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Processo n.º 982/07
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
 
 
 Acordam, na 3ª Secção, do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I – RELATÓRIO
 
  
 
 1. Nos autos recorridos, foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de 
 Lisboa, em 11 de Setembro de 2007, nos termos do qual foi confirmada 
 integralmente a decisão do tribunal de instrução que pronunciou o ora recorrente 
 
 “pela prática em autoria material e concurso real de: a) um crime de 
 infidelidade, p. e p. pelo artigo 224º, n.º 1; b) um crime de abuso de 
 confiança, p. e p. pelo artigo 205º, n.º 1, n.º 4, al. b) e n.º 5; c) três 
 crimes de falsificação de documento, p. e p. pelas disposições legais conjugadas 
 dos artigos. 255º, al. a) e 256º, n.º 1, al. a), todos do Código Penal” (fls. 
 
 1523).
 
  
 Através do requerimento de interposição de recurso, A.  pretendia que este 
 Tribunal apreciasse quer a constitucionalidade da norma constante da “alínea d) 
 do n.º 2 do artº 120º do Código de Processo Penal, interpretada ou entendida no 
 sentido de que os casos de nulidade nelas contidos ou objecto da sua previsão 
 são apenas os casos de absoluta ou total falta de inquérito e não os que o 
 
 «Ministério Público», não ouve os clientes, lesados e beneficiados, do banco 
 Assistente e, concomitantemente, não averigua nem solicita documentação que era 
 essencial à descoberta da verdade material (…)” (fls. 1578 e 1579), quer a 
 constitucionalidade da norma constante do “n.º 2 do artigo 287º do Código de 
 Processo Penal, por impor um limite numérico ao número de testemunhas que podem 
 ser oferecidas pelo Arguido na Abertura de Instrução que, visa a comprovação 
 judicial de deduzir acusação ou de arquivar o processo e não submetê-lo a 
 julgamento, violando assim o princípio do contraditório e as normais garantias 
 de defesa, na medida em que, inibe o direito natural a contraditar todos os 
 elementos e prova do processo insuficientes para a formação da culpa (…)” (fls. 
 
 1579).
 
  
 
 2. Perante esta configuração do objecto processual, em 26 de Novembro de 2007, a 
 Relatora proferiu o seguinte despacho:
 
  
 
 “Apesar de a tal estar obrigado por força do n.º 2 do artigo 75º-A da LTC, o 
 recorrente não indicou expressamente qual a peça processual na qual foi 
 suscitada a questão de inconstitucionalidade de interpretação normativa da 
 alínea d) do n.º 2 do artigo 120º do CPP, apesar de o ter feito em relação à 
 alegada inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 287º do CPP (cfr. artigo 7º, a 
 fls. 1581 e 1582).
 
  
 Contudo, analisados exaustivamente os autos de recurso, comprova-se que o 
 recorrente nunca suscitou efectivamente a questão de inconstitucionalidade da 
 interpretação normativa da alínea d) do n.º 2 do artigo 120º do CPP, tal como 
 aplicada pela decisão recorrida, pelo que o Tribunal Constitucional não pode 
 conhecer, ainda que parcialmente, do objecto do recurso interposto, conforme 
 resulta do n.º 2 do artigo 72º da LTC.
 
  
 Acresce que, mesmo que o tivesse feito – o que apenas se pondera para efeitos 
 especulativos –, sempre resultaria que a decisão recorrida não aplicou a alínea 
 d) do n.º 2 do artigo 120º do CPP no sentido de que só ocorreria nulidade nos 
 
 “casos de absoluta ou total falta de inquérito”, ou seja, equiparando aquela 
 modalidade de nulidade à prevista na alínea d) do artigo 119º do CPP. Ao invés, 
 a decisão recorrida aplicou a alínea d) do n.º 2 do artigo 120º do CPP 
 interpretada no sentido de que não ocorre “insuficiência do inquérito ou 
 instrução” quando “é patente que, durante o inquérito que culminou com a dedução 
 da acusação contra o ora Arguido/Recorrente e outro, foram levadas a cabo todas 
 as diligências que o MINISTÉRIO PÚBLICO teve por adequadas e necessárias à 
 descoberta da verdade” (fls. 1564).
 
  
 Assim, determino que seja notificado o recorrente para, querendo, apresentar as 
 suas alegações de recurso perante este Tribunal, no prazo de 30 (trinta) dias, 
 conforme previsto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 79º da LTC, apenas quanto à questão 
 da inconstitucionalidade da norma contida no n.º 2 do artigo 287º do CPP.” (fls. 
 
 1592 e 1593)
 
  
 O recorrente não reclamou do referido despacho, que transitou em julgado, quanto 
 
 à questão do não conhecimento da norma constante da alínea d) do n.º 2 do artigo 
 
 120º do CPP, razão pela qual o presente acórdão apenas apreciará a alegada 
 inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 287º do CPP.
 
  
 
  
 
 3. Atenta esta prevenção, reveste-se de significativa relevância para os 
 presentes autos de apreciação de inconstitucionalidade, designadamente, as 
 seguintes passagens da decisão recorrida:
 
  
 
 “A esta luz, como a suficiência de indícios em sede de inquérito e de instrução 
 tem de ser vista em função da natureza preparatória e instrumental dessas fases 
 do processo relativamente à fase de julgamento, entende-se que o legislador ao 
 incluir esta norma e esta limitação do número de testemunhas a indicar, fê-lo 
 por razões de ordem pragmática, não pretendendo, com certeza, obstar à prática 
 de actos processuais fundamentais aos objectivos da própria instrução, a que não 
 podem ficar alheios os direitos de defesa do arguido.
 Mas a verdade é que, sendo esse o meio de prova mais utilizado na praxis 
 processual, dá azo, por vezes, a algumas manipulações que atrasam 
 inevitavelmente, o desenrolar e desfecho de uma fase processual que se pretende 
 célere, daí a limitação introduzida de um número máximo de testemunhas a 
 inquirir durant[e] a instrução (20 testemunhas).
 Como assim, entende-se que a norma prevista no artº 287º, nº 2 do CPP, não é 
 inconstitucional, pelo que, improcede o recurso, também, nesta parte.” (fls. 
 
 1566 a 1567)
 
  
 
             4. Notificado para alegar, o recorrente A. apresentou as suas 
 alegações, cujas conclusões foram as seguintes:
 
  
 
  
 
 “Conclusões: 
 I - Salvo o devido respeito e melhor opinião, a norma do n°2 do artigo 287° do 
 C.P.P. é materialmente inconstitucional por violação aos princípios normativos 
 constitucionais constantes das normas dos pontos do n°1 e 5 do artigo 32° da 
 Constituição da República Portuguesa, porquanto, 
 
  
 II - A mera limitação numérica a um máximo de 20 testemunhas a inquirir na 
 instrução quando tal diligência probatória for de todo omitida durante o 
 inquérito, fere o princípio constitucional da verdade material em direito penal 
 e, em decorrência, as garantias de defesa do Arguido e o princípio do 
 contraditório em actos instrutórios. 
 
  
 III - Daí que, o indeferimento pelo Tribunal de Instrução para inquirição de 57 
 clientes do banco Assistente em acto instrutório “beneficiados por 
 financiamentos irregulares” concedidos pelo Recorrente oblitera a verdade 
 material em processo penal, o que constitui uma interpretação manifestamente 
 inconstitucional da norma limitativa numérica constante da “parte final” do n°2 
 do artigo 287° do C.P.P.. 
 
  
 IV - A indicação daquelas testemunhas justificava-se, na medida em que, o 
 Recorrente tentou provar que, o Banco Assistente contratou normalmente com todos 
 os clientes indicados para a inquirição, auferindo juros contratuais por 
 abertura de crédito e outros ganhos de comissão, ganhando dinheiro pelas 
 operações efectuadas, ainda que, iniciadas, por motivos de celeridade e 
 concorrência muito forte no mercado bancário com elementos de formalização 
 mínima, tudo independentemente da conexão subjectiva dos factos enumerados em 
 série na douta acusação pública e no despacho de pronúncia. 
 
  
 V - Na verdade, o que o Recorrente apenas fez foi conceder empréstimos em nome 
 do Banco facto que constitui a razão de ser da actividade bancária a clientes, 
 sem observar as regras de crédito indo para o efeito tirar os fundos necessários 
 a esses financiamentos a contas de outros clientes. 
 
  
 VI - Essa “tirada” de dinheiro de clientes para a concessão de crédito era de 
 natureza puramente temporária até o Banco aprovar o crédito nas hierarquias 
 altas e o dinheiro ser reposto naturalmente. 
 
  
 VII - É indiscutível, portanto, que, o Recorrente/Arguido tem o direito a todas 
 as garantias de defesa para demonstrar a sua inocência, para não ser submetido a 
 julgamento por indícios injustificados, além do mais porque, nos termos da norma 
 do n°2 do art° 32° da C.R.P. “se presume inocente até ao transito em julgado da 
 sentença de condenação”.
 
  
 VIII— Por outro lado, nos termos do n°5 do art° 32° da C.R.P. está 
 imperativamente plasmado um importante princípio constitucional de conformação 
 penal que, refere “o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a 
 audiência de julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar sujeitos ao 
 princípio do contraditório”. 
 
  
 IX - Perante esta enormidade de falha de inquérito, obviamente que, o 
 Recorrente/Arguido, no âmbito da efectivação do princípio constitucional do 
 contraditório, tinha o direito, no exercício das suas garantias de defesa, de 
 abalar as conclusões fácticas que o M.P. lhe imputou no douto libelo acusatório 
 através da inquirição dos clientes do banco beneficiados por operações de 
 crédito e financiamento. 
 
  
 X - O Mmo Juiz de Instrução indeferiu a inquirição apenas sustentado num 
 argumento formal relativo ao impedimento de inquirição de mais de 20 testemunhas 
 em sede de instrução. 
 
  
 XI - Ou seja, o argumento meramente numérico, claramente limitativo do princípio 
 do contraditório (norma do n°5 do art° 32° da C.R.P.) supera e sobrepõe-se ao 
 princípio da verdade material constante das normas do n°1 do art° 29°; do n°1, 2 
 e 5 do art° 32, todos da C.R.P.. 
 
  
 XII - A inquirição desses clientes é diligencia essencial à descoberta da 
 verdade na medida em que, de entre outras coisas, haveria a possibilidade de 
 confirmar os créditos concedidos, as livranças em branco que o Recorrente os pôs 
 a assinar como protecção mínima ou formalização mínima inicial dos mesmos e as 
 elevadas despesas, taxas e juros por estes pagos ao banco Assistente por causa 
 dos ‘descobertos”. 
 
  
 XII - O indeferimento das diligências de prova requeridas pelo Recorrente na 
 instrução constitui violação ao pleno exercício do princípio contraditório e do 
 asseguramento de todas as garantias de defesa previstos nas normas n° 1 e 5 do 
 art° 32° da Constituição da República Portuguesa. 
 
  
 XIV - O indeferimento constante do despacho de fls 1292 dos autos proferido pelo 
 Mmo Juiz de Instrução acerca da realização da inquirição de todas as testemunhas 
 apenas pelo facto da norma do no 2 do art° 287° do C.P.P. impôr limite numérico 
 resulta em violação das garantias de defesa e viola o principio do 
 contraditório. 
 
  
 XVI - Em consequência, em virtude dos diversos vícios de violação da lei deverá 
 declarar-se a nulidade do despacho de pronúncia e da instrução e em decorrência 
 declarar-se o Recorrente como não pronunciado, o processo deverá ser remetido 
 para inquérito a fim de serem realizadas todas as diligências de prova omitidas 
 e deve declarar-se a inconstitucionalidade da norma do nº 2 do art° 287° do 
 C.P.P. na parte em que impõe o número de 20 testemunhas a inquirir 
 independentemente dos factos imputados e sua conexão subjectiva a diferentes 
 intervenientes responsáveis. 
 
  
 XVII - Como tal, deve declarar-se materialmente inconstitucional a norma do 
 ponto do n°2 do artigo 287° do C.P.P., em virtude de impôr, o que sucedeu neste 
 processo, quando interpretado literalmente sem qualquer integração na unidade do 
 sistema garantístico penal que visa, sempre e em qualquer caso, a busca da 
 
 “verdade material”, a eliminação de prova testemunhal essencial à mesma, por 
 excesso da limitação numérica da “parte final” da norma do n°2 do artigo 287° do 
 C.P.P., em clara violação às normas do n°1 do artigo 29° e n°1 e 5 do artigo 
 
 32°, todos da Constituição da República Portuguesa. 
 
  
 Termos em que, 
 Deve conceder provimento ao presente Recurso e, em consequência, declarar-se a 
 inconstitucionalidade da norma da “‘parte final” do n°2 do artigo 287° do 
 C.P.P., na parte, em que prescreve “‘não podem ser indicadas mais de 20 
 testemunhas”, independentemente da conexão subjectiva dos factos constantes da 
 acusação pública, determinando-se a nulidade da instrução “sub-judice” e sua 
 repetição na parte de atendimento à prova testemunhal indeferida.” (fls. 1628 a 
 
 1633)
 
  
 
 5. Posto isto, para tal notificado, o recorrido Banco B., veio contra-alegar o 
 seguinte:
 
  
 
 “1.º     A norma constante do artigo 287. n.º 2 do CPP não viola as garantias de 
 defesa consagradas no artigo 32.° n.º 5 da CRP. 
 
  
 
 2.º        A própria Instrução constitui já um meio de defesa ao alcance do 
 Arguido. 
 
  
 
 3.º        Em sede de audiência de julgamento, o Arguido poderá ainda requerer a 
 inquirição de vinte testemunhas, com a possibilidade do referido limite ser 
 aumentado em razão da complexidade do processo, nos termos do disposto no artigo 
 
 315. ° 3 e nº 7 do artigo 287º do CPP 
 
  
 
 4.º        A possibilidade legal do Juiz indeferir a produção de actos de prova 
 em sede de audiência de julgamento já foi apreciada por este Tribunal 
 Constitucional no âmbito do processo nº 764/2004 da 2ª Secção, em que decidiu o 
 seguinte: 
 
  
 
 “Há, pois, que concluir que o artigo 340. ° n.º 4 do CPP, na medida em que 
 confere ao Juiz poderes de disciplina da produção de prova, exigindo para o 
 indeferimento desta, notoriedade do seu carácter irrelevante ou supérfluo, 
 inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa ou, ainda, da sua 
 finalidade meramente dilatória, não viola as garantias de defesa do arguido 
 
 [...]“ 
 
  
 
 5.°       Por um argumento de maioria de razão, há-de entender-se que, a 
 limitação do número de testemunhas a inquirir em sede de instrução não poderá 
 violar as garantias de defesa consagradas no artigo 32° nº 5 da CRP.
 
  
 
 6.º        O indeferimento da inquirição das 57 testemunhas arroladas pelo 
 Arguido baseou-se nem tanto no limite numérico de testemunhas constante do 
 artigo 287. ° 2 do CPP, mas principalmente na inutilidade de tal inquirição, na 
 medida em que os factos sobre os quais as mesmas seriam inquiridas já haviam 
 obtido resposta com a junção aos autos dos documentos que titularam os contratos 
 de formalização da concessão de crédito efectuada pelo Arguido. 
 
  
 
 7.º        O Arguido não recorreu do despacho que indeferiu tal di1igncia, pois 
 o mesmo era irrecorrível, mas veio em sede de recurso da decisão de pronúncia do 
 Arguido pelos mesmo factos por que foi acusado, levantar a questão da 
 inconstitucionalidade da norma constante do nº 2 do artigo 287. ° do CPP. 
 
  
 
 8.º        Quanto a essa questão, o recurso para. o Tribunal da Relação de 
 Lisboa não deveria ter sido admitido nem apreciado, pois o mesmo apenas o 
 poderia ter sido, quanto ás questões da nulidade da acusação que foram arguidas 
 em sede de Instrução e ao abrigo do que foi decidido ao âmbito do Assento 6/2000 
 de 07/03.
 
  
 
 9.º        A questão da (in)constitucionalidade da aplicação do disposto no nº2 
 do artigo 287.° do CPP, sem que essa mesma inconstitucionalidade tenha sido 
 anteriormente suscitada (aquando do requerimento ou em reclamação posterior ao 
 indeferimento) possa ser posta em causa perante o Tribunal da Relação de Lisboa, 
 como alegada questão incidental, pois isso consubstanciaria admissibilidade de 
 recurso dos despachos que indeferem a realização de diligências instrutórias, 
 qual é irrecorrível, ao abrigo do disposto no artigo 291º do CPP, disposição que 
 já foi julgada não inconstitucional em vários acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, nomeadamente, nos acórdãos n.° 371/00, 375/00, 459/00 e 78/01, 
 de entre outros.
 
  
 
 10.º      O Arguido poderia, quando muito, ter recorrido para o Tribunal 
 Constitucional, logo que foi notificado do despacho que indeferiu a inquirição 
 das testemunhas requeridas, o que não fez, razão pela qual deverá ser rejeitado 
 o recurso interposto. 
 
  
 
 11.º      A Instrução é apenas uma fase processual que visa comprovar 
 judicialmente a bondade da dedução de acusação ou de arquivamento do inquérito, 
 a qual se basta com a existência de indícios suficientes da prática do(s) 
 crime(s) eventualmente denunciado(s). 
 
  
 I2.º      Como tal, não pode a mesma ser considerada, desde logo, como uma 
 privação das garantias do Arguido, sendo certo que ela é uma fase processual que 
 acresce às normais garantias de defesa concedidas ao Arguido, antes do processo 
 ser levado a julgamento.” (fls. 1650 a 1655).
 
  
 
             6. Por último, igualmente notificado, o Ministério Público veio aos 
 autos pronunciar-se nestes termos:
 
  
 
 “1.       Apreciação da questão de constitucionalidade suscitada. 
 
  
 Inconformado com o decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, o arguido A. 
 interpôs o presente recurso de constitucionalidade circunscrito, após a 
 delimitação operada a fls. 1592 e 1593, à apreciação da conformidade à Lei 
 Fundamental da norma do artigo 287°, nº 2 do Código de Processo Penal, no 
 segmento em que prescreve que não podem ser indicadas mais de vinte testemunhas. 
 
 
 
  
 Por despacho proferido pelo Juiz de Instrução Criminal, a fls. 1292, verifica-se 
 que a não inquirição das testemunhas indicadas pelo arguido radica em duas 
 ordens de razões. 
 
  
 Com efeito, o indeferimento das inquirições teve como causa não só a 
 ultrapassagem do limite legal estabelecido na norma do artigo 287° do Código de 
 Processo Penal, mas também a consideração de que a matéria a que iriam responder 
 podia ser extraída da abundante documentação junta aos autos.
 
  
 Tal significa que uma eventual procedência do recurso não iria determinar como 
 consequência a inquirição das testemunhas indicadas pelo arguido na fase de 
 instrução, uma vez que subsistiria sempre uma outra causa já consolidada para a 
 sua não audição nos autos. 
 
  
 A jurisprudência do Tribunal Constitucional aponta no sentido de, atenta a 
 função instrumental reconhecida, em geral, ao recurso de constitucionalidade, só 
 deverem ser conhecidas questões de constitucionalidade normativa quando a 
 decisão a proferir possa influir utilmente no julgamento da questão do mérito 
 discutida no processo — cf. entre outros, os Acórdãos do Tribunal Constitucional 
 nºs 257/92, 440/99 e mais recentemente os Acórdãos nºs 91/07 e 320/07. 
 
  
 No caso em apreço, e na esteira de tal jurisprudência, não deve ser conhecido o 
 objecto do recurso. 
 
  
 
 2. Conclusão 
 
  
 Nesta conformidade e face ao exposto, conclui-se: 
 
  
 
 1. O carácter instrumental do recurso em fiscalização concreta da 
 constitucionalidade implica que apenas se deva conhecer do respectivo objecto, 
 quando tal possa influir utilmente no julgamento da questão de mérito discutida 
 no processo. 
 
  
 
 2. Existindo um fundamento alternativo que, no caso concreto, torna inútil 
 apreciar a questão de inconstitucionalidade suscitada não deverá conhecer-se do 
 objecto do recurso.”
 
  
 
             7. Face ao teor das contra-alegações dos recorridos, a Relatora 
 determinou que fosse ouvido o recorrente quanto à possibilidade de não 
 conhecimento do objecto do recurso, desta feita, em relação à norma constante do 
 n.º 2 do artigo 287º do CPP, ao abrigo do n.º 2 do artigo 702º e do n.º 2 do 
 artigo 704º do CPC, aplicáveis “ex vi” artigo 69º da LTC. O recorrente 
 pronunciou-se nos seguintes termos:
 
  
 
             “1º
 Os Recorridos suscitam de modo semelhante a questão prévia, ou seja, “a audição 
 de testemunhas não iria determinar com consequência indicadas pelo Arguido na 
 fase de instrução, uma vez que subsistiria sempre outra causa já consolidada 
 para a sua não audição” por causa dos documentos. 
 
  
 
 2°
 Só que ambos os Recorridos omitiram: 
 
 1 - O Recorrente impugnou a documentação bancária totalmente; 
 
 2 - Não foram realizadas perícias acerca do “concreto” prejuízo efectivo do 
 Banco; 
 
 3 - Estão omitidos nos documentos bancários as despesas bancárias, juros 
 contratuais ou convencionais de regulação e juros de “descoberto”; 
 
 4 - Tais omissões impossibilitam falar em prejuízos quando há “ganhos” da 
 actividade bancária normal que é “vender ou emprestar dinheiro”.
 
  
 
 3º
 Perante tais omissões de inquérito e de instrução muito graves, parece-nos 
 contrário ao Direito submeter um cidadão a julgamento, na base do vox populi 
 praecepta “todos ao molhe e fé em Deus”, o Arguido que, se desenrasque em 
 julgamento por inversão pura de “ónus da prova”. 
 
  
 
 4º
 A audição de testemunhas é manifestamente essencial in casu, salvaguarda normais 
 e elementares garantias de defesa e pode evitar a sustentação de uma acusação 
 pública e despacho de pronúncia apenas estribado em documentos particulares 
 produzidos intencionalmente por “parte muito interessada” em carreá-los para os 
 autos para produzirem o efeito desejado da queixa inicial, sem que o 
 
 “Estado-Penal” os tivesse sindicado, averiguado, periciado e investigado com 
 meridiana seriedade (o cenário bancário em Portugal mostra que as instituições 
 bancárias cometem delitos graves e abusos). 
 
  
 
 5º
 Assim, não há “concausa” consolidada nestes autos, tudo está abstractamente 
 controvertido, difuso e equívoco relativamente aos factos-índice que sustentam o 
 despacho de pronúncia. 
 
  
 
 6°
 Por estas razões, relativas ao presente processo especialmente, a questão da 
 inconstitucionalidade no sentido interpretativo proposto, pode influir utilmente 
 no julgamento da questão de mérito discutida neste processo. 
 
  
 
 7°
 Na verdade, a declaração de inconstitucionalidade “subjudice” podendo não 
 obrigar a que o Juiz na instrução oiça as testemunhas obriga decisivamente a 
 baixa do processo para inquérito para melhor investigação dos factos-índice 
 penais relativos aos “prejuízos” que constitui requisito da norma penal punitiva 
 em face da facticidade nela contida. 
 
  
 
  
 Nestes termos, 
 Conclui-se: 
 
 - Pela inviabilidade das questões prévias suscitadas, devendo julgar-se o 
 presente Recurso nos termos propostos em sede de Alegações já produzidas. 
 
  
 Termos em que, 
 Deve negar-se provimento às questões suscitadas pelos Recorridos e, em 
 decorrência, conhecer-se o objecto do Recurso” (fls. 1665 a 1667)
 
  
 Cumpre agora apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II – FUNDAMENTAÇÃO
 
  
 
 8. Em sede de contra-alegações, quer o recorrido Banco B., quer o Ministério 
 Público invocaram a impossibilidade de conhecimento do objecto do recurso, no 
 que diz respeito à norma constante do n.º 2 do artigo 287º do CPP, por força da 
 manifesta inutilidade processual do mesmo. Tal resultaria da circunstância de a 
 decisão instrutória alvo de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa e, 
 presentemente, alvo de recurso para este Tribunal não se ter limitado a recusar 
 a audição das 57 testemunhas arroladas pelo recorrente com fundamento no limite 
 quantitativo ao rol de testemunha fixado pelo n.º 2 do artigo 287º do CPP, mas 
 tê-lo feito por considerar que, atenta a prova documental vertida nos autos, 
 aquela audição não se justificaria.
 
  
 Com efeito, conforme resulta do despacho proferido pelo Juiz de Instrução, a 
 fls. 1292, a dispensa de audição das 57 testemunhas arroladas pelo recorrente 
 não radicou exclusivamente no limite quantitativo fixado pelo n.º 2 do artigo 
 
 287º do CPP, mas também na circunstância de a prova documental junta aos autos 
 permitir a formação de convicção pelo tribunal sobre a verificação dos factos. 
 Deste modo, ainda que o Tribunal Constitucional viesse a julgar inconstitucional 
 a norma contida no n.º 2 do artigo 287º, tal decisão jamais seria passível de 
 alterar ou mesmo influenciar a decisão recorrida, visto que sempre subsistiria 
 aquele outro fundamento.
 
  
 Conforme é jurisprudência firme e constante deste Tribunal (a este propósito, a 
 mero título de exemplo, veja-se a jurisprudência mais recente desta Secção: 
 Acórdãos n.º 493/07, de 08 de Outubro de 2007, n.º 504/07, de 12 de Outubro de 
 
 2007, n.º 33/08, de 23 de Janeiro de 2008, n.º 131/08, de 25 de Fevereiro de 
 
 2007), a natureza instrumental do recurso por inconstitucionalidade veda o 
 conhecimento de questões sempre que a decisão a proferir pelo Tribunal 
 Constitucional não sejam aptas a promover uma alteração da decisão recorrida. É 
 esta jurisprudência que se reitera, sendo que, no caso concreto ora em apreço, a 
 subsistência de outro fundamento para dispensa da audição das testemunhas sempre 
 tornaria processualmente inútil uma eventual decisão no sentido da 
 inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 287º do CPP.
 
  
 Em suma, por se revelar inútil, não subsistem razões que justifiquem o 
 conhecimento do recurso quanto à norma constante do n.º 2 do artigo 287º do CPP, 
 sendo que a questão do conhecimento da constitucionalidade da norma relativa à 
 alínea d) do n.º 2 do artigo 120º do CPP se encontra prejudicada, por força de 
 trânsito em julgado de decisão já proferida a fls. 1592 e 1593.
 
  
 
  
 III – DECISÃO
 
  
 
             Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se não conhecer 
 do objecto do presente recurso. 
 
  
 Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 12 UC´s, nos 
 termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
 Lisboa, 13 de Maio de 2008
 Ana Maria Guerra Martins
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Vítor Gomes
 Gil Galvão