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Processo n.º 114/07      
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 I
 
  
 
  
 
 1.            A. deduziu reclamação do despacho do Desembargador Relator do 
 Tribunal da Relação de Lisboa que não admitiu o recurso que pretendia interpor 
 para o Tribunal Constitucional.
 
  
 
  
 
 2.            Resulta dos autos que:
 
  
 
 2.1.        Inconformado com o acórdão confirmatório do Tribunal da Relação de 
 Lisboa, que o condenara a vinte meses de prisão pela prática de crime de tráfico 
 de estupefacientes de menor gravidade, o arguido A. pretendeu, em Junho de 2006, 
 interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Na motivação, invocou a 
 inconstitucionalidade do artigo 400º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo 
 Penal, por violação do artigo 32º, n.º 1, da Constituição (fls. 13 e seguintes 
 dos presentes autos de reclamação).
 
  
 
                  O Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Lisboa não 
 admitiu o recurso, com fundamento no artigo 400º, n.º 1, alínea e), do Código de 
 Processo Penal, invocando, entre o mais, que, “na sequência de vária 
 jurisprudência neste sentido, não se vislumbra que o art. 400º, n.º 1, e), do 
 C.P.P. sofra de qualquer inconstitucionalidade, nomeadamente face ao consignado 
 no art. 32º, n.º 1, da C.R.P.” (despacho de 18 de Julho de 2006, a fls. 17).
 
  
 
 2.2.        Tendo o arguido A. requerido que sobre tal decisão recaísse acórdão, 
 o Desembargador Relator proferiu, em 8 de Setembro de 2006, o seguinte despacho 
 
 (fls. 18):
 
  
 
 “[…] a sua pretensão não tem viabilidade em proceder.
 Na verdade, o despacho de fls. 2066 pronuncia-se sobre a admissibilidade do 
 recurso interposto a fls. 2011, para o STJ, tendo decidido pela não 
 admissibilidade de tal recurso, ao abrigo do disposto no art. 400º, n.º 1, e) do 
 CPP.
 Ora, o despacho de admissão, ou não, de recurso interposto, é da exclusiva 
 competência do juiz do processo (o juiz relator nos tribunais superiores), 
 conforme decorre expressamente do art. 414º, n.º 1, do CPP, não se tratando de 
 questão a decidir em Conferência.
 A lei prevê expressamente o único modo de impugnação do despacho que não admitiu 
 o recurso, que é a reclamação, conforme previsto no art. 405º do CPP.
 Nessa conformidade, indefiro o requerido.
 
  
 
  
 
 2.3.        Notificado deste despacho, veio A. interpor recurso para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei 
 n.º 28/82, de 15 de Novembro, através de requerimento em que afirma (fls. 19):
 
  
 
 “[…]
 A norma do Código de Processo Penal que o recorrente julga ferida de 
 inconstitucionalidade material (por violação do disposto no art.º 32º n.º 1 da 
 Lei Fundamental e do art.º 6º da CEDH, ratificada por Portugal) é a constante do 
 art.º 400º n.º 1 alínea e) do Código do Processo Penal.
 O que se alegou na pendência do processo, «maxime» no recurso interposto para 
 esta Veneranda Relação de Lisboa.
 
 […].”.
 
  
 
  
 
                  O recorrente esclareceu depois (fls. 21 destes autos) que “a 
 decisão de que pretende recorrer é a constante do douto despacho de fls. 2072, 
 proferido a 8 de Setembro de 2006, onde expressamente se invoca o disposto no 
 art.º 400º, n.º 1, alínea e), do C.P.P., preceito esse que se julga ferido de 
 inconstitucionalidade material”.
 
  
 
 2.4.        Por despacho de 27 de Outubro de 2006 (a fls. 22), o Desembargador 
 Relator, no Tribunal da Relação de Lisboa, decidiu não admitir o recurso para o 
 Tribunal Constitucional, fundamentando assim a sua decisão:
 
  
 
 “[…]
 Vem o arguido A. esclarecer que o seu requerimento de interposição de recurso 
 para o Tribunal Constitucional se refere ao despacho de fls. 2072, proferido a 8 
 de Setembro de 2006.
 Todavia, o aludido despacho limitou-se a indeferir a pretensão do arguido, de 
 levar a questão da admissibilidade de anterior recurso para o STJ à Conferência.
 Enquanto a questão de inconstitucionalidade suscitada pelo recorrente se reporta 
 
 à interpretação dada ao art. 400º nº 1 alínea e) do CPP, pelo despacho de fls. 
 
 2066, que não foi impugnado.
 Nessa conformidade, por inexistência de objecto, não admito o recurso interposto 
 a fls. 2081/2082.
 
 […].”.
 
  
 
  
 
 2.5.        Invocando o disposto no artigo 405º do Código de Processo Penal, A. 
 deduziu reclamação do despacho de não admissão do recurso para o Tribunal 
 Constitucional, através do requerimento de fls. 2 e seguintes, em que se lê:
 
 “[…]
 
 1. O recurso para o Tribunal Constitucional, nos exactos termos em que foi 
 interposto, (70º n.º 1 alínea b) e art.º 70º n.º 3, art.º 71º, 72º n.º 1 alínea 
 b) da Lei 28/82 de 15 de Novembro – na sua actual redacção), versa, apenas sobre 
 a questão da apreciação da constitucionalidade do art.º 400º n.º 1 alínea e) do 
 CPP, sendo o seu prazo de interposição de 10 dias, prazo esse que deve «in casu» 
 ter o seu início a partir da notificação ao mandatário do arguido, do douto 
 despacho judicial, não transitado, prolatado a fls. 2072. 
 
 2. Como resulta dos autos, o recorrente interpôs, por isso e atempadamente, esse 
 mesmo recurso de constitucionalidade, tendo-o feito por fax enviado em 20 de 
 Setembro de 2006. 
 
 3. Na verdade, o recorrente interpôs em tempo o mencionado recurso, impugnando 
 desde logo (na medida em que recorria apenas e tão só acerca da interpretação da 
 constitucionalidade de um dado preceito suscitada durante o processo), a 
 interpretação que o douto Tribunal recorrido estava fazendo do mencionado 
 preceito legal (o art.º 400º n.º 1 alínea e) do CPP), sendo no mais irrelevante 
 
 (para efeitos de contagem do prazo para admissão de recurso de 
 constitucionalidade) que se haja suscitad[o] a questão de se haver pretendido 
 que sobre determinada questão devesse recair acórdão, com a subida dos autos à 
 Conferência. 
 
 4. E dizemos irrelevante, porque o recurso de constitucionalidade, como decorre 
 da Lei [n.º] 28/82 de 15 de Novembro só pode ser interposto em última instância, 
 ou seja, quando mais nenhum recurso, reclamação (aí se incluindo a reclamação 
 para a conferência) possa ser interposto. Na verdade, de acordo com o disposto 
 no n.º 2 do art.º 70º da mencionada Lei 28/82 de 15 de Novembro, 
 
 «Os recursos previstos nas alíneas b) e f) do número anterior apenas cabem de 
 decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já 
 haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam», acrescentando de seguida o 
 n.º 3 do referido preceito legal que «São equiparadas a recursos ordinários as 
 reclamações para os presidentes dos tribunais superiores, nos casos de não 
 admissão ou de retenção do recurso, bem como as reclamações dos despachos dos 
 juízes relatores para a conferência».
 Sendo esse, precisamente, o caso dos autos. 
 Deste modo – e com os apontados fundamentos –, o recorrente estava em tempo e 
 tinha legitimidade para recorrer. 
 Pelo que, 
 Deve a presente reclamação merecer provimento, uma vez que o recorrente estava 
 em tempo, e tinha legitimidade, sendo, por essa razão, o recurso o próprio e 
 tempestivo. 
 Razão pela qual não deveria ter sido rejeitado.
 
 [...].”.
 
  
 
  
 
 3.            O representante do Ministério Público junto do Tribunal 
 Constitucional emitiu parecer, do seguinte teor (fls. 25):
 
  
 
 “A presente reclamação é manifestamente infundada.
 Na verdade, o reclamante – confrontado com a rejeição do recurso que pretendia 
 interpor para o STJ – não esgotou os meios impugnatórios «ordinários», tratando 
 de reclamar para o Presidente do STJ de tal indeferimento; e, ao reclamar de tal 
 despacho para a conferência, usando meio procedimental obviamente inadequado, 
 levou a que naturalmente o despacho recorrido se limitasse a verificar a 
 impropriedade do meio utilizado, sem se pronunciar – e, portanto, «aplicar» – a 
 norma a que vinha reportado o recurso de fiscalização concreta.”.
 
  
 
  
 
                  Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II
 
  
 
  
 
 4.            O ora reclamante pretendeu interpor recurso para o Tribunal 
 Constitucional, invocando como fundamento a alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da 
 Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da norma constante do artigo 
 
 400º, n.º 1, alínea e), do Código do Processo Penal, “que o recorrente julga 
 ferida de inconstitucionalidade material (por violação do disposto no art.º 32º 
 n.º 1 da Lei Fundamental e do art.º 6º da CEDH, ratificada por Portugal)” 
 
 (supra, 2.3.).
 
                  O Desembargador Relator, no Tribunal da Relação de Lisboa, 
 entendeu que o despacho recorrido “se limitou a indeferir a pretensão do 
 arguido, de levar a questão da admissibilidade de anterior recurso para o STJ à 
 Conferência”, “enquanto a questão de inconstitucionalidade suscitada pelo 
 recorrente se reporta à interpretação dada ao art. 400º nº 1 alínea e) do CPP” 
 em anterior despacho (o de fls. 2066 dos autos principais, constante de fls. 17 
 destes autos); “nessa conformidade, por inexistência de objecto, não admit[iu] o 
 recurso” (supra, 2.4.).
 
  
 
                  Na reclamação agora deduzida, o reclamante vem afirmar, em 
 síntese, que “interpôs em tempo o mencionado recurso, impugnando desde logo (na 
 medida em que recorria apenas e tão só acerca da interpretação da 
 constitucionalidade de um dado preceito suscitada durante o processo) a 
 interpretação que o douto Tribunal recorrido estava fazendo do mencionado 
 preceito legal (o art.º 400º n.º 1 alínea e) do CPP)” e que considera 
 
 “irrelevante (para efeitos de contagem do prazo para admissão de recurso de 
 constitucionalidade) que se haja suscitado a questão de se haver pretendido que 
 sobre determinada questão devesse recair acórdão, com a subida dos autos à 
 Conferência”, “porque o recurso de constitucionalidade, como decorre da Lei n.º 
 
 28/82 de 15 de Novembro só pode ser interposto em última instância, ou seja, 
 quando mais nenhum recurso, reclamação (aí se incluindo a reclamação para a 
 conferência) possa ser interposto” (supra, 2.5.).
 
  
 
  
 
 5.            O recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do 
 Tribunal Constitucional – a disposição invocada pelo ora reclamante, como 
 fundamento do recurso de constitucionalidade, no respectivo requerimento de 
 interposição – é o recurso que cabe das decisões dos tribunais “que apliquem 
 norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo”.
 
                  Para que o Tribunal Constitucional possa conhecer de um recurso 
 fundado nessa disposição, exige-se que o recorrente suscite, durante o processo, 
 a inconstitucionalidade da norma que pretende que este Tribunal aprecie e que 
 tal norma seja aplicada na decisão recorrida, não obstante a acusação de 
 inconstitucionalidade que lhe foi dirigida.
 
  
 
                  Tal como dispõe o n.º 2 do mesmo artigo 70º, o recurso previsto 
 na alínea b) do número anterior apenas cabe de decisões que não admitam recurso 
 ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que 
 no caso cabiam. E, de acordo com o n.º 3 do referido preceito legal, “são 
 equiparadas a recursos ordinários as reclamações para os presidentes dos 
 tribunais superiores, nos casos de não admissão ou de retenção do recurso”.
 
  
 
                  Ora, decorre claramente dos autos que o ora reclamante não 
 esgotou os meios impugnatórios “ordinários” – no caso, não utilizou o meio 
 processual adequado para esse efeito, pois não deduziu reclamação para o 
 Presidente do STJ do despacho que, na Relação de Lisboa, não admitira o recurso 
 que pretendia interpor para o Supremo, tal como se prevê no artigo 405º do 
 Código de Processo Penal.
 
  
 
                  Tendo, em vez disso, requerido que sobre tal despacho recaísse 
 acórdão da conferência, o despacho que indeferiu esse requerimento (o despacho 
 de 8 de Setembro de 2006, supra, 2.2.), não procedeu obviamente à aplicação da 
 norma questionada pelo ora reclamante sob o ponto de vista da sua conformidade 
 constitucional – a norma constante do artigo 400º, n.º 1, alínea e), do Código 
 do Processo Penal.
 
  
 
                  Tanto basta para concluir que não podia ser admitido o recurso 
 interposto pelo ora reclamante com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 
 
 70º da Lei do Tribunal Constitucional e, consequentemente, que a presente 
 reclamação tem de ser indeferida. 
 
  
 
                  Não merece pois qualquer censura o despacho reclamado.
 
  
 
  
 III
 
  
 
  
 
 6.            Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal 
 Constitucional decide indeferir a presente reclamação.
 
  
 
                  Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20  (  
 vinte  )   unidades  de conta.
 
  
 Lisboa, 8 de Fevereiro de 2007
 Maria Helena Brito
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Rui Manuel Moura Ramos