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Processo nº 1026/08
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
 
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
 
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 recorrente A. e são recorridos o Ministério Público e B. e outro, foi interposto 
 recurso ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei da Organização, 
 Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).
 
  
 
 2. Em 13 de Janeiro de 2009, o Tribunal decidiu, ao abrigo do disposto no nº 1 
 do artigo 78º-A da LTC, não tomar conhecimento do objecto do recurso, com o 
 seguinte fundamento:
 
  
 
 «Constitui requisito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do 
 nº 1 do artigo 70º da LTC a suscitação prévia, perante o tribunal que proferiu a 
 decisão recorrida, da questão de inconstitucionalidade que o recorrente pretende 
 que o Tribunal Constitucional aprecie. 
 Nos presentes autos, o recorrente não questionou, perante o Supremo Tribunal de 
 Justiça, a norma do artigo 5° do Código de Processo Penal, quando interpretada 
 no sentido de que a lei aplicável para efeitos de admissibilidade do recurso 
 para o S.T.J. é a lei que entrou em vigor já depois do processo se ter iniciado, 
 após ter sido proferida decisão da 1ª instância. Sendo certo que a decisão 
 recorrida aplicou, como ratio decidendi, esta norma e não a que o recorrente 
 havia questionado previamente.
 Com efeito, quando reclamou da decisão sumária para a conferência – ou seja, 
 durante o processo (artigo 70º, nº 1, alínea b), da LTC) –, o então reclamante 
 sustentou que é inconstitucional a interpretação do artigo 5° do Código de 
 Processo Penal segundo a qual a lei aplicável ao caso é a lei que entrou em 
 vigor já depois de o processo se ter iniciado.
 Não se podendo dar como verificado o requisito da suscitação prévia da questão 
 de inconstitucionalidade que o recorrente pretende que o Tribunal aprecie, há 
 que concluir pelo não conhecimento do objecto do recurso interposto, o que 
 justifica a prolação da presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da LTC)».
 
  
 
  
 
 3. O recorrente vem agora reclamar desta decisão, com os fundamentos seguintes:
 
  
 
 «1- O arguido suscitou a questão da inconstitucionalidade no requerimento em que 
 reclamou para a conferência no Supremo Tribunal de Justiça, em virtude de uma 
 decisão sumária de não admissibilidade do recurso interposto pelo Arguido para o 
 Supremo Tribunal de Justiça. 
 
 2- Na verdade o que o arguido sempre pretendeu arguir foi a violação da norma 
 implícita no artigo 5° do Código do Processo Penal, quando interpretada (como o 
 foi pelo Venerando Supremo Tribunal de Justiça) no sentido de que a lei 
 aplicável para efeitos de admissibilidade do recurso para o S.T.J. é a lei que 
 entrou em vigor já depois do processo se ter iniciado e que estava em vigor após 
 ter sido proferida decisão da 1ª Instância, da qual recorreu o Arguido. 
 
 3- Na verdade, o mandatário do arguido não pretende escamotear que quando 
 reclamou para a conferência e arguiu a inconstitucionalidade referiu o seguinte 
 e citamos: 
 
  “A interpretação do artigo 5º do Código de Processo Penal, plasmada na decisão, 
 de que se reclama, segundo a lei aplicável ao caso é a lei que entrou em vigor 
 já depois de o processo se ter iniciado, é aliás nosso ver, inconstitucional, 
 
 “Porquanto viola o princípio constitucional da aplicação da lei mais favorável, 
 previsto nos artigos 18° n°s 2 e 3, 29° n°4- 2ª parte e 282 n° 3 todos da 
 Constituição Portuguesa” 
 Concluíamos dizendo que a lei processual posterior que retirar um direito a um 
 desses graus de recurso, constitui na nossa opinião um agravamento sensível e 
 ainda evitável da situação processual do arguido, designadamente uma limitação 
 do seu direito de defesa. 
 
 4- Ora o que se pretendia era afirmar (e julgamos que tal é facilmente 
 perceptível no requerimento referido e nos que se seguiram) que a norma do 
 artigo 5° quando interpretada no sentido que o diploma legislativo que deveria 
 ser aplicado no que respeita á admissibilidade do recurso era o que havia 
 entrado em vigor após se ter iniciado o processo, não obstante já se encontrar 
 em vigor no momento da prolação da decisão do Tribunal da primeira Instância, 
 
 5- Violava a Constituição Portuguesa (mormente os artigos supra mencionados e 
 também referidos)
 
 (…)».
 
  
 
 4. Notificados os recorridos, respondeu apenas o Ministério Público, pela 
 seguinte forma:
 
  
 
 «1º
 Conforme entendimento jurisprudencial reiterado, recai sobre o recorrente, nos 
 recursos tipificados na alínea b) do nº1 do artigo 70º da Lei nº28/82, o ónus de 
 enunciar de forma precisa, cabal e conclusiva a interpretação normativa que – 
 constituindo “ratio decidendi” da decisão impugnada perante este Tribunal 
 Constitucional – integra o objecto do recurso de fiscalização concreta 
 interposto, a qual deve coincidir com a dimensão que o interessado questionou 
 durante o processo.
 
 2º
 Tal não ocorre manifestamente no caso dos autos, já que o momento relevante para 
 aferir da aplicabilidade da lei nova é – na óptica do Supremo Tribunal de 
 Justiça – a data da decisão da 1ª instância – e não, como sustenta o recorrente, 
 a data do início do processo.
 
 3º
 Assim sendo, o recurso só será admissível se o reclamante demonstrasse que o 
 entendimento plasmado no acórdão recorrido se configurava, quanto a esse ponto, 
 como a “decisão – surpresa” – o que, aliás, manifestamente não ocorre, já que, 
 na decisão proferida a pag.1337, e objecto de reclamação para a conferência, se 
 adoptou expressamente o entendimento de que o momento processual relevante para 
 aferir da recorribilidade era “ a data da decisão da 1ª instância”.
 
 4º
 Sendo, pois, esta a específica dimensão normativa cuja constitucionalidade o ora 
 reclamante devia ter suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça».
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 A decisão reclamada concluiu pelo não conhecimento do objecto do recurso 
 interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, por não se poder 
 dar como verificado o requisito da suscitação prévia da questão de 
 inconstitucionalidade cuja apreciação foi requerida. Ou seja, a da conformidade 
 constitucional da interpretação do artigo 5° do Código de Processo Penal segundo 
 a qual a lei aplicável ao caso é a lei que entrou em vigor já depois de o 
 processo se ter iniciado.
 O reclamante sustenta que sempre pretendeu arguir a violação da norma implícita 
 no artigo 5° do Código do Processo Penal, quando interpretada no sentido de que 
 a lei aplicável para efeitos de admissibilidade do recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça é a lei que entrou em vigor já depois do processo se ter 
 iniciado e que estava em vigor após ter sido proferida decisão da 1ª Instância.
 Ainda que assim seja, o que é facto é que, durante o processo, questionou a 
 constitucionalidade da interpretação do artigo 5° do Código de Processo Penal 
 segundo a qual a lei aplicável ao caso é a lei que entrou em vigor já depois de 
 o processo se ter iniciado, omitindo qualquer referência à prolação de decisão 
 em 1ª instância (cf. ponto 12. da reclamação para a conferência do Supremo 
 Tribunal de Justiça). De resto, o próprio reclamante reconhece que, durante o 
 processo, pôs em causa a conformidade constitucional daquela interpretação do 
 artigo 5º do Código de Processo Penal e não da que depois foi especificada no 
 requerimento de interposição de recurso. Sendo certo que faz toda a diferença 
 questionar uma ou outra interpretação deste artigo 5º
 O objecto do recurso de constitucionalidade define-se no requerimento de 
 interposição (artigo 75º-A, nº 1, da LTC) e o recorrente tem o ónus da 
 suscitação prévia da questão de inconstitucionalidade normativa cuja apreciação 
 pretenda (artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da LTC). Tem de haver, por 
 isso, coincidência entre a norma cuja apreciação é requerida e a norma cuja 
 constitucionalidade foi questionada durante o processo. Se assim não suceder, o 
 Tribunal Constitucional, vai conhecer da questão de inconstitucionalidade ex 
 novo, em vez de reapreciar uma questão já jugada pelo tribunal recorrido (cf. 
 Acórdão do Tribunal Constitucional nº 569/94, Diário da República, II Série, de 
 
 10 de Janeiro de 1995).
 Uma vez que o recorrente não questionou, perante o Supremo Tribunal de Justiça, 
 a norma indicada no requerimento de interposição de recurso, importa concluir 
 pelo indeferimento da presente reclamação.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 4 de Março de 2009
 
  
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão