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Processo nº 347/2005
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheira Maria Fernanda Palma
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I
 RELATÓRIO
 
  
 
 1.  A. instaurou, junto do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, acção 
 declarativa, sob a forma de processo sumário, contra B., pedindo a declaração de 
 nulidade de um contrato de mútuo e a condenação da ré no pagamento da quantia de 
 Euros 14.954,00, acrescida de juros.
 A ré foi citada e recebeu cópia da petição inicial, cópia essa que se encontrava 
 incompleta. Por outro lado, foi dito à ré, pelo funcionário da Secretaria 
 Judicial, que não era obrigatória a constituição de mandatário.
 A ré não contestou a acção.
 O Tribunal considerou a ré regularmente citada e julgou a acção parcialmente 
 procedente.
 
  
 
 2.  Autor e ré interpuseram recursos para o Tribunal da Relação de Guimarães. A 
 ré sustentou nas alegações de recurso a inconstitucionalidade do artigo 198°, n° 
 
 2, do Código de Processo Civil.
 O Tribunal da Relação de Guimarães, por acórdão de 23 de Fevereiro de 2005, 
 julgou improcedentes os recursos interpostos.
 Quanto ao recurso da ré, o Tribunal entendeu o seguinte:
 
  
 IV – 1 – Impõe-se apreciar em 1º lugar, a apelação da R, pois que resultado 
 possível da sua procedência é o da anulação total do processo, o que 
 manifestamente prejudicaria o conhecimento da apelação interposta pelo A.
 Com efeito, aquela apelação postula a apreciação das seguintes questões:
 A – Saber se a citação da R tendo sido irregular porque não tenha a mesma 
 recebido com ela a petição inicial completa, e, porque lhe foi indicado 
 erradamente que não era necessária a constituição de advogado, se poderá ter, 
 não, como meramente nula, mas como inexistente, para o efeito de se concluir 
 pelo atempado da sua arguição, de modo a impor-se a anulação do processado 
 salvando-se apenas a petição inicial;
 B – Saber se, caso assim não se entenda, e se entenda antes que, havendo mera 
 nulidade da citação, esta nulidade está sanada por falta da tempestiva arguição, 
 não se deverá entender a norma do art 198°/2 como inconstitucional, por violação 
 dos princípios constitucionais constantes dos arts 13° e 20° da CRP;
 C – Saber se a petição inicial não é inepta por incompatibilidade substancial 
 dos pedidos formulados pelo A.
 
  
 A – Invoca a R que com a citação não recebeu a petição inicial completa, 
 faltando-lhe a fls 5 v.
 Torna-se pouco compreensível esta referência à fls 5 v. da petição, pois que tal 
 articulado apenas comporta duas folhas e meramente três páginas … 
 Mas, admitindo-se que o duplicado da petição inicial a entregar à R não o foi de 
 forma completa, desde o momento em que esta não fez qualquer prova dessa falha e 
 desde o momento em que não veio ao processo oportunamente reclamá-la – dispondo 
 para o efeito, como melhor se verá, do prazo que lhe foi indicado para contestar 
 
 – é evidente que nenhum relevo se poderia agora dar àquela omissão.
 Não faz qualquer sentido entender que a incompletude da petição inicial entregue 
 no acto da citação, ainda por cima, totalmente indemonstrada, possa implicar a 
 ausência total de citação com os consequentes efeitos. Estaria descoberto o modo 
 de os réus destruírem a seu belo prazer todo o processado, o que é absolutamente 
 insustentável.
 
 É que de facto, embora a falta de citação – a que se reporta o art 196° do CPC – 
 e a nulidade da citação – a que se reporta o art 198° do CPC – sejam ambas 
 nulidades de acto processual, a primeira tem implicações muito mais graves, do 
 que a segunda, não tanto pelas respectivas consequências mais directas – pois 
 que, se ali implica a anulação do processado posterior à petição (art 194° al 
 a)) aqui, implicando a repetição da citação, implicará também a anulação dos 
 termos subsequentes, já que os mesmos dela dependem absolutamente, nos termos do 
 art 201°/2 – mas porque ali se está na presença de uma nulidade principal (quer 
 dizer, passível de ser conhecida oficiosamente e em qualquer momento processual, 
 e consequentemente passível de ser arguida igualmente por qualquer das partes em 
 qualquer momento processual) e aqui se está na presença de uma nulidade quase 
 sempre secundária (quer dizer, só passível de ser conhecida por reclamação do 
 interessado, e que se sana na falta da sua oportuna arguição), só assim não 
 sucedendo quando a mera irregularidade da citação ocorra em citação edital, ou 
 quando essa irregularidade se traduza no facto de não ter sido indicado qualquer 
 prazo para a defesa que são casos em que a nulidade da citação é de conhecimento 
 oficioso nos termos do art 202° do CPC. 
 Ora, o que está na base de implicações tão diversas, é que a falta de citação 
 implica que o destinatário da citação não chega a ter (suficiente) conhecimento 
 do conteúdo do acto, de modo a poder defender-se eficazmente, enquanto que na 
 nulidade da citação, apenas não foram observadas na sua realização formalidades 
 prescritas na lei, mas sem que estas, - que, necessariamente, para que a 
 irregularidade possa relevar como nulidade, hão-de ter prejudicado a defesa do 
 citado (cfr art 198°/4 e 201º 1 parte final) comprometam, afinal, o 
 conhecimento do acto de modo a colocar em causa a defesa do citado.
 De facto todas as situações previstas especificamente como correspondendo a 
 falta de citação – art 196° e suas alíneas a) a e) – têm de comum a não 
 cognoscibilidade do acto pelo citado, como, de algum modo, resulta da situação 
 mais genérica prevista nesta última alínea.
 De tal modo que não repugna, obviamente, e tal como o defende Lopes do Rego na 
 passagem que a apelante pôs em evidência, que em situações limite, uma ou 
 conjugadas irregularidades numa citação, ainda que não possam reconduzir-se 
 propriamente a qualquer das situações referidas nas alíneas do art 196°, porque, 
 na prática, inviabilizaram “a cognoscibilidade pelo citando do conteúdo do acto, 
 dificultando-lhe em termos desproporcionados o exercício do direito de defesa”, 
 integrem o vício da falta de citação.
 Ora não é esse, manifestamente, o caso da incompletude do duplicado da petição 
 inicial entregue no acto da citação, como não é o caso de erradamente se 
 advertir o citando que “não é obrigatória a constituição de mandatário 
 judicial”.
 
 É que a menção, no acto da citação, da obrigatoriedade ou não, da constituição 
 de mandatário move-se num plano diferente do da maior ou menor cognoscibiliddae 
 do conteúdo do acto.
 Se a um citando é dito, correctamente, que se pode defender sem que lhe seja 
 obrigatório constituir advogado, tal não significa que o não constitua, ou que, 
 de todo o modo, a ele não recorra quando é citado. Mas se o não constituir, ou 
 nem sequer a ele recorrer quando é citado, não deixará de poder contestar 
 sozinho, fazendo-o na medida da sua compreensão e capacidade, sujeitando-se 
 depois à sua maior ou menor habilidade. Ponto é que saiba, claramente que se não 
 contestar se terão por confessados os factos articulados pelo A, intuindo, nesse 
 caso e, naturalmente, a sua provável condenação na acção.
 A falta de causalidade de um erro da secretaria como o que está sob análise para 
 a indefesa do citando é posta em relevo quando se tenha presente que, quem se 
 apresente a contestar sozinho em acção, em que, pelo seu valor ou conteúdo, o 
 patrocínio judiciário é obrigatório – e ainda que tenha sido correctamente 
 advertido no acto da citação para a necessidade do patrocínio judiciário – nunca 
 verá, sem mais, o seu direito de defesa coarctado pela falta de constituição de 
 mandatário, sendo-lhe conferido prazo certo para o fazer, sob pena – e só então 
 
 – de ficar sem efeito a defesa que apresentou, isto nos termos do art 33° do 
 CPC. 
 Se, na situação dos autos, a R se tivesse apresentado sozinha a contestar, 
 convencida que estaria, pela advertência contida na citação, de que o patrocínio 
 judiciário não era obrigatório, e se, notificada depois para constituir 
 mandatário, o constituísse, é evidente que não se deixaria de admitir a nova 
 defesa que este entendesse apresentar, em representação daquela.
 Só que, no caso dos autos, a R não apresentou qualquer defesa.
 Mas porque não estava impedida de o fazer, ainda que sozinha, o apontado erro 
 relativo à não necessidade de constituição de advogado não se pode entender como 
 causal relativamente a esta sua indefesa.
 Isto tudo foi referido para se concluir que a irregularidade em análise 
 
 –consistente em erradamente se advertir para a desnecessidade de constituição de 
 mandatário – não pode implicar o resultado de uma falta de citação.
 Mas obviamente que constitui uma nulidade da citação pois que indiscutivelmente 
 a falta cometida prejudica a defesa do citando – art 198°/4 – e é certo que os 
 erros da secretaria não podem prejudicar a parte – art 161º/6 do CPC. 
 Tinha é que ser arguida no prazo indicado para a contestação, nos termos do art 
 
 198°/2 do CPC, sob pena da respectiva sanação, e não o foi.
 
  
 B – É tempo de transitar para a segunda questão acima relevada. Entende a R que 
 a aplicação à situação dos autos do referido art 198°/2 (na sua 1ª parte) é 
 inconstitucional porque implicará violação dos princípios consagrados nos arts 
 
 13° e 20° da CRP, respectivamente principio da igualdade das partes e princípio 
 do acesso à justiça.
 Um outro e outro dos apontados princípios, para além de terem assento 
 constitucional, são estruturantes da nova legislação do processo civil.
 Postula o princípio da igualdade que se dê tratamento igual a situações 
 essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais 
 
 (proibindo, inversamente, o tratamento desigual de situações iguais e o 
 tratamento igual de situações desiguais) – cfr entre muitos outros o recente Ac 
 do T Constitucional, n° 719/04, DR, II Série, de 3/2/05, p 1733.
 Ora, como atrás se viu, a situação para que a R reclama tratamento de “falta de 
 citação”, não se equivale a esta, não merecendo tal tratamento, sob pena, 
 justamente, como resulta da atrás transcrita formulação do principio da 
 igualdade, se ofender tal princípio.
 Também a situação em causa nos autos, não sendo tratada como de “falta de 
 citação”, não descamba em verdadeiro obstáculo ou dificultação do acesso aos 
 tribunais na suas dimensões de direito a uma tutela efectiva e eficaz e de 
 proibição de indefesa, pois, como se viu, nem por isso a R deixava de se poder 
 defender, se se tivesse proposto a tal. Consequentemente, não há que julgar 
 inconstitucional a norma do n° 2 do art 198° do CPC na interpretação e aplicação 
 que dela se fez nos presentes autos.
 
  
 
  
 
 3.  B. interpôs recurso de constitucionalidade nos seguintes termos:
 
  
 B., Recorrente nos Autos à margem melhor identificados, e beneficiária de apoio 
 judiciário na modalidade de dispensa total do pagamento de taxa de justiça e 
 demais encargos com o processo, não se conformando com a Douta Decisão que lhe 
 foi notificada, vem dela interpor RECURSO para o Tribunal Constitucional, o que 
 o faz nos termos seguintes:
 
 - O Recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do n° 1 do artigo 70° da Lei n° 
 
 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei na 85/89, de 7 de Setembro e 
 pela Lei n° 13-A/98, de 26 de Fevereiro;
 
 - Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade do n° 2 do artigo 198° do 
 Código de Processo Civil com a interpretação com que foi aplicada na Douta 
 Decisão recorrida no sentido de concluir-se que o facto da secretaria judicial, 
 no acto de citação, ter erradamente advertido para a desnecessidade de 
 constituição de mandatário, não poder implicar o resultado de uma falta de 
 citação, mas antes, uma nulidade de citação, pois que indiscutivelmente a falta 
 cometida prejudica a defesa do citando – artigo 198°, n° 4, do C.P.C. e é certo 
 que os erros da secretaria não podem prejudicar a parte – artigo 161°, n° 6, do 
 C.P.C., tendo aquela que ser arguida no prazo indicado para a contest.ação nos 
 termos do n°     [sic] do artigo 198° do C.P.C., sob pena da respectiva sanação 
 e não o foi, pelo que, a aplicação do n° 2 do artigo 198° do C.P.C., na situação 
 dos autos, não é inconstitucional, pois a situação para que a R. reclama 
 tratamento de falta de citação, não descamba em verdadeiro obstáculo ou 
 dificultação do acesso aos tribunais nas suas dimensões de direito a uma tutela 
 efectiva e eficaz de proibição de indefesa;
 
 - tal interpretação do n° 2 do artigo 198° do Código de Processo Civil viola os 
 artigos 13° e 20° da Constituição da República Portuguesa ou respectivamente os 
 princípios da igualdade das partes, princípio do acesso à justiça e princípio da 
 proibição da indefesa;
 
 - A questão da inconstitucionalidade foi suscitada nos autos nas Alegações de 
 Recurso apresentadas pela R.;
 
  
 Junto do Tribunal Constitucional a recorrente apresentou alegações que concluiu 
 do seguinte modo:
 
  
 a) A decisão ora recorrida e proferida, ao interpretar o n° 2 do artigo 198° do 
 C.P.C., como o fez, no sentido de considerar que se encontra sanada a nulidade 
 de citação ocorrida, em virtude de ter sido prestada informação incorrecta à R., 
 pela secretaria judicial do tribunal de 1ª instância, sobre a não 
 obrigatoriedade da constituição de mandatário judicial.
 b) Tal interpretação e salvo melhor opinião, consagra uma restrição intolerável 
 
 à actuação processual das partes, que, nesse contexto, não podem adequada e 
 eficazmente exercer os seus direitos e ver julgada a lide que estão envolvidos.
 c) O entendimento dado ao segmento acima referido do n° 2 do art. 198° do CPC 
 viola o princípio constitucional do acesso ao direito e aos tribunais que o art. 
 
 20° da Constituição consagra, pois
 d) Feriu o princípio do contraditório, traduzindo, na prática, uma intolerável 
 desigualdade de armas, na justa medida em que, do mesmo passo, cerceia à R. e 
 ora Recorrente a possibilidade de uma defesa técnica efectiva, pois,
 e) No acto da citação, a secretaria judicial informou a R., no acto da citação, 
 que não era necessária a constituição de mandatário judicial.
 Assim sendo,
 f) No acto de citação da R. a secretaria judicial ao ter erradamente indicado à 
 R. e ora Recorrente de que não era obrigatória a constituição de mandatário 
 judicial violou de forma inquestionável, o disposto nos artigos 32°, n° 1, 
 alínea a), artigo 678°, n° 1, ambos do Cód. De Processo Civil, n° 1 do artigo 
 
 24° da Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro, e artigos 13°, 18° e 20° da Constituição 
 da República Portuguesa,
 g) Pelo que, salvo o devido respeito por opinião contrária, terá de entender‑se 
 que a solução constante do n° 2 do artigo 198° do C.P.C. constitui uma restrição 
 desproporcionada ao direito fundamental de acesso ao direito e aos tribunais, na 
 sua vertente de direito ao patrocínio judiciário, pois,
 h) No caso em apreço, e aceitando que o valor da acção é de 14.954,00 Euros, nos 
 termos conjugados dos artigos 32°, n° 1, alínea a), artigo 678°, n° 1 ambos do 
 Código de Processo Civil e o artigo 24°, n° 1, da Lei n° 3/99, de 13 de Janeiro, 
 era obrigatória a constituição de mandatário judicial. Deste modo,
 i) O Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, e salvo melhor opinião, ao 
 interpretar tal norma nesse sentido, de se encontrar sanada a nulidade de 
 citação ocorrida nos autos,
 j) Violou o princípio da indefesa e do processo equitativo, afirmados no Artigo 
 
 20° da Lei Fundamental, pois,
 k) No caso sub onson, a não defesa da R., que, nos presentes autos teria, 
 impreterivelmente, de ser representada por advogado, nos termos dos artigos 32°, 
 n° 1, alínea a), artigo 678°, n° 1, ambos do Código de Processo Civil e o artigo 
 
 24°, n° 1, da Lei n° 3/99, de 13 de Janeiro, ocasionou-lhe as mais gravosas 
 consequências,
 l) Com a sua condenação de preceito e conforme o direito, atento o disposto no 
 artigo 784° do C.P.C..
 m) Pelo que encontram-se assim violados, de forma clara, o princípio do 
 contraditório, princípio da igualdade de armas e ainda, em última análise, os 
 artigos 13°, 18° e 20° da C.R.P., pois,
 n) A restrição do patrocínio revela-se, à luz da conjugação dos artigos 18° e 
 
 20° da Lei Fundamental, desproporcionada e desadequada, pois, excluindo-se a 
 defesa dos interesses da R. e ora Recorrente que na matéria cabe à R., 
 representada por mandatário judicial, ainda que ele não se mostre absolutamente 
 necessário, atinge o núcleo essencial do direito de acesso aos tribunais, 
 consagrado naquele artigo 20°, na vertente de nomeação no processo de 
 
 “intermediário técnico”, entendido como a representação em juízo das partes ou 
 sujeitos processuais por profissionais do foro, no que respeita à condução 
 técnico-jurídica do processo, pois,
 o) Quer o direito de acção do autor, quer o direito a uma decisão judicial sem 
 dilações e demoras indevidas, quer o direito de defesa do réu (além de 
 expressamente referidos na nossa lei ordinária – artigos 2° e 3° do C.P.C.) 
 merecem reconhecimento e protecção constitucional – artigo 20° da C.R.P.. Sendo 
 inarredável que,
 p) A indicação, incorrecta, feita pela secretaria judicial à R., quanto à 
 obrigatoriedade da constituição de mandatário judicial,
 q) Com tal nulidade, atingiu-se e feriu-se o processo, em aspectos nucleares, 
 substanciando ofensa de princípios que o estruturam: o do contraditório e o da 
 igualdade substancial das partes, denegando, objectivamente, a garantia de 
 acesso aos tribunais.
 Assim,
 r) Pugnamos pela inconstitucionalidade do n° 2 do artigo 198°, no caso sub 
 onson, na interpretação que lhe foi dada.
 s) Sendo de afastar, no caso dos autos, a aplicabilidade do n° 2, 1ª parte, do 
 artigo 198° do C.P.C., pois,
 t) Mostra-se ferida de inconstitucionalidade material por ofensa aos princípios 
 consagrados nos artigos 13° e 20° da C.R.P., artigos 3° e 3°-A do Código de 
 Processo Civil e artigo 10° da Declaração Universal dos Direitos do Homem, ou, 
 quando menos, as exigências e garantias constitucionais decorrentes da própria 
 ideia de Estado.
 
  
 EM CONSEQUÊNCIA
 Deverá ser declarada a inconstitucionalidade da 1ª parte do n° 2 do artigo 198° 
 do Código de Processo Civil, na parte em que considera que se encontra sanada a 
 nulidade de citação ocasionada pela secretaria judicial do tribunal de 1ª 
 instância, por indicação incorrecta da não obrigatoriedade de constituição de 
 mandatário judicial da decisão recorrida, por violação dos princípios do 
 contraditório do acesso aos tribunais, princípio da igualdade e princípio da 
 igualdade de armas, que se extraem dos arts. 2°, 13°, 18° e 20°, n° 1, da 
 Constituição, artigos 3° e 3°-A do Código de Processo Civil e artigo 10° da 
 Declaração Universal dos Direitos do Homem, ou, quando menos, as exigências e 
 garantias constitucionais decorrentes da própria ideia de Estado, devendo o 
 Acórdão recorrido ser reformulado em onsonância com o juízo sobre a questão de 
 inconstitucionalidade, assim se fazendo, como sempre 
 JUSTIÇA!
 
  
 O recorrido não contra-alegou.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar.
 
  
 
  
 II
 FUNDAMENTAÇÃO
 
  
 
 4. O presente recurso de constitucionalidade tem por objecto a norma do artigo 
 
 198°, n° 2, do Código de Processo Civil, interpretada no sentido de ser 
 considerada sanada, por não ter sido suscitada no prazo da contestação, a 
 nulidade da citação, decorrente de a ré ter sido erradamente informada de que 
 não era obrigatória a constituição de mandatário judicial.
 
  
 Verifica-se, no processo pretexto do presente recurso de constitucionalidade, 
 que não foi dado cumprimento ao disposto no artigo 235° do Código de Processo 
 Civil, na parte em que refere a informação da “necessidade de patrocínio 
 judiciário”. O tribunal a quo considerou que esse incumprimento originou a 
 nulidade da citação. 
 Ora, tal informação, se tivesse sido devidamente prestada, implicaria uma 
 estratégia de defesa necessariamente diferente daquela que a ré, porque não foi 
 aconselhada de forma correcta, adoptou.
 Note-se que a recorrente não impugnou a natureza da invalidade da citação no 
 caso (a nulidade). O que a recorrente impugna é a norma que determina que a 
 nulidade da citação, no caso de a ré ser erradamente informada de que não é 
 obrigatória a constituição de mandatário judicial, se considera sanada se não 
 for arguida no prazo da contestação.
 A obrigatoriedade de constituição de advogado visa, para além do adequado 
 funcionamento do sistema judicial, facultar à parte uma estratégia processual 
 tecnicamente fundada, de modo a possibilitar um eficaz exercício dos respectivos 
 direitos processuais, incluindo a decisão sobre a apresentação da contestação e 
 os seus termos. É esse o fim da norma.
 Para o efeito, é pouco relevante que a ré tenha sido informada do prazo de 
 defesa e dos efeitos da sua falta, dada a densidade técnica que tais informações 
 apresentam. De resto, em momento algum é referido o modo como tais informações 
 foram prestadas à ré.
 Sublinhe-se que a ré, após a citação, reagiu quando foi confrontada com o acto 
 processual imediato que lhe foi notificado, ou seja, a decisão condenatória.
 O direito de acesso aos tribunais pressupõe, naturalmente, uma actuação 
 transparente e, dir-se-ia, de boa fé quer das partes quer dos agentes do sistema 
 judicial. Pressupõe, ainda, um acesso informado e esclarecido por parte dos 
 sujeitos que pretendem fazer valer os seus direitos em juízo.
 Os erros das partes têm consequências que se repercutem nas respectivas esferas. 
 Os erros dos agentes do sistema judicial não podem repercutir-se na esfera das 
 partes.
 Se, através de uma actuação contrária à lei, um funcionário judicial inviabiliza 
 o acesso do particular a uma informação relevante para a sua estratégia de 
 defesa, é natural que se reconheça ao sujeito erradamente informado a 
 possibilidade de reagir assim que se apercebe da situação processual em que se 
 encontra e dos efeitos que entretanto se produziram, sem que tivesse a 
 possibilidade de a eles aceder.
 
 É verdade que deste modo são afectados actos entretanto praticados, 
 nomeadamente, o julgamento. Porém, trata-se de uma consequência imputável a um 
 erro do funcionário judicial, pelo que se justifica o respectivo efeito no 
 funcionamento do sistema numa lógica de responsabilização dos agentes judiciais 
 e, por essa via, do próprio Estado.
 Sustentar, como decorre do acórdão impugnado, que a recorrente devia ter 
 oferecido a sua defesa no prazo que presumidamente lhe foi indicado traduz-se na 
 exigência desproporcionada da prática de um acto objectivamente irregular, já 
 que sempre seria necessária a constituição de advogado, constituição que não 
 ocorreria em face da errada informação prestada.
 A sanação da nulidade, como se disse, não é posta em causa pela recorrente. Ora, 
 ela só deverá, na verdade, ocorrer quando a recorrente tiver as condições 
 indispensáveis para se aperceber que a nulidade teve lugar. É esta a solução 
 adequada ao princípio de um processo justo e equitativo. E é esta a solução que 
 concretiza o direito de acesso aos tribunais exercido num contexto de 
 transparência e de lealdade entre todos os agentes implicados no funcionamento 
 do sistema judicial.
 O artigo 198°, n° 2, do Código de Processo Civil, viola, pois, o princípio de 
 acesso ao direito e aos tribunais consagrado no artigo 20° da Constituição 
 quando interpretado no sentido de considerar sanada a nulidade da citação no 
 prazo para apresentar a contestação, quando a Secretaria informa a ré, 
 erradamente, de que não é obrigatória a constituição de advogado e esta somente 
 reage quando é notificada da sentença condenatória.
 
  
 
  
 III
 DECISÃO
 
  
 
  
 
 5.                              Em face do exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide julgar inconstitucional, por violação do artigo 20º, nºs 1 e 4, da 
 Constituição, a norma do artigo 198°, n° 2, do Código de Processo Civil, quando 
 interpretado no sentido de considerar sanada a nulidade da citação no prazo para 
 apresentar a contestação, quando a Secretaria informa a ré, erradamente, de que 
 não é obrigatória a constituição de advogado e esta somente reage quando é 
 notificada da sentença condenatória, revogando, consequentemente, a decisão 
 recorrida que deverá ser reformulada de acordo com o presente juízo de 
 inconstitucionalidade.
 
  
 Lisboa, 8 de Março de 2006
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Rui Manuel Moura Ramos