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Processo nº 256/08
 Plenário
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
 
 
             Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
 
 
 A – Relatório
 
  
 
             1 - O Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da 
 Madeira, invocando o disposto no art.º 281.º, n.º 2, alínea g), da Constituição 
 da República Portuguesa, requer a apreciação e declaração, com força obrigatória 
 geral, da inconstitucionalidade e da ilegalidade dos artigos 117.º e 118.º da 
 Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2008).
 
  
 
             2 – O teor das normas em questão é o que se segue:
 
  
 
                                                                        
 
 «Artigo 117.º
 Necessidades de financiamento das regiões autónomas
 
  
 
 1 - As Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira não podem acordar 
 contratualmente novos empréstimos, incluindo todas as formas de dívida, que 
 impliquem um aumento do seu endividamento líquido.
 
 2 - Podem excepcionar-se do disposto no número anterior, nos termos e condições 
 a definir por despacho do ministro responsável pela área das finanças, 
 empréstimos e amortizações destinados ao financiamento de projectos com 
 comparticipação de fundos comunitários.
 
 3 - O montante de endividamento líquido regional, compatível com o conceito de 
 necessidade de financiamento do Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais 
 
 (SEC95), é equivalente à diferença entre a soma dos passivos financeiros, 
 qualquer que seja a sua forma, incluindo nomeadamente os empréstimos contraídos, 
 os contratos de locação financeira e as dívidas a fornecedores, e a soma dos 
 activos financeiros, nomeadamente o saldo de caixa, os depósitos em instituições 
 financeiras e as aplicações de tesouraria.
 
  
 Artigo 118.º
 Transferências orçamentais para as regiões autónomas
 
  
 
 1 - Nos termos do artigo 37.º da Lei Orgânica n.º 1/2007, de 19 de Fevereiro, 
 são transferidas as seguintes verbas:
 a) …
 b) € 185 863 280 para a Região Autónoma da Madeira.
 
 2 - Nos termos do artigo 38.º da Lei Orgânica n.º 1/2007, de 19 de Fevereiro, 
 são transferidas as seguintes verbas:
 a) …
 b) € 24 394 555 para a Região Autónoma da Madeira.».
 
  
 
  
 
             3 – Fundamentando o seu pedido, o Requerente alegou, em síntese, o 
 seguinte:  
 
  
 
             - Os artigos 117.º e 118.º da Lei do Orçamento de Estado para 2008 
 padecem de inconstitucionalidade e de ilegalidade. 
 
             Foi violado o direito de audição dos órgãos de governo das regiões 
 previsto na Constituição e nos Estatutos e, no que especificamente respeita ao 
 artigo 118.º da Lei do Orçamento, foram ainda violados o artigo 118.º, n.º 2, do 
 Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira e o artigo 88.º, 
 n.º 2, da Lei de Enquadramento do Orçamento de Estado. 
 
             
 
             - O Requerente tem legitimidade para pedir a declaração de 
 inconstitucionalidade e de ilegalidade das referidas normas orçamentais, uma vez 
 que está em causa a violação dos direitos das regiões autónomas e, ainda, do 
 Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira. 
 
  
 
             − A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira não foi 
 devidamente ouvida no processo de aprovação da Lei do orçamento e houve, deste 
 modo, ofensa do artigo 229.º, n.º 2, da Constituição, dos artigos 89.º e 
 seguintes, do Estatuto da Região Autónoma da Madeira e do artigo 4.º da Lei n.º 
 
 40/96, de 31 de Agosto, que regula a audição dos órgãos de governo das Regiões 
 Autónomas. 
 
             A votação final global da Lei do Orçamento ficou concluída a 23 de 
 Novembro de 2007. Ora a respectiva Proposta só foi enviada para parecer da 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira em 16 de Novembro de 2007, 
 tendo a sua efectiva recepção apenas ocorrido no dia 19 de Novembro de 2007. 
 Antes que tivesse oportunidade de se pronunciar foi drasticamente surpreendida 
 com a votação final nos dias 22 e 23 de Novembro. 
 
             A Assembleia da República 'no decurso do prazo concedido para a 
 emissão de parecer por parte da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da 
 Madeira e sem esperar por ele, inopinadamente efectuou a votação na 
 especialidade e encerrou a sua participação no procedimento legislativo pela 
 votação final global da futura Lei do Orçamento de Estado para 2008'. 
 
             Deste modo, foi atribuído, à Assembleia Legislativa da Região 
 Autónoma da Madeira, um prazo de apenas 3 dias para se pronunciar, em manifesta 
 violação do prazo de 15 dias, conferido pela Lei n.º 40/96, de 31 de Agosto, que 
 lhe permitiria exercer devidamente o seu direito de audição.  
 
             A jurisprudência do Tribunal Constitucional é a este respeita clara. 
 Os Acórdãos nºs 670/99 e 581/2007 postulam uma 'consideração substancialista do 
 direito de audição'. E o Acórdão n.º 130/2006 confirma que a obrigatoriedade do 
 direito de audição não pode ser convertida numa 'formalidade sem sentido útil'. 
 
  
 
             − O artigo 118.º da Lei do Orçamento de Estado viola a cláusula do 
 não retrocesso financeiro, consagrada no artigo 118.º, n.º 2, do EPARAM, na 
 redacção aprovada pela Lei n.º 130/99, de 21 de Agosto. 
 
             De facto, o valor transferido em 2008, de € 185 863 280 é inferior 
 ao que foi transferido em 2006, € 204 888 536. É verdade que tal valor é 
 superior ao valor de € 170 895 000 transferido em 2007, mas este valor era 
 
 'também ele inconstitucional'. 
 
             Nem sequer se diga que o único padrão aferidor das relações entre o 
 Estado e as Regiões Autónomas é o constante da Lei das Finanças das Regiões 
 Autónomas, Lei Orgânica n.º 1/2007, de 19 de Fevereiro, que se aplicou 
 retroactivamente – e também inconstitucionalmente – a partir de 1 de Janeiro de 
 
 2007'. 
 
             É a própria Lei das Finanças das Regiões Autónomas que expressamente 
 se subordina aos Estatutos Político-Administrativos. 
 
  
 
             - O mesmo artigo 118.º da Lei do Orçamento para 2008 viola, ainda, o 
 artigo 88.º, n.º 2, da Lei de Enquadramento do Orçamento de Estado. 
 
             Na verdade, o Programa de Estabilidade e Crescimento não permite 
 legitimar a redução do valor das transferências orçamentais para as regiões.    
 
             Basta ver que, por um lado, as transferências para os Açores 
 aumentaram. De facto, 'enquanto que os Açores receberam, em 2008, € 286 060 663 
 e em 2007, € 223 436 000 contra os € 210 066 776 de 2006, já a Madeira recebeu 
 em 2008, € 185 863 280, e em 2007, € 170 895 000, contra os € 204 888 536 de 
 
 2006'. 
 
             Por outro lado, é manifesto que o próprio Estado não mostra 
 capacidade para cumprir os parâmetros do Programa de Estabilidade e Crescimento, 
 
 'bastando dizer, para o justificar, que para 2007 e em relação a 2006, as 
 despesas de funcionamento do Estado aumentaram 9,4 %, as despesas sobem 3,1%, o 
 serviço da dívida aumenta 16% e os encargos financeiros da dívida pública 
 aumentaram 8,1%'. 
 
             Assim, a redução das transferências orçamentais para a Região 
 Autónoma da Madeira não se pode justificar com base em tal Programa uma vez que 
 o próprio Estado não reduziu o seu passivo orçamental de modo a cumpri-lo. 
 
  
 
             - Conclui, pois, o Requerente, pedindo ao Tribunal que declare, com 
 força obrigatória geral, a inconstitucionalidade e a ilegalidade dos artigos 
 
 117.º e 118.º da Lei do Orçamento de Estado para 2008 (Lei n.º 67-A/2007, de 31 
 de Dezembro).    
 
             
 
             4 – Notificado, nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 
 
 55.º, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), o 
 Presidente da Assembleia da República ofereceu o merecimento dos autos, 
 enviando, simultaneamente, cópia da documentação relativa aos trabalhos 
 preparatórios da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro − Orçamento de Estado para 
 
 2008 −, acompanhada de um índice detalhado.
 
  
 
             5 – Discutido o memorando apresentado pelo Presidente do Tribunal 
 Constitucional, nos termos do art. 63.º da LTC, e fixada a orientação do 
 Tribunal, procedeu-se à distribuição do processo, cumprindo agora dar corpo à 
 decisão.
 
  
 
  B – Fundamentação
 
  
 
             6 – A questão da legitimidade do requerente
 
  
 
             Nos termos do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da 
 Constituição da República Portuguesa (CRP), os Presidentes das Assembleias 
 Legislativas das Regiões Autónomas podem requerer ao Tribunal Constitucional a 
 declaração de inconstitucionalidade de normas, com força obrigatória geral, 
 quando 'o pedido de declaração de inconstitucionalidade se fundar em violação 
 dos direitos das regiões autónomas ou o pedido de declaração de ilegalidade se 
 fundar em violação do respectivo estatuto”.
 
             Este pressuposto está realizado, no que respeita ao pedido de 
 declaração de inconstitucionalidade e de ilegalidade, agora formulado, com 
 fundamento em violação do dever de audição das Regiões Autónomas, previsto na 
 Constituição e no Estatuto Político-Administrativo. 
 
             O Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira 
 
 é, também, parte legítima para pedir a declaração da ilegalidade do artigo 118.º 
 da Lei do Orçamento para 2008, alegando violação do Estatuto 
 Político-Administrativo da Madeira. 
 
             Todavia, não tem ele legitimidade processual para suscitar questões 
 de ilegalidade com base em outras leis que não sejam o Estatuto 
 Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira e, deste modo, não pode 
 suscitar a questão de ilegalidade à luz do artigo 88.º, n.º 2, da Lei de 
 Enquadramento Orçamental. 
 
             Foi o que explicou este Tribunal, no Acórdão n.º 581/07, publicado 
 no Diário da República II Série, de 8 de Janeiro de 2008, e disponível, também, 
 em www.tribunalconstitucional.pt (onde se impugnava a norma do artigo 126.º da 
 Lei do Orçamento de Estado para 2007, com base precisamente nos mesmos preceitos 
 que agora se invocam, ou seja, o artigo 118.º, n.º 2, do EPARAM e o artigo 88.º, 
 n.º 2, da Lei de Enquadramento do Orçamento):
 
  
 
             'Quanto à regra do não retrocesso financeiro, é patente que ela se 
 inscreve no EPARAM estando contida no seu artigo 118.º. De um ponto de vista 
 formal, não pode, pois, negar-se que esta norma é susceptível da qualificação 
 habilitante do requerimento de declaração de ilegalidade apresentado.
 
             Já o mesmo se não diga do disposto no artigo 88.º, n.º 2, da Lei de 
 enquadramento orçamental. Ainda que este diploma seja uma lei de valor 
 reforçado, com valência paramétrica da legalidade das normas constantes das Leis 
 anuais do Orçamento (artigo 106.º, n.º 1, da CRP), a verdade é que ele não cai 
 dentro da esfera de legitimidade restringida, quanto a iniciativas de 
 fiscalização abstracta da legalidade, consagrada na alínea g) do n.º 2 do artigo 
 
 281.º da CRP.'
 
  
 
             Quando o Requerente pede a declaração de ilegalidade do artigo 118.º 
 da Lei do Orçamento para 2008 com base no artigo 88.º, n.º 2, da Lei de 
 Enquadramento do Orçamento, não formula nem um pedido de 'declaração de 
 inconstitucionalidade fundado em violação dos direitos das regiões', nem um 
 pedido de 'declaração de ilegalidade fundado no respectivo estatuto'. 
 
             Ora, só a violação da Constituição da República Portuguesa e do 
 Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira conferem ao 
 Presidente da respectiva Assembleia Legislativa legitimidade para impugnar a 
 validade de normas legais, requerendo ao Tribunal Constitucional a declaração da 
 sua inconstitucionalidade ou ilegalidade. 
 
             Ao pedir a declaração de ilegalidade do artigo 118.º da Lei do 
 Orçamento com base no artigo 88.º, n.º 2, da Lei de Enquadramento do Orçamento, 
 o Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira não se está 
 a basear nem na Constituição da República Portuguesa nem Estatuto 
 Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira. 
 Não tem, portanto, legitimidade processual para o fazer.  
 
  
 
             7 – Da alegada violação do direito de audição das regiões autónomas
 
             
 
             É indiscutível que existe uma obrigatoriedade de audição das regiões 
 sempre que a Assembleia da República aprove leis que lhes digam respeito. 
 
             De facto o artigo 229.º, n.º 2, da Constituição estabelece 
 peremptoriamente que 'os órgãos de soberania ouvirão sempre, relativamente às 
 questões da sua competência respeitantes às regiões autónomas, os órgãos de 
 governo regional'. Essa obrigatoriedade de audição surge também reiterada no 
 artigo 89.º, n.º 1, do EPARAM, onde se prescreve que 'a Assembleia e o Governo 
 da República ouvem os órgãos de governo próprio da Região Autónoma sempre que 
 exerçam poder legislativo ou regulamentar em matérias da respectiva competência 
 que à Região digam respeito'.
 
             Este dever de audição dos órgãos próprios das regiões, no que 
 respeita às matérias que lhes digam respeito deve ser cumprido de modo a 
 garantir que as regiões autónomas são efectivamente ouvidas num momento em que 
 as sugestões que porventura façam possam ainda ser tidas em conta na discussão 
 das propostas ou projectos de lei. 
 
             A este respeito é particularmente esclarecedor o Acórdão n.º 
 
 130/2006 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), onde se pode ler:
 
  
 
             'Entende o Tribunal que – sob pena de se esvaziar o direito de 
 audição, convertendo a obrigatoriedade de audição numa formalidade sem sentido 
 
 útil – a oportunidade da pronúncia do titular do direito deve situar-se numa 
 fase do procedimento legislativo adequada à ponderação, pelo órgão legiferante, 
 do parecer que aquele venha a emitir, com a possibilidade da sua directa 
 incidência nas opções da legislação projectada. 
 O cabal exercício do direito de audição pressupõe, assim, que, além de um prazo 
 razoável para o efeito, ele se exerça (ou possa exercer) num momento tal que a 
 sua finalidade (participação e influência na decisão legislativa) se possa 
 atingir, tendo sempre em conta o objecto possível da pronúncia'.
 
  
 
             O Requerente entende que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma 
 da Madeira não foi ouvida em tempo útil.      
 
             Vejamos se realmente assim foi.
 
             A Proposta de Lei n.º 162/X, que deu início ao processo de aprovação 
 do Orçamento de Estado para 2008, entrou na Assembleia da República no dia 12 de 
 Outubro de 2007. 
 
             Dessa Proposta de lei constava um artigo 114.º, que se referia aos 
 limites do endividamento líquido das regiões e um artigo 115.º, que era relativo 
 
 às transferências orçamentais para as regiões autónomas. 
 
             Estes artigos da proposta de Lei correspondem, respectivamente, aos 
 artigos 117.º e 118.º da Lei do Orçamento de Estado, que agora se impugnam por 
 falta de audição. 
 
             O citado artigo 115.º manteve-se inalterado no decurso de todo o 
 processo legislativo na Assembleia da República; o artigo 116.º, pelo contrário, 
 foi objecto de uma rectificação referente aos valores em euros das 
 transferências para as regiões. 
 
             Em concreto procedeu-se a um aumento de tais valores face ao que 
 constava da Proposta que entrou na Assembleia da República. 
 
             Essa rectificação foi feita através do Ofício n.º 1789, de 12 de 
 Outubro, que deu entrada no Gabinete do Ministro dos Assuntos Parlamentares no 
 dia 17 de Outubro de 2007. Este Ministro encaminhou, no mesmo dia, tal 
 rectificação (através do Ofício n.º 8299 MAP de 17 de Outubro), ao Presidente da 
 Assembleia da República. E este, por sua vez, enviou-a, no dia seguinte de manhã 
 
 (18 de Outubro), por via electrónica, às 11 horas e 53 minutos, com a menção de 
 
 'urgente', ao Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da 
 Madeira.             
 
             Em resposta à Proposta de Lei n.º 162/X (com a rectificação 
 introduzida pelo Ofício n.º 1789, de 12 de Outubro), foi enviado à Assembleia da 
 República, no dia 2 de Novembro de 2007, também por via electrónica, o Parecer 
 da 2ª Comissão Especializada Permanente (Economia, Finanças e Turismo) da 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira. 
 
             Era o seguinte o teor de tal Parecer, na parte que agora importa: 
 
  
 
             '10ª Proposta de alteração do artigo 114.º 
 Propõe-se a seguinte alteração ao artigo 114.º para permitir o aumento do 
 endividamento líquido da Região Autónoma da Madeira em 50 milhões:         
 
  
 Artigo 114.º
 Necessidades de financiamento das regiões autónomas
 
 1 - As Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira podem acordar contratualmente 
 novos empréstimos, incluindo todas as formas de dívida, que impliquem um aumento 
 do seu endividamento líquido superior a 50 milhões de euros para cada região 
 autónoma.
 
 2. …
 
 3. … 
 
  
 
             11ª Aditamento de um artigo 115.º-A
 Propõe-se o aditamento de um artigo referente ao IVA, de modo a garantir que as 
 Regiões Autónomas receberão em 2008 o mesmo valor de receita de IVA que 
 receberiam pela aplicação do método da capitação, em cumprimento do disposto no 
 artigo 21.º, n.º 3, da Lei n.º 13/98 de 24 de Fevereiro, conjugado com a alínea 
 a) do n.º 1 do artigo 59.º da Lei Orgânica n.º 1/2007 de 19 de Fevereiro: 
 
  
 Artigo 115.º-A
 Transferência a Título de compensação do IVA
 Fica o Governo autorizado, através do Ministro responsável pela área das 
 finanças, a transferir para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, as 
 verbas necessárias para cumprir o disposto no artigo 21.º, n.º 3, da Lei n.º 
 
 13/98, de 24 de Fevereiro, tendo como referência o valor que resultaria para 
 cada região da aplicação em 2007 e em 2008 do método da capitação.' 
 
  
 
             Como se vê, o Parecer da Assembleia Legislativa da Região Autónoma 
 da Madeira propõe uma alteração ao artigo 114.º da Proposta de Lei n.º 162/X e 
 sugere, ainda, que seja acrescentado um artigo 115.º-A (que, obviamente se 
 seguiria ao artigo 115.º).
 
             O debate na generalidade iniciou-se no dia 6 de Novembro (Diário da 
 Assembleia da República, I série, de 7 de Novembro). 
 
             No dia 8 de Novembro, terminou o debate na generalidade. 
 
             Foi enviada à Mesa uma declaração de voto dos deputados Jacinto 
 Serrão, Maximiano Martins e Júlia Caré, do PS, que fazia referência à questão 
 das transferências orçamentais para as regiões autónomas e à correcção feita nos 
 valores, no sentido do seu aumento [pelo acima citado Ofício n.º 1789, de 12 de 
 Outubro], 'face a uma aparente divergência dos critérios da Lei de Finanças das 
 Regiões Autónomas' (Diário da Assembleia da República, I série, de 9 de 
 Novembro, p. 39-40). 
 
             Nesse mesmo dia, a Proposta de Lei n.º 162/X foi aprovada na 
 generalidade, com os votos a favor do PS e os votos contra dos restantes 
 partidos. Baixou à Comissão para aprovação na especialidade. 
 
             No dia 23 de Novembro, os artigos 114.º e 115.º da Proposta de Lei 
 n.º 162/X foram aprovados na especialidade (Diário da Assembleia da República, I 
 série, de 24 de Novembro, p. 56) e, nesse mesmo dia, se procedeu à votação final 
 global do Orçamento. 
 
             Destes factos, documentados nos trabalhos preparatórios, resulta 
 claro que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira teve 
 oportunidade de se pronunciar sobre os preceitos constantes dos artigos 114.º e 
 
 115.º (com a rectificação introduzida pelo ofício n.º 1789, de 12 de Outubro).   
 
       
 
             Fê-lo através do seu Parecer de 2 de Novembro, elaborado pela 2ª 
 Comissão Especializada Permanente (Economia, Finanças e Turismo). 
 
             Esse parecer entrou na Assembleia da República 6 dias antes da 
 aprovação da Proposta de lei n.º 162/X, na generalidade, e 21 dias antes da 
 aprovação, na especialidade, das normas dos artigos 114.º e 115.º dessa 
 Proposta, que correspondem aos artigos 117.º e 118.º da lei do Orçamento que 
 agora se impugnam. 
 
             É certo que, no dia 16 de Novembro de 2007, foram enviadas à 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira alterações à Proposta de 
 Lei n.º 162/X para esta se pronunciar, e que, segundo o Requerente, só terão 
 sido recebidas no dia 19. 
 
             E é também certo que, logo nos dias 22 e 23 decorreria a votação na 
 especialidade do Orçamento. 
 
             Contudo, as alterações à Proposta que estavam em causa não se 
 referiam, em nada, aos artigos 114.º e 115.º da Proposta de Lei n.º 162/X, que 
 viriam a dar origem aos artigos 117.º e 118.º da Lei do Orçamento de Estado para 
 
 2008, agora impugnados por falta de audição. 
 
             A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira teve, pois, 
 oportunidade de se pronunciar, e pronunciou-se, efectivamente, sobre as normas 
 que agora impugna.     
 
             E a audição realizou-se em termos constitucional e legalmente 
 adequados. Foi-lhe concedido um prazo razoável que lhe permitiu pronunciar-se 
 antes do início da discussão.  
 
             De facto, no Acórdão 670/99 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), o Tribunal considerou que o prazo de 15 dias é 
 suficiente para garantir a efectividade prática do direito de audição, previsto 
 no artigo 229.º, n.º 2, da Constituição da República e no artigo 89, n.º 1, do 
 EPARAM, concluindo nestes termos: 'Pode, então, tomar-se como medida razoável de 
 prazo para a generalidade dos casos o que a Lei nº 40/96 definiu como regra – 
 quinze dias').
 
             Aí se entendeu também que, dado que a pronúncia das regiões 
 autónomas só pode incidir sobre normas específicas (as que especificamente digam 
 respeitem às regiões), o momento relevante para efeitos de direito de audição 
 seria a discussão e aprovação na especialidade. 
 
             Esta doutrina viria depois a ser reafirmada no Acórdão n.º 529/01 
 
 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) e, mais recentemente, no referido 
 Acórdão n.º 581/07.
 
             Nesses arestos, o Tribunal reafirmou uma distinção básica quanto ao 
 momento adequado para a audição das regiões autónomas, em função do âmbito ou da 
 extensão do objecto dessa audição. 
 
             Assim, se a audição incidir “sobre a globalidade da proposta de lei 
 ou sobre os respectivos princípios”, o pedido de parecer há-de ser formulado 
 
 “com a antecedência suficiente sobre a data do início da discussão na 
 generalidade”; se respeitar apenas a normas específicas da proposta, a audição 
 pode ser desencadeada antes do “início da discussão da proposta de lei na 
 especialidade”. 
 
  
 
             Ora, como vimos, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da 
 Madeira foi chamada a pronunciar-se, e pronunciou-se, sobre as normas agora 
 impugnadas, bastante tempo antes da sua discussão e votação na especialidade, 
 tendo disposto para tal do prazo de 15 dias legalmente previsto (no artigo 6.º 
 da Lei n.º 40/96, que regula a audição dos órgãos de governo das regiões 
 autónomas). 
 
             A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira foi, 
 portanto, devidamente ouvida sobre as normas constantes dos artigos 114.º e 
 
 115.º da Proposta de Lei n.º 162/X que vieram a ser aprovadas, na especialidade, 
 a 23 de Novembro de 2007. 
 
             A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira não pode 
 negar que teve oportunidade de se pronunciar sobre o conteúdo dos artigos 117.º 
 e 118.º da Lei do Orçamento de Estado para 2008, nos exactos termos em que foram 
 aprovados. 
 
             Note-se que não houve a mínima alteração entre as normas constantes 
 da proposta de lei n.º 162/X (devidamente rectificada) que foi apresentada à 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira para que ela se 
 pronunciasse (e sobre a qual ela efectivamente se pronunciou) e a versão final 
 dessas mesmas normas que veio a constar da Lei do Orçamento aprovada pela 
 Assembleia da República. Os preceitos são absolutamente idênticos, seja nas 
 palavras usadas, seja nos números apresentados.
 
             É certo que as propostas de alteração formuladas no Parecer não 
 foram aprovadas pela Assembleia da República. Mas, como é evidente, o direito de 
 audição das regiões autónomas não implica um direito à aprovação das propostas 
 de alteração por elas apresentadas. Como se esclareceu no já citado Acórdão n.º 
 
 670/99: 'sem dúvida que o órgão de soberania não está vinculado aos termos da 
 resposta dada [pela região autónoma]'. 
 
             Deste modo, não há qualquer violação do dever de audição da 
 Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira.       
 
  
 
  
 
             8 – A questão da violação da cláusula de não retrocesso financeiro 
 do artigo 118.º, n.º 2, do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma 
 da Madeira     
 
              
 
             A Lei Orgânica n.º 1/2007, de 19 de Fevereiro (Lei de Finanças das 
 Regiões Autónomas), determina que será a Lei do Orçamento de Estado a fixar, 
 anualmente, 'as verbas a transferir para cada uma das Regiões Autónomas' (artigo 
 
 37.º, n.º 1).
 
              O artigo 118.º da Lei do Orçamento de Estado para 2008 dá pois 
 execução ao que o artigo 37.º, n.º 1, da Lei das Finanças das Regiões Autónomas 
 determina. 
 
             O Requerente alega, contudo, que a norma da Lei do Orçamento para 
 
 2008 é ilegal, por violação do artigo 118.º, n.º 2, do EPARAM. 
 
             Essa disposição, recorde-se, determina que '[e]m caso algum, as 
 verbas a transferir pelo Estado podem ser inferiores ao montante transferido 
 pelo Orçamento do ano anterior multiplicado pela taxa de crescimento da despesa 
 pública corrente no Orçamento do ano respectivo'.
 
             O Tribunal já afirmou, por mais de uma vez, que as normas relativas 
 
 às 'relações financeiras entre o Estado e as regiões autónomas' não estão 
 abrangidas na 'reserva de Estatuto' e não possuem por isso a força normativa 
 própria de tal diploma. 
 
             De facto, já no Acórdão n.º 567/2004 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), o Tribunal considerou que o artigo 85.º da Lei 
 de Enquadramento do Orçamento de Estado, ao admitir que a Lei do Orçamento de 
 Estado pudesse 'determinar transferências de montante inferior àquele que 
 resultaria das leis financeiras aplicáveis a cada subsector', não violaria a 
 reserva de Estatuto. 
 
             Aí se explicou que «não ocorre violação da “reserva de estatuto” 
 sempre que uma norma o contrarie. E depois explica-se (começando por citar o 
 Acórdão n.º 162/1999):
 
 “ «Não basta, pois, que uma determinada norma conste de um estatuto regional 
 para que a sua alteração por um decreto-lei importe violação da reserva de 
 estatuto […] Essa violação só existirá se essa norma constante do estatuto 
 pertencer ao âmbito material estatutário – ou seja: se ela regular questão 
 materialmente estatutária».
 Ora, fora da reserva de estatuto está necessariamente “o regime de finanças das 
 regiões autónomas” – alínea t) do artigo 164.º da Constituição – e nomeadamente 
 a matéria das “relações financeiras entre a República e as regiões autónomas” – 
 n.º 3 do artigo 229.º da Constituição –, que é matéria reservada à competência 
 legislativa da Assembleia da República.'
 
             Também no Acórdão n.º 238/2008 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), em que o Tribunal apreciou a conformidade das 
 normas do artigo 37.º, nºs 2 a 7, da Lei de Finanças das Regiões Autónomas com o 
 artigo 118.º do EPARAM, se concluiu: 
 
  
 
             'De tudo o que anteriormente se expôs decorre a necessária conclusão 
 de que, por força da repartição constitucional de competências, os parâmetros de 
 validade jurídica das normas relativas às relações financeiras entre o Estado e 
 as Regiões Autónomas se devem procurar na Constituição e não nos Estatutos 
 Político-Administrativos das Regiões Autónomas'. 
 
  
 
             Além disso o Tribunal teve já oportunidade de se pronunciar sobre 
 uma questão perfeitamente idêntica, nos seus traços essenciais, àquela que agora 
 se suscita. 
 
             Tal sucedeu no referido Acórdão n.º 581/2007.
 
             O Requerente pede a declaração de ilegalidade da norma da Lei do 
 Orçamento que se referia às transferências orçamentais para a Região Autónoma da 
 Madeira (artigo 118.º da Lei do Orçamento de Estado para 2008), fundado no 
 preceito constante 118.º, n.º 2, do EPARAM. 
 
             Ora, no processo que deu origem àquele acórdão, decidido no ano 
 passado, o mesmo Requerente pediu a declaração de ilegalidade da norma da Lei do 
 Orçamento que se referia às transferências orçamentais para a Região Autónoma da 
 Madeira (o artigo 126.º da Lei do Orçamento de Estado para 2007), fundado no 
 mesmo artigo 118.º, n.º 2, do EPARAM. 
 
             Como se vê, as questões são, essencialmente, idênticas.
 
             No mencionado Acórdão n.º 581/2007, o Tribunal apreciou pois, a 
 pedido do ora Requerente, a questão da ilegalidade da norma contida no artigo 
 
 126.º da Lei do Orçamento do Estado para 2007 (Lei n.º 53-A/2006, de 29 de 
 Dezembro), que corresponde, no seu conteúdo essencial, à norma do artigo 118.º 
 da Lei do Orçamento de Estado para 2008 (Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro). 
 
             O Tribunal começou, nesse acórdão, por reconhecer que compete à 
 Assembleia da República «definir, em cada ano, na Lei do Orçamento do Estado, o 
 montante a transferir para os Açores e para a Madeira», para, depois, ponderar o 
 seguinte: 
 
             'A cláusula de não retrocesso consta da norma contida no n.º 2 do 
 artigo 118.º (transferências orçamentais) do EPARAM, a qual é do seguinte teor:
 
             «Em caso algum, as verbas a transferir pelo Estado podem ser 
 inferiores ao montante transferido pelo Orçamento do ano anterior multiplicado 
 pela taxa de crescimento da despesa pública corrente no Orçamento do ano 
 respectivo.»
 
             Vem arguido que a Lei do Orçamento do Estado, ao determinar um 
 montante de transferência financeira, para 2007, inferior ao do ano anterior, 
 viola aquela norma estatutária, norma de legalidade reforçada, que não pode ser 
 desvirtuada por uma lei comum, como o é a lei orçamental.
 
             Em abono desta tese, desenvolvem-se considerações tendentes a 
 demonstrar a prevalência hierárquica de cada Estatuto Político-Administrativo 
 das Regiões Autónomas sobre a Lei de Finanças das Regiões Autónomas (Lei 
 Orgânica n.º 1/2007, de 19 de Fevereiro) e sobre a Lei de enquadramento 
 orçamental (Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto). 
 
             Importa reconhecer, na verdade, que uma definição rigorosa da 
 natureza e âmbito normativo dos Estatutos das Regiões Autónomas é determinante 
 do juízo a emitir sobre o facto de o n.º 2 do artigo 118.º do EPARAM não ter 
 sido obedecido. 
 A Constituição não nos indica, pela positiva, quais as matérias que devem 
 constituir objecto de reserva de lei estatutária. Mas daí não pode concluir-se 
 que ganham necessariamente essa qualidade, à margem de qualquer predicado 
 material objectivo do seu conteúdo, todas as normas que constam dos Estatutos, 
 por simples decorrência dessa formal localização sistemática'. 
 
             Depois continuou, ainda, o mesmo Acórdão:
 
             “Compete a este órgão de soberania [ou seja, à Assembleia da 
 República] definir, em cada ano, na Lei do Orçamento do Estado, o montante a 
 transferir para os Açores e para a Madeira. Por isso mesmo, no artigo 106.º, n.º 
 
 3, alínea e), da CRP, se determina que a proposta de Orçamento seja acompanhada 
 de relatórios sobre «as transferências de verbas para as regiões autónomas».
 
             Não pode, pois, uma regra formalmente integrada nos Estatutos impor 
 um limite aos poderes parlamentares de fixação do montante das verbas a 
 transferir, restringindo a competência da Assembleia da República para efectuar 
 os ajustamentos anuais que entenda justificados.
 
             A tese contrária implicaria uma constrição da competência 
 parlamentar na regulação das relações financeiras entre o Estado central e as 
 regiões autónomas que não estaria constitucionalmente sufragada.
 
             Por isso mesmo, é seguro concluir que, seja qual for o significado a 
 atribuir aos termos literais da proibição peremptória de retrocesso, cominada no 
 n.º 2 do artigo 118.º do EPARAM, esta norma não pode prevalecer-se de um 
 estatuto que não possui – o de integrante da reserva material de estatuto – para 
 suplantar o regime instituído por uma Lei do Orçamento do Estado.
 
             Daí que o facto de o comando contido naquela norma não ter sido 
 observado não representa uma violação estatutária, inexistindo a ilegalidade que 
 daí decorreria”.
 
             O Tribunal não encontra, nem foram apresentadas pelo Requerente, 
 quaisquer razões que justifiquem que não aceite a fundamentação desenvolvida no 
 citado Acórdão n.º 581/07, que, por isso, aqui se renova. 
 
  
 
             
 C – Decisão
 
  
 
             9 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide: 
 
  
 
             a) Não conhecer, por falta de legitimidade do requerente, do pedido 
 de declaração de ilegalidade do artigo 118.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de 
 Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2008), na parte em que se funda na 
 violação do artigo 88.º, n.º 2, da Lei de Enquadramento Orçamental; 
 
             b) Não declarar a inconstitucionalidade nem a ilegalidade, com 
 fundamento na preterição do direito de audição das regiões autónomas, dos 
 artigos 117.º e 118.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro; 
 
             c) Não declarar a ilegalidade da norma do artigo 118.º da Lei n.º 
 
 67-A/2007, de 31 de Dezembro, por violação da cláusula de não retrocesso 
 financeiro constante do artigo 118.º, n.º 2, do EPARAM.
 
  
 Lisboa, 25 de Junho de 2008
 Benjamim Rodrigues
 Carlos Fernandes Cadilha
 Maria Lúcia Amaral
 Maria João Antunes
 Gil Galvão
 João Cura Mariano
 José Borges Soeiro
 Ana Maria Guerra Martins
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Mário José de Araújo Torres
 
                       Carlos Pamplona de Oliveira, com declaração
 
                                                Vítor Gomes (Com declaração de 
 voto idêntica à apontada no acórdão n.º 581/07)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 Votei a decisão, mas devo precisar o seguinte: assevera-se, no acórdão, de resto 
 em consonância com a jurisprudência do Tribunal, que os presidentes dos Governos 
 Regionais não têm 'legitimidade processual' para suscitar questões de 
 ilegalidade com base em outras leis que não sejam os estatutos 
 político-administrativos de cada uma das Regiões. 
 Tal entendimento radica no disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 281º da 
 Constituição, preceito que fixa, no seu n.º 1, os poderes do Tribunal 
 Constitucional em matéria de 'fiscalização abstracta da constitucionalidade e da 
 legalidade', e que, no n.º 2, identifica os órgãos e as entidades com 
 competência para formular ao Tribunal Constitucional os correspondentes pedidos. 
 Todavia, a alínea g) deste n.º 2, ao tratar especificamente dos órgãos e 
 entidades de âmbito regional que selecciona para o efeito, não lhes confere 
 competência irrestrita neste domínio, pois apenas permite a formulação de 
 pedidos de declaração de inconstitucionalidade fundados na 'violação dos 
 direitos das regiões autónomas', e a formulação de pedidos de declaração de 
 ilegalidade fundados na 'violação do respectivo estatuto'.  
 No que agora interessa, antes da 6ª revisão constitucional o preceito autorizava 
 as entidades regionais a formularem pedidos de declaração de ilegalidade 
 fundados não só na violação do estatuto da respectiva região, mas também na 
 violação de 'lei geral da República'. 
 Afigura-se-me que a alteração desta norma traiu o pensamento do legislador 
 constituinte que, não desejando limitar a competência das autoridades regionais 
 nesta matéria, teria pretendido, apenas, adequar o texto constitucional à 
 extinção das 'leis gerais da República', como categoria própria de actos 
 legislativos. Ora, sendo certo que antes da revisão de 2004 as autoridades 
 regionais podiam indubitavelmente pedir a declaração de ilegalidade de quaisquer 
 normas legais 'com fundamento em violação de lei com valor reforçado' (alínea b) 
 do n.º 1 do preceito) – por estas serem necessariamente 'leis gerais da 
 República' –, tudo indica que, a partir daquela lei de revisão, deixaram de 
 poder pedir a declaração de ilegalidade de normas 'com fundamento em violação de 
 lei com valor reforçado' (a alínea b) do n.º 1 do preceito não sofreu alteração) 
 por a sua competência, nesta área, ter ficado reduzida aos casos em que o pedido 
 
 é formulado unicamente com fundamento na violação 'do respectivo estatuto'. 
 Esta circunstância tem consequências relevantes, uma vez que por força da actual 
 redacção do n.º 3 do artigo 229º da Constituição 'as relações financeiras entre 
 a República e as regiões autónomas' passam a ser reguladas por uma lei de valor 
 reforçado, mas obrigatoriamente não estatutária (artigos 229º  n.º 3, 164º 
 alínea t) e 166º n.º 2 da Constituição).
 Mantenho, todavia, o entendimento – que já expressei em declaração anexa ao 
 Acórdão n.º 581/07 – de que a norma constante do n.º 2 do artigo 118º do 
 Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira não pode ser 
 considerada como parâmetro de legalidade por ser, ela própria, desconforme com o 
 citado n.º 3 do artigo 229º da Constituição.
 
  
 Carlos Pamplona de Oliveira