
 n.ºs 5 e 6, do Código de Processo Civil (redacção anterior à reforma dos 
 recursos operada em 2008), tenham, efectivamente, sido aplicadas com as 
 dimensões especificadas pelo Recorrente, o que não é líquido – constata-se que 
 qualquer juízo que viesse a ser formulado sobre tais matérias não teria 
 capacidade de produzir reflexo útil nos autos. Com efeito, e como se pode ler no 
 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, entendeu-se que ‘embora não totalmente 
 oriunda da 1.ª instância, a decisão fáctica proferida nos autos mostra-se 
 convenientemente motivada (…).’ Assim, qualquer juízo de inconstitucionalidade 
 reportado às dimensões especificadas do artigo 712.º, n.ºs 5 e 6, do Código de 
 Processo Civil, esbarraria sempre – para efeitos de alteração da decisão 
 proferida – no entendimento que tem o Tribunal a quo de que a decisão de facto 
 se encontra convenientemente motivada, pelo que, em face disto, não teria 
 aplicabilidade a fattispecie dos referidos n.ºs 5 e 6.”
 Cumpre apreciar e decidir.
 II – Fundamentação
 
 3. A reclamação deduzida carece manifestamente de fundamento. Com efeito, a 
 argumentação da Reclamante em nada abala a fundamentação da decisão sumária 
 reclamada. O STJ, apreciando os artigos 712.º, n.ºs 5 e 6, do Código de Processo 
 Civil, conclui que os preceitos não padeciam de qualquer inconstitucionalidade. 
 Mas, concretamente na parte relativa à apreciação do artigo 712.º, n.º 5, o STJ 
 refere que “embora não totalmente oriunda da 1.ª instância, a decisão fáctica 
 proferida nos autos mostra-se convenientemente motivada, em conformidade com o 
 que prescrevem os arts. 563º nº 2 do CPC e 205º n.º 1 da Constituição.” Ora, tal 
 como vêm especificadas as questões de constitucionalidade suscitadas pelo ora 
 Reclamante, e na medida em que o STJ entende que a decisão se encontra 
 devidamente fundamentada, a aplicação dos preceitos impugnados não foi, sequer, 
 desencadeada por aquele Tribunal. Isto porque, como se enfatizou na decisão 
 sumária reclamanda, o STJ considerou que – independentemente das questões 
 relativas à origem da fundamentação (1.ª instância ou Relação) – o certo é que, 
 tal como se apresentaram os autos perante aquele Alto Tribunal, a decisão se 
 encontrava fundamentada nos termos legais e constitucionalmente exigidos. Ora, 
 as questões de constitucionalidade que a Recorrente suscita perante o Tribunal 
 Constitucional versam o artigo 712.º, n.ºs 5 e 6 do Código de Processo Civil. A 
 aplicabilidade de tais normas – mesmo que referidas, com as necessárias 
 adaptações, ao Supremo Tribunal de Justiça, como pretende a Reclamante – depende 
 da verificação de omissão de fundamentação da decisão sobre algum facto 
 essencial ao julgamento da causa. O que, como vimos, foi afastado pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça, ao contrário do que sustenta a Reclamante, que, portanto, 
 nem sequer aplicou as normas em apreço, surgindo a pronúncia relativamente à não 
 inconstitucionalidade das mesmas, no discurso argumentativo da decisão a quo, 
 como mero obiter dictum. 
 Improcede, portanto, a reclamação deduzida.
 III – Decisão
 
 5. Assim, e, sem necessidade de maiores considerações, acordam, em conferência, 
 indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão 
 reclamada no sentido de não tomar conhecimento do recurso.
 Custas pelo Reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 11 de Março de 2009
 José Borges Soeiro
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos