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Processo n.º 41/07
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
   Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                                  1.1. A. deduziu reclamação para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei de Organização, 
 Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 
 
 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 
 de Fevereiro (LTC), contra o despacho do Conselheiro Relator do Supremo 
 Tribunal de Justiça (STJ), de 30 de Novembro de 2006, que não admitiu recurso 
 por ele interposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, 
 contra o acórdão do mesmo Tribunal, de 12 de Outubro de 2006, que, concedendo 
 provimento a recurso do Ministério Público contra o acórdão do Tribunal da 
 Relação do Porto, na parte em que absolvera o arguido de um crime de burla 
 agravado, na forma tentada, o condenou, por este crime, na pena de um ano de 
 prisão, e, em cúmulo com a pena de três anos de prisão (suspensa na sua execução 
 por quatro anos e sob regime de prova) cominada no acórdão da Relação, na pena 
 
 única de três anos e quatro meses de prisão, com supressão da suspensão.
 
                                  O recorrente havia, em 27 de Outubro de 2006, 
 
 “reclamado para a conferência” contra o aludido acórdão de 12 de Outubro de 
 
 2006, “reclamação” de cujo teor resultava que através dela se pretendia 
 
 “recorrer” desse acórdão, e que, por falta de fundamento legal, não foi admitida 
 por despacho de 6 de Novembro de 2006 do Conselheiro Relator do STJ.
 
                                  No requerimento de interposição de recurso para 
 o Tribunal Constitucional, entrado na Secretaria do STJ em 20 de Novembro de 
 
 2006, o recorrente indicou como normas cuja inconstitucionalidade queria ver 
 declarada os artigos 13.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 
 referiu que a questão de inconstitucionalidade teria sido suscitada nas 
 alegações escritas para o STJ. Anexou logo a esse requerimentos a “motivação” do 
 recurso endereçado ao Tribunal Constitucional, na qual sustenta, em suma, que 
 não se verificou o crime pelo qual o acórdão recorrido o condenou, concluindo 
 que “o douto acórdão ora recorrido viola o artigo 29.º, n.º 1, e viola ainda o 
 princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República 
 Portuguesa”, “pois o arguido foi condenado por factos que não consubstanciam o 
 crime de burla na forma tentada pelo qual foi condenado”.
 
  
 
                                  1.2. Esse recurso não foi admitido pelo 
 despacho ora reclamado, do seguinte teor:
 
  
 
                  “Através de requerimento de fls. 452, apresentado neste Supremo 
 Tribunal de Justiça, em 20 de Novembro de 2006, o arguido A. veio interpor 
 recurso para o Tribunal Constitucional.
 
                  Nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 1, da Lei Orgânica 
 de Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, o prazo para 
 interposição de recurso é de 10 dias.
 
                  Por força da remissão do artigo 69.º da referida Lei para o 
 Código de Processo Civil, o prazo é contado a partir da notificação da decisão, 
 a qual, nos presentes autos, ocorreu por via da notificação ao 
 mandatário/defensor do arguido (artigos 253.º, n.º 1, e 685.º, n.º 1, do CPC), 
 não havendo lugar a qualquer alteração quanto ao dia a quo, dado o facto de o 
 requerimento de fls. 443 não dizer respeito a pedido de rectificação, aclaração 
 ou reforma da decisão. Com efeito, só no caso de rectificação de erros materiais 
 
 (artigo 667.º, n.º 1, do CPC) ou esclarecimento de alguma obscuridade ou 
 ambiguidade que a decisão contenha ou reforma quanto a custas e multa (artigo 
 
 669.º, n.º 1, do CPC), requerido pelas partes é que o prazo para o recurso se 
 começa a contar da notificação da decisão proferida sobre o requerimento.
 
                  Assim, haverá o prazo de 10 dias para o recurso para o Tribunal 
 Constitucional que se contar a partir de 19 de Outubro, terceiro dia após o 
 registo, por ser nessa data que se presume feita a notificação da decisão, 
 conforme estabelece o artigo 254.º, n.º 3, do CPC.
 
                  Porque tal prazo, que tem natureza peremptória, há muito se 
 extinguiu, o recurso para o Tribunal Constitucional foi interposto fora de 
 prazo, motivo pelo qual se indefere o respectivo requerimento.”
 
  
 
                                  1.3. A reclamação apresentada pelo recorrente 
 contra este despacho desenvolve a seguinte argumentação:
 
  
 
 “O recorrente interpôs recurso do acórdão do Tribunal de 1.ª instância, a saber, 
 o Tribunal Judicial de Valongo, perante o qual foi condenado pela prática de um 
 crime de burla qualificada, previsto e punido pelos artigos 217.º, n.º 2, alínea 
 a), do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão e pela prática de um crime de 
 burla qualificada na forma tentada na pena de 1 ano de prisão e em cúmulo 
 jurídico na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão.
 O recorrente recorreu deste acórdão para o Venerando Tribunal da Relação do 
 Porto, que proferiu douto acórdão através do qual julgou o recurso interposto 
 pelo arguido/recorrente parcialmente procedente e, em consequência, absolveu o 
 arguido do crime de burla na forma tentada e suspendeu a execução da pena de 3 
 anos de prisão, aplicada ao arguido pela prática de um crime de burla agravada 
 na forma consumada, pelo período de 4 anos.
 O Dig.mo Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal da Relação do Porto 
 recorreu deste acórdão para o Supremo Tribunal de Justiça, que revogou o acórdão 
 absolutório do Tribunal da Relação e condenou o arguido pela prática do crime de 
 burla na foram tentada.
 Não se conformando com o referido acórdão, o recorrido reclamou para a 
 conferência do Supremo Tribunal de Justiça, tendo a reclamação sido indeferida 
 com o seguinte despacho:
 
  
 
 «O acórdão de fls. 423 e seguintes deste Supremo Tribunal de Justiça, que 
 conheceu do recurso interposto pelo Ministério Público do acórdão absolutório da 
 Relação do Porto, foi decidido após audiência, nos termos do artigo 423.º do 
 CPP.
 Dessa decisão não há reclamação para a conferência (cf. artigo 700.º, n.º 3, do 
 CPC, aplicável ex vi artigo 4.º do CPP), tendo‑se com ela esgotado as vias de 
 recurso ordinário previstas no CPP (cf. artigo 432.º, a contrario, do CPP).
 Não recebo a reclamação/recurso por falta de fundamento legal, indeferindo o que 
 vem requerido a fls. 435 e seguintes.»
 
  
 Após a notificação desta decisão que indeferiu a reclamação para conferência, o 
 recorrente recorreu então para o Tribunal Constitucional, alegando a violação 
 dos artigos 13.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa.
 Contudo, o recurso interposto para esse Egrégio Tribunal Constitucional foi 
 indeferido por se ter entendido que foi interposto fora do prazo.
 Ora, é deste despacho que não recebeu o recurso que o recorrente não se conforma 
 e do mesmo vem reclamar para que seja recebido.
 Prescreve o referido artigo 75.º, n.º 1, da LOFPTC que o prazo de interposição 
 do recurso é de 10 dias.
 A questão a decidir será saber a partir de quando se começa a contar este prazo.
 No despacho que não admitiu o recurso, de que ora se reclama, é referido que o 
 prazo é contado a partir da notificação da decisão e que esta ocorreu a 19 de 
 Outubro de 2006.
 Contudo, o prazo não se poderá contar a partir da notificação do acórdão que 
 ocorreu a 19 de Outubro, em virtude de o recorrente ter reclamado para a 
 conferência e a mesma reclamação ter sido indeferida, decisão essa de indeferir 
 a reclamação foi notificada ao mandatário a 11 de Novembro de 2006.
 Só a partir desta data, salvo melhor opinião, começou a correr o prazo para 
 interpor recurso para este Egrégio Tribunal, pois só com a notificação da não 
 admissão da reclamação para a conferência o arguido teve conhecimento, através 
 do seu mandatário, de que tinha esgotado aí a via do recurso ordinário.
 Um entendimento contrário a este, em nosso entendimento, viola as garantias do 
 arguido constitucionalmente consagradas.”
 
                  
 
                                  1.4. No Tribunal Constitucional, o 
 representante do Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
 
  
 
                  “A presente reclamação carece manifestamente de fundamento 
 sério.
 
                  Assim – e para além da intempestividade do recurso, decorrente 
 da evidente inidoneidade do meio processual utilizado pelo recorrente no STJ 
 
 (reclamação para a conferência de um acórdão ali proferido) –, é evidente – quer 
 pelo teor do requerimento de interposição, quer pela insólita «motivação» logo 
 apresentada – que se não mostra colocada pelo reclamante qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa, susceptível de apreciação por este Tribunal.”
 
                  
 
                                  Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                                  2.1. Como bem decidiu a decisão reclamada, o 
 prazo de 10 dias de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional 
 contra o acórdão do STJ, de 12 de Outubro de 2006, iniciou‑se com a notificação 
 deste acórdão ao ora recorrente, efectuada por carta registada expedida em 16 de 
 Outubro de 2006 e consumada no subsequente dia 19, pelo que o recurso interposto 
 em 20 (ou 17) de Novembro de 2006 é manifestamente extemporâneo.
 
                                  Na verdade, a dedução de incidentes 
 pós‑decisórios legalmente inexistentes (como a “reclamação para a conferência” 
 contra um acórdão do STJ) não tem a virtualidade de interromper aquele prazo. 
 Este efeito interruptivo do prazo apenas está legalmente previsto para os 
 pedidos de rectificação, aclaração ou reforma de decisões judiciais (artigo 
 
 686.º, n.º 1, do Código de Processo Civil – CPC), só sendo extensivo às 
 arguições de nulidade no caso de recurso para o Tribunal Constitucional por este 
 recurso não poder ter por fundamento a nulidade da decisão recorrida e, assim, 
 ser inaplicável o regime da parte final do primeiro período do n.º 3 do artigo 
 
 668.º do CPC.
 
  
 
                                  2.2. Ao fundamento da extemporaneidade da 
 interposição do recurso acresce, como se salientou no parecer do Ministério 
 Público, o facto de o recorrente nunca ter suscitado, durante o processo, 
 qualquer questão de inconstitucionalidade normativa – nem sequer no requerimento 
 de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional a na “motivação” que o 
 acompanhou, em que (apesar de esse já não ser momento adequado para o efeito) se 
 limitou a imputar ao próprio acórdão recorrido, em si mesmo considerado (e não a 
 qualquer norma ou interpretação normativa), a violação dos artigos 13.º e 29.º 
 da CRP, por o ter “condenado por factos que não consubstanciam o crime de burla 
 na forma tentada”.
 
  
 
                                  3. Em face do exposto, acordam em indeferir a 
 presente reclamação.
 
                                  Custas pelo reclamante, fixando‑se a taxa de 
 justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 30 de Janeiro de 2007.
 Mário José de Araújo Torres
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos