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Processo n.º 50/08
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro João Cura Mariano
 
          (Conselheiro Benjamim Rodrigues)
 
                                                                         
 
 
 
                  Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 Relatório
 A A., S.A., intentou contra B. uma acção especial de insolvência, alegando, em 
 síntese, ser dona e legítima possuidora de duas livranças emitidas, 
 respectivamente, em 15.12.99, no valor de € 131.801,98, e 14.07.00, no valor de 
 
 € 100.801,73, com datas de vencimento em 17.11.03, subscritas por C., Lda. e 
 avalizadas pelo Requerido que não foram pagas nas datas dos seus vencimentos, 
 nem em momento posterior, tendo ainda justificado o pedido de declaração de 
 insolvência com base na alegação de que o Requerido não cumpre as suas 
 obrigações, pendendo contra ele várias execuções e que não tem quaisquer bens ou 
 rendimentos. 
 Neste articulado a Requerente informou não saber quem eram os cinco maiores 
 credores do requerido.
 
  
 Este deduziu oposição, por requerimento apresentado em 4-1-2007, mas só no dia 
 
 16-1-2007 veio indicar a lista dos seus cinco maiores credores.
 
  
 Por despacho de 22-1-2007 considerou-se que a oposição tinha sido apresentada 
 fora do prazo e, em consequência, determinou-se o desentranhamento da oposição e 
 da lista dos seus cinco maiores credores, tendo sido proferida na mesma data 
 sentença que julgou confessados os factos alegados na petição inicial, por falta 
 de oposição, e declarou o requerido em estado de insolvência, por verificação 
 dos factos indiciários mencionados nas alíneas a) e b), do artigo 20.º, n.º 1, 
 do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas.
 
  
 O Requerido interpôs recurso destas decisões para o Tribunal da Relação do 
 Porto, tendo o mesmo sido julgado improcedente por acórdão de 28-6-2007.
 
  
 Após não lhe ter sido admitido recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o 
 Requerido recorreu para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido pelo 
 Tribunal da Relação do Porto, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, 
 alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua redacção actual (LTC), 
 pretendendo ver fiscalizada a constitucionalidade das normas constantes do 
 artigo 30.º, nºs 2 e 5, do CIRE, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de 
 Março.
 
  
 Concluiu do seguinte modo as suas alegações:
 
 “1ª 
 O disposto no nº 2 do art. 30º do CIRE, mormente no inciso que comina a “pena de 
 não recebimento” da oposição do devedor quando não vai acompanhada da lista dos 
 
 5 principais credores, é inconstitucional, porque cria uma excepção 
 injustificada, no âmbito do processo civil, em que este sistema tem como 
 princípio director a sanação dos vícios dos articulados iniciais – petição e 
 contestação –, como decorre do disposto nos artigos 265°.2, 508°.3 e 508°.A, 1 
 c), violando por isso os princípios da unidade do sistema jurídico e da 
 proporcionalidade, bem como o disposto nos arts. 1º, 2º, 3º.1, 13º, 25º.1, 
 
 26º.1, 202º.1 e 204º.1, da Constituição. 
 
 2ª. 
 O facto da oposição ao pedido de declaração não ser acompanhada da lista dos 
 seus 5 maiores credores não causa qualquer empecilho ao desenvolvimento normal 
 da lide, até pelo facto desses outros credores não terem qualquer direito de 
 intervenção na fase declarativa do processo de insolvência. 
 Atenta a natureza dos bens jurídico-pessoais em jogo num processo de 
 insolvência, em que estão em causa direitos fundamentais do devedor, a cominação 
 do referido inciso impede o direito de defesa, por parte do devedor, desses seus 
 bens e direitos pessoais. 
 
 3ª. 
 O disposto no nº 5 do art. 30º do CIRE, na parte em que comina como confessados 
 factos alegado na petição inicial”, mormente quando a oposição não é recebida 
 porque não acompanhada da lista dos 5 principais credores, também é 
 inconstitucional, porque viola os princípios e normas invocadas na conclusão 
 
 1ª. 
 
 4ª. 
 Na acção de insolvência, mormente quando o requerido é uma pessoa humana, está 
 em causa: a sua dignidade pessoal e social, o seu direito de participar na 
 democracia económica, o seu direito de eleição para cargos políticos, a sua 
 integridade moral, o seu direito ao desenvolvimento da personalidade, o seu 
 direito à capacidade civil, ao bom nome, reputação e imagem, o seu direito à 
 mobilidade, o seu direito ao trabalho e administração patrimonial. 
 Com a declaração de insolvência, estes direitos são violentados, parcelados e/ou 
 limitados. 
 Como são direitos fundamentais do cidadão, admitindo-se a sua restrição, esta 
 terá que se fundar na salvaguarda de outros direitos ou valores idênticos ou 
 superiores. 
 
 5ª. 
 A limitação ou inibição do exercício dos direitos descritos na conclusão 
 anterior só pode operar pela via da acção judicial, em processo comum civil ou 
 penal, com todas as garantias de defesa predisposta na lei constitucional e 
 ordinária – substantiva e processual –, quanto a esta ou seja, e quanto à lei 
 ordinária, como decorre, “inter alia”, do disposto nos arts. 69º, 345º.1 e 354º 
 do CC e arts. 485º e 1510º do CPC. 
 Atento o disposto nessas normas, a confissão dos factos por falta de 
 contestação, mormente quando esta é desentranhada dos autos por falta da lista 
 dos 5 maiores credores, que não intervêm na fase declarativa do processo, 
 prevista na norma em apreço, é inconstitucional porque aqueles direitos são 
 indisponíveis, e os factos que podem ser causa da sua limitação ou inibição têm 
 que ser judicativamente apurados pelo Tribunal competente. 
 
 6ª. 
 As normas em apreço neste recurso são produto da ideologia económica que 
 pontifica no nosso País, em que a lógica da concentração capitalista, mormente 
 do capitalismo financeiro, sobrepoja a lógica de uma sociedade assente nos 
 valores da Pessoa Humana (Humanismo), e foram induzidas, como todo o Código que 
 as acolhe, pela pressão dos grandes grupos económicos e financeiros, que vêm 
 generalizando e alastrando a situação de pobreza e proletarização do povo 
 português, contra a letra e o espírito da Constituição. Essas normas, bem como a 
 lei que as acolhe, não têm qualquer correspondência com a consciência colectiva 
 
 ético-jurídica do povo português que, na sua imensa maioria, referenda 
 diariamente a filosofia constitucional. 
 
 7ª 
 As disposições dos nºs 2 e 5 do art. 30º do CIRE violam: 
 a) O princípio da unidade do sistema jurídico, com referência ao art. 13º da 
 Constituição, porque cria normas especiais que colidem com as normas 
 substantivas e processuais de direito geral, sem qualquer fundamento que 
 justifique a diferença; 
 b) o princípio da proporcionalidade, porque não existe qualquer razão que as 
 funde, ou seja, não há direito ou interesse de igual ou superior valor, que 
 justifique a quebra de direitos de defesa e a ficção da confissão de factos que 
 atingem direitos fundamentais do cidadão; 
 c) o art. 1º da CRP, porque tal forma de legislar é incompatível com as bases do 
 ordenamento jurídico: a dignidade da pessoa humana, a justiça e a solidariedade. 
 
 
 d) o art. 2º da CRP, porque incompatível com a ideia e princípio de direito; 
 e) Os arts. 31º, 202°.1 e 204°.1 da CRP, porque é forma de alienar a soberania 
 popular aos desígnios do poder económico, e de condicionar os tribunais no 
 exercício da administração da justiça em nome do povo; 
 f) O art. 13º da CRP, porque não respeitam a dignidade social e prejudicam o 
 direito de defesa daqueles a quem é imputada a situação de insolvência; 
 g) Os arts. 25º.1 e 26º.1 da CRP, porque enfraquecem a defesa dos direitos 
 referidos na conclusão 4ª. 
 Termos em que o disposto nos nºs 2 e 5 do art. 30º do CIRE, devem ser julgados 
 inconstitucionais”. 
 
  
 A recorrida, A., S.A., contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
 
  
 
                                                     *
 Fundamentação
 
 1. Do objecto do recurso
 A admissibilidade do recurso interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do 
 artigo 70.º, da LTC – como ocorre no presente caso – depende da decisão 
 recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões 
 normativas arguidas de inconstitucionais pelo recorrente.
 Só quando a norma aplicada for relevante para a decisão da causa é que se 
 justifica a intervenção do Tribunal Constitucional, em via de recurso.
 Na verdade, o recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade dispõe de 
 uma peculiar natureza incidental e desempenha uma função instrumental em termos 
 de o conhecimento das questões de constitucionalidade só ser devido nos casos 
 em que a decisão a tomar possa interferir utilmente no julgamento da questão de 
 mérito.
 Apesar da redacção da decisão da 1ª instância suscitar dúvidas sobre qual foi o 
 fundamento ou fundamentos que determinaram o desentranhamento da contestação 
 apresentada pelo requerido no processo de insolvência, o Tribunal da Relação do 
 Porto, no acórdão recorrido, considerou que a ordem de desentranhamento teve 
 como fundamento o facto da oposição não vir acompanhada da lista dos cinco 
 maiores credores, tendo decidido o recurso interposto nessa pressuposição, 
 socorrendo-se de interpretação do disposto no artigo 30.º, n.º 2 e 5, do CIRE.
 Tendo o recurso de constitucionalidade como alvo o acórdão do Tribunal da 
 Relação do Porto, o resultado da fiscalização de constitucionalidade das normas 
 ou interpretações normativas do artigo 30.º, n.ºs 2 e 5, do CIRE, pode 
 determinar uma alteração dos fundamentos do acórdão recorrido e, 
 consequentemente, do sentido da sua decisão, pelo que importa conhecer do mérito 
 do recurso interposto.
 Relativamente à aplicação do n.º 2, do artigo 30.º, do CIRE, a decisão recorrida 
 considerou que deve ser desentranhada a oposição que não se mostra acompanhada 
 de informação sobre a identidade dos cinco maiores credores do requerido, sem 
 que seja facultado a este a oportunidade de suprir tal deficiência.
 Mercê da instrumentalidade do recurso de constitucionalidade é apenas este 
 entendimento que deve ser fiscalizado, relativamente ao estatuído no n.º 2, do 
 artigo 30.º, do CIRE.
 
  
 
 2. Do mérito do recurso
 Dispõe o artigo 30º, do C.I.R.E.:
 
 1 - O devedor pode, no prazo de 10 dias, deduzir oposição, à qual é aplicável o 
 disposto no n.º 2 do artigo 25.º.
 
 2 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o devedor junta com a oposição, 
 sob pena de não recebimento, lista dos seus cinco maiores credores, com exclusão 
 do requerente, com indicação do respectivo domicílio.
 
 3 - A oposição do devedor à declaração de insolvência pretendida pode basear-se 
 na inexistência do facto em que se fundamenta o pedido formulado ou na 
 inexistência da situação de insolvência.
 
 4 - Cabe ao devedor provar a sua solvência, baseando-se na escrituração 
 legalmente obrigatória, se for o caso, devidamente organizada e arrumada, sem 
 prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 3.º.
 
 5 - Se a audiência do devedor não tiver sido dispensada nos termos do artigo 
 
 12.º e o devedor não deduzir oposição, consideram-se confessados os factos 
 alegados na petição inicial, e a insolvência é declarada no dia útil seguinte ao 
 termo do prazo referido no n.º 1, se tais factos preencherem a hipótese de 
 alguma das alíneas do n.º 1 do artigo 20.º”. 
 Na lógica da fundamentação do acórdão recorrido a aplicação da norma constante 
 do n.º 5, onde se estatui as consequências da falta de oposição do requerido em 
 processo de insolvência, tem como pressuposto prévio a aplicação à situação 
 processual sub iudicio da norma constante do n.º 2, onde se estabelece como 
 sanção para a falta de indicação dos cinco maiores credores do requerido o não 
 recebimento da oposição, pelo que deve analisar-se, em primeiro lugar, a 
 constitucionalidade do disposto no n.º 2, na interpretação que dele fez a 
 decisão recorrida, uma vez que, na hipótese de se concluir por um juízo de 
 censura, perde utilidade a apreciação da norma contida no referido n.º 5, uma 
 vez que este deixa de ser aplicável.
 Para uma compreensão sistemática do disposto no n.º 2, do artigo 30.º, do CIRE, 
 há que proceder à sua leitura em conjugação com o que consta dos artigo 23.º, 
 n.º 2, b), e n.º 3, e 37.º, n.º 3, do mesmo Código.
 Na alínea b), do n.º 2, do artigo 23.º, determina-se que o requerente da 
 declaração de insolvência na respectiva petição deve identificar os cinco 
 maiores credores do requerido, com exclusão do próprio requerente. E no n.º 3, 
 do mesmo artigo, permite-se que, não sendo possível ao requerente credor 
 efectuar essa indicação, este solicite que a mesma seja efectuada pelo devedor 
 requerido.
 
 É precisamente esta mesma identificação dos cinco maiores credores, acrescida da 
 indicação do domicílio destes,  que o n.º 2, do artigo 30.º, impõe que o 
 requerido junte com a oposição deduzida ao pedido de declaração de insolvência.
 E o artigo 37.º, n.º 3, ao estabelecer um modo de citação privilegiada da 
 sentença que venha a declarar a insolvência do requerido dos cinco maiores 
 credores conhecidos, com exclusão do requerente – citação pessoal ou carta 
 registada conforme tenham residência habitual, sede ou domicílio em Portugal -, 
 revela a finalidade da exigência daquela informação.
 Esta forma privilegiada de chamamento dos cinco maiores credores do requerido 
 aos termos do processo de insolvência tem origem no anterior Código dos 
 Processos Especiais de Recuperação de Empresa e de Falência (CPEREF). 
 No domínio deste Código, logo após a instauração do processo, quer este 
 assumisse a modalidade da recuperação de empresa ou da falência, e desde que não 
 houvesse motivos para indeferimento liminar da petição, era de imediato citado 
 não só o devedor, mas também a generalidade dos credores – ou só estes no caso 
 de apresentação à falência - para se pronunciarem sobre o pedido. A intervenção 
 da generalidade dos credores na fase anterior à declaração de falência resultava 
 duma visão universal do processo de falência em toda a sua extensão, incluindo a 
 sua fase declarativa, contrariamente ao que sucedia no anterior regime previsto 
 no Código de Processo Civil.
 Para ser possível a citação do maior número de credores, deveria o devedor, 
 quando fosse o requerente, apresentar a relação de todos os credores e 
 respectivos domicílios, com a indicação do montante dos seus créditos, datas de 
 vencimento e garantias de que beneficiavam (artigo 16.º, a), do CPEREF), e 
 quando o requerente fosse um credor ou o Ministério Público deveriam estes 
 oferecer todos os elementos que possuíssem relativamente ao passivo e activo do 
 devedor, o que contemplava necessariamente a indicação dos credores conhecidos 
 
 (artigo 17.º, n.º 1 e 3, do CPEREF).
 Na sua versão original, o CPEREF previa que o devedor e os dez maiores credores 
 conhecidos fossem citados pessoalmente, enquanto os restantes credores eram 
 chamados por edital (artigo 20º, n.º 3), tendo o Decreto-lei n.º 315/98, de 20 
 de Outubro, reduzido o número de credores citados pessoalmente para cinco.
 Pretendia-se deste modo assegurar o conhecimento efectivo pelos credores mais 
 importantes do pedido de declaração de falência do devedor, de modo a estes 
 terem a possibilidade de se oporem a tal pretensão, sendo consideradas as suas 
 razões.
 Mas o CIRE encarou a fase declarativa do processo de insolvência numa 
 perspectiva diferente, retomando o figurino do regime do processo especial de 
 falência previsto no Código de Processo Civil, vigente até à aprovação do 
 CPEREF. Como esclarecem CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, “agora a fase 
 inicial do processo que se desenrola até à prolação da sentença declaratória de 
 insolvência, obedece à estrutura geral da acção declarativa comum, 
 desenvolvendo-se com carácter restrito e privado, entre demandante e demandado, 
 dispensando-se por isso, a audição de quem quer mais que seja nos casos de 
 apresentação do devedor (cfr. art.º 28.º), visto que, aí, não há sequer esta 
 dicotomia. Todos os outros envolvidos apenas são chamados a intervir, após a 
 declaração de insolvência, não já para se pronunciarem sobre o estado do 
 devedor, mas, simplesmente, para exercerem os direitos que a nova situação lhes 
 confere.” (in. “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas anotado”, 
 vol. I, pág. 166, da ed. de 2005, da Quid iuris).
 Apesar dos credores não requerentes não serem agora citados para intervirem 
 nesta fase inicial do processo de insolvência, sendo apenas citados para 
 reclamarem os seus créditos após a declaração de insolvência, manteve-se a 
 forma privilegiada de citação para os cinco maiores credores (artigo 37.º, n.º 
 
 3, do C.P.C.), obrigando-se as partes da fase declarativa, mas sobretudo o 
 devedor, a fornecerem antecipadamente (na fase de apresentação dos articulados) 
 a sua identificação de modo a que, declarada a insolvência, se possa proceder de 
 imediato à sua citação pessoal ou por carta registada, caso residam no 
 estrangeiro (esta obrigação não constava, contudo, do Anteprojecto de Código que 
 acompanhou a Proposta de Lei de Autorização Legislativa).
 Entendeu o legislador sancionar a falta desta indicação pelo devedor no 
 articulado de oposição com o não recebimento da oposição, tendo o acórdão 
 recorrido entendido que esta sanção deve ser aplicada sem sequer se dar 
 oportunidade ao devedor contestante de suprir essa falta.
 
 É este entendimento do acórdão recorrido, cuja conformidade com os parâmetros 
 constitucionais convocáveis cumpre verificar. Nesta tarefa, o Tribunal 
 Constitucional não está limitado às normas ou princípios constitucionais 
 invocados pelo recorrente.
 A garantia da via judiciária estatuída no artigo 20.º, da C.R.P., conferida a 
 todos os cidadãos para tutela e defesa dos direitos e interesses legalmente 
 protegidos, abrange não só a atribuição do direito de acção judicial, mas também 
 a garantia de que o processo, uma vez iniciado, deve seguir as regras de um 
 processo equitativo, conforme impõe o n.º 4, do referido artigo 20.º.
 No domínio do processo civil, onde se insere o processo especial de insolvência, 
 avulta a regra do contraditório e da proibição da indefesa que lhe está 
 associada, donde resulta, na sua acepção primária, que não seja 
 constitucionalmente legítima a actuação de uma norma que não conceda à parte 
 demandada oportunidade de deduzir a sua defesa, acabando esta por se ver 
 confrontada com uma decisão condenatória, cujos fundamentos de facto ou de 
 direito não teve possibilidade de contraditar (vide, sobre o princípio do 
 contraditório em processo civil, Lopes do Rego, em “Os princípios 
 constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade, dos ónus e 
 cominações e o regime da citação em processo civil”, em “Estudos em homenagem ao 
 Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa”, pág. 836 e seg., Lebre de Freitas, em 
 
 “Introdução ao processo civil”, pág. 96 e seg., da ed. de 1996, da Coimbra 
 Editora, e Jorge Miranda, em “Constituição e processo civil”, em “Direito e 
 Justiça”, vol. VIII, tomo 2, pág. 19 e seg.).
 E, apesar de vigorar, na definição da tramitação do processo civil, uma ampla 
 discricionariedade legislativa que permite ao legislador ordinário, por razões 
 de conveniência, oportunidade e celeridade, fazer incidir ónus processuais sobre 
 as partes e prever quais as cominações ou preclusões que resultam do seu 
 incumprimento, isso não significa que as soluções adoptadas sejam imunes a um 
 controle de constitucionalidade que verifique, nomeadamente, se esses ónus são 
 funcionalmente adequados aos fins do processo, ou se as cominações ou preclusões 
 que decorram do seu incumprimento se revelam totalmente desproporcionadas à 
 gravidade e relevância da falta, nomeadamente pelo seu carácter irremediável ou 
 definitivo, impossibilitador de qualquer ulterior suprimento (vide, neste 
 sentido, Lopes do Rego, na ob. cit., pág. 839 e seg.).
 Tendo o CIRE optado por manter a citação pessoal ou por carta registada dos 
 cinco maiores credores, apesar da intervenção destes ocorrer apenas na fase de 
 reclamação de créditos após a declaração de insolvência, tal como sucedia no 
 regime do Código de Processo Civil anterior à aprovação do CPEREF, revela-se 
 adequada a exigência de que o devedor informe antecipadamente o tribunal sobre 
 os elementos identificativos dos seus cinco maiores credores, uma vez que se 
 trata de um ónus de fácil cumprimento, considerando a posição privilegiada do 
 devedor para prestar tal informação, permitindo, assim, que aquela citação 
 ocorra em data próxima após a declaração da falência. 
 
  E quanto ao momento em que deve ser prestada esta informação, é compreensível, 
 por razões de simplicidade, que tenha sido escolhido o da apresentação da 
 oposição pelo devedor, quando este não é o requerente da insolvência, uma vez 
 que esta fase declarativa não admite outros articulados, para além da petição 
 inicial e da oposição, seguindo para julgamento logo após a dedução desta, 
 quando a haja (artigo 35.º, do CIRE). Aí, se for declarada a insolvência, haverá 
 que designar-se logo prazo para a reclamação de créditos, sendo citados os 
 cinco maiores credores conhecidos, com exclusão do que tiver sido requerente 
 
 (artigos 36º, al. j), e 37.º, n.º 3, do CIRE).
 Pode-se, pois, concluir que o ónus estabelecido a cargo do devedor revela-se 
 funcionalmente adequado aos fins do processo, não sendo uma exigência puramente 
 formal, arbitrariamente imposta, sem qualquer sentido útil para a tramitação 
 processual, nem dificulta de modo excessivo ou intolerável a actuação 
 procedimental imposta aos intervenientes processuais.
 Mas ao contrário do CPEREF que não previa qualquer cominação específica para a 
 falta de indicação pelo requerente dos credores a citar, o CIRE estabeleceu como 
 cominação para a falta de cumprimento deste ónus pelo devedor-requerido, o não 
 recebimento da oposição por ele apresentada ao pedido de declaração da sua 
 insolvência.
 O não recebimento da oposição tem como consequência a confissão dos factos 
 alegados na petição inicial, nos termos do n.º 5, do artigo 30.º, do CIRE (vide, 
 neste sentido, CARVALHO FERNANDES e JOÃO LABAREDA, na ob. cit., pág. 171), 
 sendo a insolvência declarada se esses factos preencherem a hipótese de alguma 
 das alíneas do n.º 1, do artigo 20.º, do CIRE (n.º 5, do artigo 30.º, do CIRE), 
 o que copia a solução geral dada pela lei processual civil para a revelia 
 operante (artigo 484.º, n.º 1, do CPC), devendo, contudo, ter-se presente que os 
 factos enumerados nas referidas alíneas do n.º 1, do artigo 20.º, são meramente 
 indiciários duma situação de insolvência (vide, neste sentido, Carvalho 
 Fernandes e João Labareda, na ob. cit., pág. 132, e Lebre de Freitas, em 
 
 “Pressupostos objectivos e subjectivos da insolvência”, em Themis, número 
 especial de 2005, pág. 17-18).
 Estamos perante a previsão duma pesada cominação para a falta de cumprimento do 
 dever de indicar os cinco maiores credores de modo a permitir a sua posterior 
 citação pessoal ou por carta registada para reclamação de créditos – o não 
 recebimento da oposição apresentada pelo devedor requerido, com a consequente 
 confissão dos factos alegados pelo requerente para fundamentar a declaração de 
 insolvência do requerido. Esta cominação retira à parte demandada a 
 possibilidade da sua defesa ser valorada, acabando esta por se ver confrontada 
 com uma decisão, cujos fundamentos de facto e de direito não tiveram em 
 consideração a oposição por ela manifestada.
 Aplicando este dispositivo, o acórdão recorrido entendeu que deve ser 
 desentranhada a oposição que não se mostra acompanhada de informação sobre a 
 identidade dos cinco maiores credores do requerido, uma vez que não tendo essa 
 informação sido prestada no momento fixado na lei, tal falta já não é 
 susceptível de ser suprida.
 Ora, não respeitando a falta assim sancionada aos elementos essenciais 
 componentes da defesa apresentada, mas sim a dados úteis a uma eventual ulterior 
 fase processual que o legislador, por razões de simplicidade e celeridade, 
 entendeu deverem ser prestados conjuntamente com a oposição ao pedido de 
 declaração de insolvência, a aplicação fulminante de tal cominação revela-se 
 flagrantemente desproporcionada à falta cometida.
 Na verdade, os motivos que conduziram o legislador a associar a prestação da 
 informação sobre a identidade dos cinco maiores credores do requerido à 
 apresentação da oposição por este são incapazes de justificar que as 
 consequências do incumprimento daquela prestação incidam de forma tão drástica 
 sobre o direito do requerido se defender.
 A concordância prática entre os valores da simplicidade e celeridade processual 
 e o respeito pelo princípio da proibição da indefesa nesta situação tem de ser 
 possível, sem necessidade de se chegar ao extremo de, em desproporcionada 
 homenagem àqueles valores, se sacrificar completamente este princípio 
 fundamental do direito processual.
 E mesmo que se entenda que a informação sobre a identidade dos cinco maiores 
 credores também poderá ser utilizada pelo juiz para a sua audição oficiosa na 
 audiência de julgamento, para apuramento dos factos subjacentes à emissão do 
 juízo de insolvência, todas as considerações acima efectuadas reveladoras duma 
 visível desproporção entre a sanção cominada e a falta cometida, continuam a ser 
 válidas. Respeitando esta utilidade na prestação da informação em causa ao 
 domínio da prova e não ao da exposição dos fundamentos da acção e da defesa 
 perante o tribunal, continua a sua associação aos articulados, designadamente ao 
 de oposição, a apoiar-se em meras razões de simplicidade e celeridade que, como 
 já se referiu, não são suficientes para justificar uma preclusão irremediável do 
 direito à defesa.
 Tendo-se evidenciado que a cominação prevista no n.º 2, do artigo 30.º, do CIRE, 
 para a falta de indicação dos cinco maiores credores conjuntamente com a 
 oposição deduzida, é manifestamente desproporcionada, sobretudo quando nem 
 sequer se admite a possibilidade do suprimento dessa falta, deve considerar-se 
 que a interpretação efectuada pela decisão recorrida viola a exigência 
 constitucional do processo equitativo, constante do artigo 20.º, n.º 4, da 
 CRP., julgando-se procedente o recurso.
 Considerando-se inconstitucional a interpretação normativa do artigo 30.º, n.º 
 
 2, do CIRE, perfilhada pelo acórdão recorrido, o que obriga à reformulação desta 
 decisão, fica prejudicada a apreciação da invocada inconstitucionalidade do n.º 
 
 5, do mesmo artigo, uma vez que a sua aplicação resultava do sentido daquela 
 interpretação normativa aqui julgada inconstitucional.
 
                                                     
 
 *
 Decisão
 Nestes termos decide-se:
 a) Julgar inconstitucional, por violação do direito a um processo equitativo, 
 consagrado no n.º 4, do artigo 20.º, da Constituição da República Portuguesa, a 
 norma do artigo 30.º, n.º 2, do Código da Insolvência e da Recuperação de 
 Empresas, na interpretação segundo a qual deve ser desentranhada a oposição que 
 não se mostra acompanhada de informação sobre a identidade dos cinco maiores 
 credores do requerido, sem que a este seja facultada a oportunidade de suprir 
 tal deficiência.
 b) Julgar prejudicada a apreciação da constitucionalidade da norma contida no 
 n.º 5, do artigo 30.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas;
 c) Conceder provimento ao recurso;
 d) Ordenar a reforma da decisão recorrida em função do precedente juízo de 
 inconstitucionalidade.
 
  
 
                                                     *
 Custas pela recorrida, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, 
 ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 
 
 303/98, de 7 de Outubro (artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma).
 
  
 Lisboa, 19 de Novembro de 2008
 João Cura Mariano
 Joaquim de Sousa Ribeiro
 Mário José de Araújo Torres
 Benjamim Rodrigues (vencido de acordo com declaração anexa)
 Rui Manuel Moura Ramos
 
  
 
  
 DECLARAÇÃO DE VOTO
 
  
 Votei vencido por não poder acompanhar o julgamento do acórdão segundo o qual a 
 norma constitucionalmente impugnada viola o direito constitucional a um processo 
 equitativo.
 
             A tese que fez vencimento abonou-se no entendimento de que a 
 cominação estabelecida no n.º 2 do art.º 30.º do CIRE - não recebimento da 
 oposição, concretizado através de desentranhamento do respectivo articulado, 
 quando recebido pela secretaria – “para a falta de indicação dos cinco maiores 
 credores conjuntamente com a oposição, é manifestamente desproporcionada, 
 sobretudo quando nem sequer se admite a possibilidade de suprimento dessa 
 falta”.
 
             Para nós, porém, o ónus de juntar, com a oposição, a lista dos cinco 
 maiores credores do devedor não se configura manifestamente como excessivo, em 
 termos de dificultar, intoleravelmente, a sua defesa.
 
             De facto, não se antolha aqui, em abstracto, qualquer razão que 
 permita considerar particularmente gravoso o cumprimento desse ónus, quer em 
 face das menções que são legalmente exigidas – apenas o nome e o domicílio do 
 credor –, quer também, perante a constatação de que, como relevou o Tribunal a 
 quo, se trata de “algo que é do conhecimento pessoal do devedor e que este 
 poderá facilmente elaborar, no prazo da oposição (10 dias), mesmo que não tenha 
 contabilidade organizada”. 
 
             Estamos perante factos que são do conhecimento, pessoal e imediato, 
 do devedor, que não carecem de qualquer esforço de investigação, nomeadamente, 
 para apuramento do concreto montante de cada crédito, pois este não integra a 
 exigência legal: não conseguimos lobrigar como é que não seja de exigir de 
 qualquer devedor que este saiba identificar, imediatamente, quem são os seus 
 cinco maiores credores. 
 
             Pelo reduzidíssimo número de credores, cuja indicação é pedida, e 
 pela quota de influência que têm os respectivos créditos na sua situação 
 económico-financeira, qualquer pessoa, no lugar de devedor, imediatamente os 
 pode identificar sem qualquer esforço. 
 
             Depois, para o cumprimento de um ónus de tão facílimo cumprimento, o 
 devedor dispõe de largos 10 dias!
 
             Por outro lado, a referida exigência manifesta-se, também, funcional 
 e finalisticamente, adequada ao processo em causa, designadamente, quando se 
 considere a conveniência do conhecimento desses elementos antes de ser proferida 
 a decisão que declare a insolvência.
 
             Embora, no novo regime do CIRE esses cinco maiores credores (ou 
 quaisquer outros) não tenham de ser citados para se pronunciarem sobre o pedido, 
 a par do devedor cuja insolvência é pedida, no caso de acção intentada por um 
 credor (em contrário do regime anteriormente vigente), como dá nota o acórdão, 
 tal não significa que a sua identificação não se apresente como necessária e 
 adequada para uma justa composição do conflito. 
 
             Para o CIRE, o processo de insolvência passou a ser um processo de 
 interesse público. 
 
             A rápida satisfação possível dos credores do insolvente corresponde, 
 nos dias de hoje, a uma necessidade do funcionamento saudável e sustentado da 
 economia de mercado. 
 
             Não está, apenas, em causa a protecção do interesse particular de 
 cada credor, mas, também, do interesse público de que a economia não seja 
 tolhida pela inacção, em tempo actual, dos instrumentos jurídicos que regulam as 
 relações económico-financeiras entre os seus agentes.
 
             A celeridade, na cobrança dos créditos vencidos, constitui, 
 insofismavelmente, um meio privilegiado de realizar esses interesses.
 
             Ora, um dos principais objectivos prosseguidos pelo CIRE foi, 
 precisamente, conseguir os ganhos possíveis da celeridade, eliminando, 
 nomeadamente, actos processuais.
 
             A não citação dos credores, antes da sentença de declaração de 
 insolvência, mas apenas depois, e, aqui, já, para reclamarem os seus créditos, 
 explica-se por esta razão. 
 
             Com essa não citação, e os incidentes a que a sua realização poderia 
 dar lugar, obtêm-se fortes ganhos de celeridade.
 
             Mas, se o devedor deduz oposição aos fundamentos de insolvência, 
 alegados por um credor requerente, então, tem todo o sentido que ele indique, 
 por mor dos princípios do due processo off law, os seus cinco maiores credores, 
 a fim de permitir ou possibilitar ao tribunal um acesso, facilitado e atempado, 
 a fontes de informação, relativamente a factos com manifesto interesse para a 
 averiguação do preenchimento dos pressupostos da declaração da insolvência.  
 
             Como é consabido, já no domínio do CPEREF se impunha ao juiz o 
 poder-dever de “realizar as diligências necessárias à averiguação dos 
 pressupostos invocados e recolher os elementos que o habilitem a decidir” (assim 
 rezava o artigo 24.º, com redacção aproximada à estabelecida no § 5 – 
 Verfahrensgrundsätze – da Insolvenzordnung alemã). 
 
             Actualmente, o artigo 11.º do CIRE consagra o princípio do 
 inquisitório no processo de falência, nos termos do qual o juiz pode decidir com 
 base em factos que não tenham sido alegados pelas partes, o que, como referem 
 Luís Carvalho Fernandes e João Labareda (Código da Insolvência e da Recuperação 
 de Empresas Anotado, vol. I, Lisboa, 2006, p. 102), “contem implícita a 
 faculdade do juiz, por sua própria iniciativa, os investigar livremente, bem 
 como recolher as provas e informações que entender convenientes”.
 
             Ora, estando a operacionalidade deste princípio influenciada por um 
 obstáculo de monta, dados os “prazos muito apertados legalmente impostos ao juiz 
 para a prática dos pertinentes actos que lhe incumbem” (Luís Carvalho Fernandes 
 e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 
 vol. I,  Lisboa, 2006, pp. 102-103), bastando referir a este propósito o facto 
 de a audiência de discussão e julgamento dever ser “logo marcada (...) para um 
 dos cinco dias subsequentes” e do juiz ter de proferir a sentença no prazo de 
 cinco dias (cf. os n.os 1, 4 e 8 do artigo 35.º do CIRE), bem se compreende que 
 o dever de indicação por parte do devedor seja sujeito a uma sanção que o demova 
 de apresentar uma oposição para puro ganho de tempo. 
 
             Daí que o referido ónus se deva considerar justificado no plano 
 endoprocessual. 
 
             Não se olvidando que alguns autores, como Luís Carvalho Fernandes e 
 João Labareda (op. cit., p.171), consideram que a disposição em causa consagra 
 uma “solução radical e dura”, há-de convir-se que, mesmo defronte da 
 consequência processual, aí implicada, o intuito compulsório subjacente à 
 teleologia da norma se releva coerente com a tutela dos interesses mencionados, 
 com o grau de exigência subjacente ao cumprimento do referido ónus e com a 
 manifesta previsibilidade da sanção processual (cf., Carlos Lopes do Rego “Os 
 princípios constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade dos 
 
 ónus e cominações e o regime da citação em processo civil, in Aa. Vv., Estudos 
 em homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra, 2003, pp. 846 
 e ss.).
 
             Nessa óptica, ponderando em particular as exigências impeditivas do 
 estabelecimento de ónus processuais de carácter excessivo ou desproporcionado, 
 dir-se-á que a satisfação da condição legal de que depende o exercício do 
 direito de defesa não representa um constrangimento excessivo ou de difícil 
 realização, pelo que, fora dos casos em que estejam preenchidos os pressupostos 
 do justo impedimento, o não recebimento da oposição terá de imputar-se a uma 
 actuação voluntaristicamente não diligente por parte do devedor.
 
             A meu ver, o acórdão invadiu o terreno do legislador, impondo a sua 
 leitura sobre a proporcionalidade entre os meios e fins visados pela medida 
 legislativa, fora dos casos de erro manifesto ou de evidência.
 
             É que continuamos a ter por boa a doutrina que foi sufragada no 
 Acórdão n.º 187/01, disponível em www.tribunalconstitucional.pt:
 
  
 
             “[…] não pode deixar de reconhecer-se ao legislador – diversamente 
 da administração – […] uma “prerrogativa de avaliação”, como que um “crédito de 
 confiança”, na apreciação, por vezes difícil e complexa, das relações empíricas 
 entre o estado que é criado através de uma determinada medida e aquele que dela 
 resulta e que considera correspondente, em maior ou menor medida, à consecução 
 dos objectivos visados com a medida […]. Tal prerrogativa da competência do 
 legislador na definição dos objectivos e nessa avaliação […] afigura-se 
 importante sobretudo em casos duvidosos, ou em que a relação medida-objectivo é 
 social ou economicamente complexa, e a objectividade dos juízos que se podem 
 fazer (ou suas hipotéticas alternativas) difícil de estabelecer.
 
  
 
 […] em casos destes, em princípio, o Tribunal não deve substituir uma sua 
 avaliação da relação, social e economicamente complexa, entre o teor e os 
 efeitos das medidas, à que é efectuada pelo legislador, e que as controvérsias 
 geradoras de dúvida sobre tal relação não devem, salvo erro manifesto de 
 apreciação – como é, designadamente (mas não só), o caso de as medidas não serem 
 sequer compatíveis com a finalidade prosseguida –, ser resolvidas contra a 
 posição do legislador.
 
  
 
 […] a própria averiguação jurisdicional da existência de uma 
 inconstitucionalidade, por violação do princípio da proporcionalidade por uma 
 determinada norma, depende justamente de se poder detectar um erro manifesto de 
 apreciação da relação entre a medida e seus efeitos, pois aquém desse erro deve 
 deixar-se na competência do legislador a avaliação de tal relação, social e 
 economicamente complexa.”.
 Benjamim Silva Rodrigues