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Processo n.º 343/08
 
 1.ª Secção
 Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
 
  
 Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
 
 I – Relatório
 
 1. A., inconformado com a decisão sumária proferida neste Tribunal em 28 de 
 Abril de 2008, pela qual se determinou negar provimento ao recurso que pretendeu 
 interpor, vem agora reclamar para a conferência, nos termos do disposto no 
 artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional.
 Disse, no seu requerimento:
 
 “A decisão (sumária) de que se reclama assume, nos seus próprios termos, a 
 natureza sumária ‘… por se tratar de matéria em que, versando sobre questões 
 apreciadas anteriormente por este Tribunal, entende-se ser de manter os 
 orientações já firmadas” (vide n° 5. a fls. 7). 
 Se bem que se aceite poderem os aspectos da ilegalidade por violação de lei com 
 valor reforçado e da inconstitucionalidade com base na violação do principio 
 constitucional da protecção da confiança (vide números 5.1 e 5.2.1) ser 
 susceptíveis da decisão sumária a que alude o preceito legal em causa — por 
 efectivamente terem sido objecto das decisões anteriores do Tribunal 
 Constitucional identificadas —, o mesmo já não sucede quanto à questão da 
 inconstitucionalidade por ‘violação do direito à contratação colectiva. 
 Com efeito, a douta decisão reclamanda (número 5.2.2) parte do princípio de que 
 a questão da inconstitucionalidade invocada nestes autos é a mesma que foi 
 analisada e decidida no Acórdão n.º 581/95, e louva-se na argumentação desse 
 douto aresto para alcançar a mesma conclusão. 
 Mas as questões não são as mesmas, nem são semelhantes — as questões nos dois 
 Processos são diferentes, podendo mesmo dizer-se que são opostas. 
 Realmente, no Acórdão n° 581/95 estava em apreciação e foi decidida a 
 constitucionalidade de uma norma (no caso, o art. 2° do diploma anexo ao Dec. 
 Lei n.º 64-A189, de 27 de Fevereiro) que retirava à regulamentação colectiva 
 certas matérias. O que aí se decidiu, e a nosso ver bem, foi que, uma vez que a 
 norma constitucional remete para a lei ordinária (nos termos da lei, diz o 
 preceito constitucional) a conformação desse mesmo direito constitucional, a lei 
 adquire uma função constitutiva do próprio Tatbestand do direito, e por isso não 
 
 é constitucionalmente ilegítima essa ‘retirada’. 
 No caso dos presentes autos isso não está em causa. Aliás — e é por isso dizemos 
 que as situações são mesmo opostas — a Lei n.º 23/98, de 26 de Maio (cuja 
 natureza ou não de “valor reforçado para aqui é de todo irrelevante), prevê 
 expressamente que são objecto de negociação colectiva as matérias relativas à 
 fixação ou alteração das pensões de aposentação ou de reforma corpo e alínea b) 
 do art. 6°). 
 Face ao exposto, podemos mesmo dizer que o Acórdão n° 581/95 decidiu uma questão 
 que do direito constitucional de negociação em matéria que a própria lei 
 conformadora de forma expressa consagra.” 
 
 2. A decisão sumária reclamada tem a seguinte fundamentação:
 
 “A) Objecto do Recurso
 
 4. Há que proceder, em primeiro lugar, à delimitação do objecto do recurso. Vem 
 impugnada a Lei n.º 1/2004, de 15 de Janeiro, na sua globalidade. No entanto, 
 movendo-se os autos no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade (e 
 ilegalidade por invocada violação de diploma com valor reforçado), apenas 
 integram o respectivo objecto as normas que, tendo efectivamente sido aplicadas 
 pela decisão recorrida, constituam sua ratio decidendi. Tais normas são as 
 contidas nos artigos 51.º, n.º 3, 53.º, n.º 1, e 43.º, n.º 1, alínea a), do 
 Estatuto da Aposentação. As duas primeiras normas referidas resultam – na versão 
 aplicada – da redacção introduzida pela Lei n.º 1/2004, não integrando a última 
 
 – atinente ao modo como se fixa o regime da aposentação aplicável – o objecto do 
 recurso por não vir suscitada, relativamente a ela, qualquer questão. Assim, 
 compõe o objecto dos autos o artigo 1.º, n.º 1, da Lei n.º 1/2004, na parte em 
 que conferiu nova redacção aos artigos 51.º, n.º 1, e 53.º, n.º 1, do Estatuto 
 da Aposentação.
 Encontrado assim o objecto do recurso, passemos agora à respectiva análise.
 B) Apreciação das questões de constitucionalidade
 
 5. Entende-se ser de proferir decisão sumária ex vi artigo 78.º-A, n.º 1, da Lei 
 do Tribunal Constitucional por se tratar de matéria em que, versando sobre 
 questões apreciadas anteriormente por este Tribunal, entende-se ser de manter as 
 orientações já firmadas.
 
 5.1. Assim, no que respeita especificamente ao recurso interposto ao abrigo do 
 artigo 70.º, n.º 1, alínea f), da mencionada Lei, é de reiterar nesta sede o 
 julgamento de não verificação de ilegalidade por violação de lei com valor 
 reforçado proferido no Acórdão n.º 374/2004, publicado no Diário da República, 
 II Série, de 30 de Junho de 2004. Em fiscalização abstracta da legalidade das 
 normas contidas no artigo 1.º, n.ºs 1, a 5, da Lei n.º 1/2004, o Plenário do 
 Tribunal Constitucional decidiu não declarar a ilegalidade pedida por entender 
 que a Lei n.º 23/98 não possui valor reforçado. Remete-se, por conseguinte, 
 nesta parte, para o citado Acórdão n.º 374/2004, extractado ex abundantia nos 
 autos.
 
 5.2. Analisemos agora o recurso interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, 
 alínea b), comportando duas questões de constitucionalidade material – uma 
 atinente à eventual violação do direito fundamental dos trabalhadores à 
 contratação colectiva, previsto no artigo 56.º, da Constituição; e a outra, 
 respeitante à desconformidade com os princípios constitucionais do estado de 
 direito, da confiança, da protecção contra o arbítrio e da certeza e segurança 
 jurídicas, ínsitos, nomeadamente, nos artigos 1.º, 2.º, 3.º, e 20.º, da 
 Constituição.
 
 5.2.1. Comecemos por esta última. Também em fiscalização abstracta, o Plenário 
 do Tribunal Constitucional teve oportunidade de apreciar a constitucionalidade 
 da norma resultante da redacção introduzida ao artigo 51.º, n.º 3, do Estatuto 
 da Aposentação pela Lei n.º 1/2004 (Acórdão n.º 302/2006, publicado no Diário da 
 República, II Série, de 12 de Junho de 2006). Foi então apreciada a conformidade 
 da norma em face do princípio constitucional da protecção da confiança, tendo-se 
 concluído pela não declaração de inconstitucionalidade.
 Pode-se ler, no mencionado aresto:
 De qualquer modo, na maior extensão desse efeito desfavorável ao subscritor 
 pressuposta pela argumentação do requerente ou neste outro de mais reduzida 
 expressão quantitativa, considera-se que não existem razões para que o Tribunal 
 se afaste da jurisprudência firmada no Acórdão nº 99/99 (cit.), em que estava em 
 causa uma questão em tudo semelhante à colocada no presente processo: a de saber 
 se a introdução de uma diferente e menos favorável fórmula de cálculo da pensão 
 de aposentação afecta expectativas – e, mais precisamente, expectativas 
 legítimas – dos subscritores da Caixa Geral de Aposentações. 
 Para alcançar a conclusão de que não existe, neste domínio, uma expectativa 
 legítima dos subscritores da Caixa Geral de Aposentações, o citado Acórdão nº 
 
 99/99 teve presente, desde logo, a norma do artigo 43.º do Estatuto da 
 Aposentação, que dispõe: 
 
 «1 – O regime da aposentação fixa-se com base na lei em vigor e na situação 
 existente à data em que: 
 a) Se profira despacho a reconhecer o direito a aposentação voluntária que não 
 dependa de verificação de incapacidade; 
 b) Seja declarada a incapacidade pela competente junta médica, ou homologado o 
 parecer desta, quando a lei especial o exija; 
 c) O interessado atinja o limite de idade; 
 d) Se profira decisão que imponha pena expulsiva ou se profira condenação penal 
 definitiva da qual resulte a demissão ou que coloque o interessado em situação 
 equivalente. 
 
 2 – O disposto no nº 1 não prejudica os efeitos que a lei atribua, em matéria de 
 aposentação, a situações anteriores. 
 
 3 – …».
 Como se vê, o n.º 1 do artigo 43.º é claro na determinação de que é no momento 
 da aposentação – ou, mais rigorosamente, no momento em que se verifique qualquer 
 das situações previstas nas alíneas a) a d) daquele n.º 1 – que se fixa, com 
 base na lei em vigor nesse momento, o respectivo regime.  
 Significa isto, como sublinhou o Acórdão n.º 99/99, que não possuem os 
 subscritores da Caixa Geral de Aposentações no activo qualquer expectativa 
 legítima na imutabilidade ou fixidez do statu quo vigente, antes não podendo 
 deixar de contar, por força do que está expressamente preceituado no artigo 43.º 
 do Estatuto da Aposentação, com eventuais alterações do regime jurídico da 
 aposentação. Em bom rigor, só no momento em que se aposentar – di-lo claramente 
 aquela norma – será possível ao subscritor conhecer, nos seus precisos contornos 
 e em toda a sua complexidade, as regras que lhe irão ser aplicáveis. E, como se 
 afirmou no Acórdão nº 99/99, «(…) a impossibilidade de previsão de uma mudança 
 só frustraria expectativas legítimas dos destinatários da norma em causa se 
 estes não devessem razoavelmente contar com a possibilidade da mudança, 
 designadamente, por o legislador os ter advertido do momento em que se fixa o 
 regime da aposentação». Ora - prossegue o Acórdão nº 99/99 -, «o artigo 43.º do 
 Estatuto da Aposentação incorpora, neste sentido, uma previsão genérica de 
 possibilidade de mudança de regimes, ao determinar que o regime da aposentação 
 se fixa com base na lei em vigor e na situação existente à data em que se 
 verifiquem os pressupostos que dão origem à aposentação (…). E, por outro lado, 
 este regime foi sendo, ao longo dos anos, sucessivamente alterado (umas vezes em 
 sentido favorável, outras em sentido desfavorável ao interesse do recorrente), 
 ao ponto de os destinatários de tais normas deverem ter por assente que, até à 
 constituição da sua posição de pensionistas, mudanças poderiam sobrevir, ainda 
 que imprevisíveis no seu sentido ou momento da aplicação. Não parece, assim, 
 desde logo, que se possa dizer que a alteração em causa afectou expectativas 
 legítimas dos destinatários da norma, sendo seguro que, ainda que assim não 
 fosse, não se poderia dizer que a alteração legislativa em causa constituísse 
 uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das 
 normas não pudessem contar – justamente por, como o legislador esclareceu já no 
 artigo 43º do Estatuto da Aposentação, deverem contar com mutações do regime da 
 aposentação (em sentido favorável ou desfavorável, embora, evidentemente, sem 
 poderem adivinhar o sentido preciso dessas mutações) até à data em que se 
 verifiquem os pressupostos que dão origem à aposentação». 
 Afigura-se manifesto que não existe qualquer expectativa dos subscritores digna 
 de tutela pelo Direito que tenha sido intoleravelmente atingida por ter passado 
 a ser relevante para o cálculo da pensão a média das remunerações do último 
 triénio em vez do quantitativo correspondente ao vencimento do cargo pelo qual 
 se verifica a aposentação acrescido da média das demais retribuições do último 
 biénio. Na verdade a pretensa «expectativa» dos subscritores não se baseia em 
 qualquer contribuição que hajam feito, mas tão-só numa noção difusa de 
 manutenção ou cristalização do statu quo do regime da aposentação em todas as 
 suas vertentes – ideia que, no limite, inviabilizaria toda e qualquer 
 intervenção reformadora do legislador neste domínio. 
 Decisivamente, não pode afirmar-se, sem mais, que os trabalhadores possuam uma 
 expectativa a que o cálculo da pensão de aposentação seja efectuado sempre da 
 mesma maneira ao longo da sua carreira contributiva. Ponto é que as alterações 
 que venham a ser introduzidas não importem, à luz de critérios de 
 proporcionalidade e de razoabilidade, uma lesão de tal forma grave ou profunda 
 na «confiança no sistema» que os trabalhadores depositaram durante a sua 
 carreira contributiva. 
 A convocação de critérios de razoabilidade e de proporcionalidade para averiguar 
 de eventuais violações do princípio da confiança já foi efectuada por este 
 Tribunal, como se viu, podendo referir-se os já citados Acórdãos n.º 287/90 e 
 n.º 580/99 ou, mais remotamente, o Acórdão nº 141/85 (in Acórdãos do Tribunal 
 Constitucional, 6.º vol., pp. 39 ss.). Ora, o abandono do critério da 
 retribuição base do cargo pelo qual se verifica a aposentação como factor de 
 referência e o alargamento de dois para três anos do período relevante para a 
 determinação da média, atenta a sua reduzida dimensão temporal, a ampla 
 liberdade de conformação reconhecida ao legislador e, mais decisivamente, a 
 circunstância de os trabalhadores não beneficiarem, no quadro da Constituição, 
 de um qualquer direito à «imutabilidade do sistema» são factores que militam no 
 sentido de se poder concluir que a alteração introduzida não afectou, de forma 
 absolutamente intolerável ou desproporcionada, quaisquer expectativas dignas de 
 tutela jurídica dos trabalhadores e, portanto, o princípio da confiança, ínsito 
 no princípio do Estado de direito democrático. 
 O Acórdão n.º 99/99, publicado no Diário da República, II Série, de 31 de Março 
 de 1999 – e para cuja orientação remete o Acórdão n.º 306/2006 –, em análise a 
 alteração legislativa que introduziu modificações relevantes para o cálculo da 
 pensão da aposentação, julgou, nomeadamente, nos termos que se seguem:
 
 7. Ora, no caso sub iudice, compreende-se que a introdução pelo legislador de um 
 limite máximo da remuneração relevante para o cálculo da pensão de aposentação 
 afecte expectativas dos destinatários da prescrição legal. É facto que não havia 
 razão específica para os destinatários anteciparem aquela mutação da ordem 
 jurídica (a imposição daquele limite naquele momento).
 Resta, porém, saber se tais expectativas eram legítimas, no sentido de merecerem 
 a tutela do Direito, ou se o legislador acautelou a possibilidade de formação de 
 tais expectativas, advertindo os destinatários da impossibilidade de se fixar um 
 dado regime da aposentação antes de certo momento.
 Na verdade, a impossibilidade de previsão de uma mudança só frustraria 
 expectativas legítimas dos destinatários da norma em causa se estes não devessem 
 razoavelmente contar com a possibilidade da mudança, designadamente, por o 
 legislador os ter advertido do momento em que se fixa o regime da aposentação. 
 Ora, o artigo 43º do Estatuto da Aposentação incorpora, neste sentido, uma 
 previsão genérica de possibilidade de mudança de regimes, ao determinar que o 
 regime da aposentação se fixa com base na lei em vigor e na situação existente à 
 data em que se verifiquem os pressupostos que dão origem à aposentação (o que, 
 no caso vertente, não ocorreu antes de Fevereiro de 1994). E, por outro lado, 
 este regime foi sendo, ao longo dos anos, sucessivamente alterado (umas vezes em 
 sentido favorável, outras em sentido desfavorável ao interesse do recorrente), 
 ao ponto de os destinatários de tais normas deverem ter por assente que, até à 
 constituição da sua posição de pensionistas, mudanças poderiam sobrevir, ainda 
 que imprevisíveis no seu sentido ou momento da aplicação.
 Não parece, assim, desde logo, que se possa dizer que a alteração em causa 
 afectou expectativas legítimas dos destinatários da norma, sendo seguro que, 
 ainda que assim não fosse, não se poderia dizer que a alteração legislativa em 
 causa constituísse uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os 
 destinatários das normas não pudessem contar – justamente, por, como o 
 legislador esclareceu já no artigo 43º do Estatuto da Aposentação, deverem 
 contar com mutações do regime da aposentação (em sentido favorável ou 
 desfavorável, embora, evidentemente, sem poderem adivinhar o sentido preciso 
 dessas mutações) até à data em que se verifiquem os pressupostos que dão origem 
 
 à aposentação.
 Aliás, deve reconhecer-se que não existe uma relação directa entre os descontos 
 a efectuar para a Caixa Geral de Aposentações e a pensão de aposentação a 
 receber. E compreende-se que assim seja, tanto podendo, desde logo, o 
 interessado ser prejudicado como beneficiado com a falta desta relação directa 
 
 (assim se a pensão for globalmente de montante inferior àqueles pagamento ou de 
 montante superior).
 Os fundamentos dos Acórdãos que vimos citando – 306/2006 e 99/99 – são 
 mobilizáveis para a questão ora em apreço, concluindo-se, por conseguinte, que 
 as alterações introduzidas pela Lei n.º 1/2004 aos artigos 51.º, n.º 3, e 53.º, 
 do Estatuto da Aposentação, não ofendem as regras e princípios constitucionais 
 invocados.
 
 5.2.2. Relativamente à inconstitucionalidade material da Lei n.º 1/2004 – na 
 parte em que introduziu modificações nas normas que serviram de base de cálculo 
 da pensão de aposentação do Recorrente – por violação do direito fundamental à 
 contratação colectiva, é igualmente de aplicar a jurisprudência que este 
 Tribunal já firmou neste domínio.
 Na óptica do Recorrente, a Lei n.º 1/2004, ao introduzir alterações no método de 
 cálculo e, consequentemente, no montante das pensões de aposentação, deveria ter 
 sido precedida de negociação colectiva. Não o tendo sido, resultaria violado tal 
 direito fundamental dos trabalhadores. 
 Vejamos o que, a propósito deste direito fundamental titulado pelos 
 trabalhadores, se escreveu no Acórdão n.º 581/95 (publicado no Diário da 
 República, I Série-A, de 22 de Janeiro de 1996):
 A Constituição atribui às associações sindicais a competência para o exercício 
 do direito de contratação colectiva, mas devolve ao legislador a tarefa de 
 delimitação do mesmo direito, aqui lhe reconhecendo uma ampla liberdade 
 constitutiva. A interpretação do alcance desta devolução para a Lei (CRP, artigo 
 
 56.º, n.º 3, in fine, e n.º 4) não pode contudo deixar de entrever na norma 
 atributiva de uma competência às organizações sindicais de exercerem o direito 
 de contratação colectiva (CRP, artigo 56.º, n.º 3) a própria afirmação 
 constitucional deste direito e a garantia da sua realização.
 Materialmente, o direito de contratação colectiva ‘analisa-se em dois aspectos: 
 
 (a) direito à liberdade negocial colectiva, não estando os acordos colectivos 
 sujeitos a autorizações ou homologações administrativas ou a esquemas públicos 
 obrigatórios de solução de conflitos; (b) direito à autonomia contratual 
 colectiva, não podendo deixar de haver um espaço aberto à disciplina contratual 
 colectiva, o qual não pode ser aniquilado por via normativo-estadual. É certo 
 que este direito é garantido apenas 'nos termos da lei’, estando portanto sob 
 reserva de lei. Todavia, a lei não pode deixar de delimitá-lo de modo a 
 garantir-lhe um mínimo de eficácia constitucionalmente relevante (…) havendo 
 sempre de garantir uma reserva de convenção colectiva, ou seja, um espaço não 
 vedado à contratação colectiva». (G. Canotilho e Vital Moreira, Constituição da 
 República Portuguesa Anotada, 2.ª ed., Coimbra, 1984, p. 311).
 Então, importa saber se o legislador, ao retirar à regulamentação colectiva uma 
 certa matéria — no caso, a matéria de procedimento disciplinar, pois que o 
 objecto do recurso, consistente na dimensão da norma plasmada na interpretação 
 do tribunal a quo postula aqui esse enfoque do problema — vem reduzir de tal 
 modo aquele espaço da autoregulação constitucionalmente garantido que põe em 
 causa a possibilidade de realização do direito de contratação colectiva. O que é 
 perguntar se a existência de normas legais imperativas em matéria de processo 
 disciplinar traduz uma afectação do conteúdo essencial daquele direito. (…)
 Retomemos a formulação contida no artigo 56.º, n.º 3, da Constituição: «Compete 
 
 às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é 
 garantido nos termos da lei».
 Não se trata aí de uma ingerência autorizada do legislador, configurando uma 
 limitação do direito de contratação colectiva. O que se estabelece é uma reserva 
 de conformação (Ausgestaltungsvorbehalt): o legislador não intervém para impor 
 limites ao direito, mas o direito só tem existência completa na modulação que o 
 legislador lhe confere.
 Este âmbito de conformação do legislador é particularmente relevante, como 
 explana Alexy (Theorie der Grundrechte, Suhrkamp Taschenbuch Wissenschaft, pág. 
 
 300), em matéria de competências privadas. E é este o caso. A dogmática 
 jurídico‑constitucional distingue a noção de conformação em sentido verdadeiro e 
 próprio da noção de restrição, precisamente em relação às normas de competência. 
 Na doutrina portuguesa, Vieira de Andrade dá conta de que «essa necessidade 
 prática [de introduzir e acomodar os direitos na vida jurídica] é 
 particularmente notória quando se trata de efectivar direitos em que predomina o 
 aspecto institucional...» (Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa 
 de 1976, Almedina, Coimbra, 1983, pág. 227).
 
 É, pois, evidente que, neste domínio, a lei adquire uma função constitutiva do 
 próprio Tatbestand do direito. Então, criada que está pelo próprio figurino 
 constitucional a abertura para uma ampla liberdade constitutiva do legislador, 
 cabe perguntar se a norma do artigo 2.º, ao retirar à regulamentação colectiva 
 certas matérias do regime jurídico do Decreto‑Lei n.º 64‑A/89 – aquelas que aí 
 são determinadas pela exclusão das matérias do artigo 59.º – vem reduzir de tal 
 modo aquele espaço de autoregulação constitucionalmente garantido que põe em 
 causa a possibilidade de realização do direito de contratação colectiva.
 Também aqui o método de controlo faz apelo ao critério da proporcionalidade. 
 Interesses públicos relevantes como os da segurança jurídica e da igualdade – 
 postulando uniformização de procedimentos – podem ditar que as normas sejam 
 imperativas e não dispositivas. Além disso, o «espaço virtual» da contratação 
 colectiva não se esgota no âmbito de realidade sobre que incide o Decreto‑Lei 
 n.º 64‑A/89: o regime jurídico deste Decreto‑Lei [que, aliás, se abre em 
 momentos relevantes à autonomia colectiva (artigo 59.º)] tem incidência apenas 
 num sector da vida das relações de trabalho e o papel central da regulamentação 
 colectiva está por via de regra na «contratualização» de prestações, que não é 
 posta em causa.
 Não é pois constitucionalmente ilegítima a determinação que se contém na norma 
 do artigo 2.º do diploma anexo ao Decreto‑Lei n.º 64‑A/89, visto que por ela o 
 legislador concretiza uma ampla competência de conformação sem negar a 
 existência de um «objecto possível» da contratação colectiva.
 Assim, não constituindo dimensão deste direito fundamental o direito efectivo à 
 contratação colectiva sempre que estiverem em causa regras atinentes ao método e 
 forma de cálculo das pensões de aposentação, e, de igual modo, não resultando 
 qualquer aniquilamento virtual de tal direito pelo facto de tais matérias terem 
 sido reguladas, in casu, pela Lei n.º 1/2004 (e não através do mecanismo da 
 contratação colectiva), conclui-se pela não existência de inconstitucionalidade 
 material resultante de violação do artigo 56.º, n.º 3, da Constituição.
 Cumpre apreciar e decidir.
 II – Fundamentação
 
 3. A decisão recorrida negou provimento ao recurso interposto entendendo 
 tratar-se de questões que haviam sido já objecto de anterior pronúncia pelo 
 Tribunal Constitucional. 
 Com efeito, no que diz respeito ao recurso interposto ao abrigo do artigo 70.º, 
 n.º 1, alínea f), bem como à inconstitucionalidade material por violação dos 
 princípios do estado de direito, da confiança, da protecção contra o arbítrio e 
 da certeza e segurança jurídicas, conclui-se que essas questões foram já 
 expressamente apreciadas e decididas nos Acórdãos n.ºs 374/2004 e 302/2006, 
 publicados, respectivamente, no Diário da República, II Série, de 30 de Junho de 
 
 2004 e 12 de Junho de 2006. De igual modo, os fundamentos enunciados no Acórdão 
 n.º 99/99, publicado no Diário da República, II Série, de 31 de Março de 1999, 
 são mobilizáveis para a apreciação da questão de constitucionalidade supra 
 referida.
 
 4. Assim, e na medida em que a reclamação deduzida também expressamente o 
 reconhece, é de manter a decisão proferida de rejeição do recurso interposto no 
 que respeita à questão da ilegalidade por violação de lei com valor reforçado 
 bem como à questão de constitucionalidade atinente à violação dos princípios do 
 estado de direito, da confiança, da protecção contra o arbítrio e da certeza e 
 segurança jurídicas.
 Já no que se refere à invocada violação do direito fundamental à contratação 
 colectiva, entende-se ser de deferir a reclamação apresentada e revogar o 
 despacho proferido na parte em que, considerando tratar-se de questão simples, 
 apenas se remeteu para o Acórdão n.º 581/95, assim se rejeitando o recurso 
 interposto.
 III – Decisão
 
 5. Face ao exposto acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal 
 Constitucional, deferir a reclamação apresentada e ordenar que o recurso siga os 
 ulteriores termos.
 Sem custas.
 
  
 Lisboa, 1 de Julho de 2008 
 José Borges Soeiro
 Gil Galvão
 Rui Manuel Moura Ramos