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Processo nº 215/2008
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral
 
 
 Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
 
 I
 Relatório
 
  
 
 1. Em 10 de Abril de 2008 foi proferida decisão sumária (fls. 968) em que se 
 entendeu não poder o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do recurso 
 interposto para o Tribunal por A. e mulher, por o mesmo ser intempestivo.
 
  
 
 2.  Notificados desta decisão, A. e mulher vieram reclamar para a conferência, 
 dizendo o seguinte: 
 
  
 A decisão sumária ora posta em crise entendeu que os aqui Reclamantes, ao 
 recorrerem do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra em 29 de 
 Maio de 2007, para o Supremo Tribunal de Justiça, lançaram mão de um meio 
 processual manifestamente impróprio, a que não poderia ser reconhecida eficácia 
 interruptiva do prazo de interposição de um eventual recurso de 
 constitucionalidade do aresto. 
 Em consequência, considerou intempestivo o recurso interposto daquele acórdão, 
 em 4 de Outubro de 2007, para o Tribunal Constitucional. 
 Com o devido respeito, e salvo melhor opinião, a decisão de não tomar 
 conhecimento do recurso interposto não se afigura acertada. 
 Ao contrário do considerado na decisão em apreço, os ora Reclamantes, ao 
 recorrerem do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra para o Supremo Tribunal 
 de Justiça, não visavam a produção de efeitos puramente dilatórios no prazo de 
 interposição de um putativo recurso de inconstitucionalidade. Nem anteviam tal 
 iniciativa processual como um meio manifestamente impróprio ou inidóneo de 
 tutela dos seus legítimos interesses. 
 Diga-se, em primeiro lugar, que não cabe às partes em litígio fazer juízos a 
 priori sobre a propriedade ou idoneidade da utilização dos meios processuais que 
 o ordenamento jurídico disponibiliza para a solução das questões que se lhe 
 deparam. É aos Tribunais, enquanto órgãos de administração da justiça e em face 
 das específicas circunstâncias da lide, que compete declará-lo. Assim o impõe o 
 exercício da função jurisdicional, que lhes é constitucionalmente atribuído – 
 artigos 110º e 202° e seguintes da Constituição. 
 Descendo ao concreto, no pedido de esclarecimentos de fls. 868 e segs., os 
 Recorrentes não se limitaram a reconhecer “a não admissibilidade de recurso para 
 o Supremo Tribunal de Justiça das decisões que fixem o valor da indemnização em 
 processo de expropriações”, como destaca a decisão ora reclamada. Ao invés, 
 explicitaram claramente que pretendiam “a sindicância do douto acórdão proferido 
 na parte em que este decidiu não haver fundamento legal para a admissão do 
 recurso de agravo interposto pelos expropriados”. Restringiram, sem margem para 
 dúvidas, o âmbito do recurso, identificando a decisão constante da parte 
 dispositiva do acórdão que queriam impugnar. 
 Como se pode apurar dos elementos constantes dos autos, o mencionado recurso de 
 agravo havia sido interposto da decisão da Exma. Juíza a quo de indeferir a 
 ampliação do pedido formulado no recurso da acta de conferência de arbitragem 
 porquanto esta não consubstanciaria um desenvolvimento do pedido inicial. 
 Trata-se de uma questão eminentemente adjectiva, que contende com a aplicação da 
 lei processual civil. Em concreto, pretendiam os Recorrentes invocar perante o 
 Supremo Tribunal de Justiça a violação do artigo 273°, n° 2 do Código de 
 Processo Civil. 
 Ora, conforme se deixou expresso na referida peça processual, foram proferidas 
 ao longo do tempo, pelos diferentes Tribunais da Relação, decisões sobre a mesma 
 matéria que se podem considerar contraditórias – vide os acórdãos citados, a 
 saber: 
 
  
 
 – Acórdão da Relação do Porto proferido no processo n° 0536230, de 02-03-2006, 
 in www.dgsi.pt que: 
 
 “... O que está em causa é, efectivamente, na tese dos expropriados, a 
 diminuição da capacidade construtiva resultante dessa servidão, pelo que a 
 ampliação feita já se encontrava contida no pedido inicial, constituindo, 
 claramente, um desenvolvimento do pedido primitivo e é consentida pela 
 disposição do art. 273°, n° 2, do CPC...” 
 
  
 
 – Acórdão da mesma Relação, proferido no processo n° 0330740, de 24-04-2003 já 
 havia decidido exactamente no mesmo sentido – in www.dgsi.pt – e da Relação de 
 Lisboa o Acórdão de 10/03/1994 in CJ, Ano XIX, tomo II, pág. 83. 
 
  
 Assim, cabe recurso de revista do acórdão tendo como fundamento a violação da 
 lei de processo, de acordo com o definido no artigo 754°, n° 2 do C.P.C., por 
 remissão do artigo 722°, n° 1 do C.P.C. 
 Ainda que tal solução não se concebesse, sempre se admitiria o acolhimento do 
 recurso ao abrigo do disposto no artigo 678°, n° 4 do C.P.C., com base na 
 aludida contradição de acórdãos. 
 O próprio Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se sobre a questão 
 controvertida in casu no acórdão de 19/10/1999, proferido no processo n° 99A801, 
 de se conclui que “No processo de expropriação é admissível a ampliação do 
 pedido até ou nas alegações que antecedem a sentença da 1ª instância” – in 
 
 www.dgsi.pt. 
 Em face dos elementos acima expostos, cabe concluir que os Recorrentes e ora 
 Reclamantes tinham legítimas e fundadas expectativas de verem a sua pretensão 
 apreciada pelo Supremo Tribunal de Justiça. Nesta medida, o recurso interposto, 
 ainda que não viesse a ser admitido, sempre seria representaria, ab initio, um 
 meio impugnatório legalmente idóneo com vista à garantia dos direitos dos ora 
 Reclamantes. 
 Ademais, importa recordar que o presente litígio teve origem em declaração de 
 utilidade pública, com carácter de urgência, publicada no DR n° 284, II série, 
 de 10/12/1998 – há praticamente 10 anos – tendo sido tomada posse administrativa 
 do prédio expropriado em 29/03/1999. Nesta altura, o interesse único dos 
 Recorrentes é verem-lhes ser atribuída a justa indemnização decorrente do acto 
 expropriativo que os privou do gozo do imóvel, pelo que dificilmente se 
 comprazeriam com a adopção de expedientes puramente dilatórios que, na melhor 
 das hipóteses, teriam o mérito de diferir no tempo a percepção daquele valor. 
 Embora o artigo 78°-A, n° 1 da L.C.T. permita que a decisão sumária de não 
 conhecimento do recurso consista “em simples remissão para anterior 
 jurisprudência do Tribunal”, entendem pois os Reclamantes que aquela carece de 
 fundamentação, na medida em que ficou por explicar a natureza manifestamente 
 imprópria e ostensivamente inadmissível da actuação processual dos Reclamantes. 
 Num outro sentido, há que relevar o facto de que também a entidade expropriante 
 interpôs, na data de 12/06/2007, recurso de revista do acórdão da Relação para o 
 Supremo Tribunal de Justiça. Por despacho de fls. 857 e 858, aquele não foi 
 admitido. Tendo sido apresentada reclamação, nos termos do art. 688°, n° 1 do 
 C.P.C., que foi indeferida por despacho de 13/11/2007. 
 Ora, à luz do disposto no n° 2 do artigo 75° da Lei do Tribunal Constitucional, 
 poder-se-á também considerar que só aí se tornou definitiva a decisão de não 
 admissão de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, contando-se desse 
 momento em diante o prazo para interposição de recurso de constitucionalidade. 
 Daqui resultaria que o recurso dos ora Reclamantes nunca seria extemporâneo, 
 tendo, outrossim, sido interposto em tempo. 
 O recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, tinha, como se indicou 
 no requerimento respectivo, um efeito meramente devolutivo. 
 Num sentido amplo, pode dizer-se que os recursos têm sempre efeito devolutivo, 
 na medida em que constituem o meio de impugnação de decisões judiciais e, 
 consequentemente, por eles se submete o litígio a uma reapreciação por um 
 tribunal superior (devolve-se-lhe a apreciação), seja quanto às questões de 
 facto e direito (recurso para um Tribunal da Relação), seja somente quanto às 
 questões jurídicas (recurso para o Supremo Tribunal de Justiça). 
 No entanto, a expressão tem uma utilização técnica numa acepção mais restrita: 
 significa que um recurso tem efeito meramente devolutivo, isto é, que não tem a 
 interposição de recurso um efeito suspensivo quanto à execução da decisão 
 recorrida, ou, sendo recurso de agravo, quanto à marcha do processo – vide Ana 
 Prata, Dicionário Jurídico, Almedina, 3ª edição revista e actualizada, Coimbra, 
 
 1999. 
 Referindo-se aos recursos ordinários, Castro Mendes, Recursos, 1980, págs. 140 e 
 seguintes, quanto aos efeitos, distingue: 
 a)  efeito devolutivo (consiste na atribuição ao tribunal superior do poder de 
 rever a decisão recorrida); 
 b)  efeito suspensivo ( consiste na paralisação da execução da decisão 
 recorrida) 
 
 * o efeito diz-se meramente devolutivo quando não tem efeito suspensivo, 
 devolutivo tem sempre. 
 Em relação aos efeitos da expedição ou subida do recurso: 
 a)  efeito suspensivo (da marcha do processo, a não ser a do próprio recurso); 
 b)  efeito não-suspensivo (da marcha do processo). 
 Quanto aos efeitos da pendência do recurso: 
 a)  suspende o trânsito em julgado; 
 b)  mantém pendente a instância; 
 c)  mantém interrompida a prescrição (cfr. art° 327°, n° 1 do Código Civil). 
 No caso concreto, a interposição dos recursos, quer dos Recorrentes, quer da 
 entidade Recorrida, teve, precisamente, como efeito, a manutenção da pendência 
 da instância, pelo que não corria ainda o prazo de impugnação da decisão junto 
 do Tribunal Constitucional. 
 Acrescente-se que, mesmo que persista ainda a sombra da dúvida sobre a bondade 
 deste entendimento, só esta visão dos factos dá corpo ao respeito pelo princípio 
 pro actione. Este princípio, acolhido na nossa jurisprudência, nomeadamente pelo 
 STA, “postula um entendimento que possibilite o exame da questão de fundo (...) 
 em detrimento da rejeição (...) por questões formais que não sejam absolutamente 
 seguras” – vide Ac. do STA de 27-11-2003 in www.dgsi.pt. 
 No fundo, “Os princípios do inquisitório, anti-formalista e “pro-actione” 
 postulam que a nível dos pressupostos processuais se deva privilegiar uma 
 interpretação que se apresente como a mais favorável ao acesso ao direito e a 
 uma tutela jurisdicional efectiva, podendo a tal respeito falar-se de sanação de 
 
 “defeitos processuais”, tendo em vista possibilitar o exame do mérito das 
 pretensões deduzidas.” – vide Ac. do STA de 25-06-2003 in www.dgsi.pt. 
 Ao recusar a apreciação do recurso de constitucionalidade com fundamento na sua 
 intempestividade, a decisão reclamada posterga o aludido princípio, traindo a 
 garantia constitucional do acesso aos tribunais consagrada no artigo 20° da 
 Constituição, bem como infra-constitucionalmente no artigo 2° do Código de 
 Processo Civil. 
 Por fim, diga-se ainda que a presente decisão sumária põe em causa o respeito 
 pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem e seus Protocolos adicionais. 
 Desde logo, com a adopção de uma interpretação restritiva e formalista das 
 normas de acesso ao Tribunal Constitucional, que não permite a discussão da 
 questão de fundo, sai preterida a exigência de um processo equitativo, assente 
 no artigo 6°, n° 1 da Convenção, bem assim como o direito a um recurso efectivo, 
 consagrado no artigo 13° do mesmo diploma. 
 Ao invés, com a manutenção da decisão vertida no acórdão proferido pelo Tribunal 
 da Relação de Coimbra, por força da não admissão do recurso de 
 constitucionalidade, a ordem jurídica nacional impõe aos expropriados uma 
 penalização desproporcionada e excessiva não justificada pelo interesse público 
 prosseguido. Por outras palavras, os tribunais nacionais não asseguram o justo 
 equilíbrio que deve reinar entre as exigências do interesse público e a 
 salvaguarda do direito ao respeito pelos bens dos expropriados. Assim sendo, 
 resulta violando, para além dos artigos 62°, n° 2 e 13° da Constituição, o 
 artigo 1° do 1° Protocolo adicional à Convenção – Protecção da propriedade.
 
  
 A recorrida EP – Estradas de Portugal, EPE, nada disse quanto à reclamação 
 apresentada.
 
  
 
 3.  Tendo em conta o teor da reclamação apresentada, foi proferido despacho pela 
 relatora (fls. 988 e seguintes), determinando a notificação das partes, ao 
 abrigo do disposto no artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, para se 
 pronunciarem, querendo, sobre a possibilidade de o Tribunal Constitucional vir a 
 não conhecer do objecto do recurso com outro fundamento, pelas seguintes razões:
 
  
 a)  Os recorrentes interpõem o recurso ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 
 
 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Um dos pressupostos de admissibilidade 
 deste tipo de recursos é, como bem se sabe, o da suscitação, durante o processo, 
 da questão da inconstitucionalidade da(s) norma(s) que se pretende que o 
 Tribunal aprecie. No requerimento de interposição do recurso (fls. 884) 
 sustentam os recorrentes que «[a] questão de inconstitucionalidade foi levantada 
 em sede de alegações dos recursos de agravo e de apelação interpostos para o 
 Tribunal da Relação de Coimbra». No entanto, compulsando os autos, verifica-se 
 que, nessa sede, os recorrentes imputam a inconstitucionalidade à própria 
 decisão judicial, em si mesma considerada, e não às normas – ou à dimensão 
 interpretativa das normas – cuja constitucionalidade pretendem que o Tribunal 
 aprecie: vejam-se as fls, 358, 653; 654 e 657 dos autos.
 b)  Pressuposto de admissibilidade deste tipo de recursos é também – como 
 igualmente se sabe – que a decisão recorrida tenha feito efectiva aplicação 
 da(s) norma(s) cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie. No 
 requerimento do recurso identificam-se essas mesmas normas (a contida nº 2 do 
 artigo 273º do CPC, na dimensão interpretativa aí indicada; as contidas nos 
 artigos 1º, 22 nº 2 e 25º do Código das Expropriações de 1991, também na 
 dimensão interpretativa aí indicada: fls. 883). No entanto, a decisão recorrida 
 
 – o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29 de Maio de 2007 – não fez 
 efectiva aplicação das «normas» [ ou das «dimensões normativas»] que constituem, 
 de acordo com o respectivo requerimento, o objecto do recurso interposto. Na 
 realidade, não tendo sido, como já se viu, a inconstitucionalidade de tais 
 normas alegada de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu 
 a decisão recorrida, não estava este, de resto, obrigado a dela conhecer (artigo 
 
 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
 
  
 
 4.  Notificados deste despacho, A. e mulher vieram responder, nos seguintes 
 termos: 
 
  
 
 1. Por douta decisão proferida a 10 de Abril de 2008, ao abrigo do previsto no 
 n° 1 do artigo 78°-A da Lei do Tribunal Constitucional, foi julgado improcedente 
 o recurso interposto pelos Recorrentes para este Tribunal do Acórdão do Tribunal 
 da Relação de Coimbra, com fundamento na sua extemporaneidade, fundamento este 
 reiterado no despacho ora em apreço. 
 
 2. Desta decisão interpuseram os Recorrentes recurso para a Conferência, no uso 
 da faculdade prevista no artigo 78°-A, n°3, da dita Lei. 
 
 3. O objecto do Recurso para a Conferência foi, como não poderia deixar de ser, 
 delimitado pela douta decisão deste Tribunal. 
 
 4. Como bem se sabe, considerando o previsto no n° 1 do artigo 71° da Lei do 
 Tribunal Constitucional, os recursos de decisões para o Tribunal Constitucional 
 são restritos à questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade (como é o 
 caso), suscitada. 
 
 5. Equivale por dizer que o recurso interposto estava delimitado à questão da 
 extemporaneidade suscitada pelo Tribunal. 
 
 6. Nem, como se sabe, poderia ser doutra forma, pois às partes não é exigível 
 que se pronunciem sobre eventuais fundamentos de Direito e/ou de facto de 
 decisão a proferir. 
 
 7. Salvo o devido respeito, merecido, não se alcança o fundamento legal 
 subjacente à prolação deste despacho, tanto mais que no 78°-B se elencam, 
 expressamente, os outros poderes conferidos ao relator e aí não se prevê o 
 convite às partes para se pronunciarem sobre outras questões antes da decisão da 
 reclamação pela conferência. 
 
 8. Por outro lado, este despacho consubstancia um convite às partes a 
 pronunciarem-se sobre a questão de fundo do recurso interposto num momento 
 processual que não é o próprio e num prazo mais curto do que aquele que é 
 previsto pelo 79° para alegações. 
 
 9. A questão é muito simples, como se sabe: o Tribunal proferiu decisão, sobre 
 esta e os seus fundamentos os Recorrentes interpuseram recurso, pelo que 
 aguardam que a Conferência se pronuncie nos termos do disposto nos números 3, 4 
 e 5 do já citado artigo 78°-A da Lei do Tribunal Constitucional, o que se de 
 novo se pede.
 
  
 A recorrida EP – Estradas de Portugal, EPE, não respondeu.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II
 Fundamentos
 
  
 
 5.  Notificados da decisão sumária que não conheceu do objecto do recurso com 
 fundamento em intempestividade do mesmo, vieram A. e mulher reclamar para a 
 conferência. Entretanto, identificados outros possíveis fundamentos de não 
 conhecimento do objecto do recurso - imputação da inconstitucionalidade à 
 própria decisão judicial, em si mesma considerada, e não às normas cuja 
 constitucionalidade os ora reclamantes pretendem que o Tribunal aprecie e não 
 aplicação, pela decisão recorrida, das «normas» ou das «dimensões normativas» 
 que constituem o objecto do recurso interposto - foram os reclamantes 
 notificados para se pronunciarem, o que fizeram.
 
  
 
 6.  Ora, como se disse já no despacho da relatora de fls. 988 e seguintes (supra 
 
 3), independentemente da questão de saber se o recurso é ou não intempestivo, 
 outros motivos existem para não conhecer do objecto do presente recurso.
 Antes de mais, sublinhe-se que esse despacho não traduz o exercício de poder 
 jurisdicional posterior à prolação da decisão sumária como parece sustentar o 
 reclamante na resposta de fls. 993 (supra 4).
 Tal despacho – em que nada se decidiu relativamente à causa submetida a este 
 Tribunal – foi proferido ao abrigo do disposto no artigo 3º, n.º 3, do Código de 
 Processo Civil, com o objectivo de dar às partes a oportunidade de se 
 pronunciarem sobre um fundamento de não conhecimento do recurso de 
 constitucionalidade diferente daquele que fundou a decisão sumária objecto de 
 reclamação.
 
 É que dos autos decorrem duas outras razões que impedem o Tribunal 
 Constitucional de conhecer o presente recurso.
 Senão vejamos:
 
  
 
 7.  Os recorrentes interpuseram o recurso de constitucionalidade ao abrigo do 
 que dispõe a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal 
 Constitucional. Ora, um dos pressupostos de admissibilidade deste tipo de 
 recursos é, conforme decorre do normativo citado, a suscitação, durante o 
 processo, da questão de constitucionalidade, em termos tais que permitam ao 
 Tribunal a quo dela poder vir a conhecer.
 Por isso mesmo se exige, conforme dispõe o artigo 75.º - A, n.º 2 in fine, da 
 Lei do Tribunal Constitucional,  que no requerimento de recurso seja indicada a 
 peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade.
 Cumprindo esta última exigência, vieram os ora reclamantes dizer, no seu 
 requerimento de recurso, que a questão de inconstitucionalidade foi levantada em 
 sede de alegações dos recursos de agravo e de apelação interpostos para o 
 Tribunal de Relação de Coimbra.
 Todavia, compulsados os autos, verifica-se que, na verdade, a questão de 
 constitucionalidade não foi suscitada, ao contrário do que alegam os ora 
 reclamantes, nos articulados por eles mencionados.
 Verifica-se, pois, que nas alegações dos recursos de agravo e de apelação o que 
 os ora reclamantes vêm fazer é questionar as decisões do tribunal a quo pondo-as 
 directamente em crise e imputando a inconstitucionalidade à própria decisão 
 judicial em si mesma considerada, e não às normas – ou à dimensão normativa das 
 normas – cuja constitucionalidade pretendem agora que o Tribunal Constitucional 
 venha apreciar.
 Esta asserção torna-se particularmente clara quando se lê, nas alegações do 
 recurso de agravo, que (fls. 344):
 
  
 
 18. A decisão em recurso viola, pelo exposto, o nº 2 do artigo 62º da CRP, o 
 artigo 58º do C.E., os artigos 273º, nº 2, 463º, nº 1 e 506º, nºs 1 e 2 do CPC, 
 pelo que deve ser admitida a ampliação do pedido, assim se fazendo
 Justiça.
 
  
 E nas alegações do recurso de apelação, que (fls. 653, 654, 657, 659): 
 
  
 
 (…)
 
 24. Por conseguinte, ao não garantir aos Expropriados a percepção da justa 
 indemnização a que, por via do acto ablativo expropriativo que incidiu sobre o 
 seu prédio, têm direito. Como tal, o douto aresto viola também o disposto no 
 art. 22°, n.° 1 do Código das Expropriações e art. 62° n.° 2 da Constituição. 
 
 (…)
 
 32. Sempre teria a douta sentença que concretizar, explicar o conteúdo dos 
 conceitos que emprega para fundamentar uma decisão que afecta a esfera jurídica 
 dos aqui Recorrentes, mormente se tais conceitos são convocados no sentido de 
 desvalorizar o solo em questão e, consequentemente, limitar o montante 
 indemnizatório a atribuir aos Expropriados. 
 
 33. A manifesta falta de concretização do considerado provado resulta na falta 
 de fundamentação do decidido, o que implica a nulidade do recorrido, por 
 imposição da al. b) do n.° 1 do art. 668° do CPC. 
 
 34. E porque tal implica a diminuição das garantias dos Expropriados tendo em 
 vista a obtenção de uma justa indemnização, afigura-se violado o princípio 
 cristalizado no art. 22° do Código das Expropriações e, primordialmente, no n.° 
 
 2 do art. 62° da CRP.
 
 (…)
 
 56. A falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que 
 justificam a adopção destes índices e coeficientes, e a já alegada omissão de 
 pronúncia quanto à qualidade ambiental da zona que envolve a parcela 
 expropriada, provocam a nulidade da sentença posta em crise, ex vi alíneas b) e 
 d) do n.° 1 do art. 668° do Código de Processo Civil. 
 
 57. Ademais, porque, como se demonstrou no presente capítulo, falha na avaliação 
 fáctica e legal da realidade do solo expropriado, daí resultando a atribuição 
 aos Expropriados de um quantum indemnizatório inferior ao que lhes era devido, a 
 decisão recorrida viola o estipulado no art. 22° do Código das Expropriações e, 
 superiormente, no art. 62° n.° 2 da Constituição. - 
 
 (…)
 
 69. A decisão recorrida viola o princípio da igualdade perante os encargos 
 públicos que o princípio da justa indemnização postula, mais concretamente, no 
 domínio da relação externa daquele. 
 
 (…)
 
  
 Ora, não tendo os ora reclamantes questionado, perante o tribunal que proferiu a 
 decisão recorrida, a constitucionalidade de qualquer norma ou dimensão  
 normativa, não lhes está agora aberta a via de recurso para o Tribunal 
 Constitucional. Tanto basta para que se não possa conhecer do objecto do 
 recurso.
 
  
 
 8.  Outro pressuposto de admissibilidade do recurso de constitucionalidade 
 interposto, como o foi no processo sub judice, ao abrigo da alínea b), do n.º 1 
 
 , do art. 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, é também que a decisão 
 recorrida tenha feito efectiva aplicação da(s) norma(s) cuja 
 inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie. No requerimento de 
 recurso, identificam-se essas mesmas normas como sendo a norma contida no n.º 2 
 do artigo 273.º do Código de Processo Civil interpretada “no sentido em que, em 
 processo expropriativo, não admite a ampliação do pedido elaborado, decorrente 
 da determinação, por via pericial, da constituição de uma servidão non 
 aedificandi da parcela do prédio expropriado” e as normas contidas nos artigos 
 
 1.º, 22, n.º 2 e 25.º do Código das Expropriações de 1991, interpretadas “no 
 sentido em que não há que atender às características concretas da parcela 
 expropriada na definição do valor real da mesma.”
 Pois bem, quanto à primeira questão de constitucionalidade colocada, apenas, 
 relembra-se, no recurso de constitucionalidade, o Tribunal a quo não aplicou, 
 enquanto razão de decidir, a norma do artigo 273.º, n.º 2, do Código de Processo 
 Civil na interpretação enunciada pelos reclamantes. Na verdade, a ratio 
 decidendi do tribunal a quo baseia-se não na consideração de que a ampliação do 
 pedido não é admitida nos casos em que, por via pericial, se verifica a 
 constituição de uma servidão non aedificandi, mas sim que esta ampliação não é 
 possível quando a servidão non aedificandi resulta desde logo da publicação da 
 declaração de utilidade pública. Considera o tribunal a quo a fls. 813 (num 
 entendimento que não cabe ao Tribunal avaliar) que a constituição da servidão 
 non aedificandi é cognoscível a partir da data da declaração de utilidade 
 pública não sendo configurável, portanto, como um desenvolvimento ou 
 consequência do pedido principal condição necessária para que, à luz do n.º 2 do 
 artigo 273.º do Código de Processo Civil, a ampliação de pedido pudesse ser 
 admitida.  
 O mesmo se deverá dizer quanto à segunda questão de constitucionalidade, não 
 suscitada no âmbito do processo mas enunciada no requerimento de recurso 
 submetido ao Tribunal. A bem da verdade deve dizer-se que os reclamantes 
 entendem não que a interpretação levada a cabo pelo tribunal a quo das normas 
 sob juízo foi inconstitucional mas sim que o tribunal a quo não aplicou, em seu 
 entender, de forma certeira as disposições em causa.
 Com efeito, o acórdão do tribunal a quo torna claro que se baseou na 
 necessidade, constitucionalmente fundada, de atender às características 
 concretas da parcela a expropriar para cálculo da indemnização (fls. 825 e ss).
 Do que se trata, neste sede, é de questionar a aplicação em concreto da ratio 
 decidendi do tribunal a quo. Do que se trata, nesta sede, é de questionar o 
 montante quantitativo de indemnização que o tribunal a quo entendeu atribuir aos 
 ora reclamantes. Do que não se trata, nesta sede, é, pois, de uma interpretação 
 das normas ínsitas aos artigos 1.º, 22.º, n.º 2, e 25.º da Código de 
 Expropriações de 1991 no sentido de que não há que atender às características 
 concretas da parcela expropriada na definição do valor real da mesma. 
 Assim sendo, não podem dar-se como verificados os pressupostos processuais do 
 tipo de recurso interposto.
 
  
 III
 Decisão
 
  
 Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a 
 presente reclamação, confirmando a decisão reclamada.
 
  
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 12 (doze) unidades de 
 conta.
 
  
 Lisboa, 26 de Novembro de 2008
 Maria Lúcia Amaral
 Carlos Fernandes Cadilha
 Gil Galvão