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Processo n.º 57/08
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
 
 
             Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
             1. O relator proferiu a seguinte decisão, ao abrigo do n.º 1 do 
 artigo 78.º-A da LTC:
 
 “1. A., B. e mulher, C., e D., instauraram no Tribunal Judicial da Comarca do 
 Montijo, contra E. e outros, todos melhor identificados nos autos, acção 
 declarativa, com processo sumário, pedindo que se declare que são proprietários 
 do prédio urbano sito na Av. …., em … …, tendo constituída a seu favor o direito 
 de servidão de passagem sobre o prédio dos réus, com ele confiante, e que se 
 condene os réus a reconhecer esse direito e a, de qualquer forma, não obstruir o 
 seu exercício, nomeadamente, removendo o veículo que colocaram no corredor de 
 passagem, bem como a pagarem-lhes uma indemnização, a liquidar em execução de 
 sentença, pelos prejuízos decorrentes dessa conduta.
 Por sentença do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca do Montijo foi a acção 
 declarada parcialmente procedente, declarando-se os autores proprietários do 
 prédio em causa, e os réus absolvidos do demais peticionado.
 Desta decisão apelaram os autores, vindo o Tribunal da Relação de Lisboa, por 
 acórdão de 13 de Maio de 2004, a negar provimento ao recurso, confirmando a 
 sentença recorrida.
 Inconformados com este aresto, e após decisão do agravo referente ao incidente 
 relativo da notificação do acórdão da Relação (cf. acórdão de fls. 349 e segs.), 
 interpuseram os autores recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual foi 
 admitido por despacho do relator na Relação, de 5 de Dezembro de 2006 (cf. fls. 
 
 368).
 
 2. Recebidos os autos no Supremo Tribunal de Justiça, o relator, em 15 de Maio 
 de 2007, lavrou o seguinte despacho:
 
  
 
 «I – Pelo requerimento de fls. 366, os AA A. e outros vieram requerer revista do 
 Acórdão da Relação de Lisboa, que constitui fls. 284 e segs. Dos autos, 
 fundando-se, para tal, em ofensa de casos julgados.
 E, porque se mostra de manifesta evidência a inadmissibilidade do aludido 
 recurso, ao abrigo do disposto no art. 3.º, n.º 3 do CPC, entende-se por 
 desnecessário o cumprimento do art. 704.º do mesmo diploma.
 II – Com efeito, tendo a presente acção sido instaurada em 26/03/1998, e 
 ascendendo o seu valor a € 7.481,97, é manifesto que a decisão impugnada se não 
 enquadra no pressuposto processual geral vertido no n.º 1 do art. 678º do CPC – 
 arts. 305º, n.º 2 desta codificação, 20º, n.º 1 da LOTJ e 24º, n.º 3 da LOFTJ -, 
 pelo que, consequentemente, a sua admissibilidade apenas se poderia acolher no 
 disposto no n.º 2 daquele citado art. 678º da codificação adjectiva. 
 Ora, há lugar a ofensa de caso julgado material, excluída que se mostra, desde 
 logo, a arguição da violação de caso julgado formal – art. 672º do CPC -, quando 
 a decisão impugnada tenha contrariado uma decisão anterior já transitada em 
 julgado, o que tem lugar, quando a decisão recorrida seja contrária a outra 
 proferida em momento anterior, devidamente transitada em julgado, em que sejam 
 as mesmas as partes intervenientes, que incida sobre o mesmo objecto e que se 
 mostre apoiada na mesma causa de pedir – arts. 498º e 671º, n.º 1 do CPC e 
 Manual do Cons. Amâncio Ferreira, pág. 104. 
 Assim, nas alegações apresentadas, os recorrentes vêm alegar que a decisão 
 proferida na 1a instância, e confirmada pela Relação, ofendeu dois casos 
 julgados, sendo um constituído pela sentença homologatória da desistência dos 
 pedidos, proferida na acção n.º 28/1966, e o restante pela sentença prolatada na 
 acção n.º 102/1961. 
 Ora, na presente acção, foi proferida sentença, em que foi declarado serem os AA 
 proprietários plenos do prédio urbano sito na Av. …., em … … , descrito sob o 
 n.º 15983 da freguesia de …., fls. 131 do Livro B-44 da Conservatória do Registo 
 Predial do Montijo, e absolvidos os RR dos demais pedidos formulados, entre os 
 quais se contava a declaração de que os AA têm legalmente constituído, a favor 
 daquele seu prédio, um direito de servidão de passagem (ou de trânsito), sobre o 
 prédio dos RR, com que confina a norte, sendo esse direito de servidão 
 consubstanciado num corredor de passagem. 
 Por seu turno, na invocada acção n.º 102/61, e conforme expressamente consta a 
 certidão junta pelos AA, a decisão proferida foi a seguinte: 
 Julgando a acção em parte procedente se condenam os réus F. e mulher e G. e 
 mulher a taparem a janela e as portas e a absterem-se de passar pelo corredor, e 
 julgando-a improcedente no restante, se absolvem os réus D., H., I., J., K. e 
 suas esposas dos pedidos de se absterem de passar pelo corredor e de indemnizar 
 os autores. 
 
 - fls. 29. 
 Constata-se, assim, e desde logo, que, numa sentença homologatória da 
 desistência do pedido, não é proferida qualquer decisão de mérito sobre o mesmo, 
 pelo que, consequentemente, mostra-se manifestamente desfocada a sua invocação, 
 para efeitos da formação de caso julgado material sobre o objecto da lide. 
 Por outro lado, e no que respeita à restante decisão invocada, da apontada 
 transcrição da mesma não se extrai a declaração da constituição, ou 
 reconhecimento, pela via jurisdicional, da titularidade de uma qualquer servidão 
 de passagem em benefício do prédio dos AA. 
 E, ainda que, eventualmente, o tribunal haja fundado a decisão que proferiu, na 
 existência de tal direito de passagem, a força do caso julgado não se estende 
 aos fundamentos da sentença, que no corpo desta se situam entre o relatório e a 
 decisão final – Manual do Prof. Antunes Varela, pág. 714. 
 Assim, e atendendo a que a eficácia do caso julgado apenas cobre a parte 
 decisória da sentença – art. 659º, n.º 2, parte final, do CPC -, esta 
 constitutiva da resposta do tribunal à pretensão que lhe haja sido suscitada 
 pelo autor, e, em caso de reconvenção, também pelo réu, torna-se, portanto, de 
 manifesta evidência, a inexistência do fundamento invocado pelos recorrentes 
 para a interposição da presente revista. 
 III – Perante o que acaba de expor-se, e de acordo com o preceituado no art. 
 
 700º, n.º 1, al. e) do CPC, decide-se não tomar conhecimento do objecto do 
 recurso em causa.»
 
  
 Notificados deste despacho, reclamaram os recorrentes para a Conferência, nos 
 seguintes termos:
 
  
 
 «[…]
 Como é notório, os ora requerentes consideram-se muito prejudicados por esse 
 despacho.
 
  
 A) Quanto ao caso julgado, na Acção n.º 28/1966:
 Desde logo, com o maior respeito, não podem aceitar o entendimento de que uma 
 sentença homologatória da desistência do pedido não forma caso julgado material 
 sobre o objecto da lide, visto que nessa sentença não é proferida qualquer 
 decisão de mérito sobre o pedido.
 Com efeito, conforme ensina o Insigne Professor Alberto dos Reis, no seu 
 
 “Comentário ao Código de Processo Civil”, vol. 3.º, em anotação ao então artigo 
 
 298.º, em parte transcrita na Alegação de recurso,
 
 “A desistência do pedido, a confissão e a transacção exercem a mesma função que 
 a sentença de mérito: como esta, põem termo à causa, compondo-a”.
 
 “O conflito de interesses, traduzido na lide ou na relação substancial em 
 litígio, fica resolvido e arrumado mediante qualquer desses actos”.
 
 “Se o juiz entende que o acto é regular, homologa-o, julga-o válido, de sorte 
 que a lide fica arrumada e resolvida em conformidade com a manifestação de 
 vontade emitida pela parte ou pelas partes”.
 
 “O autor, desistindo, renuncia ao direito que se arrogara contra o réu, e não 
 pode, por isso, propor nova acção sobre o mesmo objecto”.
 
  Quer dizer, a sentença homologatória da desistência do pedido recai sobre a 
 relação jurídica substancial, ou seja, sobre o mérito da causa, formando, assim, 
 um caso julgado material.
 
  
 B) Quanto ao caso julgado, na Acção n.º 102/1961:
 Os réus D. (já falecido) e a sua Mulher, a ora requerente A., foram absolvidos 
 dos pedidos de se absterem de passar pelo corredor e de indemnizar os autores.
 Ora, é uma necessidade lógica-jurídica, e, aliás, resulta da sentença, que estes 
 réus foram absolvidos desses pedidos precisamente por o tribunal ter reconhecido 
 que eles têm um direito de servidão de passagem sobre tal corredor, em benefício 
 do seu prédio.
 E nem se diga que a força de caso julgado não se pode estender aos fundamentos 
 da sentença.
 Como ensina o mesmo Mestre, Professor Alberto dos Reis, nomeadamente no seu 
 
 “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V., em anotação ao artigo 672.º:
 
 “Já tivemos ensejo de assinalar que deve receber-se com grandes reservas e 
 limitações a proposição de que o caso julgado está na decisão e não nos 
 fundamentos (veja-se o vol. 3º, pág. 143; veja-se, também, a Rev. de Leg., 75.º, 
 pág. 145); por vezes os fundamentos constituem outras tantas decisões, 
 susceptíveis de adquiri a força de caso julgado”.
 
 É a situação desses autos, em que o tribunal teve de julgar que esses réus têm 
 um direito de servidão de passagem sobre o corredor, antes de  proferir a 
 decisão sobre o pedido da Acção.
 Vejam-se os exemplos dados por esse Ilustre Professor.
 Neste sentido, de que o caso julgado se estende aos fundamentos, que sejam 
 pressuposto necessário, ou antecedente lógico indispensável à emissão da parte 
 dispositiva do julgado, ver, ainda, e jurisprudência, v.g., Ac. S.T.J. de 
 
 23/10/1986, no Bol. n.º 360, pág. 609, Ac. S.T.J. de 29/6/1976, no Bol. n.º 258, 
 pág. 220, e o Ac. S.T. Adm., em Tribunal Pleno, de 31/10/1990, em “Acórdãos 
 Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo”, n.º 365, pág. 625; etc.
 Nestes termos, por se verificarem, efectivamente, dois casos julgados, o, aliás, 
 douto despacho do Exmo. Juiz Relator deve ser revogado, e o recurso de Revista 
 deve vir a ser julgado totalmente procedente, com as legais consequências.»
 
  
 
        Por acórdão de 9 de Outubro de 2007, o Supremo Tribunal de Justiça, 
 decidindo em conferência, confirmou o despacho do relator, no sentido do não 
 recebimento da revista interposta pelos autores, com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «II - …, tendo a presente acção sido instaurada em 26/03/1998, e ascendendo o 
 seu valor a € 7.481,97, é manifesto, que, na sequência deste, a decisão 
 impugnada se mostra insusceptível de enquadramento no princípio geral vertido no 
 n.º 1 do art. 678º do CPC, por inexistência do requisito respeitante ao valor da 
 causa, exigível para a admissão de um qualquer recurso ordinário – arts. 305º, 
 n.º 2 desta última codificação, 20º, n.º 1 da LOTJ e 24º, n.º 3 da LOFTJ –, pelo 
 que, consequentemente, apenas, e exclusivamente, no âmbito da excepção prevista 
 no n.º 2 daquele citado art. 678º da codificação adjectiva se poderia acolher a 
 sua admissibilidade, uma vez que, neste último apontado normativo se consigna 
 que o recurso é sempre admissível, independentemente do valor da causa, no caso 
 do seu fundamento se radicar na ofensa de caso julgado. 
 Com efeito, há lugar a ofensa do caso julgado material, excluída que se mostra, 
 desde logo, uma qualquer eventual arguição da violação do caso julgado formal – 
 art. 672º do CPC –, quando a decisão impugnada seja contrária a outra decisão 
 anterior, já transitada em julgado, em que sejam as mesmas as partes 
 intervenientes, que incida sobre o mesmo objecto e que se mostre fundada na 
 mesma causa de pedir – arts. 497º, 498º e 671º, n.º 1 do CPC e Manual do Cons. 
 Amâncio Ferreira, pág. 104. 
 Ora, nas alegações apresentadas, os recorrentes vêm invocar que a decisão 
 proferida na 1ª instância, e confirmada pela Relação, ofendeu dois casos 
 julgados, um constituído pela sentença homologatória da desistência dos pedidos, 
 proferida na acção n.º 28/1966, e o restante pela sentença prolatada na acção 
 n.º 102/1961. 
 Temos, portanto, que, na sentença, que os recorrentes pretendem ver sindicada 
 por este Supremo, foi reconhecida a propriedade plena daqueles, relativamente ao 
 prédio urbano sito na Av. …., em …., descrito sob o n.º 15983 da freguesia de …, 
 fls. 131 do Livro B-44 da Conservatória do Registo Predial do Montijo, tendo os 
 RR sido absolvidos dos demais pedidos formulados, entre os quais, e para o que 
 aqui ora releva, se inseria o respeitante à declaração de que os AA têm 
 legalmente constituído um direito de servidão de passagem (ou de trânsito), a 
 favor daquele seu prédio e sobre o prédio dos RR, com que confina a norte, 
 direito de servidão esse consubstanciado num corredor de passagem. 
 Por seu turno, na invocada acção n.º 102/61, instaurada pelos antecessores dos 
 ora RR contra os antecessores dos aqui AA e outros, e em que o pedido para aqui 
 relevante se consubstanciava na condenação dos últimos a absterem-se de passar 
 pelo prédio dos primeiros, acção esta em que pelos respectivos AA foi alegado, 
 que os demandados passaram a fazer caminho por uma faixa de terreno que faz 
 parte daquele seu prédio, a decisão proferida, após a rectificação a que foi 
 sujeita, assumiu o seguinte teor: 
 Julgando a acção em parte procedente se condenam os réus F. e mulher e G. e 
 mulher a taparem a janela e as portas e a absterem-se de passar pelo corredor, e 
 julgando-a improcedente no restante, se absolvem os réus D., H., I., J., K. e 
 suas esposas dos pedidos de se absterem de passar pelo corredor e de indemnizar 
 os autores. - fls. 22v e 29. 
 Por outro lado, na acção n.º 28/66, instaurada, igualmente, pelos antecessores 
 dos ora RR contra os antecessores dos ora AA, e em que aqueles peticionaram a 
 condenação dos últimos, e na parte, que ora, e para aqui, se mostra relevante, a 
 absterem-se de passar pelo terreno, que, pertencendo ao prédio dos nela AA, 
 corre ao longo do dos RR naquela acção, pelo lado norte, e estes, 
 reconvencionamente, peticionaram o pagamento de uma indemnização, a sentença na 
 mesma proferida traduziu-se na homologação da transacção lavrada entre as 
 partes, através da qual as mesmas desistiram dos pedidos que haviam 
 reciprocamente formulado. 
 Constata-se, portanto, que, em nenhuma das apontadas acções foi suscitada pelos 
 ora AA/recorrentes, e a título reconvencional, já que, naquelas, sempre qualquer 
 outro meio para tal lhes estava vedado, a declaração jurisdicional respeitante à 
 existência de um direito de servidão em benefício do prédio de que são 
 titulares, uma vez que, a constituição de tal direito real não decorre do 
 conteúdo das decisões nas mesmas proferidas, e antecedentemente enunciadas, já 
 que, em ambas, a causa de pedir invocada se consubstanciava, apenas, no direito 
 de propriedade dos respectivos demandantes sobre um corredor, com cerca de 1,5 m 
 de largura, existente ao longo da extrema sul do seu prédio, e, o pedido, 
 traduziu-se no consequente reconhecimento de tal direito, com a daí decorrente 
 reivindicação do seu uso e fruição exclusivas. 
 E, ainda que, na sentença proferida na acção 102/61 se faça alusão à existência 
 de uma servidão de trânsito, em benefício do prédio situado a nascente do dos 
 então AA – fls. 28 –, tal asserção foi utilizada, apenas, como fundamento, para 
 a improcedência do pedido por aqueles deduzido, relativamente à condenação dos 
 então RR, de se absterem de passar pelo aludido corredor, pelo que, tal 
 fundamentação, por necessariamente alheia ao específico conteúdo decisório da 
 sentença – art. 661º, n.º 1 do CPC –, não pode revestir força de caso julgado. 
 Com efeito, e como se extrai do estatuído nos arts. 659º, n.º 2, parte final, 
 
 671º, n.º 1 e 673°, primeira parte, do CPC, a força obrigatória do caso julgado 
 apenas cobre a decisão proferida sobre a relação material controvertida, a qual 
 se expressa na parte conclusiva da sentença, constituída pela decisão final, uma 
 vez que, a força do caso julgado não se estende aos fundamentos da sentença, que 
 no corpo desta se situam entre o relatório e a decisão final, já que os factos 
 considerados como provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se 
 isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair 
 deles outras consequências, além das contidas na decisão final, como, 
 igualmente, ocorre quanto às relações jurídicas prejudiciais – Manual do Prof. 
 Antunes Varela, pág. 714, 716 e 717. 
 Temos, pois, que, inexistindo nas sentenças invocadas pelos recorrentes, 
 qualquer decisão expressa contemplando o reconhecimento da constituição de uma 
 servidão de passagem, em benefício do seu prédio, e onerando o prédio dos RR, 
 mostra-se, consequentemente, inverificada, a ocorrência do fundamento aduzido 
 para a admissibilidade do recurso interposto.»
 Em 26 de Outubro de 2007, vieram os recorrentes arguir a nulidade deste aresto, 
 ao abrigo do artigo 668.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, e 
 invocar a inconstitucionalidade dos artigos 698.º, n.º 2, e 724.º do mesmo 
 código, na interpretação que implicitamente lhes foi dada pelo acórdão 
 recorrido, no sentido de decidir pela inadmissibilidade do recurso de Revista, 
 apesar de ter sido admitido pelo Tribunal da Relação (cf. requerimento de fls. 
 
 402 e 403).
 
        Por acórdão de 13 de Dezembro de 2007, o Supremo Tribunal de Justiça 
 indeferiu a reclamação, não conhecendo da questão de constitucionalidade, por 
 entender que não foi suscitada em tempo nem tinha que ser conhecida 
 oficiosamente pelo Supremo, dada a sua manifesta inexistência.
 
 3. Notificados deste aresto vieram os recorrentes, A. e outros, interpor recurso 
 para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º 
 da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, com os seguintes fundamentos [segue 
 transcrição do requerimento de interposição de recurso]:
 
  
 
 « […]
 Com efeito, é consabido, é um facto notório, consagrado pela Doutrina e 
 Jurisprudência, que deve sempre admitir-se o recurso com o fundamento em ofensa 
 de caso julgado, quando o recorrente faça a invocação, com seriedade e 
 verosimilhança, sendo questão de fundo, ou seja de procedência, a apurar 
 ulteriormente, o saber se houve ou não essa ofensa (cf. v.g., Prof. Alberto dos 
 Reis, no seu Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 370, edição de 1952, 
 em anotação ao artigo 690º; Rodrigues Bastos, em “Notas”, 3º, pág. 279; Revista 
 dos Tribunais, 87º, pág. 318; Ac. S.T.J. de 25/03/1969, no Bol. nº 185, pág. 
 
 232; etc.). 
 Acresce que é Jurisprudência corrente que a autoridade de caso julgado, para 
 além da decisão, se estende à resolução das questões preliminares que sejam 
 antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado (cf.. 
 v.g., os notáveis Ac. S.T.J. de 24/11/1977, no Bol. nº 271, pág. 172; de 
 
 29/06/1976, no Bol. nº 258, pág. 220; de 20/06/1978, no Bol. nº 278, pág. 149; 
 de 21/02/1980, no Bol. nº 294, pág. 258; de 23/10/1986, no Bol. nº 360, pág. 
 
 609; de 10/07/1997, em Colectânea de Jurisprudência (S.T.J.), vol. II, pág. 165; 
 etc.). 
 Portanto, com o maior Respeito, já pelas razões invocadas na Alegação de 
 Recurso, já pelas razões acabadas de expor, considera-se indubitável o dever de 
 ser admitido o Recurso. 
 Aliás, foi essa a posição do Tribunal da Relação que, admitiu o Recurso de 
 Revista, apesar de, anteriormente ter decidido não se verificarem os casos 
 julgados invocados. 
 Porém, o Excelentíssimo Conselheiro Relator, afirmando mostrar-se manifesta 
 evidência a inadmissibilidade do Recurso, ao abrigo do disposto no artigo 3º, nº 
 
 3, do C.P.Civil, entendeu desnecessário o cumprimento do artigo 704° do mesmo 
 diploma. 
 Ora, em ambas essas disposições legais é imposto o cumprimento do princípio do 
 contraditório, sendo certo que no artigo 704° essa imposição é mesmo feita em 
 termos absolutos (“… o Relator antes de proferir decisão, ouvirá, cada uma das 
 partes, pelo prazo de 10 dias”). 
 O Excelentíssimo Juiz Relator ao proferir decisão – confirmada em Conferência – 
 sem ouvir cada uma das partes, violou o princípio do contraditório, que está 
 abrangido no princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2° da 
 Constituição da República. 
 Assim, os artigos 3º, nº 3 e 704º do C.P.Civil, supracitados, são 
 inconstitucionais, na interpretação, expressa ou implícita, que lhes foi dada, 
 por violarem, nomeadamente, o aludido artigo 2° da Constituição. 
 
 É imperativo, lógico e jurídico, consagrado pelo Tribunal Constitucional, que, 
 
 “E inexigível à parte que suscite, antes da prolação da decisão, a 
 inconstitucionalidade de uma norma com cuja aplicação não podia razoavelmente 
 contar, ou de uma interpretação normativa imprevisível”
 
 (cf.. V.g., Acórdão do Tribunal Constitucional de 17/10/1995, no Bol. nº 451 
 
 (suplemento), pág. 474; etc.). 
 Foi isso que aconteceu no caso dos autos, em que os ora recorrentes foram 
 totalmente surpreendidos com a decisão do S.T.J., pelo que têm que ser 
 interpretados, em conformidade, o artigo 70º, nº 1,alínea b) e o artigo 75º-A, 
 ambos da Lei do Tribunal Constitucional. 
 De resto, embora, em abstracto e em generalidade, o artigo 687º, nº 4, do 
 C.P.Civil, afirme que a decisão que admite o recurso não vincula o Tribunal 
 Superior, a verdade é que, no caso concreto, não podia o S.T.J. vir a decidir 
 não admitir o recurso. 
 
 É que o S.T.J. não refutou a decisão da Relação que admitiu esse recurso, nem 
 lhe fez qualquer referência, o que devia ter sido feito, uma vez que a decisão 
 da Relação é, obviamente, uma decisão jurisdicional, com força, autoridade, e 
 prestígio, institucionais. 
 E, ainda, porque não tendo o S.T.J. cumprido o artº 704º do C.P.Civil, quando 
 conheceu da questão da admissibilidade do recurso, conheceu de questão de que 
 não podia tomar conhecimento. 
 Em face das inconstitucionalidades, supracitadas, - que devem ser declaradas — 
 deve ser revogado o Ac. S.T.J., que, em Conferência, confirmou o despacho do 
 Exmo. Conselheiro Relator, no sentido do não recebimento da Revista interposta, 
 e, em consequência, deve ser ordenado que o S.T.J. receba a Revista e conheça do 
 objecto do Recurso, em harmonia com a Alegação dos ora recorrentes, na qual, 
 aliás, também, foi alegada a inconstitucionalidade de várias normas, na 
 interpretação expressa ou implícita, que lhes foi dada pelo douto Acórdão da 
 Relação.»
 
 4. Não se encontrando o Tribunal Constitucional vinculado pela decisão que 
 admitiu o recurso – n.º 3 do artigo 76.º da Lei n.º 28/82 – entende-se não poder 
 conhecer do objecto do recurso, sendo caso de proferir decisão sumária, nos 
 termos do n.º 1 do artigo 78.º-A do mesmo diploma.
 Com efeito, tratando‑se de recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70.º da LTC – como ocorre no presente caso –, a sua admissibilidade 
 depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de 
 inconstitucionalidade haver sido suscitada durante o processo, de modo 
 processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão 
 recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (n.º 2 do artigo 
 
 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio 
 decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo 
 recorrente.
 
 5. Não está em causa no presente recurso o conhecimento da questão de 
 constitucionalidade reportada à interpretação das normas dos artigos 698.º, n.º 
 
 2, e 724.º, do Código de Processo Civil, suscitada pelos recorrentes no 
 requerimento de arguição de nulidades do acórdão de 9 de Outubro de 2007, desde 
 logo, porque não foi incluída no objecto do recurso. Nem, tão pouco, a 
 apreciação do acerto da decisão recorrida quanto à aplicação do direito 
 ordinário ao caso concreto, a qual, como se sabe, não pode ser objecto de 
 recurso de constitucionalidade.
 O que os recorrentes pretendem é a apreciação da constitucionalidade das normas 
 dos artigos 3.º, n.º 3, e 704.º, do Código de Processo Civil, na interpretação 
 dada pelo Juiz relator no Supremo Tribunal de Justiça, ou seja, no sentido de 
 dispensar a audição das partes antes de decidir da admissibilidade do recurso.
 Efectivamente, no despacho de 15 de Maio de 2007, o relator no Supremo Tribunal 
 de Justiça dispensou a audição das partes, ao abrigo dos mencionados preceitos, 
 por entender que era “de manifesta evidência a inadmissibilidade do aludido 
 recurso”.
 Ora, na reclamação para a conferência que os recorrentes apresentaram em reacção 
 a este despacho, limitaram-se a discordar dos argumentos aduzidos pelo relator 
 no sentido da inverificação da “ofensa do caso julgado”, que constituía o 
 fundamento invocado para a admissibilidade do recurso. Não colocaram perante a 
 conferência a questão de não terem sido ouvidos antes da decisão do relator.
 Assim, o acórdão da conferência de 9 de Outubro de 2007, apenas decidiu se 
 ocorria nos autos o pressuposto invocado da admissibilidade do recurso ao abrigo 
 do n.º 2 do artigo 678.º do Código de Processo Civil – “ofensa do caso julgado” 
 
 –, tendo concluído pela não verificação deste fundamento do recurso e, por 
 conseguinte, mantido o despacho reclamado.
 Deste modo, este acórdão não se pronunciou sobre a questão da falta da prévia 
 audição das partes, como os recorrentes parecem querer afirmar no seu 
 requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional.
 
 6. Ora, independentemente de se indagar se a decisão do relator, relativamente à 
 dispensa de audição das partes, ao abrigo dos artigos 3.º, n.º 3 e 704.º do 
 Código de Processo Civil, transitou em julgado, por não ter sido impugnada na 
 reclamação para a conferência, ou se os recorrentes têm, efectivamente, 
 legitimidade para colocar tal questão, porquanto, apesar de inicialmente não 
 terem sido ouvidos sobre a “inadmissibilidade do recurso de revista”, puderam à 
 posteriori, uma vez notificados do despacho do relator, aduzir perante a 
 conferência (que era afinal o órgão com competência final para decidir tal 
 questão) os seus argumentos a favor da admissibilidade do recurso, questões 
 estas que conduziriam à não admissibilidade do recurso de constitucionalidade, 
 certo é que não pode tomar-se conhecimento do objecto do recurso porque os 
 recorrentes não suscitaram durante o processo a inconstitucionalidade das normas 
 em causa.
 
 É certo que o Tribunal Constitucional entende ser dispensável este pressuposto 
 
 (suscitação da questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido, 
 antes de proferida a decisão impugnada) naquelas situações, de todo 
 excepcionais ou anómalas, em que o recorrente não dispôs de oportunidade 
 processual para suscitar a questão de constitucionalidade antes de proferida 
 a decisão recorrida ou em que, tendo essa oportunidade, não lhe era exigível que 
 suscitasse então a questão de constitucionalidade.
 Porém, tais situações não ocorreram no caso dos autos porque, com a prolação do 
 despacho do relator a dispensar a audição das partes, tomaram os recorrentes 
 conhecimento da aplicação das normas dos artigos 3.º, n.º 3, e 704.º do Código 
 de Processo Civil. Tiveram oportunidade processual e tinham o ónus de suscitar a 
 sua inconstitucionalidade na reclamação para a conferência que deduziram contra 
 o despacho do relator, para acautelarem o eventual recurso de 
 constitucionalidade, mas não o fizeram.
 Deste modo, não tendo sido suscitada durante o processo a questão de 
 constitucionalidade das normas cuja apreciação em sede de recurso de 
 constitucionalidade se pretende que seja feita, e tendo os recorrentes disposto 
 de oportunidade processual para o efeito, não pode tomar-se conhecimento do 
 objecto do recurso.
 
 7. Nestes termos, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei nº 28/82, de 15 de 
 Novembro, decide-se não tomar conhecimento do objecto do recurso.
 Custas a cargo dos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 7 unidades de 
 conta, sem prejuízo do apoio judiciário concedido nos autos.”
 
  
 
  
 
             2. Os recorrentes reclamaram desta decisão, ao abrigo do n.º 3 do 
 artigo 78.º-A da LTC, sustentando, em síntese, que não tinham o ónus de suscitar 
 a questão de constitucionalidade na reclamação do despacho do relator para a 
 conferência, uma vez que o meio previsto no n.º 3 do artigo 700.º do CPC se 
 destina a obter decisão por parte do órgão colectivo titular do poder 
 jurisdicional, não tendo o reclamante de motivar a sus discordância com o 
 despacho do relator, bastando-lhe requerer que a conferência se pronuncie.
 
  
 
 3. A reclamação é manifestamente infundada.
 
  
 Pode discutir-se, de modo genérico, se o reclamante tem o ónus de substanciar as 
 razões da sua divergência relativamente à decisão do relator ou se lhe basta 
 requerer, sem mais, que “sobre a matéria do despacho recaia um acórdão”, sem 
 necessidade de explicitação das razões da divergência. Porém, seja qual for a 
 interpretação que se adopte quanto à interpretação do regime do n.º 3 do artigo 
 
 700.º do Código de Processo Civil, a questão de constitucionalidade tem sempre 
 de ser colocada à conferência (quando anteriormente o não tiver sido), porque o 
 que está em causa é o cumprimento do ónus de suscitação da questão de 
 constitucionalidade como pressuposto do recurso para o Tribunal Constitucional, 
 matéria que tem regime legal próprio. 
 Com efeito, a reclamação do despacho do relator integra o caminho necessário à 
 exaustão dos recursos ordinários (n.º 3 do artigo 70.º da LTC) e o requerente 
 tem o ónus de suscitar a questão de constitucionalidade de modo processualmente 
 adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida (n.º 2 do artigo 
 
 72.º da LTC). A exaustão dos meios ordinários não é imposta por razões meramente 
 formais, mas para permitir que as questões se resolvam na ordem jurisdicional 
 respectiva, quando o possam ser sem intervenção do Tribunal Constitucional. A 
 regra – aliás, coerente com a natureza da intervenção do Tribunal Constitucional 
 por via de recurso – é a de que a questão de constitucionalidade tem sempre de 
 ser colocada perante o órgão jurisdicional de que se recorre, antes de este 
 proferir a decisão impugnada. A dispensa da suscitação da questão perante o 
 tribunal que tenha proferido a decisão recorrida é já produto de um entendimento 
 jurisprudencial funcionalmente adequado deste ónus. Visa evitar que o acesso ao 
 Tribunal Constitucional fique vedado naquele casos, seguramente excepcionais ou 
 anómalos, em que o interessado não teve oportunidade real de o conhecer, seja 
 porque o processo, pela sua concepção ou pelas concretas vicissitudes da sua 
 condução, não tenha fornecido ao interessado oportunidade efectiva de expressar 
 o seu entendimento sobre a constitucionalidade da norma antes de ela ser 
 aplicada, seja porque tal aplicação (ou a adopção de certo sentido normativo) 
 não era previsível (pelo carácter surpreendente da aplicação ou da interpretação 
 adoptada), agindo de modo diligente. Ora, quando a norma ou o sentido normativo 
 inconstitucional é aplicado pela decisão do relator, o interessado tem 
 inquestionável oportunidade de chamar o órgão competente para a decisão final na 
 ordem jurisdicional respectiva a pronunciar-se mediante (e na) reclamação para a 
 conferência (cfr. neste sentido, Decisão Sumária n.º 539/99). O objectivo da 
 reclamação não é, somente, o de substituir uma decisão singular (do relator) por 
 uma decisão colectiva (da conferência), mas obter uma apreciação da questão de 
 constitucionalidade antes do recurso ao Tribunal Constitucional.
 Não o fazendo, como no caso sucedeu, não fica preenchido este pressuposto 
 específico do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade exigido 
 pela alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. Foi o que se decidiu e agora se 
 reitera.
 
  
 
             4. Decisão
 
  
 
             Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar os 
 reclamantes nas custas com 20 (vinte) UCs de taxa de justiça.
 Lisboa, 23 de Junho de 2008
 Vítor Gomes
 Ana Maria Guerra Martins
 Gil Galvão