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Processo nº 55/07
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é 
 recorrente A. e recorrida B., Lda., foi interposto recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei de 
 Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do 
 acórdão daquele Tribunal de 6 de Dezembro de 2006.
 Em 6 de Fevereiro de 2007, foi proferida decisão sumária, pela qual o Tribunal 
 decidiu, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, nº 1, da LTC, não tomar 
 conhecimento do objecto do recurso.
 Foi utilizada a seguinte fundamentação:
 
  
 
 «1. Da análise da peça processual indicada pela recorrente como sendo aquela na 
 qual suscitou a questão de inconstitucionalidade (artigo 75º-A, nº 2, parte 
 final, da LTC) – designadamente das passagens expressamente referidas no 
 requerimento de interposição de recurso –, resulta que não se verifica um dos 
 requisitos do recurso interposto: a suscitação, durante o processo, da questão 
 de inconstitucionalidade, de modo processualmente adequado perante o tribunal 
 que proferiu a decisão recorrida (artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da 
 LTC).
 Durante o processo, no recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, 
 limita-se a recorrente, por um lado, a sustentar que “interpretação diversa” da 
 por si sustentada do preceito legal em causa violaria a Constituição – não 
 especificando, pela positiva, a interpretação considerada inconstitucional; e, 
 por outro, a remeter para a “jurisprudência que fez vencimento no acórdão 
 recorrido” sem, mais uma vez, a especificar.
 Ora, se, por um lado, «enunciar a dimensão que se pretende ver sindicada 
 consiste sempre na definição, pela positiva, do contexto situacional que, na 
 perspectiva seguida, tornará a sua aplicação inconstitucional e não, conforme 
 facilmente se concederá, na indicação da única interpretação tida por 
 constitucionalmente possível, para assim excluir todas as demais» (Acórdão do 
 Tribunal Constitucional nº 509/06, não publicado); por outro, «o cumprimento do 
 
 ónus a que se refere o artigo 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional não 
 se basta, com efeito, com a mera afirmação, perante o tribunal recorrido, de que 
 certa interpretação normativa, não concretizada, é inconstitucional, pois que 
 tal não traduz a invocação de uma verdadeira questão de inconstitucionalidade: o 
 preceito vai mais longe, impondo ao recorrente a delimitação dessa questão, de 
 forma a possibilitar ao tribunal recorrido a sua cabal compreensão e, portanto, 
 a sua efectiva decisão» (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 361/2006, não 
 publicado).
 Aliás, a recorrente acaba por concluir que o Acórdão recorrido violou os artigos 
 
 53º e 58º da CRP, que consagram o direito à segurança no emprego e o direito de 
 trabalho, o que também é significativo de uma suscitação não adequada de questão 
 de inconstitucionalidade normativa. Aquela conclusão (cf. supra conclusão 29. da 
 peça processual indicada, ponto 3. do Relatório) revela que, durante o processo, 
 não foi suscitada, de forma adequada, uma questão de inconstitucionalidade 
 normativa, já que se questiona também a conformidade constitucional da própria 
 decisão recorrida».
 
  
 
  
 
 2. Desta decisão reclama agora a recorrente para a conferência, ao abrigo do 
 disposto no nº 3 do artigo 78º-A da LTC, nos seguintes termos:
 
  
 
 «(…) A circunstância de na alegação do recurso de revista, a recorrente se ter 
 limitado a afirmar que “interpretação diversa da por si sustentada do preceito 
 legal em causa violaria a Constituição – não especificando, pela positiva, a 
 interpretação considerada inconstitucional, e, por outro, a remeter para a 
 
 “jurisprudência que fez vencimento no acórdão recorrido”, sem mais uma vez, a 
 especificar”,
 No nosso entender não deixa de cumprir o requisito da suscitação durante o 
 processo, da questão da inconstitucionalidade de modo processualmente adequado.
 
 3. Quanto à remissão para a “jurisprudência que fez vencimento no acórdão”, ela 
 foi claramente explicitada, visto que a mesma se evidencia, por forma clara e 
 isenta de dúvidas, no acórdão em referência, qual seja e isso é aliás dito por 
 forma expressa e concretizada ao longo de toda a alegação do recurso de revista, 
 e desde logo a partir do n° 2.1 do corpo da alegação.
 
 4. Com efeito aí se escreve que “a jurisprudência que fez vencimento”, no 
 acórdão foi a de interpretar a norma da al. h) do n° 1 do art° RJCCT como 
 significando que é considerado trabalhador à procura do primeiro emprego todo 
 aquele
 a) que nunca trabalhou mediante contrato sem termo”
 b) “que trabalhou por contratos a termo, por maior que seja o seu numero, 5, 10, 
 
 20, 30, 40
 c) “quer tenha 30, 40 ou 60 anos de idade”
 d)”quer esteja ou não inscrito em Centro de Emprego”
 Conduz inevitavelmente a tornar possível que um trabalhador que trabalhe durante 
 toda a sua vida, durante 30, 40 ou 50 anos, possa ser considerado trabalhador à 
 procura do 1° emprego para efeitos do disposto na al. h) do n° 1 do art°41!!! 
 E poderíamos assistir ao absurdo, caricato e trágico, de ver um trabalhador de 
 
 64 anos de idade continuar a poder ser contratado a termo, com fundamento na 
 citada al. h) em razão de por infelicidade sua, nunca ter sido contratado sem 
 termo.
 Trabalhou quase 50 anos em sucessivos contratos a termo, 10 na casa dos 20 anos, 
 mais 10 na casa dos 30 anos, e assim sucessivamente, até que chegou aos 64 anos 
 de idade, quase no fim de uma vida inteira de trabalho e a nossa veneranda 
 jurisprudência ainda permite que ele esteja contratado mais uma vez a termo, por 
 um contrato celebrado pelo prazo de um ano como trabalhador à procura do 
 primeiro emprego!
 
 5. Está ou não aqui explicita, claramente explicita, pela positiva, qual foi a 
 jurisprudência que fez vencimento no acórdão?
 Poder-se-ia exigir que se fosse mais claro e que se repetisse textualmente o que 
 havia sido escrito no acórdão?
 
 6. Especificou-se ou não “pela positiva” a interpretação da al. h) do n° 1 do 
 art° 41 do RJCCT feita pelo acórdão recorrido quando se escreveu que ela violava 
 a Constituição, violava o direito à segurança no emprego e o direito ao trabalho 
 garantidos respectivamente pelos art°s 53 e 58 da CRP?
 Pensamos que nenhumas dúvidas podem subsistir, e que só um entendimento assente 
 numa mera aparência, permitiu a decisão objecto da presente reclamação, visto 
 que cremos que não se poderia exigir que fosse suscitada por forma mais clara e 
 expressiva a interpretação que se teve por inconstitucional.
 
 7. Como escreve o Juiz Conselheiro Guilherme da Fonseca no seu Breviário .... 
 pg. 42
 O que se pressupõe é o que “o Tribunal recorrido tenha formado sobre a norma 
 aplicada um juízo de constitucionalidade, um juízo que constitua a “ratio 
 decidendi” da decisão e não um simples “obiter dictum”.
 
 8. O que implica, continua o mesmo Juiz Conselheiro, “que a questão da 
 constitucionalidade tenha de ser colocada em termos de aquele Tribunal saber que 
 tem essa questão para resolver – o que requer que a mesma seja colocada de forma 
 atempada, clara e perceptível”
 Ora, cabe perguntar, colocámos ou não tal questão, de forma atempada, clara e 
 perceptível”?
 
 9. Cremos que VExª analisando a suscitação para além de uma aparência que talvez 
 pudesse induzir em erro, nenhumas dúvidas poderão ter em responder 
 afirmativamente.
 
 10. E tanto assim foi que o acórdão recorrido expressamente se pronunciou sobre 
 a questão da constitucionalidade escrevendo-se aí a dado passo que
 
 “esta interpretação, baseando-se na estrita aplicação do disposto no art° 41 n° 
 
 1 al. h) da LCCT não sofre de inconstitucionalidade, por violação do direito à 
 segurança no emprego e do direito do trabalho”.
 
 11. Finalmente e quanto ao argumento que a decisão proferida retira do facto de 
 a recorrente ter acabado
 
 “por concluir que o Acórdão recorrido violou os artigos 53 e 58 da CRP, que 
 consagram o direito à segurança no emprego e o direito do trabalho”,
 O que segundo a decisão ora reclamada seria também
 
 “significativo de uma suscitação não adequada da questão de 
 inconstitucionalidade normativa”,
 Ele é perfeitamente descabido, uma vez que a sua invocação se limitou a dar 
 cumprimento ao disposto na al. b) do n° 2 do art° 690 do CPCivil que manda que 
 nas conclusões se indiquem as normas jurídicas violadas e foi o que fez.
 
 12. Daí, não pode, pois, retirar-se, como é manifesto, argumento algum contra a 
 admissibilidade do recurso». 
 
  
 
 3. Notificada do requerimento de reclamação para a conferência, a recorrida não 
 respondeu.
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 A decisão sumária proferida concluiu pelo não conhecimento do objecto do 
 recurso, por não se mostrar satisfeito o requisito da suscitação adequada, 
 durante o processo, da questão de inconstitucionalidade, depois de analisada a 
 peça processual indicada e, especificamente, as passagens destacadas pela 
 recorrente. 
 A reclamante pretende agora valer-se do que escreveu “a partir do nº 2.1 do 
 corpo da alegação”, concretamente do que reproduz deste número, para demonstrar 
 que especificou a jurisprudência que fez vencimento no acórdão recorrido. Para 
 além de se dever ter em conta que a passagem agora reproduzida não foi destacada 
 no requerimento de interposição de recurso, deve notar-se que, contrariamente ao 
 afirmado pela reclamante, a então recorrente não reportou à jurisprudência que 
 fez vencimento no acórdão o que aí escreveu sobre a norma da alínea h) do nº 1 
 do artigo 41º do RJCCT:
 
  
 
 «2.1. Com efeito, interpretar a norma da al. h) do n° 1 do art° 41º do RJCCT 
 como significando que é considerado trabalhador à procura do primeiro emprego 
 todo aquele
 a) que nunca trabalhou mediante contrato sem termo
 b) que trabalhou por contratos a termo, por maior que seja o seu numero, 5, 10, 
 
 20, 30, 40
 c) quer tenha 30, 40 ou 60 anos de idade
 d)que esteja ou não inscrito em Centro de Emprego
 Conduz inevitavelmente a tornar possível que um trabalhador que trabalhe durante 
 toda a sua vida, durante 30, 40 ou 50 anos, possa ser considerado trabalhador à 
 procura do 1° emprego para efeitos do disposto na al. h) do n° 1 do art°41!!! 
 E poderíamos assistir ao absurdo, caricato e trágico, de ver um trabalhador de 
 
 64 anos de idade continuar a poder ser contratado a termo, com fundamento na 
 citada al. h) em razão de por infelicidade sua, nunca ter sido contratado sem 
 termo.
 Trabalhou quase 50 anos em sucessivos contratos a termo, 10 na casa dos 20 anos, 
 mais 10 na casa dos 30 anos, e assim sucessivamente, até que chegou aos 64 anos 
 de idade, quase no fim de uma vida inteira de trabalho e a nossa veneranda 
 jurisprudência ainda permite que ele esteja contratado mais uma vez a termo, por 
 um contrato celebrado pelo prazo de um ano como trabalhador à procura do 
 primeiro emprego!».
 
  
 Por outro lado, esta passagem não permite, de facto, dar como verificado o 
 requisito da suscitação adequada, durante o processo, da questão de 
 inconstitucionalidade. Para além de não se apontar aqui para a violação de 
 qualquer norma ou princípio constitucional, não se especifica uma determinada 
 interpretação normativa em termos de o Tribunal a poder vir a enunciar numa 
 decisão. Ora, quando “se suscita a inconstitucionalidade de uma determinada 
 interpretação de certa (ou de certas) normas jurídicas, necessário é que se 
 identifique essa interpretação em termos de o Tribunal, no caso de a vir a 
 julgar inconstitucional, a poder enunciar na decisão, de modo a que os 
 destinatários delas e os operadores do direito em geral fiquem a saber que essa 
 
 (ou essas) normas não podem ser aplicadas com um tal sentido” (Acórdão do 
 Tribunal Constitucional nº 106/99, não publicado).
 Aliás, a fórmula utilizada pela própria recorrente para, em cumprimento do 
 disposto no nº 1 do artigo 75º-A da LTC, indicar a norma cuja apreciação 
 pretendia é demonstrativa da não verificação, no caso, do requisito da 
 suscitação prévia e de forma adequada da questão de inconstitucionalidade. Pode 
 ler-se nesta peça processual que o recurso visava “apreciar a 
 inconstitucionalidade da norma da al. h) do nº 1 do art° 41 do RJCCT aprovado 
 pelo Dec. Lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro (…) visto que o acórdão recorrido 
 interpretou trabalhador à procura de primeiro emprego como “todo o trabalhador 
 que nunca foi contratado por tempo indeterminado, irrelevando para o efeito a 
 idade do trabalhador e a inscrição no Centro de Emprego”.
 Por último, acrescente-se, ainda, que os pontos das conclusões das alegações que 
 foram analisados na decisão que é objecto da presente reclamação só o foram 
 porque a recorrente os indicou expressamente no requerimento de interposição de 
 recurso, como um dos passos nos quais havia suscitado, de forma adequada, uma 
 questão de inconstitucionalidade. Por outro lado, para relevarem no contexto do 
 recurso previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, teria de poder 
 encontrar-se ali a suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa, 
 o que a própria reclamante agora reconhece não suceder.
 
  
 III. Decisão
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada.
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ( vinte  ) unidades 
 de conta.
 
  
 Lisboa, 30 de Março de 2007
 
  
 Maria João Antunes
 
  
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 Artur Maurício