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Proc. n.º 893/08
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 I. Relatório
 A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional de um acórdão do Tribunal da 
 Relação de Lisboa, pretendendo ver apreciada a constitucionalidade das normas 
 contidas no artigo 6°, alínea l), do Código de Custas Judiciais e no artigo 
 
 306°, n°s 2 e 3, do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual “o 
 valor para efeitos de custas no caso de oposição à penhora é o valor dos bens 
 objecto da oposição”, por violação dos artigos 20º, n.ºs 1, 4 e 5, e 202º, n.º 
 
 2, da Constituição.
 
  
 Por decisão sumária proferida ao abrigo do artigo 78º-A da Lei do Tribunal 
 Constitucional não se conheceu do objecto do recurso, por se entender que o 
 recorrente não suscitou, perante o tribunal recorrido, a questão da 
 constitucionalidade e também porque a interpretação normativa que o recorrente 
 pretendia ver apreciada tinha  constituído mero obter dictum da decisão 
 recorrida e não a sua ratio decidendi.
 
  
 Notificado dessa decisão, o recorrente vem dela reclamar para a conferência nos 
 seguintes termos:
 
  
 A doutíssima decisão ora em Reclamação sustenta o não conhecimento do objecto do 
 recurso numa falta de preenchimento dos pressupostos processuais uma vez que, em 
 suma: 
 
 - não foi concretizada qualquer interpretação normativa tida por 
 inconstitucional limitando-se o Recorrente a remeter para uma nterpretação 
 emanente da decisão sindicada ou qualquer outra no mesmo sentido que pudesse 
 surgir, na sua multiplicidade; 
 
 - a decisão recorrida só meramente obter dictum aflorou a questão do valor da 
 causa para efeito de custas na oposição à penhora, não constituindo esta a ratio 
 decidendi dessa decisão. 
 Ora, afigura-se ao Recorrente que, data venta, assenta este entendimento num 
 lapso relevante quanto à vexata quaestio apresentada ao superior juízo das 
 instâncias, como emerge da interpretação das peças processuais que antecederam a 
 decisão em crise e que foram descritas sumariamente no texto recursivo analisado 
 por este Subido Tribunal na decisão sumária ora reclamada. 
 Desde logo porque perante a ausência de tese perfeitamente expressa, de forma 
 estendível, teve o Recorrente que se socorrer de presunções retiradas do texto 
 decisório ante a insuficiência de fundamentação das instâncias recorridas, 
 situação desde logo inusitada e imprevista. 
 Na realidade a decisão de 1ª instância resume-se a que: “(...)O que está em 
 causa com o presente incidente é uma pretensa ilegalidade dos bens móveis 
 penhorados e não, como é óbvio, o imóvel já penhorado nos autos, pelo que 
 constitui pura manobra de estilo pretender-se juntar o valor patrimonial daquele 
 imóvel ao valor dos bens móveis relativamente aos quais foi deduzido o incidente 
 em causa.(...)”. 
 A esta sucinta e mal expressa decisão contrapôs o Recorrente, nas conclusões 3ª 
 e 4ª do correspondente recurso que: “Sustentando-se a oposição à penhora 
 apresentada pelo recorrente na suficiência do valor do bem imóvel penhorado no 
 antecedente, para decidir sobre quais bens deverão subsistir penhorados, o valor 
 da acção terá que conformar-se à soma dos valores atribuídos à totalidade dos 
 bens que compõem o litígio. (...) O qual outro não poderá ser que a soma de 
 todos os bens penhorados e sopesados no julgamento da oposição e consequente 
 decisão judicial, isto é o valor assim atribuído pelo recorrente.”. 
 A esta questão, depois de a delimitar e invocar as regras do artigo 9.° do 
 Código das Custas Judiciais e o artigo 306.° do Código de Processo Civil, veio 
 expressamente o Tribunal da Relação de Lisboa, fazer coincidir esses conceitos 
 com os que emergem do artigo 6.° do supra citado CCJ, como se extrai da parte 
 decisória transcrita a páginas 4 da decisão sumária aqui sob reclamação e que, 
 para facilidade de apreciação, se transcreve aqui, de novo, agora com sublinhado 
 de nossa autoria: '(...) Acresce que nos termos do art.° 6.º, n.° 1, al. 1) do 
 CCJ, o valor para efeito de custas no caso de oposição à penhora é o valor dos 
 bens objecto de oposição, regra que se harmoniza bem com a de considerar como 
 valor do incidente para outros efeitos, que não o pagamento de custas, o 
 correlativo ao valor dos bens penhorados e objecto de oposição(…).
 Destarte, resulta clarividente que o Recorrente tendo-se amparado na perfeição 
 do entendimento da norma do artigo 9.° — aludida pela Tribunal da Relação — em 
 face da sua consonância com os imperativos constitucionais, sindicou a 
 interpretação que aquele Venerando Tribunal, sem expressão clara, fazia emanar 
 do conjunto do texto decisório, as do artigo 6°, alínea 1), com a interpretação 
 
 — ao que se logra entender — no sentido de que neste valor se não podem ter por 
 abrangidos todos os bens penhorados apesar do dispositivos do n.°s 2 e 3 do 
 artigo 306.° do CPP, que se afigura ao Recorrente mandar atender ao valor 
 pecuniário acumulado dos interesses em juízo. 
 E isso deixou formalmente expresso no texto recursório decidendo: 
 
 “(...)no entendimento que sustenta, deforma essencial a veneranda decisão 
 recorrida de que “(...)o valor para efeitos de custas no caso de oposição à 
 penhora é o valor dos bens objecto da oposição(...)“, tese contrária à que ali 
 se explanara antes quanto a que “(...)o incidente deduzido tem o valor 
 determinado pela sua utilidade económica (...)”. “(...)”.
 Daqui resulta a perfeição, na modesta opinião do Recorrente, do seu requerimento 
 ante este Subido Tribunal, isto é a arguição da inconstitucionalidade daquelas 
 duas normas — que não da outra também invocada pelo TRL — na interpretação 
 expressa deficientemente, por isso emanente, subentendida, presumida também. 
 Como também, por via dessa tese expressa de modo pouco claro, salvo o devido e 
 merecido respeito, acautelara antes qualquer interpretação diversa da que 
 apresentara como correcta, na sua perspectiva, àquela Veneranda Relação, sem que 
 tal fosse necessário pois que também o entendimento que se retirava do texto da 
 primária sentença se manifestou ser a que ambas as instâncias recorridas 
 perfilham e se estava arguindo de inconstitucionalidade, qual seja, a que supra 
 se transcreveu e ora se repete “(…) O que está em causa com o presente incidente 
 
 é uma pretensa ilegalidade dos bens móveis penhorados e não, como é óbvio, o 
 imóvel  já penhorado nos autos, pelo que constitui pura manobra de estilo 
 pretender-se juntar o valor patrimonial daquele imóvel ao valor dos bens móveis 
 relativamente aos quais foi deduzido o incidente em causa (…)”, isto é o valor 
 da causa e não o valor apenas para efeito de custas, tendo o TRL entendido na 
 perfeição esse entendimento, tanto assim que o repudiou, sufragando a decisão 
 ali recorrida e deixando taxativamente lavrado na decisão o seu julgamento 
 quanto à bonomia dessa interpretação, conhecendo, ainda que sucintamente, da 
 questão da inconstitucionalidade ao afirmar: “(...)mas apenas se está perante 
 hipótese que o legislador ordinário admitiu e que o legislador constitucional 
 não arredou, pelo que não pode ser visto nisso a violação de qualquer princípio 
 constitucional(...)”. 
 Daqui resulta que, de facto, o Recorrente suscitou em sede de recurso para a 
 Relação de Lisboa a tese que se descortinava do texto recorrido, extraindo dele 
 o entendimento possível, nitidamente prevalecente em relação a qualquer outro 
 que, hipoteticamente, pudesse surgir, afinal também como o Venerando Tribunal a 
 quo que se apercebeu perfeitamente da vexata quaestio assim apresentada e a 
 julgou pronunciando-se sobre ela, como também sob a hipótese de poder ser 
 inconstitucional, fazendo ele próprio a interligação normativa entre os artigos 
 
 6.º e 9.° do CCJ numa percepção clara do thema decidenduum quanto à matéria de 
 valor da acção, fazendo ainda coincidir o valor das custas com o da acção, o que 
 sendo correcto não era na realidade o âmago da questão, antes um suplemento 
 marginal inócuo. Em suma se dirá derradeiramente que:
 a) a questão controvertida assenta em saber qual o valor do incidente de 
 oposição à penhora quando em causa estão bens móveis cuja penhora estaria vedada 
 por suficiência do bem móvel penhorado no antecedente e sem que dessa penhora 
 tivesse havido desistência; 
 b) matéria esta que foi o objecto da decisão de 1ª Instância com fundamento não 
 perfeitamente expresso mas donde emana, até por via da expressão pura manobra de 
 estilo”, que o valor se limitaria ao dos bens móveis penhorados alvo da oposição 
 em juízo; 
 c) para além desta expressão objectiva que percepcionava desse texto decisório o 
 Recorrente deixou ainda plasmado cautelarmente, em sede de conclusões, qualquer 
 outra interpretação que, eventualmente, pudesse surgir quanto às normas 
 adjectiva e tributária que arguía de inconstitucionalidade interpretativa; 
 d) como surgiu de facto, inusitada e imprevista, ao vir o TRL considerar a 
 coincidência in casu do valor do incidente com o valor tributário para efeito de 
 custas, matéria no entanto que o Recorrente tem por conforme às exigências 
 constitucionais e, por isso, não sindicada ante este Subido Tribunal; 
 e) Sendo que as questões jurídicas assim apresentada ao Tribunal a quo foram por 
 este perfeitamente entendidas, designadamente a tese tida por correcta expressas 
 nas conclusões 3ª e 4ª delas tomou conhecimento e julgou, incluindo a 
 conformidade da interpretação efectuada em 1ª instância aos imperativos 
 constitucionais invocados; 
 f) Existe, pois, no requerimento de interposição do presente recurso a 
 explicitação da tese interpretativa tida pelo Recorrente como inconstitucional, 
 tendo ela sido previamente apresentada ao julgamento do Tribunal a quo que a 
 entendeu na perfeição e a conheceu, como deixou também expressas as normas 
 violadas e o entendimento que considera correcto, tendo que se haver tudo o mais 
 como matéria preventiva de entendimentos diversos, não ocorridos, donde o 
 preenchimento de forma suficiente das exigências legais para a admissão e 
 ulteriores termos que melhor explicitarão as anomalias interpretativas que o 
 Recorrente crê existirem, com o devido respeito. 
 Termos em que se requer que em conferência venha este soberano Tribunal a 
 reapreciar a questão e conhecer da matéria colocada ao seu juízo na senda da 
 sempre necessária Justiça.
 
  
 O recorrido não respondeu.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II. Fundamentação
 
  
 A decisão sumária ora reclamada concluiu no sentido do não conhecimento do 
 recurso de constitucionalidade em virtude de, por um lado, o recorrente não ter 
 suscitado, perante o tribunal recorrido, a questão de inconstitucionalidade que 
 pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional - que é a das normas dos 
 artigos 6º, alínea l), do Código das Custas Judiciais, e 306º, n.º s 2 e 3, do 
 Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual o valor para efeitos 
 de custas no caso de oposição à penhora é o valor dos bens objecto da oposição 
 
 -, e, por outro lado, a decisão recorrida não ter aplicado a interpretação 
 normativa que constitui o objecto do recurso. 
 
  
 Tanto o cumprimento do ónus de suscitação, como a aplicação da norma ou 
 interpretação normativa na decisão recorrida, constituem pressupostos 
 processuais do presente recurso, nos termos dos artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 
 
 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional.
 
  
 Assim sendo, a presente reclamação só poderia proceder se o recorrente 
 demonstrasse: por um lado, que suscitara a questão de inconstitucionalidade 
 perante o tribunal recorrido; por outro lado, que a decisão recorrida aplicara a 
 interpretação normativa por si censurada.
 
  
 Ora, no que se refere ao cumprimento do ónus de suscitação da questão de 
 inconstitucionalidade, verifica-se que o reclamante não identifica qualquer 
 passagem das alegações que produziu perante o tribunal recorrido da qual resulte 
 que - contrariamente ao sustentado na decisão sumária - imputou às normas dos 
 artigos 6º, alínea l), do Código das Custas Judiciais, e 306º, n.º s 2 e 3, do 
 Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual o valor para efeitos 
 de custas no caso de oposição à penhora é o valor dos bens objecto da oposição, 
 a violação de normas ou princípios constitucionais.
 
  
 Limita-se, na verdade, o reclamante a transcrever certas conclusões das 
 alegações perante o tribunal recorrido nas quais nenhuma referência é feita a 
 estes preceitos ou a esta interpretação, bem como certas passagens do próprio 
 acórdão recorrido: de tais conclusões não pode, portanto, inferir-se que o 
 reclamante haja colocado uma questão de inconstitucionalidade em relação à 
 interpretação normativa que constitui o objecto do presente recurso; quanto às 
 passagens do acórdão recorrido, e porque as mesmas obviamente não se confundem 
 com qualquer peça processual apresentada pelo reclamante durante o processo, nem 
 sequer aludem à suscitação, pelo recorrente, de qualquer questão de 
 inconstitucionalidade, e não pode delas retirar-se qualquer argumento plausível 
 no sentido da suscitação de uma questão de inconstitucionalidade pelo recorrente 
 em termos processualmente adequados.
 
  
 No que diz respeito à não aplicação, na decisão recorrida, da interpretação 
 normativa que constitui o objecto do recurso, constata-se que o reclamante não 
 se pronuncia sobre a correspondente fundamentação da decisão sumária. Nesta 
 entendeu-se que a decisão recorrida não versou sobre a questão do valor para 
 efeitos de custas no caso de oposição à penhora, pois que o agravo visava 
 sindicar uma decisão relativa ao valor de um incidente para outros efeitos (que 
 não o pagamento de custas); assim sendo, a interpretação normativa que o 
 recorrente pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional constituiu mero 
 obter dictum da decisão recorrida e não a sua ratio decidendi; e que implica 
 considerar que tal interpretação não foi aplicada, nos termos e para os efeitos 
 do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional.
 
  
 O reclamante não pôs em causa esta fundamentação, pelo que não há motivo, também 
 quanto a este aspecto, para alterar o julgado.
 
  
 III. Decisão 
 Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, indefere-se a presente reclamação, 
 mantendo-se a decisão sumária reclamada.
 
  
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
 
  
 Lisboa, 12 de Março de 2009
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Gil Galvão