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Processo nº 860/07
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
 
 
  
 
             Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
             1 – A. e B. reclamam para a conferência ao abrigo do disposto no n.º 
 
 3 do art.º 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão 
 
 (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator, no Tribunal Constitucional, 
 que decidiu não tomar conhecimento do recurso interposto das decisões proferidas 
 pelo Presidente da Relação de Lisboa, de 17/04/2007 e de 22/05/2007, que lhes 
 indeferiram, respectivamente, a reclamação deduzida, nos termos do art.º 688.º 
 do Código de Processo Civil (CPC), contra o despacho proferido pelo juiz do 
 Tribunal Judicial da Comarca de Faro que não lhes admitiu o recurso interposto 
 para o Tribunal da Relação de despacho do mesmo tribunal e o pedido de reforma 
 da mesma decisão.
 
  
 
             2 – Sustentando a sua reclamação, as reclamantes desenvolvem a 
 seguinte argumentação:
 
  
 
 «1.     Na Decisão Sumária sub judice, o Exmo. Senhor Conselheiro Relator deste 
 Venerando Tribunal decidiu não conhecer do recurso, por as Recorrentes não terem 
 suscitado a questão de inconstitucionalidade atempadamente. 
 
  
 De facto, entendeu-se aí que as Recorrentes deveriam ter invocado a questão da 
 inconstitucionalidade logo na Reclamação que, nos termos do art. 688° do CPC, 
 dirigiram em 23.10.2006 ao Presidente do Tribunal da Relação de Évora, do 
 Despacho do Tribunal Judicial de Faro que não admitiu o recurso aí interposto, e 
 não apenas na reforma da Decisão proferida por aquele Presidente (04.05.2007): 
 
  
 
 “Assim sendo, a interpretação seguida pelo Presidente da Relação corresponde a 
 uma interpretação meramente declarativa dos preceitos aplicados e cuja 
 constitucionalidade se pretendeu sindicar no pedido de reforma. Mas a destempo, 
 como resulta do acima expendido. 
 
  
 Ao reclamar, pedindo a aplicação de tais preceitos legais, as recorrentes 
 estavam obrigadas a antecipar uma interpretação dos mesmos preceitos no sentido 
 de o órgão decisor poder verificar a efectiva existência do alegado pressuposto 
 de admissibilidade do recurso: a existência de ofensa de caso julgado. 
 
  
 Não estamos assim perante qualquer interpretação insólita ou imprevisível. (…) 
 
  
 Dito de outro modo, não pode considerar-se insólita ou surpreendente uma decisão 
 que, mediante uma interpretação declarativa do texto legal, faça aplicação de 
 uma norma potencial e previsivelmente mobilizável para a resolução do caso 
 concreto, porquanto instituinte de um possível desfecho para uma determinada 
 controvérsia” – pág. 7, parágrafos 3, 4 e 7. 
 
  
 
 2.        No entanto, salvo o devido respeito, tal entendimento não pode 
 proceder, pelas seguintes razões: 
 
  
 
 3.      Em primeiro lugar, quanto ao momento temporal e oportunidade processual 
 da invocação da inconstitucionalidade aqui em discussão, as Recorrentes, 
 conforme explicitaram no seu requerimento de recurso para este Venerando 
 Tribunal, só suscitaram a questão de inconstitucionalidade na Reforma de 
 
 04.05.2007 e não antes (na Reclamação dirigida ao Presidente do Tribunal da 
 Relação de Évora), porque as normas cuja inconstitucionalidade foi arguida só 
 foram efectivamente aplicadas nessa Decisão e não antes. 
 
  
 Na verdade, essa questão (a interpretação/aplicação da normas nos termos que 
 reputamos inconstitucionais) nunca foi colocada em momento anterior no processo, 
 nem era previsível que o fosse, pois a Decisão da 1ª Instância, de 26.09.2006, 
 que não admitiu o recurso e que justificou a Reclamação para o Presidente do 
 Tribunal da Relação de Évora, nos termos do art. 688° do CPC, fê-lo, não por 
 considerar que não havia ofensa de caso julgado (apesar de este fundamento ter 
 sido invocado, desde logo, pelas Recorrentes, no seu requerimento de 
 interposição de recurso), mas sim com fundamento no valor da sucumbência. 
 
  
 Assim, foi só naquela Decisão do Senhor Presidente do Tribunal da Relação de 
 
 Évora que efectivamente foi apreciada a questão de o recurso ter sido interposto 
 com fundamento em ofensa de caso julgado. Antes desse momento e decisão 
 processual nunca se abordou esta questão, razão pela qual as Recorrentes não 
 puderam, sequer, prever a interpretação e aplicação que a final foi feita da 
 norma do art. 678°, nº 2, do CPC (conjugada com as dos arts. 687°, nºs. 1 e 3, e 
 
 689°, nº 1, do CPC). 
 
  
 
 4.      Em segundo lugar, não pode proceder o argumento de que a 
 interpretação/aplicação feita pelo Presidente do Tribunal da Relação de Évora 
 das normas em causa era previsível, por resultar de uma interpretação meramente 
 declarativa do preceito legal, conforme se decidiu na Decisão sub judice. 
 
  
 
 5.      As Recorrentes não pretendem discutir aqui a bondade deste critério de 
 admissibilidade de recursos para o Tribunal Constitucional. O que se pretende 
 demonstrar é que, in casu, essa situação não se verifica. 
 
  
 
 6.      Relembre-se, com todo o respeito, que o elemento literal, gramatical ou 
 filológico da interpretação consiste na utilização das palavras da lei, 
 isoladamente e na sua unidade sintáctica, com vista a inferir o possível sentido 
 da norma que terá que ser compatível com o teor literal da lei, ou que 
 reflectir-se, de algum modo, no texto legal. Esta conclusão resulta 
 expressamente do art. 9°, nº 2, do CC, no qual se refere que “Não pode, porém, 
 ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra 
 da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” 
 
  
 Conforme refere, doutamente, Mário Bigotte Chorão[1] 1 “A busca de soluções 
 jurídicas que não se contenha nas fronteiras do sentido literal da lei já não 
 pertencerá, em rigor, à interpretação da lei, mas a actividade 
 ultra-interpretativa do direito” 
 
  
 
 7.      No entanto, da letra da lei (seja do art. 678°, nº 2, seja do art. 687°, 
 nº 3, ou do art. 689°, nº 1, do CPC) não resulta que, interposto um recurso com 
 fundamento em violação de caso julgado, o tribunal, para aferir da 
 admissibilidade do mesmo, pode desde logo conhecer e decidir sobre o respectivo 
 mérito e não admitir esse recurso por considerar que, no caso concreto, não 
 existe a invocada violação de caso julgado. 
 
  
 Salvo o devido respeito (por este Venerando Tribunal e pela interpretação do CPC 
 defendida na Decisão sub judice), essa interpretação não é declarativa, isto é, 
 não resulta da letra da lei. 
 
  
 Pelo contrário, num necessário apelo ao elemento sistemático da interpretação 
 normativa, é o próprio art. 678°, nº 2, do CPC, que vem prescrever que no caso 
 de o recurso ser interposto com fundamento em ofensa de caso julgado, o mesmo é 
 sempre admissível, seja qual for o valor da causa, sem se fazer qualquer alusão, 
 indirecta, implícita ou imperfeita, ao facto de a sua admissão depender, 
 necessariamente, de uma prévia verificação judicial da violação do caso julgado 
 que se invoca. 
 
  
 O mesmo se diga relativamente aos arts. 687°, nº 3, e 689°, nº 1, do CPC, dos 
 quais também não resulta que um dos motivos de não admissão do recurso 
 interposto com fundamento em ofensa de caso julgado seja o de o Tribunal com 
 competência para admitir o recurso poder concluir que no caso concreto não se 
 verifica essa ofensa que se invoca. 
 
  
 
 8.      Assim (sem necessidade, ainda, de optar pela interpretação mais adequada 
 do CPC), importa concluir que das normas invocadas não resulta a possibilidade 
 de o Tribunal agir conforme agiu (conhecer da efectiva existência de ofensa de 
 caso julgado no momento da admissão do recurso, antes mesmo de as Recorrentes 
 apresentarem as suas Alegações e defenderem a solução que entendem resultar do 
 Direito aplicável), pelo que, ao contrário do que se considerou na Decisão sub 
 judice, a interpretação seguida pelo Presidente do Tribunal da Relação de Évora 
 não foi uma interpretação meramente declarativa dos preceitos aplicados, pelo 
 que as Recorrentes, ao contrário do que aí também de entendeu, não estavam 
 obrigadas a antecipar essa interpretação dos referidos preceitos. 
 
  
 
 9.      Em terceiro lugar, a interpretação que o Presidente do Tribunal da 
 Relação de Évora fez dos arts. 678°, nº 2, 687°, nºs 1 e 3 e 689°, nº 1, do CPC, 
 não era previsível, designadamente pelo facto de, na nossa opinião, essa 
 interpretação contrariar o regime de recursos do CPC e a própria Constituição. 
 
  
 De facto, para além de não resultar da letra da lei (como se viu no nº 7 deste 
 Requerimento), esse entendimento também não resulta do espírito deste regime 
 jurídico-processual, nem da história destes preceitos[2] 
 
  
 
 9.1 Esta interpretação dos preceitos em causa viola, de facto, o 
 espírito/sistema da lei, pois: 
 
  
 a.      Permite uma decisão sobre o mérito do recurso (o efectivo conhecimento 
 da violação do caso julgado invocado e a conclusão que essa violação não se 
 verifica) sem que as Recorrentes tenham tido a oportunidade de apresentar as 
 suas Alegações, sendo certo que é aí que se pode demonstrar a violação do caso 
 julgado que se invoca e apresentar os argumentos jurídicos que suportam essa 
 posição. 
 
  
 b.      Permite, materialmente, uma decisão sobre o mérito do recurso antes 
 mesmo de este ter sido admitido, quando, nesta fase de admissão do recurso, o 
 poder jurisdicional se esgota na verificação dos requisitos e pressupostos 
 processuais da sua admissibilidade (art. 687°, nº 3, ia parte, do CPC), isto é, 
 na verificação de que o fundamento do recurso é aquele ou não. É certo que o 
 Tribunal ad quem, conforme se refere na Decisão sub judice (pág. 7, 2° 
 parágrafo), pode sempre discordar do entendimento do Tribunal a quo e considerar 
 que o recurso interposto com fundamento em caso julgado não deveria ter sido 
 admitido, indeferindo-o liminarmente ou não o conhecendo. No entanto, essa é uma 
 situação absolutamente diferente da que aqui se discute, pois, nesse caso, as 
 Recorrentes já tiveram oportunidade de apresentar as suas Alegações (no Tribunal 
 a quo) e demonstrar as razões de facto e de direito que suportam o seu 
 entendimento, ao contrário do caso que nos ocupa. 
 
  
 c.      Permite que o recurso seja materialmente decidido, não pelo Tribunal 
 competente para o efeito – secções do Tribunal recorrido, nos termos do art. 
 
 36°, a), da LOFTJ, enquanto Tribunal de estrutura colectiva –, mas sim por quem 
 apenas tem o poder para admitir esse recurso (Juiz singular). 
 
  
 d.      Permite a inexistência de qualquer fronteira entre a fase da 
 admissibilidade do recurso e a fase da sua procedência ou julgamento, que é 
 absolutamente essencial ser estabelecida, não só por uma questão de separação de 
 poderes/competências dos Tribunais, mas também para evitar decisões surpresa, 
 proibidas pelo art. 3° do CPC e pelo direito fundamental a uma tutela 
 jurisdicional efectiva e participada (art. 20° da Constituição). 
 
  
 e.      Permite a violação do art. 6870, nº 3, do CPC, que estabelece 
 taxativamente os fundamentos de inadmissibilidade dos recursos, pois nesse 
 preceito não se faz qualquer referência à possibilidade de um recurso interposto 
 com fundamento em violação de caso julgado poder não ser admitido por não se 
 verificar essa violação que fundamenta o recurso. 
 
  
 Em suma, não resulta das normas legais em causa (designadamente do art. 678°, nº 
 
 2, do CPC), nem do espírito deste sistema normativo, ao contrário do que se 
 refere na Decisão sub judice, a possibilidade de o Tribunal (neste caso, o 
 Presidente do Tribunal da Relação de Évora) conhecer desde logo da ofensa do 
 caso julgado que se invoca como fundamento do recurso, pelo que não era exigível 
 
 às Recorrentes que previssem essa interpretação/Decisão e se antecipassem no 
 tempo quanto à invocação da respectiva inconstitucionalidade. 
 
  
 
 9.2              Quanto ao elemento histórico da interpretação, importa 
 relembrar que a exigência legal (art. 687°, nº 1, do CPC) de o recorrente 
 indicar no seu requerimento de recurso que recorre com fundamento em ofensa de 
 caso julgado apenas se impôs com a revisão do CPC em 1986 (Decreto-Lei nº 
 
 180/96, de 25 de Setembro), onde se pretendeu resolver, em definitivo, as 
 dificuldades que existiam nesta matéria e que se prendiam com a questão de 
 saber, mesmo na ausência de uma exigência legal nesse sentido, como se 
 distinguia a fase da admissibilidade do recurso da fase do julgamento do mesmo, 
 isto é, se para o recurso ser admitido bastava que se referisse que se recorria 
 com fundamento em ofensa de caso julgado ou se era também necessário que se 
 indicassem os elementos pelos quais se mostrasse ser séria a afirmação de ter 
 sido ofendido um caso julgado. 
 
  
 Perante esta questão e dificuldade, o legislador considerou e consagrou ser 
 apenas exigível ao recorrente indicar no seu requerimento de interposição de 
 recurso que o faz com aquele fundamento específico de violação de caso julgado, 
 e não que demonstre também a efectiva violação que invoca. Se tivesse sido esta 
 a solução que o legislador pretendia teria sido essa a solução consagrada. Este 
 entendimento, aliás, era já o defendido pela jurisprudência e doutrina antes 
 desta revisão da lei processual em 1996[3]. 
 
  
 Assim, se o legislador não quis ir mais além do que foi, quando poderia ter ido, 
 não deve agora o intérprete fazê-lo, principalmente sem que exista qualquer 
 fundamento ou reflexo no teor da norma ou no espírito do sistema, conforme se 
 demonstrou. 
 
  
 
 10.  Em quarto e último lugar, se efectivamente releva, conforme se refere na 
 Decisão sub judice (pág. 2, ponto 3.1, 2° e 3° parágrafos), para efeito da 
 determinação do momento em que deve ser suscitada a questão da 
 inconstitucionalidade, o facto de essa invocação ser feita em momento em que o 
 tribunal a quo ainda pudesse conhecer dessa questão, isto é, antes de se esgotar 
 o seu poder jurisdicional, então nada obsta a que este recurso seja admitido, 
 pois o Presidente do Tribunal da Relação de Évora, na decisão sobre a reforma aí 
 apresentada pelas Recorrentes, teve a efectiva oportunidade de se pronunciar 
 sobre a inconstitucionalidade que se pretende submeter ao conhecimento deste 
 Venerando Tribunal Constitucional. 
 
  
 Deste modo, salvaguardada que estava a possibilidade de o Presidente do Tribunal 
 da Relação de Évora se pronunciar e conhecer da questão da inconstitucionalidade 
 suscitada pelas Recorrentes, bem como a competência e função deste Venerando 
 Tribunal Constitucional enquanto instância superior que, nos processos de 
 fiscalização concreta, procede apenas ao reexame ou reapreciação dessa mesma 
 questão, deveria o recurso interposto pelas Recorrentes ter sido admitido e não 
 rejeitado liminarmente, nos termos do art. 78°-A, nº 1, da Lei do Tribunal 
 Constitucional. 
 
  
 Nestes termos, 
 
  
 Pelo exposto, requer-se a este Venerando Tribunal se digne revogar a Decisão 
 Sumária sub judice e admitir o recurso interposto pelas Recorrentes, 
 notificando-as para a apresentação das respectivas Alegações, nos termos do art. 
 
 79° da Lei do Tribunal Constitucional». 
 
  
 
             3 – A recorrida E.P. Estradas de Portugal, E.P.E. não respondeu.
 
  
 
             4 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
 
  
 
             1 – A. e B. recorrem para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do 
 disposto nos arts. 70.º, n.º 1, alínea b), e 75.º-A, n.º 1, da Lei n.º 28/82, de 
 
 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), das decisões proferidas pelo 
 Presidente da Relação de Lisboa, de 17/04/2007 e de 22/05/2007, que lhes 
 indeferiram, respectivamente, a reclamação deduzida, nos termos do art.º 688.º 
 do Código de Processo Civil (CPC), contra o despacho proferido pelo juiz do 
 Tribunal Judicial da Comarca de Faro que não lhes admitiu o recurso interposto 
 para o Tribunal da Relação de despacho do mesmo tribunal e o pedido de reforma 
 da mesma decisão, pretendendo a apreciação da inconstitucionalidade da norma 
 constante dos arts. 689.º, n.º 1, e 687.º, n.º 3, do CPC, “interpretados no 
 sentido de que no julgamento da reclamação de decisão que não admita o recurso 
 interposto com fundamento em violação do caso julgado é permitido ao presidente 
 do tribunal superior conhecer do mérito do recurso que se pretende interpor e 
 concluir pela não violação do caso julgado como fundamento para não admitir esse 
 recurso, sem que esse recurso tenha sido admitido e apresentadas as respectivas 
 alegações”, e da norma constante do art.º 678.º, n.º 2, do CPC, “interpretado no 
 sentido de que a admissão dos recursos com fundamento em violação de caso 
 julgado depende da verificação judicial, no momento da sua admissão, da violação 
 do caso julgado que invoca”.
 
             No seu requerimento de interposição do recurso de 
 constitucionalidade, as recorrentes alegam ter levantado a questão de 
 inconstitucionalidade apenas no articulado de pedido de reforma da decisão do 
 Presidente da Relação que lhes indeferiu a reclamação deduzida contra a não 
 admissão do recurso para a Relação por parte do juiz do tribunal de 1.ª 
 instância, porque elas “só foram aplicadas na decisão recorrida (…), não tendo a 
 questão sido colocada em momento anterior no processo, nem sendo previsível que 
 o fosse nessa decisão (a decisão da 1.ª instância, de 26/09/2007, não admitiu o 
 recurso com fundamento no valor da sucumbência)”, pelo que inexiste o ónus de 
 antecipada suscitação.
 
  
 
             2 – Porque a situação em apreço se integra na hipótese recortada no 
 n.º 1 do art.º 78.º-A da LTC, passa a decidir-se imediatamente.
 
  
 
 3.1 – Como é consabido, constitui requisito do recurso interposto ao abrigo do 
 disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 280º da Constituição da República 
 Portuguesa (CRP) e na alínea b) do n.º 1 do art.º 70º da LTC que a questão de 
 inconstitucionalidade da norma efectivamente aplicada como ratio decidendi da 
 decisão recorrida tenha sido suscitada durante o processo.  
 O sentido deste último conceito tem sido esclarecido, por várias vezes, por este 
 Tribunal Constitucional. Assim, por exemplo, no Acórdão n.º 352/94 (publicado no 
 Diário da República II Série, de 6 de Setembro de 1994) afirmou-se que esse 
 requisito deve ser entendido “não num sentido meramente formal (tal que a 
 inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância)”, mas 
 
 “num sentido funcional”, de tal modo que essa invocação haverá de ter sido feita 
 em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão, “antes de 
 esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que (a mesma questão de 
 constitucionalidade) respeita”. 
 Por seu lado, afirma-se, igualmente, no Acórdão n.º 560/94 (publicado no Diário 
 da República II Série, de 10 de Janeiro de 1995) que «a exigência de um cabal 
 cumprimento do ónus de suscitação atempada - e processualmente adequada - da 
 questão de constitucionalidade não é [...] “uma mera questão de forma 
 secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal 
 recorrido deva pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade para o 
 Tribunal Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame da 
 questão (e não a um primeiro julgamento de tal questão)». 
 Neste domínio há que acentuar que, nos processos de fiscalização concreta, a 
 intervenção do Tribunal Constitucional se limita ao reexame ou reapreciação da 
 questão de (in)constitucionalidade que o tribunal a quo apreciou ou devesse ter 
 apreciado. Ainda na mesma linha de pensamento podem ver-se, entre outros, o 
 Acórdão n.º 155/95 (publicado no Diário da República II Série, de 20 de Junho de 
 
 1995), e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o Acórdão n.º 
 
 192/2000 (publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de 2000) - cf. 
 também, sobre o sentido de tal requisito, José Manuel Cardoso da Costa, «A 
 jurisdição constitucional em Portugal», separata dos Estudos em Homenagem ao 
 Prof. Afonso Queiró, 2ª edição, Coimbra, 1992, pp. 51 e ss..
 
 É certo que tal doutrina sofre restrições, como se salientou naquele Acórdão n.º 
 
 354/94, mas isso apenas acontece em situações excepcionais ou anómalas, nas 
 quais o interessado não dispôs de oportunidade processual para suscitar a 
 questão de constitucionalidade antes proferida ou não era exigível que o 
 fizesse, designadamente por o tribunal a quo ter efectuado uma aplicação de todo 
 insólita e imprevisível. 
 Usando os termos do recente Acórdão n.º 192/2000, dir-se-á, ainda, que “quem 
 pretenda recorrer para o Tribunal Constitucional com fundamento na aplicação de 
 uma norma que reputa inconstitucional tem, porém, a oportunidade de suscitar a 
 questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferido 
 o acórdão da conferência de que recorre...”. 
 Porém, é claro que não poderá deixar de entender-se que o recorrente tem essa 
 oportunidade quando a apreensão do sentido com que a norma é aplicada numa 
 decisão posteriormente proferida poderá/deverá ser perscrutado no(s) 
 articulado(s) processual(ais) funcionalmente previsto(s) para discretear 
 juridicamente sobre as questões cuja resolução essa decisão tem de ditar, por 
 antecedentemente colocadas, e em que aquele sentido, cuja constitucionalidade se 
 poderá questionar, se apresenta como sendo um dos plausíveis a ser aplicados 
 pelo juiz. 
 Na verdade, ao encararem ou equacionarem na defesa das suas posições a aplicação 
 das normas, as partes não estão dispensadas de entrar em linha de conta com o 
 facto de estas poderem ser entendidas segundo sentidos divergentes e de os 
 considerar na defesa das suas posições, aí prevenindo a possibilidade da 
 
 (in)validade da norma em face da lei fundamental. 
 Digamos que as partes têm um dever de prudência técnica na antevisão do direito 
 plausível de ser aplicado e, nessa perspectiva, quanto à sua conformidade 
 constitucional. 
 Por outro lado, «“suscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica é 
 fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que 
 tem uma questão de constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, 
 obviamente, que (...) tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a 
 norma (ou um segmento dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender 
 de quem suscita essa questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se 
 aponte o porquê dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao 
 menos, a norma ou princípio constitucional infringido.” Impugnar a 
 constitucionalidade de uma norma implica, pois, imputar a desconformidade com a 
 Constituição não ao acto de aplicação do Direito – concretizado num acto de 
 administração ou numa decisão dos tribunais – mas à própria norma, ou, quando 
 muito, à norma numa determinada interpretação que enformou tal acto ou decisão 
 
 (cfr. Acórdãos nºs 37/97, 680/96, 663/96 e 18/96, este publicado no Diário da 
 República, II Série, de 15-05-1996). [§] É certo que não existem fórmulas 
 sacramentais para formulação dos pedidos, nem sequer para suscitação da questão 
 de constitucionalidade. [§] Esta tem, porém, de ocorrer de forma que deixe claro 
 que se põe em causa a conformidade à Constituição de uma norma (...)» – cf., 
 inter alia, o Acórdão n.º 618/98 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt/).
 
  
 
             3.2 – Ora, é, por demais, evidente que na situação processual aqui 
 em causa, os recorrentes não podem ter-se por dispensados do ónus de suscitação 
 da questão de constitucionalidade.
 
             Senão vejamos. Os recorrentes interpuseram recurso de uma decisão da 
 
 1.ª instância para o Tribunal da Relação, com o fundamento de que seria ilegal a 
 retenção de certo valor da indemnização resultante da expropriação para efeitos 
 de pagamento das custas prováveis, por afrontar disposições legais e o julgado 
 na primeira parte da mesma decisão recorrida, bem como a exigência de pagamento 
 da taxa de justiça inicial do processo.
 
             Esse recurso não lhes foi admitido, por se considerar a decisão 
 irrecorrível em virtude de “o valor da sucumbência (€ 445) [ser] inferior a 
 metade da alçada do tribunal”.
 
             Reclamaram, então, as recorrentes para o Presidente da Relação de 
 
 Évora, nos termos do art.º 688.º do CPC, alegando, no respectivo articulado, que 
 o recurso devia ser admitido com base na violação de caso julgado, dado que o 
 n.º 2 do art.º 678.º do CPC dispõe que é sempre admissível recurso com 
 fundamento “em ofensa de caso julgado”.
 
             O Presidente da Relação de Évora indeferiu a reclamação depois de 
 haver ponderado que, tal como havia sido ajuizado pela 1.ª instância, o recurso 
 era inadmissível por o valor da sucumbência ser inferior a metade da alçada do 
 tribunal de 1.ª instância (art.º 678.º, n.º 1, do CPC) e, também, porque não se 
 verificava a ofensa de caso julgado.
 
             As recorrentes pediram, então, a reforma desta decisão do Presidente 
 do Tribunal da Relação, argumentando que o mesmo não poderia conhecer da ofensa 
 do caso julgado, como pressuposto para admitir ou não o recurso, por esse 
 conhecimento respeitar ao mérito da causa e esse estar vedado do tribunal de 
 recurso, depois de admitido o recurso, suscitando, então, as referidas questões 
 de inconstitucionalidade.
 
             Mas também esse pedido de reforma foi indeferido com base na 
 consideração de que “as situações previstas no n.º 2 da disposição legal 
 referida não são de funcionamento automático, quanto à admissão do recurso, pois 
 estão sujeitas a apreciação judicial”.
 
             Como emerge do relatado, foram as próprias recorrentes quem demandou 
 do Presidente da Relação a aplicação do n.º 2 do art.º 678.º do CPC com o 
 sentido de o recurso dever ser sempre admitido com “fundamento na ofensa de caso 
 julgado”.
 
             Ora, pedindo as recorrentes a aplicação, por parte do órgão 
 jurisdicional superior, do art.º 678.º, n.º 2, do CPC, com base na existência de 
 uma situação processual que integraria, na sua óptica, precisamente a sua 
 hipótese, não poderiam deixar de antever a interpretação desse mesmo preceito no 
 sentido de o mesmo permitir a esse órgão jurisdicional a apreciação da 
 verificação da existência do pressuposto aí conformado como possibilitando 
 sempre o recurso, independentemente do valor da causa (e da sucumbência).
 
             Trata-se de um sentido que emerge directamente da conjugação do 
 preceito que comete ao Presidente da Relação a competência para decidir se se 
 verificam ou não os pressupostos de admissibilidade do recurso (art.º 688.º do 
 CPC), em contrário do entendido na decisão reclamada, com o preceito que prevê 
 ou define esses pressupostos de admissibilidade do recurso (no caso, o n.º 2 do 
 art.º 678.º do CPC). 
 
             Na verdade, este último preceito não fala na admissibilidade do 
 recurso com fundamento “na alegação” da “ofensa de caso julgado”, mas com 
 
 “fundamento na ofensa de caso julgado”.
 
             Por outro lado, atribuir ao órgão jurisdicional a competência para 
 aplicar a lei acarreta necessariamente a atribuição da competência para 
 verificar se a hipótese da lei aplicanda se verifica ou não. Trata-se de tarefa 
 imanente ao acto jurisdicional judicativo.
 
             Finalmente, o juízo apenas tem por escopo verificar a existência do 
 requisito especial do recurso em causa, com o fim de admitir ou não o recurso. A 
 circunstância de respeitar a um pressuposto que acaba também por consubstanciar 
 a questão a decidir no recurso não impressiona, pois o seu efeito, é, como em 
 todos os demais casos, o da não admissibilidade do recurso (obviando ao 
 seguimento de recursos inadmisssíveis) e de essa decisão ser proferida por um 
 
 órgão jurisdicional superior.
 
             Também quando o recurso é admitido com base na leitura feita pelo 
 Presidente da Relação relativamente a outros pressupostos do recurso, e com 
 fundamento nela defere a reclamação, não se segue daí que o tribunal superior 
 não possa decidir em sentido contrário.
 
             Assim sendo, a interpretação seguida pelo Presidente da Relação 
 corresponde a uma interpretação meramente declarativa dos preceitos aplicados e 
 cuja constitucionalidade se pretendeu sindicar no pedido de reforma. Mas a 
 destempo, como resulta do acima expendido.
 
             Ao reclamar, pedindo a aplicação de tais preceitos legais, as 
 recorrentes estavam obrigadas a antecipar uma interpretação dos mesmos preceitos 
 no sentido de o órgão decisor poder verificar a efectiva existência do alegado 
 pressuposto de admissibilidade do recurso: a existência de ofensa de caso 
 julgado.
 
             Não estamos assim perante qualquer interpretação insólita ou 
 imprevisível.
 
             Como se afirmou no Acórdão n.º 186/03, disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt, tal “não é seguramente o caso em que a decisão 
 aplica uma norma com um sentido que desde logo emerge da própria letra do 
 preceito que a contém, como também a situação em que um tal sentido é acolhido 
 por jurisprudência pacífica ou  maioritária”.
 
             Dito de outro modo, não pode considerar-se insólita ou surpreendente 
 uma decisão que, mediante uma interpretação declarativa do texto legal, faça 
 aplicação de uma norma potencial e previsivelmente mobilizável para a resolução 
 do caso concreto, porquanto instituinte de um possível desfecho para uma 
 determinada controvérsia.
 
             Deste modo, o Tribunal Constitucional não pode conhecer do recurso 
 por incumprimento do ónus de adequada e atempada suscitação da questão de 
 constitucionalidade.
 
  
 
             4 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide não tomar conhecimento do recurso.
 
             Custas pelas recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 7 UCs.».
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
             5 – Ao contrário do sustentado na reclamação, entende o Tribunal ser 
 de manter a decisão reclamada.
 
             Como nela se afirma, a interpretação/aplicação da norma só pode 
 considerar-se imprevisível e insólita quando seja desrazoável e inadequado 
 exigir do interessado um prévio juízo de prognose relativo à aplicação dessa 
 norma/dimensão normativa.
 
             Tal, porém, não será o caso, como aí se diz, “quando a apreensão do 
 sentido com que a norma é aplicada numa decisão posteriormente proferida 
 poderá/deverá ser perscrutado no(s) articulado(s) processual(ais) funcionalmente 
 previsto(s) para discretear juridicamente sobre as questões cuja resolução essa 
 decisão tem de ditar, por antecedentemente colocadas, e em que aquele sentido, 
 cuja constitucionalidade se poderá questionar, se apresenta como sendo um dos 
 plausíveis a ser aplicados pelo juiz”, pois “ao encararem ou equacionarem na 
 defesa das suas posições a aplicação das normas, as partes não estão dispensadas 
 de entrar em linha de conta com o facto de estas poderem ser entendidas segundo 
 sentidos divergentes e de os considerar na defesa das suas posições, aí 
 prevenindo a possibilidade da (in)validade da norma em face da lei fundamental”. 
 
 
 
             Não releva assim, ao contrário do argumentado pelas reclamantes, que 
 a decisão pretendida recorrer para o tribunal superior não tenha feito aplicação 
 da norma e que ela ocorra apenas em momento posterior àquele em que o recorrente 
 possa antecipar essa aplicação. 
 
             De resto, a este propósito, é de anotar que as reclamantes, ao 
 contrário do alegado na reclamação, não invocaram sequer perante o tribunal a 
 quo o caso julgado como fundamento da admissibilidade do recurso interposto da 
 sua decisão: a alegação de que ocorreria violação do caso julgado foi feita 
 unicamente como fundamento, a par de outros, do pedido de reforma de decisão 
 anterior do tribunal atinente a outra questão que foi indeferido, sendo o 
 recurso interposto em termos gerais e apenas a “titulo de cautela” para o caso 
 de não proceder esse pedido de reforma (fls. 18).
 
             O interesse a acautelar, neste caso, é o de que não seja amputada a 
 possibilidade do recurso constitucional quando seja desrazoável e inadequado 
 exigir-se que ele anteveja a possibilidade da aplicação da norma.
 
             Ora, esta situação não acontece seguramente no caso em apreço em que 
 foram as próprias reclamantes a pedir ao Presidente do Tribunal da Relação de 
 
 Évora a aplicação do disposto no art.º 678.º, n.º 2, do CPC e não é desrazoável 
 e inadequado antever que esse preceito pudesse ser aplicado com outro sentido 
 que não aquele pressuposto pelas recorrentes.
 
             E não é desrazoável e inadequada a exigência da antevisão da 
 aplicação do concreto sentido com que o preceito foi aplicado porque, 
 independentemente de saber-se qual seja o melhor direito a inferir dos preceitos 
 legais, ele cabe perfeitamente dentro da sua expressão verbal, sendo que esta é 
 ao mesmo tempo ponto de partida e limite da interpretação, e pode ver-se como 
 postulado pelo princípio geral, vigente no sistema de recursos, segundo o qual o 
 tribunal recorrido (e, por via da reclamação, o presidente do tribunal superior 
 
 – art.ºs 688.º e 689.º do CPC), aprecia previamente a existência, em concreto, 
 dos pressupostos do recurso interposto para o tribunal superior.
 
             Por outro lado, cabe notar que a previsibilidade objectiva do 
 sentido com que o preceito convocado pelas reclamantes foi aplicado não é 
 arredada pela eventual circunstância de, na ponderação levada a cabo, as 
 reclamantes estarem convencidas de que essa “interpretação contrariava o sistema 
 de recursos do CPC e a própria Constituição”. O dever de prudência técnica, no 
 exercício do mandato judicial, não dispensa a abordagem de outras soluções, 
 muito embora possa não concordar-se com elas. O relevante é a sua 
 previsibilidade objectiva.
 
             Finalmente, é de anotar que o preceito em causa – o n.º 2 do art.º 
 
 678.º do CPC – não sofreu qualquer alteração na reforma do processo civil de 
 
 1995/1996, tendente a explicitar o sentido defendido pelas reclamantes, cuja 
 consideração seja de relevar para efeitos da previsibilidade objectiva do 
 sentido normativo aplicado.
 
              
 C – Decisão
 
  
 
             6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide indeferir a reclamação.
 
             Custas pelas reclamantes, com taxa de justiça de 20 UCs.
 Lisboa, 11/12/2007
 Benjamim Rodrigues
 Joaquim Sousa Ribeiro
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 [1] Introdução ao Estudo do Direito, Vol. II, Apontamento das aulas ao curso do 
 
 1° ano de Direito, 1983-84, pág. 564.
 
 [2] Como se sabe, os elementos sistemático e histórico da interpretação são 
 fundamentais no processo de descoberta e investigação dos fins da norma. Neste 
 sentido, cfr. MÁRIO BicottE CHORÃO, op. cit., pág. 290.
 
 [3] Nestes precisos termos, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 
 
 18.07.1950 (in. BMJ, nº 20, pág. 280), onde se decidiu o seguinte (sublinhados e 
 destaques nossos): “(...) o art. 687° do Código de Processo Civil preceitua que 
 os recursos se interpõem por meio de requerimento em que se exprima a vontade de 
 recorrer e se indique a espécie de recurso. E nem nessa disposição nem em 
 qualquer outra se exige que no requerimento de interposição de um recurso se 
 indiquem os fundamentos do recurso interposto, e muito menos, como é óbvio, que 
 se demonstre a existência desses fundamentos ou se promova a demonstração de que 
 existem, como pretende o recorrido. Contudo, porque a admissão do recurso com 
 fundamento em ofensa de caso julgado, quando se trata de causa de valor inferior 
 
 à alçada, constitui um desvio da regra consignada no já citado art. 678°, 
 torna-se necessário, para que o recurso não possa ser recusado, que o recorrente 
 invoque expressamente aquele fundamento. Mas basta que essa invocação seja 
 feita. Por um lado, a demonstração de que a ofensa do caso julgado existe tem o 
 seu lugar próprio nas respectivas alegações, pois é nelas que se ataca a decisão 
 recorrida, apontando-se as razões jurídicas baseadas em preceitos legais, pelos 
 quais o recorrente pretende a alteração ou anulação da decisão de que se 
 recorre, razões essas que constituem os fundamentos a que alude o art. 690° do 
 Código de Processo Civil. Por outro lado, o art. 688° do Código referido 
 
 [refira-se que este art. 688° corresponde actualmente, na íntegra, ao art. 687°, 
 nº 3, do CPC), ao enumerar os motivos de indeferimento do requerimento em que se 
 interpõe um recurso, não indica aquele que o recorrido aponta a fls. 94 
 
 [refira-se que, no caso concreto, a fls. 94 dos autos, o réu «opôs-se a que o 
 recurso fosse admitido, por entender, que, embora o recurso com tal fundamento 
 seja admissível até ao Supremo, independentemente de alçada, a verdade é que, no 
 modo de ver do réu, não basta que se alegue ofensa do caso julgado, sendo 
 necessário promover-se no próprio requerimento de interposição do recurso a 
 demonstração de que aquela ofensa existe, o que o recorrente não fez»]. E convém 
 notar que essa enumeração é taxativa” 
 Também neste sentido, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 28.11.1950 
 e de 06.04.1976, respectivamente, BMJ, nº 22, pág. 216 e nº 256, pág. 90. Na 
 doutrina, a autoridade de ALBERTO DOS REIS, RLJ, nº 84, pág. 119.