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Processo nº 525/05
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Rui Moura Ramos                         
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 I- A causa
 
  
 
             1. A Câmara Municipal do Porto recorre a fls. 429 – sendo recorridas 
 A. e B. –  para este Tribunal do Acórdão, constante de fls. 419/422, do Pleno da 
 Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA), 
 que julgou findo, por apresentação tardia das alegações, um recurso fundado em 
 oposição de julgados pretendido interpor pela Câmara Municipal do Porto.
 
  
 
             Para uma exacta compreensão do que está em causa no presente recurso 
 de constitucionalidade, importa relatar sucintamente o percurso processual que 
 conduziu o processo à presente fase decisória.
 
  
 
             1.1. Interpuseram as ora recorridas (fls. 2/9), para o STA – e assim 
 teve inicio  o processo –, um recurso contencioso de anulação respeitante a um 
 Despacho, da autoria do Senhor Secretário de Estado da Administração Local, 
 declarando a utilidade pública e atribuindo carácter urgente à expropriação de 
 determinadas parcelas tidas por necessárias à execução, pela autarquia aqui 
 recorrente, de um empreendimento denominado “…)”.
 
  
 
             O STA, através do Acórdão de fls.143/173, negou provimento a tal 
 recurso, decisão que motivou a interposição, por parte das aqui recorridas, de 
 um recurso “[…] em 2ª instância, para o pleno da secção do contencioso 
 administrativo” (fls. 179).
 
  
 
             Recaiu sobre este último o Acórdão de fls. 263/279 do Pleno da 1ª 
 Secção do STA. Neste aresto, por se considerar “[…] o acto impugnado[…] ilegal, 
 por erro nos pressupostos”, concedeu-se provimento ao recurso, revogando-se o 
 Acórdão recorrido e anulando-se o acto objecto da referida impugnação 
 contenciosa (cfr. Fls. 279).
 
  
 
             1.2. Inconformada, apresentou-se a Câmara Municipal do Porto 
 
 (requerimento de fls. 286/287) a pretender recorrer, com fundamento em oposição 
 de julgados, para o Plenário do STA. Admitido este recurso (cfr. Despacho de 
 
 23/06/2004 a fls. 288) e notificada à recorrente tal admissão, por carta 
 registada de 24/06/2004 (cfr. Fls. 289), apresentou a recorrente as respectivas 
 alegações no dia 30/09/2004 (cfr. Fls. 350 e 352/357). Suscitaram, então, as 
 recorridas (cfr. Contra-alegações de fls.370/374) a questão da extemporaneidade 
 daquelas alegações, por inobservância do prazo de 10 dias que, por aplicação 
 conjugada dos artigos 765º, nº3 e 153º, nº1 do Código de Processo Civil (CPC), 
 consideram aplicável.
 
  
 
             1.3. Pronunciando-se quanto a  esta posição – que o Ministério 
 Público, aliás, acompanhou a fls. 375 e vº – apresentou a recorrente a resposta 
 de fls.377/387, da qual consta o seguinte trecho: 
 
  
 
 “[…]
 A interpretação segundo a qual é ainda aplicável o prazo previsto no já revogado 
 artigo 765º do CPC seria inconstitucional, devendo 
 
  
 ser observado o princípio da interpretação conforme com a Constituição.
 Na verdade, tal interpretação  implica a sobrevivência de normas já revogadas, 
 sem que exista qualquer disposição que manifestamente estabeleça essa 
 sobrevivência, tendo por finalidade contrariar ou corrigir o legislador – com o 
 que se viola o princípio da preeminência de lei consagrado no artigo 112º, nº 2, 
 da CRP.
 Outrossim, ao estabelecer uma diferenciação entre os prazos superiores aos 
 desta, tal interpretação viola os princípios da igualdade e da tutela 
 jurisdicional efectiva, plasmados nos artigos 13º e 20º da CRP.
 Acresce ainda que, também do ponto de vista constitucional, o direito 
 fundamental de recurso “não se satisfaz com a disponibilidade teórica de meios  
 de impugnação, requerendo antes a efectividade dos meios de protecção jurídica” 
 
 – pelo que há que averiguar se a dimensão do prazo impossibilita na prática o 
 exercício da garantia constitucional” (Sérvulo Correia, p. 391).
 Por tudo o que se vem expondo neste ponto, há que fazer uma interpretação 
 favorável ao recurso.
 Ora é justamente nesse sentido que deve ser visto o CPTA: ao estabelecer no 
 artigo 152º o prazo de 30 dias para alegações no recurso para uniformização de 
 jurisprudência, o legislador deu um sinal claro de que a verificação dos 
 pressupostos de oposição de acórdãos não prescinde desse prazo em processo 
 administrativo.
 Como tal, o artigo 152º do CPTA deve, nessa medida, ser visto como uma lei 
 interpretativa, não podendo suscitar-se dúvida quanto ao prazo de 30 dias para 
 alegação em sede de recurso fundado em oposição de acórdãos.
 
 4. A inconstitucionalidade
 Por cautela processual e dever de patrocínio, para o caso de se vir a decidir 
 que é aplicável o prazo previsto no já revogado  artigo 765º do CPC, a Câmara 
 Municipal deixa desde já arguida a correspondente inconstitucionalidade.
 Fá-lo a Câmara para efeitos do previsto nos artigos 70º e seguintes da Lei do 
 Tribunal Constitucional e com fundamento nos argumentos aduzidos no ponto 
 anterior, que se dão aqui por reproduzidos: a violação do princípio 
 constitucional da preeminência da lei consagrado no artigo 112º, nº 2, e dos 
 princípios da igualdade e da tutela jurisdicional efectiva, plasmados nos 
 artigos 13º e 20º.[…]”
 
  
 
  
 
             1.4. Proferiu, então, o Pleno do STA o Acórdão de fls. 419/422 – a 
 decisão objecto de impugnação neste recurso de constitucionalidade – do qual se 
 transcrevem as passagens que apresentam relevância para a questão a apreciar por 
 este Tribunal:
 
  
 
 “[…]
 
 À questão suscitada interessam os seguintes factos:
 
 1. A ora recorrente interpôs recurso para o Plenário deste S.T.A. por intermédio 
 do requerimento de fls. 286, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido.
 
 2. O recurso foi recebido pelo despacho de fls. 288, do qual a recorrente foi 
 notificada por ofício postal expedido em 24.6.04 (fls.292).
 
 3. Em 30.9.04 deram entrada, por fax, as “alegações” da recorrente.
 
                  […]
 Constitui jurisprudência largamente dominante que,  “apesar da revogação dos 
 arts. 763º a 770º do C.P.C., ditada pelos arts. 3º e 17º, nº 1, do Dec-Lei nº 
 
 329-A/95. de 12.12, à tramitação do recurso por oposição de julgados no S.T.A. 
 são ainda aplicáveis aquelas normas, em particular as dos arts. 765º e 767º. 
 Neste sentido, podem citar-se, entre outros, os acórdãos do Pleno de 27.6.01, 
 procº. Nº 25.596, 26.11.02, proc.º nº 47.995, 17-6-04, proc.º nº 2.017/02, e de 
 
 13.10.04, proc.º nº 743/04.
 Por continuar a merecer a nossa preferência, e não ter sido validamente 
 contraditada, com argumentos novos, pelas alegações da recorrente, adere-se a 
 tal doutrina, pelos fundamentos constantes dos arestos citados, que seria ocioso 
 reproduzir.
 Resta, no entanto, desatender a arguição de inconstitucionalidade feita nas 
 alegações recorrente. 
 Parece claro que não pode estar em causa a dimensão concreta do prazo aplicável. 
 O prazo de 10 dias de modo algum compromete o exercício da garantia 
 constitucional de tutela efectiva, sendo perfeitamente adequado à prática do 
 acto processual a que corresponde. É preciso não esquecer (embora a recorrente 
 tenha confundido este aspecto, como adiante se verá) o restrito âmbito desta 
 alegação: não se trata de apresentar uma alegação que procure demonstrar qual 
 dos entendimentos em oposição deve prevalecer, mas apenas de evidenciar que 
 entre os arestos em confronto existe efectiva oposição.
 Também não colhe o argumento da violação da igualdade pela diferenciação entre 
 os prazos vigentes na jurisdição administrativa e na comum. Desde logo, é 
 inaceitável que as especificidades do contencioso administrativo reclamem, por 
 natureza, prazos superiores aos do processo civil. Depois, esse confronto não é 
 em boa verdade possível, face à abolição, na jurisdição comum, do recurso por 
 oposição de julgados.
 Finalmente, quanto à hipotética inconstitucionalidade por sobrevivência de 
 normas revogadas à revelia de disposição expressa que a estabeleça, dir-se-á que 
 não se verifica semelhante disfunção. A solução acolhida pela Jurisprudência 
 deste S.T.A. não viola o princípio da prevalência de lei, porque ela própria 
 repousa numa determinada interpretação dos textos legais tendente a preservar a 
 harmonia do sistema jurídico, segundo a qual a revogação formal das normas em 
 causa não operou relativamente aos processos do contencioso administrativo.
 Vejamos então se a alegação em causa foi tempestivamente apresentada.
 Segundo prescreve o art. 765°, a seguir à notificação do despacho do relator a 
 admitir o recurso, “o recorrente apresentará uma alegação tendente a demonstrar 
 que entre os dois acórdãos existe a oposição exigida pelos artigos 763° ou 
 
 764°”. Se a não apresentar, o recurso é logo julgado deserto; se a apresentar, 
 pode a parte contrária responder findo o prazo facultado ao recorrente”.
 Relativamente ao prazo para a apresentação desta peça processual, e não fixando 
 as atinentes normas de processo civil nenhum prazo especial para o efeito, é 
 aplicável o prazo geral de 10 dias estabelecido no art. 153° do C.P.C..
 Ora, este prazo foi largamente excedido pela recorrente, já que ele terminou em 
 
 8.7.04 (a notificação do despacho de admissão considera-se realizada em 28.6, e 
 seguidamente correram 10 dias contínuos de prazo), sendo que as alegações só 
 deram entrada em
 
 30.9.04.
 Nesta conformidade, o recurso não pode prosseguir. […]”
 
  
 
  
 
 1.5.Inconformada recorreu a Câmara Municipal do Porto para este Tribunal 
 
 (fls.447/449), ao abrigo do artigo 70º, nº1 da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro 
 
 (LTC), explicitando tal recurso nos seguintes termos:
 
  
 
 “[…]
 
 3. A recorrente pretende ver apreciada a inconstitucionalidade das normas 
 constantes do artigo 24º, alínea b) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e 
 Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, dos artigos 1º e 
 
 102º da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, aprovada pelo Decreto-Lei 
 
  nº 267/85, de 16 de Julho, do artigo 765º do CPC e dos artigos 3º e 17º, nº1 do 
 Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, todas conjugadas, com a 
 interpretação com que foram aplicadas no Acórdão recorrido.
 
 5. As aludidas normas, com a referida interpretação, violam, desde logo, o 
 princípio constitucional da preeminência de lei consagrado no artigo 112°, n.° 
 
 2, da Constituição da República Portuguesa (LIS’), visto que implicam a 
 sobrevivência de normas já revogadas, sem que exista qualquer disposição que 
 manifestamente estabeleça essa sobrevivência, tendo por finalidade contrariar ou 
 corrigir o legislador.
 
 6. Tais normas, com a aludida interpretação, violam também o princípio da 
 igualdade plasmado no artigo 13° da CRP, na medida em que estabelecem para o 
 processo administrativo prazos significativamente mais curtos do que os vigentes 
 no processo civil, com o que se desfavorece injustificadamente quem pretenda 
 socorrer-se da jurisdição administrativa.
 
 7. As mencionadas normas, com a interpretação que mereceram no acórdão 
 recorrido, violam ainda o princípio da tutela jurisdicional efectiva contido no 
 artigo 20° da CRP’, na medida em que o prazo de alegações previsto no artigo 
 
 765° do CPC se revela manifestamente insuficiente, atenta a complexidade das 
 questões que subjazem a este tipo de recurso por oposição de julgados.
 
 8. A inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo, na primeira 
 oportunidade processual que para o efeito existiu, dado que até essa altura a 
 questão não havia, sequer, sido aflorada.
 
 9. Foi essa inconstitucionalidade suscitada através de peça processual 
 consistente em requerimento e constante de fls. Dos autos (cuja cópia aqui se 
 junta sob o n.°2 e cujo conteúdo se dá por reproduzido para todos os legais 
 efeitos), sobretudo nas páginas 8 a 10 de tal requerimento.
 
 10. A questão foi suscitada de modo processualmente adequado perante o Pleno, em 
 termos tais que este ficou obrigado a dela conhecer, sendo certo que o Pleno 
 efectivamente dela conheceu no acórdão recorrido – pelo que, aliás, a recorrente 
 goza de legitimidade para a interposição do presente recurso.
 
 11. O acórdão em crise não admite recurso ordinário, por a lei não o prever, 
 dada a instância em que foi proferido.
 
 12. Nos termos do artigo 78° da já referida LTC, o presente recurso tem efeito 
 suspensivo e sobe imediatamente nos próprios autos. […]”
 
  
 
  
 
 3.      6. O recurso foi admitido no STA (cfr. Fls. 471) e subiu a este 
 Tribunal. Aqui, proferiu o ora relator o seguinte despacho: 
 
  
 
  
 
 “O processo prossegue para alegações.
 Quanto ao objecto do recurso importa ter presente que a recorrente indica (v. 
 item 3 do requerimento de interposição a fls. 447) o artigo 24º., alínea b) do 
 Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei 
 nº.129/84, de 27 de Abril; os artigos 1º. E 102º. Da Lei de Processo nos 
 Tribunais Administrativos (LPTA), aprovada pelo Decreto-Lei nº.268/85, de 16 de 
 Julho; o artigo 765º. Do Código de Processo Civil (CPC); e, finalmente, os 
 artigos 3º. E 17º., nº.1 do Decreto-Lei nº.329-A/95, de 12 de Dezembro. A 
 questão de inconstitucionalidade em causa tem que ver com o prazo para alegar 
 nos recursos por oposição de julgados no âmbito do contencioso administrativo, 
 concretamente com o entendimento do Supremo Tribunal Administrativo – renovado 
 neste processo e unânime e invariável, desde o Acórdão de 24/04/1996, proferido 
 no recurso nº.36643, v. BMJ 456,259 – segundo o qual esse prazo decorre do 
 disposto no artigo 765º., nº.3 do CPC.
 O Tribunal Constitucional procedeu à caracterização desta questão de 
 inconstitucionalidade no Acórdão nº.643/99 (www.tribunalconstitucional.pt/), 
 como respeitante ao artigo 102º. Da LPTA, interpretado no sentido de manter no 
 respectivo conteúdo uma remissão para os artigos 765º. A 767º. Do CPC, não 
 obstante a sua revogação pelo artigo 17º. Do Decreto-Lei nº.329-A/95.
 Assim, sendo entendimento do ora relator, pelas razões constantes desse Acórdão 
 nº.643/99, que esta é a correcta caracterização da questão de 
 inconstitucionalidade normativa suscitada, fica, desde já, a recorrente 
 advertida de tal entendimento e que, em função dele, o objecto do recurso se 
 restringe ao artigo 102º. Da LPTA, interpretado com o sentido anteriormente 
 indicado”. 
 
  
 
  
 
 3.                             7. Alegou a recorrente, rematando tal peça 
 processual formulando as seguintes conclusões:
 
  
 
  
 
 “[…]
 
 1) A remissão operada pelos artigos 1° e 102° da LPTA para o processo civil ou 
 para os recursos em processo civil reveste natureza abstracta;
 
 2) Com efeito, tal remissão consiste em remeter para a aplicação supletiva e 
 vagamente para todo um diploma ou toda uma categoria processual, sem remeter 
 individualizada concretamente para certa e determinada norma ou secção de 
 normas;
 
 3) Como remissão abstracta que é, é ela também dinâmica: em caso de revogação, 
 não permite afirmar a cristalização ou sobrevivência das normas revogadas, visto 
 que só têm aptidão para sobreviver as normas ou conjuntos de normas para que se 
 remeta especificamente, de forma tal que seja possível afirmar que o sistema da 
 norma remissiva se apropriou da norma remetenda;
 
 4) A aplicação feita pelo STA das normas constantes do artigo 24°, alínea b), do 
 ETAF, dos artigos 1° e 102° da LPTA, do artigo 765° do CPC e dos artigos 3° e 
 
 17°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 329-A/95, traduziu-se, porém, na aplicação no 
 contencioso administrativo de uma norma que havia sido anteriormente revogada;
 
 5) Dado o carácter de remissão dinâmica e atenta o descrito, é forçoso concluir 
 que a aplicação daquelas normas, com a interpretação dada pelo STA, teve por 
 alcance e resultado a sobrevivência de normas já revogadas, sem disposição que 
 manifestamente estabeleça essa sobrevivência, tendo por finalidade contrariar ou 
 corrigir o legislador;
 
 6) Tanto viola o princípio da preeminência de lei consagrado no artigo 112°, n.° 
 
 2, da CRP’;
 
 7) A aplicação das ditas normas, com a interpretação do STA, conduz ainda ao 
 estabelecimento de desigualdades entre a tutela dos direitos e interesses no 
 domínio do processo civil, por um lado, e no domínio do processo administrativo, 
 por outro;
 
 8) Na realidade, o prazo de alegações em recurso de revista ampliada é muito 
 superior no domínio do processo civil do que no do administrativo;
 
 9) Ora, o domínio do processo administrativo reclamaria, pelas suas 
 especificidades e particulares complexidades, o estabelecimento de prazos mais 
 alargados do que os vigentes para o processo civil – ou, pelo menos, idênticos;
 
 10) Constata-se, pois, que as normas em apreço, se interpretadas como nos autos, 
 conduzem à criação de desigualdades na tutela dos direitos e interesses das 
 várias entidades consoante o domínio em que se situem, sem que para isso exista 
 qualquer motivo razoável – com o que sai ferido o princípio da igualdade, 
 consagrado no artigo 13° da CRP;
 
 11) Acresce que a aludida aplicação das normas em apreço leva à existência de 
 prazos de alegações mais curtos nos processos mais complexos — em que nem o 
 Supremo Tribunal se entende – do que nos normalizados, daí decorrendo 
 inequivocamente o desrespeito pelo princípio da tutela jurisdicional efectiva, 
 plasmado no artigo 20° da CRP.”
 
  
 
  
 
             1.8. As recorridas, por sua vez, responderam (fls. 527/551) 
 formulando as seguintes conclusões:
 
  
 
 “1ª- A questão de inconstitucionalidade que os autos tratam está ligada ao prazo 
 para alegar nos recursos por oposição de julgados no âmbito do contencioso 
 administrativo;
 
 2ª- Tal prazo é o que decorre do disposto no artigo 765°, n.° 3 do C.P. C., não 
 obstante a sua revogação pelo artigo 170 do D.L. 329-A/95, de 12 de Dezembro,
 
 -3ª A remissão operada pelo artigo 102° da LPTÁ para aquele
 normativo processual é estática, como se refere no acórdão do STA (Pleno) de 
 
 19/02/03;
 
 4ª – Sendo em regra que a remissão ou devolução legislativa tem
 natureza dinâmica, tal regra sofre neste caso uma excepção por virtude da 
 alteração do regime para que se remeteu (artigos 763° a 770° do C.P. C.) ter por 
 causa razões específicas do sistema legal em que esse regime está inserido;
 
 5ª – Na verdade, a revogação das normas que regulavam o recurso
 para o Tribunal Pleno, em processo civil, ficou a dever-se, como se explana no 
 preâmbulo do D.L. 329-A/95, ao reconhecimento da inconstitucionalidade do 
 instituto dos “assentos “, atenta a sua natureza normativa, sendo certo que aos 
 acórdãos do Pleno da Secção proferidos em recursos fundados em oposição de 
 julgados,
 no âmbito do contencioso administrativo, não é nem nunca foi atribuída força 
 normativa, contrariamente ao que o artigo 2° do Código Civil (também revogado), 
 consagrava relativamente aos assentos;
 
 6ª – Nada justificaria, no âmbito do contencioso administrativo a 
 inaplicabilidade dos referidos artigos do C.P. C., uma vez que outros não havia 
 que fossem aplicáveis em matéria de recurso por oposição de acórdãos;
 
 7ª – O prazo de 10 dias para apresentação de alegações de modo algum compromete 
 o exercício da garantia constitucional de tutela efectiva, sendo perfeitamente 
 adequado à prática do acto processual a que corresponde;
 
  8ª – É inaceitável que as especificidades do contencioso administrativo 
 reclamem, por natureza, prazos superiores aos do processo civil, sendo que esse 
 confronto não é em boa verdade, possível, face à abolição, na jurisdição comum, 
 do recurso por oposição de julgados, não procedendo pois qualquer argumento de 
 violação do princípio da igualdade,
 
 9ª – Também não se verifica qualquer inconstitucionalidade por sobrevivência de 
 normas revogadas à revelia de disposição expressa que a estabeleça. A solução 
 acolhida pela jurisprudência do STA não viola o princípio da prevalência de lei, 
 porque ela própria repousa numa determinada interpretação dos textos legais 
 tendente a preservar a harmonia do sistema jurídico, segundo a qual a revogação 
 formal das normas em causa não operou relativamente aos processos do contencioso 
 administrativo;
 
 10ª –Também já este Tribunal Constitucional procedeu à caracterização desta 
 questão de inconstitucionalidade no acórdão 643/99 como respeitante ao artigo 
 
 102° da LPTA, interpretado no sentido de manter no respectivo conteúdo uma 
 remissão para os artigos 765° a 767° do C.P.C., não obstante a sua revogação 
 pelo artigo 170º do D.L. 329 –A/95;
 
 11ª – O sistema português de fiscalização concreta da constitucionalidade é um 
 sistema de controlo normativo, uma vez que só podem ser objecto de recurso de 
 constitucionalidade as normas jurídicas e não também as decisões judiciais, 
 consideradas em si mesmas;
 
 12ª – O Tribunal Constitucional apenas pode conhecer de recursos interpostos de 
 decisões de outros tribunais, que recusem a aplicação de normas jurídicas com 
 fundamento na sua inconstitucionalidade ou que as apliquem não obstante a sua 
 inconstitucionalidade haver sido suscitada durante o processo pelo recorrente, 
 sendo que a constitucionalidade a apreciar há-de ser uma questão de 
 constitucionalidade normativa, isto é, respeitante a uma norma (ou a uma sua 
 dimensão parcelar ou interpretação); 13ª – A recorrente, Câmara Municipal do 
 Porto, não suscitou nunca a inconstitucionalidade do artigo 102° da LPTA, norma 
 que remete para os artigos 763° a 770° do C.P.C., nem a sua interpretação;
 
 14ª – Admitindo, porém, que tal inconstitucionalidade foi suscitada, o despacho 
 do Excelentíssimo Senhor Conselheiro Relator restringiu o objecto do recurso ao 
 artigo 102° da LPTA, interpretado no sentido de manter no respectivo conteúdo 
 uma remissão para aqueles artigos do C.P.C. não obstante a sua revogação pelo 
 artigo 17º do D.L. 329-A/95”.
 
  
 
  
 
  
 II – Fundamentação
 
  
 
  
 
             2. O primeiro passo lógico do iter decisório do presente recurso, 
 tendo presente que as recorridas (v. as conclusões 11ª a 13ª a fls. 550 das 
 respectivas contra-alegações) entendem que não foi suscitada uma questão de 
 inconstitucionalidade normativa (“13ª- A recorrente […] não suscitou nunca a 
 inconstitucionalidade do artigo 102º da LPTA […] nem a sua interpretação”), 
 sempre será o da verificação do pressuposto processual correspondente a tal 
 argumento: suscitação prévia de uma questão de desconformidade constitucional 
 que se entenda, de acordo com os critérios correntes na jurisprudência deste 
 Tribunal, assumir ou não natureza normativa. Porém, porque este aspecto se 
 apresenta, neste caso concreto, numa relação de tão estreita conexão com a 
 questão – referida no despacho interlocutório de fls. 478/479 – da delimitação 
 do objecto (normativo) do recurso, procederemos a um tratamento conjunto das 
 duas questões.
 
  
 
             2.1. A recorrente indicou, no acto de interposição do recurso – e 
 parece reiterá-lo nas alegações (v. item 2 a fls. 510) –, como normas objecto o 
 artigo 24º, alínea b) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF; 
 Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril), os artigos 1º e 102º da Lei de Processo 
 nos Tribunais Administrativos (LPTA; Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho), o 
 artigo 765º do CPC e, finalmente, os artigos 3º e 17º, nº1 do Decreto-Lei nº 
 
 329-A/95, de 12 de Dezembro.
 
  
 
             No despacho de fls. 478 manifestou o ora relator ser seu 
 entendimento que a questão colocada, que se reconduz à de saber qual o prazo de 
 apresentação das alegações, subsequentes ao despacho de admissão do recurso por 
 oposição de julgados no âmbito do contencioso administrativo, que tal questão, 
 dizíamos, tinha como referencial normativo exclusivo o artigo 102º da LPTA. Tal 
 entendimento foi explicitado, nesse mesmo despacho interlocutório, por remissão 
 para o Acórdão nº 643/99 deste Tribunal (este e os Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional doravante citados disponíveis em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos). 
 
  
 Refere a recorrente – e tem obviamente razão – não ter encontrado no citado 
 acórdão argumento algum no sentido da constitucionalidade ou 
 inconstitucionalidade do artigo 102º da LPTA, ou de qualquer outra das normas 
 que indica como respeitantes ao entendimento do STA de qual o prazo de alegações 
 aplicável ao recurso que pretendeu interpor. Com efeito, a indicação do Acórdão 
 nº 643/99 visou apenas fornecer os fundamentos, que ora se reiteram, nos quais 
 assenta a delimitação da questão de inconstitucionalidade relevante no presente 
 recurso. Disse-se a tal respeito, no referido Acórdão nº 643/99, o seguinte:
 
  
 
  
 
   “[…]
 Está, pois, em causa a interpretação do sentido da remissão contida [no artigo 
 
 102º da LPTA] (no sentido de não ser uma remissão «dinâmica»). E não, 
 obviamente, do próprio artigo para o qual tal entendimento do referido artigo 
 
 102º remete [refere-se o Acórdão ao artigo 765º do CPC], pois a própria norma 
 objecto de remissão não comporta, em si, qualquer interpretação no sentido de, 
 apesar de revogada, dever continuar a ser aplicável, tal como não comporta 
 qualquer virtualidade aplicativa fora do processo civil independentemente 
 daquela remissão (e, depois da sua revogação, da interpretação do sentido desta 
 remissão, como sendo «dinâmica» ou «estática»). […]”
 
  
 
  
 
             Ora, também no presente recurso, discutindo a recorrente qual o 
 prazo para produção das alegações subsequentes à admissão do recurso por 
 oposição de acórdãos na jurisdição administrativa, o referencial normativo 
 relevante sempre será o da disposição legal que – remetendo para outras normas, 
 
 é certo – conduz à fixação desse prazo. Tal referência reside, sem dúvida 
 alguma, no artigo 102º da LPTA (“[o]s recursos ordinários de decisões 
 jurisdicionais regem-se pela lei de processo civil, com as necessárias 
 adaptações e, com excepção dos fundados em oposição de acórdãos, são processados 
 como os recursos de agravo […]”).
 
  
 
             Com efeito, a virtualidade de originarem em concreto a fixação do 
 prazo em causa, não a têm as restantes normas indicadas pela recorrente. Não a 
 tem, obviamente, o artigo 24º, alínea b) do ETAF (redacção introduzida pelo 
 Decreto-Lei nº 229/96, de 29 de Novembro), que se limita a dispor sobre a 
 competência da Secção de Contencioso Administrativo funcionando como Pleno, 
 quanto aos recursos dos acórdãos “que, relativamente ao mesmo fundamento de 
 direito […], perfilhem solução oposta à de acórdão da mesma secção ou do mesmo 
 pleno”. E, da mesma forma, não tem esse efeito de fixação do prazo – isto quando 
 individualmente considerado – o artigo 1º da LPTA, mera norma genérica 
 respeitante à lei reguladora do processo nos tribunais administrativos. Tal como 
 também o não fixa (ao prazo aqui em causa) o artigo 765º do CPC, concretamente o 
 seu nº2, que se refere (referia) ao recurso para o Tribunal Pleno em processo 
 civil e, sem a mediação do artigo 102º da LPTA – como se sublinhou no Acórdão nº 
 
 643/99 –, “não comporta qualquer virtualidade aplicativa fora do processo 
 civil”. E, enfim, relativamente aos artigos 3º e 17º do Decreto-Lei nº 329-A/95, 
 de 12 de Dezembro (dos quais resulta a revogação, com efeitos imediatos, do 
 artigo 765º do CPC), pelos mesmos argumentos constantes do citado Acórdão nº 
 
 643/99, pode afirmar-se, até por maioria de razão, que não é (e efectivamente 
 não foi) em função deles que a decisão recorrida concluiu por via interpretativa 
 ser de 10 dias o prazo das alegações aqui em causa.
 
  
 
             2.1.1. Questão distinta, mas conexa com esta, é a que respeita ao 
 preenchimento dos pressupostos processuais do recurso de constitucionalidade. 
 Está em causa uma norma – que já se definiu ser o artigo 102º da LPTA – em 
 determinada interpretação: aquela que caracteriza como estática a remissão 
 
 (contida nesse artigo 102º) para a “lei de processo civil” e, por isso mesmo, 
 subsistente independentemente da revogação, entretanto ocorrida, das normas que 
 no processo civil (os artigos 763º a 770º, neste caso particularmente o artigo 
 
 765º, todos do CPC) disciplinavam o recurso para o Tribunal Pleno.
 
  
 
             A natureza estritamente normativa da fiscalização de 
 constitucionalidade atribuída a este Tribunal comporta, enquanto objecto de 
 apreciação, o específico sentido interpretativo que na decisão recorrida tenha 
 sido conferido a determinada norma, isto sempre que tal sentido possa ser 
 destacado do próprio acto de julgamento, enquanto “regra abstractamente 
 enunciada e vocacionada para uma aplicação potencialmente genérica” (Carlos 
 Lopes do Rego, “O Objecto Idóneo dos Recursos de Fiscalização Concreta da 
 Constitucionalidade: As Interpretações Normativas Sindicáveis pelo Tribunal 
 Constitucional”, in Jurisprudência Constitucional, nº3, Julho/Setembro, 2004, p. 
 
 7). Ora, no caso dos autos, facilmente se apreende que a decisão recorrida, 
 conforme já se indicou, assentou num entendimento, que implicitamente só pode 
 estar reportado ao artigo 102º da LPTA [embora a decisão se não refira a ele, 
 explicitamente, só ele (a norma que remete) e não as outras normas (para as 
 quais ele remete) potencia o resultado interpretativo final], entendimento esse, 
 dizíamos, que comporta inquestionavelmente essa dimensão de regra com algo de 
 destacável – algo que como que sobrevive ao acto da simples aplicação da norma – 
 e que, por isso mesmo, apresenta essa vocação abstracta que configura uma 
 interpretação normativa – ou, se preferirmos, uma dimensão interpretativa de uma 
 norma – sindicável pelo Tribunal Constitucional. Isto com base no entendimento, 
 que o Tribunal firmou, interpretando o artigo 280º da CRP, expressamente e pela 
 primeira vez, no Acórdão nº 55/85 [ publicado nos Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 5º Vol., pp. 461/479], ao considerar-se “[…] competente para 
 fundar [um] juízo de constitucionalidade em determinada interpretação da norma 
 que a decisão recorrida tiver aplicado, ou a que tiver recusado aplicação[…]” 
 
 (p. 464).
 
  
 
             2.1.2. Ainda em sede de preenchimento dos pressupostos do recurso, 
 que foi interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, 
 poder-se-ia questionar –  as recorridas pelo menos questionam-no (v. item 2 
 supra), e o Tribunal deve debruçar-se sobre a questão –  se a recorrente 
 suscitou, previamente à decisão recorrida, uma questão de inconstitucionalidade 
 
 à qual não fosse absolutamente estranho, enquanto referencial normativo, o 
 artigo 102º da LPTA e a interpretação deste que conduz à “sobrevivência”, ao 
 Decreto-Lei nº 329-A/95, do prazo que o STA considerou ser o aqui aplicável e em 
 função do qual julgou findo o recurso por oposição de julgados pretendido 
 interpor.
 
  
 
             A suscitação de inconstitucionalidade anterior à decisão recorrida 
 está contida no requerimento de fls.389/399 (o requerimento está repetido a fls. 
 
 400/410) e dele consta (v. item 4 a fls.398) uma invocação expressa de 
 desconformidade constitucional que não contendo qualquer referência (nesse local 
 especifico) ao artigo 102º da LPTA, remete para trechos anteriores dessa mesma 
 peça processual nos quais esta norma é indicada (cfr. Fls. 390, 391, 392 e 394). 
 O contexto discursivo do documento aponta inequivocamente no sentido destas 
 alusões estarem abrangidas na imputação de desconformidade constitucional. 
 Diz-se, com efeito, no item 4 do requerimento: “[f]á-lo a Câmara para efeitos do 
 previsto nos artigos 70º e seguintes da Lei do Tribunal Constitucional e com 
 fundamento nos argumentos aduzidos no ponto anterior, que se dão aqui por 
 reproduzidos: a violação do princípio constitucional da preeminência de lei 
 consagrado no artigo 112º, nº2, e dos princípios da igualdade e da tutela 
 judicial efectiva […]”.
 
  
 Ora, esta afirmação, no contexto referido, basta para que o Tribunal considere 
 adequadamente suscitada pela recorrente a questão de inconstitucionalidade, 
 designadamente considerando-a reportada à norma do artigo 102º da LPTA na 
 interpretação que o STA, implicitamente – implicitamente porque pressupondo-a 
 sempre (pois é ela que remete para a norma do CPC que contém o prazo) o STA 
 jamais a nomeou –, lhe conferiu, ou seja, a interpretação que entende que a 
 remissão para a “lei de processo civil”, contida no artigo 102º da LPTA, no caso 
 dos recursos de decisões jurisdicionais fundados em oposição de acórdãos, assume 
 natureza estática e, em função disso, a posterior revogação no âmbito do 
 processo civil das normas para as quais a LPTA remetia, não obsta à permanência 
 dessas normas como sendo as que regulam o regime do recurso por oposição de 
 julgados na jurisdição administrativa. É a conformidade constitucional desta 
 dimensão interpretativa do artigo 102º da LPTA, matéria sobre a qual o STA, 
 aliás, se pronunciou na decisão recorrida (cfr. Fls. 421), que o Tribunal 
 Constitucional – considerando preenchidos os pressupostos processuais do recurso 
 
 – passará a apreciar. 
 
  
 
 2.2. Como ponto de partida importa sublinhar a circunstância de este Tribunal, 
 já posteriormente ao despacho interlocutório de fls.478/479, ter proferido o 
 Acórdão nº 462/05 (2ª Secção) no qual se pronunciou pela conformidade 
 constitucional do artigo 102º da LPTA, “entendid[o] como mantendo no seu 
 conteúdo uma remissão para o conteúdo normativo dos artigos 765º a 767º do 
 Código de Processo Civil, não obstante a sua revogação pelo artigo 17º do 
 Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro” (alínea a) do pronunciamento 
 decisório respectivo). Trata-se de situação em tudo idêntica à do presente 
 recurso. O Tribunal Constitucional, por entender que a sua validade se mantém  
 inteiramente, pretende reafirmar os argumentos constantes desse Acórdão nº 
 
 462/05 e proferirá adiante decisão no mesmo sentido. Não obstante, procurar-se-á 
 discutir no presente aresto as especificidades argumentativas que, relativamente 
 ao anterior pronunciamento do Tribunal,  as alegações da recorrente parecem 
 conter. Preliminarmente, porém, no que concerne às várias soluções 
 interpretativas possíveis quanto à regulação concreta do recurso por oposição de 
 julgados na jurisdição administrativa, após a revogação dos artigos 763º a 770º 
 do CPC, operada pelo artigo 17º do Decreto-Lei nº 329-A/95, importa ter presente 
 
 – e citam-se as palavras do Acórdão nº 462/05 – “[…] não cabe[r] ao Tribunal 
 Constitucional apreciar os méritos relativos [dessas] soluções 
 
 [interpretativas], mas apenas averiguar se a continuidade do regime adoptado 
 pelo Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Junho, que aprovou a Lei de Processo nos 
 Tribunais Administrativos , e que corresponde a [uma dessas] alternativa[s], é 
 constitucionalmente conforme, como, implicitamente, julgou o Supremo Tribunal 
 Administrativo”.
 
  
 
 2.2.1. A circunstância de estarmos perante processo pendente à data da entrada 
 em vigor (1/01/2004) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 
 aprovado pela Lei nº 15/02, de 22 de Fevereiro, determina que lhe seja aplicável 
 o regime constante da LPTA [esta, não obstante revogada pelo artigo 6º, alínea 
 e) da Lei nº 15/02, aplica-se (cfr. Artigo 5º, nº 1 desta mesma Lei) aos 
 
 “processos que se encontrem pendentes à data da sua entrada em vigor”; a data da 
 entrada em vigor do CPTA decorre do artigo 2º da Lei nº 4-A/03, de 19 de 
 Fevereiro]. 
 
  
 Relativamente ao regime dos recursos de decisões jurisdicionais, continha a LPTA 
 
 (e ainda contém para os processos iniciados anteriormente a 1/01/2004), no 
 respectivo artigo 102º, a já por diversas vezes mencionada remissão para a lei 
 de processo civil, nos recursos fundados em oposição de acórdãos. Nesta – no 
 processo civil – , à data da edição da LPTA, vigoravam as disposições do CPC de 
 
 1961 (aprovado pelo Decreto-Lei nº 44129, de 28 de Dezembro de 1961 e que, 
 embora muito alterado, constitui o CPC ainda hoje em vigor) que regulavam os 
 recursos para o Tribunal Pleno, disposições contidas nos artigos 763º a 770º e 
 que eram – “com as necessárias adaptações”, como preceituava o artigo 102º da 
 LPTA –  as normas das quais se retirava a tramitação dos recursos para o Pleno 
 do STA baseados em oposição de acórdãos.
 
  
 Através do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, procedeu-se a uma 
 profunda reforma do processo civil, alterando-se e revogando-se um número muito 
 significativo de normas do CPC. Destas, entre as disposições eliminadas, 
 constavam os artigos 763º a 770º do CPC, cuja revogação, aliás, teve aplicação 
 imediata, nos termos do artigo 17º, nº 1 do Decreto-Lei nº 329-A/95. A supressão 
 destes artigos do CPC, permanecendo em vigor o artigo 102º da LPTA, colocou à 
 jurisdição administrativa, então – estávamos em Dezembro de 1995 –, o problema 
 específico de definir qual a tramitação dos recursos fundados em oposição de 
 acórdãos, designadamente no que tange ao prazo de cinco dias fixado no artigo 
 
 765º, nº3 do CPC (“ Dentro de cinco dias, a contar da notificação do despacho 
 que admita o recurso, o recorrente apresentará uma alegação tendente a 
 demonstrar que entre os dois acórdãos existe a oposição exigida pelos artigos 
 
 763º ou 764º. Se a não apresentar, o recurso é logo julgado deserto […]”).
 
  
 Logo na primeira vez que esta questão foi submetida ao STA (em subsecção da  
 Secção de Contencioso Administrativo, Acórdão de 24/04/1996, publicado no 
 Boletim do Ministério da Justiça, nº 456, pp. 259/263), definiu este – que era 
 
 ,aliás, o único tribunal ao qual a questão se poderia colocar –  a remissão do 
 artigo 102º da LPTA para o processo civil como “estática” (por oposição a 
 
 “dinâmica”), nos termos e com as consequências já referidas ao longo desta 
 decisão. Importa recordar o discurso argumentativo deste Acórdão do STA de 1996, 
 no trecho versando este específico aspecto:
 
  
 
  
 
 “[…]
 Entende-se que a remissão ou devolução legislativa tem, em regra, natureza 
 dinâmica, e não estática; isto é, a remissão não respeita ao regime material 
 concretamente existente à data em que é feita, mas à forma como o sistema 
 apelado regula ou venha a regular a situação, pelo que as alterações que nele 
 venham a registar se repercutem na regulação da situação a que respeita a norma 
 de remissão ou de devolução. Assim, no caso [do artigo 102º da LPTA], as 
 alterações que se venham a registar a nível do Código de Processo Civil na 
 regulamentação do recurso de agravo serão imediatamente aplicáveis – sempre com 
 as necessárias adaptações, como é óbvio – à generalidade dos recursos 
 jurisdicionais das decisões  dos tribunais administrativos.
 Esta regra sofre, contudo, uma excepção quando a alteração do regime para que 
 remete a norma de devolução tem por causa razões específicas do sistema legal em 
 que esse regime está inserido.
 
 […]
 
                   Na verdade, a revogação das normas que regulavam o recurso 
 para o tribunal pleno, em processo civil, ficou a dever-se, como se explana no 
 preâmbulo do Decreto-Lei nº 329-A/95, ao reconhecimento da inconstitucionalidade 
 do instituto dos «assentos», atenta a sua natureza normativa. […]
 
                   A eliminação do recurso para o tribunal pleno, em processo 
 civil, fundado em oposição de julgados, foi determinada, assim, por razões 
 específicas desse ramo de direito, inexistentes no contencioso administrativo, 
 onde aos acórdãos do pleno da Secção não é nem nunca foi atribuída força 
 obrigatória geral, como o artigo 2º do Código Civil (também revogado pelo artigo 
 
 4º, nº 2, do Decreto-Lei nº 329-A/95) consagrava relativamente aos assentos.
 
                   Neste quadro, deve entender-se que, apesar da sua revogação no 
 
 âmbito do processo civil, as normas dos artigos 765º a 767º do Código de 
 Processo Civil continuam aplicáveis, com as necessárias adaptações, à regulação 
 da tramitação do recurso por oposição de acórdãos no âmbito do contencioso 
 administrativo.
 
                   […]”
 
  
 
  
 Tal interpretação do artigo 102º da LPTA, com a particularidade de se entender 
 que, por força do disposto no artigo 153º, nº 1 do CPC, o prazo de cinco dias 
 previsto no artigo 765º, nº 3 do CPC, passaria a ser – como, aliás, foi 
 entendido neste caso – de dez dias [note-se que ao mesmo prazo de dez dias se 
 chegaria conjugando os artigos 6º (v. respectivo nº 1, alínea a) ) e 18º do 
 Decreto-Lei nº 329-A/95 ], tal interpretação do artigo 102º da LPTA, dizíamos, 
 passou a constituir jurisprudência constante e invariável do STA (cfr., entre 
 muitos outros possíveis, e sem qualquer decisão divergente, os Acórdãos de 
 
 19/02/2003 e 24/05/2005, correspondentes aos processos nºs 047985 e 01056/04, 
 ambos disponíveis em www.dgsi.pt/jsta.nsf/ ). Isto em termos tais que, no citado 
 Acórdão nº 462/05, este Tribunal afirmou – e tal afirmação poderia ser repetida 
 no presente recurso – que: “[q]uando interpuseram o seu recurso, os recorrentes 
 não podiam, pois, deixar de conhecer esta orientação, no sentido da manutenção 
 da aplicabilidade do artigo 765º do Código de Processo Civil ao recurso por 
 oposição de julgados nos tribunais administrativos” (final do item 7 do Acórdão 
 nº 462/05).
 
  
 
 2.2.1.1. Esta última observação justifica-se inteiramente – e por isso é feita – 
 num contexto de indagação de constitucionalidade de determinada dimensão 
 interpretativa de uma norma, tendo presentes os poderes de cognição do Tribunal 
 Constitucional relativamente às normas e princípios constitucionais violados 
 
 (artigo 79º-C da LTC). Com efeito, assim se afastariam, por não pertinentes, 
 quaisquer hipotéticos argumentos de desconformidade constitucional reportados ao 
 
 “princípio da confiança”, subjacente a uma leitura articulada dos artigos 2º e 
 
 20º da CRP, por vezes violado pelo “ineditismo” (a expressão é usada neste 
 preciso contexto pelo Acórdão nº 413/02 deste Tribunal) de determinadas 
 interpretações judiciais respeitantes ao exercício de faculdades processuais 
 pelas partes (v. Carlos Lopes do Rego, “Os Princípios Constitucionais da 
 Proibição da Indefesa, da Proporcionalidade dos Ónus e Cominações e o Regime da 
 Citação em Processo Civil”, in Estudos Em Homenagem Ao Conselheiro José Manuel 
 Cardoso da Costa,  Coimbra, 2003, pp. 848/849). Obviamente que em Junho de 2004 
 
 (cfr. Despacho de fls. 288), qualquer “investimento de confiança” da recorrente 
 respeitante à interpretação da remissão contida no artigo 102º da LPTA pelos 
 tribunais, só se poderia reportar à interpretação aqui adoptada pelo STA.
 
  
 
 2.2.2. Esta interpretação, presente, como se disse, na jurisprudência do STA 
 desde o citado Acórdão de 1996, opera, como a definiu o Acórdão nº 462/05 deste 
 Tribunal, citando a formulação de  Karl Engisch, num quadro de “«obediência 
 pensante» (Heck) e inteiramente de acordo com o espírito do legislador, 
 actua[ndo] as verdadeiras intenções deste ao tomar em conta o sentido e o fim da 
 norma” (Introdução ao Pensamento Jurídico, 2ª ed., Lisboa, 1968, p. 279; cfr. 
 Item 8 do Acórdão). Tal captação do “espírito do legislador” – Engisch noutro 
 passo da obra fala, sugestivamente, em “seguir o rasto do próprio legislador” 
 
 (ibidem) – enquadra a supressão dos artigos 763º a 770º do CPC no exacto 
 contexto em que o legislador da reforma do processo civil de 1995 a situou, 
 verificando – e trata-se obviamente de uma técnica hermenêutica conforme às 
 legis artis da interpretação jurídica – que esse contexto justificativo não se 
 reproduz (está, aliás, ausente) quando se encara o significado dessas normas, as 
 suprimidas no processo civil, no âmbito do contencioso administrativo.
 
  
 
 2.2.2.1. É inquestionável qual a razão de ser da revogação, pelo legislador do 
 Decreto-Lei nº 329-A/95, dos artigos (763º a 765º do CPC) respeitantes ao 
 recurso para Tribunal Pleno. Estas normas, com efeito, processualizavam a 
 prolação de “assentos” pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) e estes foram 
 considerados inconstitucionais por este Tribunal, pela primeira vez, pelo 
 Acórdão nº 810/93 (este, além de disponível no sítio já indicado, está publicado 
 nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 26º Vol., pp. 261/301; este juízo foi 
 reiterado em decisões posteriores, sendo conferida força obrigatória geral à  
 formulação decisória respectiva, pelo Acórdão nº 743/96, in Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 34º Vol., pp.7/21). Este fundamento da opção do legislador ao 
 revogar as referidas normas do CPC é, aliás, expressamente assumido no preâmbulo 
 do Decreto-Lei nº 329-A/95 (v. os trechos em causa em Carlos Lopes do Rego, 
 Comentários ao Código de Processo Civil, vol. II, 2ª ed., Coimbra, 2004, pp. 
 
 389/390; cfr., do mesmo autor, A Uniformização da Jurisprudência no Novo Direito 
 Processual Civil, Lisboa, 1997, pp. 10/14; cfr., ainda, José Lebre de Freitas e 
 Armindo Ribeiro Mendes, Código de Processo Civil anotado, Vol. 3º, Coimbra, 
 
 2003, p. 192).
 
  
 Observe-se, porém, que esta justificação não procedia no específico âmbito do 
 contencioso administrativo, por inaplicabilidade a este do instituto dos 
 assentos. Com efeito, caracterizando o “Recurso para o Tribunal Pleno”, dizia 
 Marcello Caetano:
 
  
 
  
 
 “[…]
 O legislador quis facilitar a uniformização da jurisprudência do Tribunal mas 
 sem tolher a sua evolução que, sobretudo no contencioso administrativo, pode 
 desempenhar tão importante papel na adaptação da lei às realidades da vida 
 corrente e na formação da doutrina. Por isso não se adoptou o sistema dos 
 assentos que vigora no Supremo Tribunal de Justiça e que aí se justifica 
 sobretudo pela necessidade de tornar a sua jurisprudência obrigatória para os 
 numerosos tribunais de 1ª e 2ª instâncias que lhe estão subordinados. O Supremo 
 Tribunal Administrativo, graças à publicidade das sua resoluções e à tradição de 
 larga fundamentação em que se baseiam, tem conseguido ver a sua jurisprudência 
 acatada de tal modo que não existe um problema de obrigatoriedade legal de 
 observância da jurisprudência pelos tribunais inferiores.”
 
 [Manual de Direito Administrativo, 9ª ed. (reimpressão), Tomo II, Coimbra, 1980, 
 p. 1387; o mesmo autor considerava os assentos do STJ não vinculativos (“não 
 obrigam”) para os tribunais administrativos (Manual…, cit., 10ª ed., Tomo I, 
 Lisboa, 1973, pp. 123/124)]
 
  
 
  
 Esta inaplicabilidade dos assentos ao contencioso administrativo apenas sofreu 
 uma aparente – e, aliás, algo espúria – excepção, que Castanheira Neves 
 explicita nos seguintes termos:
 
  
 
  
 
 “[…]
 Como se sabe, a partir de 1963 – rectius, a partir do Decreto-Lei nº 45497, de 
 
 30 de Dezembro de 1963, que aprovou o […] Código de Processo do Trabalho – a 
 competência para emitir assentos deixou de pertencer em exclusivo ao Supremo 
 Tribunal de Justiça e estendeu-se ao Supremo Tribunal Administrativo, 
 funcionando igualmente em tribunal pleno, embora tão-só relativamente à 
 jurisprudência da sua 3ª Secção («do contencioso do trabalho e previdência 
 social») – v. arts. 195º, 196º e 197º daquele Código. O regime processual dos 
 assentos destes dois supremos tribunais não é idêntico – divergência que […] vai 
 mesmo para além daquela que resulta de uns se inserirem fundamentalmente no 
 regime dos recursos (os assentos do STJ, não obstante a particularidade do 
 recurso no «interesse da lei» previsto no art. 770º do [CPC] ) e não já assim os 
 assentos do STA, os quais não podem nunca ser suscitados em termos de recurso 
 pela parte processual vencida e no interesse da sua posição na causa.[…]
 
 [O Instituto dos «Assentos» e a Função Jurídica dos Supremos Tribunais, Coimbra, 
 
 1983. p.1, nota 1]
 
  
 
  
 E, efectivamente, reportando-se esta possibilidade de o STA emitir assentos a 
 uma competência – que este perdeu em 1977 – de natureza essencialmente 
 jurídico-civil – o Direito do Trabalho –  o argumento da estranheza da figura 
 dos assentos ao contencioso administrativo tem (sempre teve) todo o  sentido [ a 
 competência laboral da 3ª Secção do STA, a única em que pôde “assentar” (cfr. 
 Artigos 195º a 197º do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei 
 nº 45497, de 30/12/1963), foi-lhe retirada pela Lei Orgânica dos Tribunais 
 Judiciais (Lei nº 82/77, de 6 de Dezembro), que extinguiu a 3ª Secção do STA e 
 criou a Secção de “jurisdição social” do STJ (cfr. Artigos 83º, nº1, alínea a) e 
 
 22º, nº1 da Lei nº 82/77)]. Aliás, esta mesma inaplicabilidade dos assentos ao 
 domínio que ora nos interessa, foi identicamente sublinhada por Guilherme da 
 Fonseca, já posteriormente a 1977 e na vigência da LPTA (mas anteriormente ao 
 Decreto-Lei nº 329-A/95), caracterizando nos seguintes termos os acórdãos 
 proferidos nos recursos por oposição de julgados:
 
  
 
  
 
 “[…]
 Este tipo de recursos tem por finalidade evitar que a mesma questão de direito, 
 sendo idêntica a situação de facto, seja objecto de decisões contraditórias, 
 pretendendo-se assim uma uniformização da jurisprudência.
 Só que, acaba-se num recurso jurisdicional do modelo do recurso de revista, 
 porque os acórdãos do Pleno da Secção – no caso de julgados contraditórios da 
 mesma Secção – ou do Plenário do Supremo Tribunal Administrativo – no caso de 
 julgados contraditórios de diferentes Secções ou até do mesmo Plenário – não 
 constituem assentos, diferentemente do que sucede com o Supremo Tribunal de 
 Justiça (e, se não há assentos, é apenas mais um grau de jurisdição). […]
 
 [Direito Processual Administrativo Contencioso – Dos Recursos Jurisdicionais, 
 ed. Polic., s. d., p. 19] 
 
  
 
  
 
 2.2.2.2. Foi com base nesta interpretação, cujo encadeamento argumentativo se 
 acaba de explicitar, que o STA definiu como estática, em vez de dinâmica, a 
 remissão contida no artigo 102º da LPTA. A exacta definição de qual o sentido 
 interpretativo profundo em causa no entendimento do STA tem óbvia relevância 
 para a  questão de inconstitucionalidade, justificando-se (tal como sucedeu com 
 o aspecto tratado no item 2.2.1.1. supra) no contexto da invocação pela 
 recorrente de existência de  violação do princípio constitucional da igualdade. 
 Demonstra-se assim, reconstituindo os elementos subjacentes ao percurso 
 interpretativo do STA, que na essência do recurso por oposição de julgados no 
 contencioso administrativo existiam especificidades, comparativamente aos 
 acórdãos nesse contexto tirados pelo STJ, que tornavam intrinsecamente distintas 
 as duas situações. Estas diferenças, porque acabam por expressar situações que, 
 sendo de semelhança, não são de igualdade ou de identidade de motivos, colocam 
 em crise, desde logo, a pertinência de argumentos assentes em considerações de 
 igualdade. Retomaremos, porém, adiante, esta questão. 
 
  
 
 2.2.3. A recorrente aponta à interpretação do artigo 102º da LPTA aqui sufragada 
 pelo STA três vícios determinantes da inconstitucionalidade da mesma: violação 
 do princípio da preeminência de lei; ofensa ao princípio da igualdade; violação 
 do princípio da tutela jurisdicional efectiva. Parte substancial da argumentação 
 da recorrente remete-nos para um estudo de Sérvulo Correia (“O Prazo de 
 Alegações no Recurso Fundado em Oposição de Acórdãos no Supremo Tribunal 
 Administrativo. Um Caso Paradigmático do Problema da Aplicação da Lei de 
 Processo Civil no Contencioso Administrativo”, in Sérvulo Correia, Rui Medeiros, 
 Bernardo Diniz de Ayala, Estudos de Direito Processual Administrativo, Lisboa, 
 
 2002, pp. 255/279). Deste estudo, cujos argumentos importa apreciar, cumpre 
 sublinhar, desde já, que a afirmação do autor, no que respeita à questão de 
 inconstitucionalidade que a esta decisão interessa, é a seguinte: “[…] temos 
 algumas dúvidas de que um prazo de cinco dias para a alegação em causa em 
 contencioso administrativo não seja de molde, dada a sua escassez, a 
 inviabilizar, senão sempre em muitos casos,  a garantia que o recurso com 
 fundamento na oposição de acórdãos nominalmente representa” (ob. Cit., p. 278).
 
  
 
 2.2.3.1. A violação do princípio da preeminência de lei, reportada pela 
 recorrente ao artigo 112º, nº2 da CRP, decorreria de a interpretação em causa 
 implicar “a sobrevivência de normas já revogadas, tendo por finalidade 
 contrariar ou corrigir o legislador” (fls. 514). Não é este, manifestamente, o 
 significado do princípio da preeminência de lei, subjacente ao artigo 112º da 
 CRP (v. J.J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 
 
 7ª ed., Coimbra, 2003, pp. 835/836). De qualquer forma, enquanto demonstração da 
 tese da inconstitucionalidade, o argumento da recorrente, segundo o qual as 
 normas do CPC invocadas na decisão, porque estão revogadas, não podem ser 
 aplicadas, actua numa lógica circular – como argumento auto-justificante –, 
 enfermando, assim, de um vício que o invalida. É que só funciona no pressuposto 
 da validade do seu ponto de partida: a remissão do artigo 102º da LPTA é 
 dinâmica e, por isso, as normas dos artigos 763º a 770º do CPC estão, também, 
 revogadas no contencioso administrativo. Esquece-se, porém, que o STA, 
 interpretativamente, fixou outro entendimento do artigo 102º da LPTA, em 
 resultado do qual as normas aplicadas – e concretamente aquela em função da qual 
 se definiu o prazo largamente ultrapassado pela recorrente – não estão 
 revogadas, destruindo-se, assim, o argumento. O que está em causa é, tão só, a 
 interpretação de normas – aquilo que constitui a essência da função judicial – 
 
 “a actividade racional de conferir significado a um texto legal […] a actividade 
 intelectual de determinar a mensagem normativa contida no texto da lei” ( Aharon 
 Barak, Purposive Interpretation in Law, Princeton, 2005, p. 3). E, nesta 
 actividade, concluindo-se (interpretativamente) pela não revogação de uma “norma 
 chamada” (a norma para a qual se remete), poder-se-á, através desta, violar 
 alguma norma ou princípio constitucional – adiante o veremos – , mas não se 
 está, seguramente, a utilizar o expediente técnico-legislativo da remissão sem 
 norma “habilitante” ( este parece ser o sentido visado pela recorrente ao 
 referir-se a “preeminência de lei”).
 
  
 Em torno da questão do carácter estático ou dinâmico de uma remissão para outras 
 normas, enquanto técnica legislativa, não se colhem ademais, no texto de 
 Baptista Machado citado pela recorrente (Introdução ao Direito e ao Discurso 
 Legitimador, Coimbra, 1983, pp.105/108), argumentos no sentido de a remissão 
 contida no artigo 102º da LPTA (“[o]s recursos […] de decisões jurisdicionais 
 regem-se pela lei de processo civil, com as necessárias adaptações […]”) 
 conferir ao “instituto para que remete uma função integradora subsidiária do 
 regime que estabelece para o instituto que está a considerar” (alegações a fls. 
 
 512, citando Introdução ao Direito…, cit., p. 106). Pelo contrário, a formulação 
 da LPTA (“[o]s recursos […] regem-se”) parece apontar mais para aquilo que o 
 mesmo autor qualifica como hipóteses de remissão nas quais, “em vez de uma 
 remissão com função integradora genérica, temos uma disposição legal que 
 expressamente prevê desde logo a extensão de certo instituto a outro” (ibidem). 
 De qualquer forma, relativamente ao uso do expediente técnico-legislativo da 
 remissão, tratando-se, como refere Baptista Machado, de “casos análogos” –  “os 
 casos regulados pelas normas chamadas” –  e não de “casos iguais” (ob. Cit., p. 
 
 107), deve o intérprete  ponderar, relativamente às vicissitudes das normas 
 chamadas, a persistência ou não dos diversos elementos que fundam essa 
 semelhança (a analogia expressa mais uma relação de semelhança que de 
 igualdade). Foi este, basicamente, o juízo do STA: os motivos da revogação das 
 normas do CPC (o fim dos assentos), deixam incólumes quaisquer razões de 
 semelhança que estivessem na base da remissão contida no artigo 102º da LPTA.
 
  
 
 2.2.3.2. A este fundamento de desconformidade constitucional acrescenta a 
 recorrente, como já se indicou, a violação do princípio da igualdade e do 
 princípio da tutela jurisdicional efectiva. Ambos os argumentos assentam em 
 diversos exercícios de comparação (entre o processo civil e o contencioso 
 administrativo; entre o contencioso administrativo regido pela LPTA e aquele ao 
 qual se aplica o CPTA) em matéria de prazos. Assim, descrevendo o processamento 
 
 – e colocando um especial ênfase na questão dos prazos – da tramitação aqui em 
 causa, poderemos aquilatar das verdadeiras diferenças entre esta e as outras 
 tramitações que se pretendem utilizar como termo de comparação e, assim, aferir 
 da relevância constitucional dos motivos invocados.
 
  
 Na descrição do recurso para o Tribunal Pleno, por referência às normas do CPC 
 que a recorrente considera também revogadas no contencioso administrativo, 
 transcreve-se a tramitação – que é, na visão do STA, a aqui aplicável –  
 indicada por Armindo Ribeiro Mendes:   
 
  
 
  
 
 “[…]
 A característica marcante desta marcha consiste na existência de dois graus de 
 julgamento do próprio recurso […].
 Numa primeira fase ou grau, discute-se apenas a questão prévia da existência dos 
 requisitos ou pressupostos de admissibilidade do recurso.
 Numa segunda fase – e uma vez admitida a existência dum conflito de 
 jurisprudência – segue-se o julgamento do objecto do recurso.
 
 […]
 Como nos outros recursos, tem de haver um requerimento de interposição (art. 
 
 765º, nº 2), onde se deve individualizar o acórdão-fundamento e indicar o lugar 
 onde está registado ou publicado […].
 Segue-se o primeiro grau de alegações. A contar de cinco dias [dez dias no 
 presente caso] da notificação do despacho que admita o recurso, o recorrente tem 
 o ónus de apresentar uma primeira alegação «tendente a demonstrar que entre os 
 dois acórdãos existe a oposição exigida […] (art. 765º, nº 3). A falta de 
 alegação do recorrente implica a deserção do recurso.
 Sendo apresentadas as alegações pelo recorrente, segue-se a alegação do 
 recorrido. Não há que formular conclusões nestas alegações.
 
 […]
 A seguir ocorre a distribuição do processo no Supremo […].
 Por último, será julgada a questão preliminar da existência de conflito de 
 jurisprudência e da verificação dos pressupostos específicos do recurso.
 
 «O processo vai com vista, por quarenta e oito horas, a cada um dos juízes da 
 secção seguintes ao relator. Este tem vista final por cinco dias e, na primeira 
 sessão posterior, a secção resolverá em conferência se existe a oposição que 
 serve de fundamento ao recurso» (art. 766º, nº 1).
 Se a secção entender que há oposição de julgados, esta decisão não é definitiva, 
 não faz caso julgado formal podendo o plenário decidir em sentido contrário 
 
 (art. 766º, nº3).
 Se a secção entender que não há oposição de julgados, o seu acórdão é definitivo 
 e porá termo ao recurso (artigo 766º, nº2). Se for controvertida a questão de 
 saber se o acórdão-fundamento havia ou não transitado em julgado a secção terá 
 de «verificar qual é a situação na data em que vai decidir sobre a oposição […]. 
 Até à sessão a que se refere o nº1, pode o requerente alegar o que entender 
 quanto ao trânsito em julgado do referido acórdão» (art. 766º, nº2).
 Este acórdão é notificado às partes.
 
 […] No caso de se reconhecer que há oposição de julgados, inicia-se a 2ª fase da 
 marcha do recurso.
 A partir da notificação do acórdão previsto no art. 766º, nºs 1 e 3, cada uma 
 das partes tem 10 dias para examinar o processo e apresentar a sua alegação 
 sobre o objecto do recurso. Há, pois, aqui um segundo grau de alegações. O 
 recorrente tem, pois, um duplo ónus de alegação.
 
 […] 
 Por fim, é feito o julgamento do recurso em plenário.
 
 […]”
 
  
 
 [Recursos em Processo Civil, 2ª ed., Lisboa, 1994, pp.292/294;sublinados 
 acrescentados; cfr. Guilherme da Fonseca, Direito Processual…, cit., pp. 19/22]
 
  
 
  
 Estando a efectuar-se comparações entre regimes diversos (v. item 2.2.2.2. 
 supra), comportando fases distintas, que não têm equivalente num e noutro caso, 
 a lógica comparativa não pode funcionar mecanicamente. Como refere Carlos Lopes 
 do Rego, caracterizando o novo regime, “[…] optou-se [na reforma operada pelo    
 
     Decreto-Lei nº 329-A/95] por eliminar o recurso para o tribunal Pleno, como 
 quarto grau de jurisdição, destinado a sanar os conflitos jurisprudenciais já 
 consumados – substituindo-o por um julgamento ampliado da revista, encarado como 
 vicissitude da fase do julgamento deste recurso ordinário” (A Uniformização…, 
 cit., p 21). De qualquer forma, analisando o sistema decorrente dos artigos 763º 
 a 770º do CPC (acima descrito, aquele que, estando revogado no processo civil, 
 se entende vigorar aqui no contencioso administrativo), verificamos que aquilo 
 que no processo civil vigente é concentrado numa alegação única de trinta dias 
 
 (leitura conjugada dos artigos 732º-A, 732º-B, 726º e 698º, nº2 do CPC) aparecia 
 dividido por várias fases no recurso para o Tribunal Pleno, anteriormente ao 
 Decreto-Lei nº 329-A/95. Sendo certo que as várias fases apresentam objectos 
 temáticos distintos, concentrados numa fase (alegação) única agora, acaba por se 
 obter, numa visão comparativa global e integrada, espaços temporais de actuação 
 das partes, nos diversos regimes, que, não sendo absolutamente iguais, se 
 equivalem em termos das possibilidades de actuação processual que, uns e outros, 
 conferem às partes (à mesma conclusão se chega efectuando a comparação com o 
 regime do CPTA vigente; cfr. Artigo 152º respectivo; v. Mário Aroso de Almeida, 
 Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais 
 Administrativos, Coimbra, 2005, p. 764). 
 
  
 A Constituição não impõe que todos os prazos processuais, mesmo em situações com 
 significativos pontos de contacto, tenham que ser absolutamente iguais. E, neste 
 caso, decorrendo as (pequenas) diferenças de prazos de questões de sucessão de 
 leis no tempo, leis que representam evoluções substanciais nas tramitações 
 processuais respectivas, não se pode ter a pretensão de alcançar uma 
 uniformidade absoluta. Não obstante, repete-se, realizando um exercício de 
 equivalência, que pondere as fases diferenciadas, presentes e ausentes em cada 
 regime considerado, e que pondere igualmente os prazos – concentrados num 
 regime, separados noutro – consoante o objecto da comparação, obtemos espaços 
 temporais que, de tão próximos, não consubstanciam diferenças intoleráveis.
 
  
 Vale isto, identicamente, quando se compara (e é a comparação que faz Sérvulo 
 Correia; ob. Cit., pp. 278/279) os dez dias do artigo 102º, com os vinte dias do 
 artigo 106º, ambos da LPTA, recordando que os dez dias apenas visam “demonstrar” 
 
 (como diz o artigo 765º, nº 3 do CPC) que duas decisões do STA, já antes 
 
 “descobertas” como contraditórias pelo recorrente, estão em “oposição”, 
 
 “relativamente à mesma questão fundamental de direito” e “assent[a]m sobre 
 soluções opostas” (leitura conjugada dos artigos 765º e 763º do CPC). E, 
 note-se, que isto sucede no fim de um processo onde já ocorreu um largo debate 
 entre as partes através dos articulados, do qual já resultaram decisões 
 judiciais objecto de um ou de mais recursos, e onde as questões jurídicas que a 
 comparação de acórdãos convocará, seguramente, já foram antes discutidas.
 
  
 
  A igualdade e a efectividade da tutela judicial conferida às partes neste 
 quadro não se pode dizer que saia, dentro dos limites temporais aqui em causa, 
 afectada. Não estamos, seguramente, como este Tribunal já o disse no Acórdão nº 
 
 462/05, num domínio em que a norma objecto, com a sobreposição interpretativa em 
 causa, traduza a violação de qualquer disposição constitucional.
 
  
 
  
 III- Decisão
 
  
 
 3. Pelo exposto, decide-se, operada a delimitação do recurso nos termos 
 indicados no item 2.1. supra:
 
  
 A)                           Não julgar inconstitucional a norma do artigo 102º 
 da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, entendida como mantendo no seu 
 conteúdo uma remissão para o conteúdo normativo dos artigos 765º a 767º do 
 Código de Processo Civil, não obstante a sua revogação pelo artigo 17º do 
 Decreto-Lei nº329-A/95, de 12 de Dezembro;
 B)                           Consequentemente, negar provimento ao recurso e 
 confirmar a decisão recorrida, no que à questão de constitucionalidade diz 
 respeito. 
 
  
 Lisboa, 17 de Janeiro de 2006
 Rui Manuel Moura Ramos
 Maria João Antunes
 Maria Helena Brito
 
                                  Carlos Pamplona de Oliveira - vencido, conforme 
 declaração que junto.
 Artur Maurício 
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 
  
 
  
 Concordo com o julgamento de não inconstitucionalidade da norma analisada no 
 presente aresto, cuja decisão, aliás, reproduz a do recente acórdão n.º 
 
 462/2005, de que foi relator o Senhor Conselheiro Paulo Mota Pinto.
 Porém, em meu entender, a recorrente não suscitou devidamente a questão de 
 inconstitucionalidade da norma que acabou por ser objecto do presente recurso. 
 Com efeito, da peça processual reproduzida no ponto 1.3. do acórdão (onde se 
 entende que a questão terá sido suscitada) resulta que a norma analisada nunca 
 foi acusada de inconstitucional no Tribunal recorrido, pois nesse articulado não 
 há qualquer referência ao artigo 102º da Lei de Processo nos Tribunais 
 Administrativos, preceito onde acabou por ser ancorada a norma em causa.
 Com este fundamento, não conheceria do objecto do recurso. 
 
  
 Carlos Pamplona de Oliveira