 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo n.º 262/08
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
  
 Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 Relatório
 No âmbito do processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, n.º 4/06, do 
 
 1º Juízo da comarca de Tavira, A. foi condenado como autor material, em concurso 
 real, de três crimes de furto qualificado, sendo um na forma tentada, e de um 
 crime de furto simples, na pena conjunta de 7 anos e 6 meses de prisão. 
 
  
 O Tribunal da Relação de Évora, na sequência de recurso interposto pelo arguido, 
 confirmou aquela decisão. 
 
  
 Inconformado, o arguido recorreu uma vez mais, agora para o Supremo Tribunal de 
 Justiça, discordando da condenação no que concerne a dois dos crimes pelos quais 
 foi condenado, bem como da medida das penas parcelares e conjunta que lhe foram 
 aplicadas.
 
  
 O Supremo Tribunal de Justiça proferiu acórdão em 28-11-2007, rejeitando o 
 recurso interposto.
 
  
 Esta decisão foi notificada ao mandatário do arguido através de aviso postal 
 registado, datado de 30 de Novembro de 2007.
 
  
 O arguido reclamou para a conferência desta decisão.
 
  
 O Conselheiro Relator por despacho proferido em 7-1-2008, indeferiu a 
 reclamação, com fundamento em que a decisão reclamada já havia sido proferida em 
 conferência.
 
  
 O arguido, por requerimento apresentado em 16 de Janeiro de 2008, interpôs 
 recurso do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 28-11-2007, nos 
 seguintes termos:
 
 “A., recorrente nos autos acima identificados, não se conformando com a decisão 
 de rejeição de fls. 916/917 confirmada pelo despacho de fls. 923, da mesma vem 
 interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70º nº 1, 
 alínea b) da Lei 28/82, de 15 de Novembro, com as alterações introduzidas pela 
 Lei nº 143/85, de 26 de Novembro, pela Lei nº 85/89, de 7 de Setembro, pela Lei 
 nº 88/95, de 1 de Setembro, e pela Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro, e com 
 efeito suspensivo nos termos do artigo 78º nº 3 do mesmo diploma. 
 O acórdão objecto do presente recurso considerou que o recurso para o Supremo 
 Tribunal de Justiça deveria ser rejeitado por ser a decisão irrecorrível nos 
 termos do artigo 400º, nº 1, al. f) do CPP. 
 Na resposta ao parecer do Ministério Público o arguido e recorrente defendeu, 
 salvo melhor entendimento, que a decisão ora posta em crise é recorrível nos 
 termos do artigo 400º, nº 1, al. e) da anterior versão do Código de Processo 
 Penal. Embora tal alínea e) tenha sido revogada pelo actual CPP, não podemos 
 ignorar o princípio estabelecido no artigo 5º do CPP, cujo nº 1 estabelece a 
 possibilidade de manter a validade dos actos realizados na vigência da lei 
 anterior (como é o caso do presente recurso) e cujo nº 2, al. a), determina que 
 o novo CPP não se aplica ao presente processo, iniciado anteriormente à sua 
 vigência, porquanto da sua aplicabilidade imediata resulta um agravamento da 
 situação processual do arguido e limita o seu direito de defesa. 
 Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá que um dos pedidos do recurso 
 apresentado referia-se a uma questão que podemos denominar como questão prévia e 
 que consistia no facto do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora 
 ter rejeitado o conhecimento da matéria de facto por alegadamente haver uma 
 lacuna no que se refere à transcrição da prova produzida. Contudo, o recorrente 
 defendeu no seu recurso que foi apresentada a devida transcrição da prova e 
 pedia que fosse ordenada a remessa dos autos ao Tribunal da Relação por forma a 
 que fosse apreciada a matéria de facto. O Tribunal da Relação pode conhecer de 
 facto e, salvo melhor opinião, ao conhecer só de direito limitou os direitos de 
 defesa do arguido, pelo que não se pode dizer que estamos verdadeiramente 
 perante uma decisão que confirma a decisão da primeira instância, uma vez que a 
 decisão da segunda instância não apreciou todas as questões que deveria ter 
 apreciado, designadamente a matéria de facto. O recorrente considera que deveria 
 ser analisada a validade da transcrição da prova e ordenada a apreciação da 
 matéria de facto pelo Tribunal da Relação de Évora. 
 Assim, e salvo opinião melhor fundamentada, o recorrente considera que estão a 
 ser-lhe negados direitos fundamentais constitucionalmente consagrados, como é o 
 caso do princípio da igualdade, porquanto anteriormente à actual versão do CPP 
 alguns recursos eram rejeitados por se tratar de decisões da segunda instância 
 que confirmavam decisões da primeira instância por se tratar de penas inferiores 
 a cinco anos, pelo que se pressupõe que ainda pelo anterior regime, tratando-se 
 de pena superior a cinco anos, haveria lugar a recurso. Actualmente o recorrente 
 com pena superior a cinco anos vê o seu recurso rejeitado, porque a sua 
 situação alegadamente integra-se na alínea f) do artigo 400º do CPP. O 
 recorrente considera que a actual redacção do artigo 400º colide com os direitos 
 de defesa previstos no artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, 
 maxime o nº 1 que garante o direito ao recurso, e como tal pretende que o 
 Tribunal Constitucional aprecie tal constitucionalidade. É que tendo sido 
 revogada a antiga alínea e) tornou-se ainda mais extenso o leque de penas das 
 quais não cabe recurso, desde que o Tribunal da Relação confirme a decisão da 
 primeira instância com a aplicação efectiva de pena não superior a oito anos. Ou 
 seja, um arguido com uma pena de oito anos, que já é uma pena considerável (tão 
 considerável que é por exemplo a pena mínima aplicável ao homicídio) vê negado o 
 seu direito ao recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Acontece que o 
 arguido in casu vem apenas condenado por furtos e ainda assim vê negado o 
 direito ao recurso. E, pelo caso vertente nos presentes autos, verifica-se que 
 facilmente um processo desemboca na alínea f) do artigo 400º. Basta o Tribunal 
 da Relação decidir não conhecer da matéria de facto alegando falta de 
 transcrição e confirmar o raciocínio da primeira instância no que se refere à 
 matéria de direito. Só que in casu, e salvo melhor opinião, a transcrição 
 existe. E aqui, mais uma vez, salvo o devido respeito, o recorrente sente que 
 está a ser violado o princípio da igualdade (artigo 13º da CRP) já que por 
 diversas vezes se registaram situações de recursos parcialmente procedentes no 
 Tribunal da Relação de Évora por via da apreciação da matéria de facto e com 
 transcrições efectuadas dentro do mesmo molde que o foram in casu. 
 Tais inconstitucionalidades e ilegalidades foram suscitadas na resposta ao 
 parecer do Ministério Público proferido no STJ e bem assim na reclamação para a 
 Conferência. 
 Em conclusão: 
 
 1. À interposição do presente recurso aplica-se o anterior CPP, pelo que a 
 decisão é recorrível por se integrar na previsão do artigo 400º, nº 1, al. e) e, 
 salvo o devido respeito por opinião diversa, só esta interpretação poderá ser 
 conforme aos direitos de defesa do arguido previstos na Constituição da 
 República Portuguesa. 
 
 2. Além do mais, salvo melhor entendimento, o recorrente entende que estão a ser 
 violados princípios constitucionais e o próprio artigo 400º do CPP na redacção 
 actual colide com os direitos de defesa consagrados no artigo 32º da CRP, maxime 
 o nº1 que garante o direito ao recurso e, como tal, pretende que o Tribunal 
 Constitucional aprecie tal constitucionalidade e legalidade.” 
 
  
 O Conselheiro Relator do acórdão recorrido, proferiu despacho em 6-2-2008 de não 
 admissão do recurso interposto para o Tribunal Constitucional, por ter 
 considerado que o mesmo foi apresentado para além do prazo legal.
 
  
 O arguido reclamou desta decisão para o Tribunal Constitucional, nos seguintes 
 termos:
 O fundamento de não admissão do recurso baseia-se em que o mesmo terá sido 
 interposto “fora de prazo” iniciando a contagem de tal prazo na data da 
 notificação do acórdão de que o recorrente pretende interpor recurso. Contudo, e 
 salvo melhor entendimento, considera o recorrente que a contagem do prazo não 
 poderá iniciar-se nessa data, porquanto nos dez dias subsequentes a tal 
 notificação do acórdão de que pretendia recorrer, o recorrente realizou uma 
 diligência prevista na lei para aquele momento processual que foi a reclamação 
 para a conferência da decisão da rejeição de fls. 916/917. É que não se trata in 
 casu tão só e simplesmente de recorrer de um acórdão proferido pelo STJ; 
 trata-se de reagir pelos meios previstos na lei a uma decisão de rejeição do 
 recurso. Ora, conferindo a legislação em vigor o direito ao recorrente de 
 reclamar para a conferência da decisão de rejeição, o recorrente lançou mão 
 desse mecanismo legal nos dez dias subsequentes à notificação do despacho que 
 rejeitou o recurso. A decisão dessa reclamação, que corresponde ao despacho de 
 fls. 923, foi notificada ao recorrente em 7 de Janeiro do corrente ano e, nos 
 dez dias subsequentes, mais precisamente em 16 de Janeiro, foi remetido ao STJ o 
 recurso para o Tribunal Constitucional, pelo que o mesmo recurso não é, de forma 
 alguma, extemporâneo, devendo ser admitido. 
 Salvo melhor opinião, considerar que o recurso foi interposto fora de prazo 
 equivale a interpretar a lei de forma a que os recorrentes não utilizem o 
 mecanismo legal da reclamação para a conferência e passem directamente à fase do 
 recurso, o que não nos parece ser o espírito da lei. Ora, seguindo esse 
 raciocínio, reclamar para a conferência irá equivaler a uma renúncia ao recurso, 
 o que também não nos parece ser a intenção do legislador. Dessa forma, de um 
 modo geral, e por analogia, também nunca se poderiam utilizar quaisquer 
 mecanismos legais intermédios entre a notificação das decisões e os recursos, 
 como sejam por exemplo, os pedidos de esclarecimento ou de reforma das 
 sentenças, pois enquanto tais diligências fossem levadas a cabo, transcorreria o 
 trânsito em julgado e os recursos seriam sempre interpostos fora de prazo. 
 Termos em que se requer que a presente reclamação seja julgada procedente e o 
 recurso admitido. 
 
  
 O Ministério Público pronunciou-se sobre a reclamação apresentada, alegando o 
 seguinte:
 
 “O recurso de constitucionalidade interposto é efectivamente intempestivo.
 Na verdade, o ora reclamante – confrontado com o acórdão que rejeitou, por 
 legalmente inadmissível, o recurso dirigido ao STJ – veio “reclamar para a 
 conferência” do próprio acórdão, naturalmente proferido pela conferência –, 
 confundido esta situação processual com a que efectivamente legitima tal meio 
 impugnatório – a prolação de “decisão sumária” pelo relator. Tal significa que 
 fez uso de um meio impugnatório manifestamente inexistente no ordenamento 
 processual, pelo que naturalmente tal actuação não obsta a que transite em 
 julgado ou acórdão que se pretendia atacar.”
 
  
 
                                                       *
 Fundamentação
 O prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional é de dez dias 
 
 (artigo 75.º, da LTC).
 Este prazo conta-se segundo as regras previstas no C.P.C. (artigo 69.º da LTC).
 O prazo de interposição dos recursos, em regra, tem o seu início na data da 
 notificação da decisão recorrida (artigo 685.º, n.º 1, do C.P.C.).
 Nos termos do artigo 686.º, do C.P.C., “se alguma das partes requerer a 
 rectificação, aclaração ou reforma da sentença, nos termos do artigo 667.º e do 
 n.º 1, do artigo 669.º, o prazo para o recurso da sentença só começa a correr 
 depois de notificada a decisão proferida sobre o requerimento.”
 Neste caso, o arguido notificado de acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de 
 Justiça de rejeição de recurso, reclamou para a conferência desse acórdão, tendo 
 essa reclamação sido indeferida, uma vez que o acórdão reclamado já tinha sido 
 proferido em conferência.
 Na verdade, o incidente de reclamação para a conferência nos tribunais 
 superiores só tem lugar das decisões individuais do relator e não das decisões 
 colectivas, proferidas através de acórdão (artigos 700.º, n.º 3, e 724.º, n.º 1, 
 do C.P.C.).
 O reclamante utilizou, pois, um meio impugnatório manifestamente inexistente no 
 ordenamento processual (reclamação para a conferência duma decisão já proferida 
 em conferência, no S.T.J.), pelo que a reclamação apresentada não tem a 
 virtualidade de suspender ou interromper o prazo de impugnação do acórdão 
 indevidamente reclamado, como tem insistentemente afirmado este Tribunal (vide, 
 a título de exemplo, os acórdãos n.º 278/2005, 64/2007, 173/2007, 279/2007 e 
 
 80/2008, todos acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
 Não se revelando a existência de qualquer causa suspensiva ou interruptiva do 
 prazo de recurso, a sua interposição em 16-1-2008 de acórdão notificado ao 
 arguido por aviso postal registado, datado de 30-11-2007, revela-se 
 manifestamente intempestiva, pelo que deve ser indeferida a reclamação 
 apresentada.
 
  
 
                                                       *
 Decisão
 Pelo exposto indefere-se a reclamação apresentada por A. do despacho de não 
 admissão do recurso para o Tribunal Constitucional proferido nestes autos em 
 
 6-2-2008. 
 
  
 
                                                       *
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, 
 considerando os critérios indicados no artigo 9.º, n.º 1, do D.L. n.º 303/98, de 
 
 7 de Outubro (artigo 7.º, do mesmo diploma).
 
  
 
                                                       *
 Lisboa, 22 de Abril de 2008
 João Cura Mariano
 Mário José de Araújo Torres
 Rui Manuel Moura Ramos