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Processo nº 842/05
 
 2ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
  
 
  
 
    Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 A – Relatório
 
  
 
    1 – A., B. e C., todos identificados nos autos, recorrem para o Tribunal 
 Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei 
 n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), do acórdão proferido 
 pelo Pleno do Supremo Tribunal Administrativo (STA), de 5 de Julho de 2005, que 
 negou provimento ao recurso jurisdicional interposto do acórdão proferido pela 
 
 3ª Subsecção da Secção de Contencioso Administrativo, do mesmo STA, que, por seu 
 lado, negara provimento aos recursos contenciosos interpostos pelos mesmos 
 recorrentes do despacho n.º 40/2000, de 29 de Março, do Presidente do Tribunal 
 de Contas, que aprovou a lista de transição de pessoal para o Corpo Especial de 
 Fiscalização e Controlo, nas carreiras de Auditor, Consultor, Técnico 
 Verificador Superior e Técnico Verificador, do quadro da Direcção Geral do 
 Tribunal de Contas.
 
  
 
    2 – Os recorrentes pedem a apreciação da questão de inconstitucionalidade da 
 norma constante do art. 32º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 440/99, interpretada na 
 acepção de “distinguir entre os titulares de cargos dirigentes da Direcção Geral 
 do Tribunal de Contas (beneficiando os contadores-gerais e os contadores chefes 
 e excluindo os outros cargos dirigentes da regra automática de transição para as 
 carreiras do corpo especial)”, pretextando que a mesma viola “o princípio da 
 igualdade previsto no art. 13º da Constituição da República Portuguesa, uma vez 
 que a distinção operada não tem qualquer fundamento material razoável, objectivo 
 e racional”.
 
  
 
    3 – Alegando sobre o objecto do recurso, no Tribunal Constitucional, os 
 recorrentes concluíram o seu discurso argumentativo do seguinte jeito:
 
    
 
    «1ª O presente recurso vem interposto do Acórdão proferido pelo Pleno da 
 Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, em 5 de 
 Julho de 2005, na parte em que negou provimento ao recurso jurisdicional 
 interposto pelos Recorrentes, aplicando a norma constante do art. 32º, n.º 3 do 
 Decreto-Lei n.º 440/99, de 2 de Novembro;
 
  
 
 2ª Entendem, no entanto, os Recorrentes que a mencionada norma – que foi 
 aplicada pelo Supremo Tribunal Administrativo -, ao distinguir entre os 
 titulares de cargos dirigentes da Direcção-Geral do Tribunal de Contas 
 
 (beneficiando os contadores-gerais e os contadores-chefes e excluindo os outros 
 cargos dirigentes da regra automática de transição para as carreiras do corpo 
 especial) é inconstitucional por violação do princípio da igualdade previsto no 
 art. 13º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que a distinção 
 operada não tem qualquer fundamento material razoável, objectivo e racional.
 
  
 
 3ª Com efeito, diferentemente da regra geral de transição prevista nos números 1 
 e 2 do art. 32º do Decreto-Lei n.º 440/99, de 2 de Novembro, a regra de 
 transição ínsita no n.º 3 do art. 32º daquele diploma, assenta não num critério 
 funcional, mas num critério orgânico, em termos tais que a transição para as 
 carreiras de auditor e consultor opera de forma automática em virtude da 
 titularidade de um cargo dirigente, in casu, os cargos de contador-geral ou de 
 contador-chefe;
 
  
 
 4ª Ora, o que surpreende nesta norma é o facto de a mesma restringir os tipos de 
 cargo dirigente – apenas se aplica aos cargos de contador-geral ou de 
 contador-chefe -, excluindo outro tipo de cargos dirigentes – como é o caso dos 
 cargos de director de serviços e de chefe de divisão – sem que se consiga apurar 
 o critério que determinou que somente os detentores daqueles cargos fossem 
 contemplados na previsão da norma;
 
  
 
 5ª Aliás, ao dispor nesse sentido, a norma do art. 32º, n.º 3, do Decreto-Lei 
 n.º 440/99 acaba mesmo por violar o princípio previsto no art. 30, n.º 2, al. M) 
 da Lei n.º 98/97, de acordo com o qual, todo o pessoal dirigente da 
 Direcção-Geral (e dos serviços de apoio das secções regionais), sem excepção, 
 deveria integrar o corpo especial de fiscalização e controlo.
 
  
 
 6ª Não foi este, no entanto, o entendimento do Tribunal “a quo”. Com efeito, de 
 acordo com o Acórdão recorrido, a distinção entre os titulares de cargos 
 dirigentes da DGTC, prevista na norma do n.º 3 do art. 32º do Decreto-Lei n.º 
 
 440/99, fundar-se-ia numa alegada diferença de conteúdo funcional entre os 
 cargos de contador-geral/director de serviços e contador-chefe/chefe de divisão;
 
  
 
 7ª Ora, e salvo o devido respeito, ao distinguir o cargo de contador-geral e de 
 contador-chefe dos cargos de director de serviços e chefe de divisão com base 
 numa alegada diferença entre funções de apoio técnico-operativo e funções 
 instrumentais, o Tribunal recorreu a conceitos que, claramente, não existiam – 
 pelo menos com esse sentido -, na DGTC antes da entrada em vigor do Decreto-Lei 
 n.º 440/99;
 
  
 
 8ª Exemplo do que se acaba de dizer é, desde logo, o facto de à data da entrada 
 em vigor do Decreto-Lei nº 440/99 existirem contadores-gerais e 
 contadores-chefes na DGTC também com funções instrumentais;
 
  
 
 9ª Com efeito, basta atentar na Contadoria-Geral dos Serviços Administrativos e 
 no Gabinete de Estudos que eram chefiados por contadores-gerais e cujas 
 contadorias estavam a cargo de contadores-chefes (cfr. Artigos 3º, números 1 e 
 
 2, 4º do Decreto-Lei n.º 56/79, de 29 de Março, e artigos 26º e 29º do 
 Decreto-Lei n.º 478/80, de 15 de Outubro).
 
  
 
 10ª O que acabámos de escrever decorre dos próprios diplomas aplicáveis, não 
 carecendo, portanto, de prova;
 
  
 
 11ª Houve assim dirigentes que, independentemente do tipo de funções exercidas, 
 foram desde logo abrangidos pela regra de transição automática prevista no n.º 3 
 do art. 32º do Decreto-Lei n.º 440/99, ou seja os contadores-gerais e 
 contadores-chefes, enquanto que outros dirigentes, como os Recorrentes, não o 
 foram simplesmente porque a denominação do seu cargo dirigente era diferente 
 daqueles;
 
  
 
 12ª Não existe, assim, nenhum fundamento material para a diferença de tratamento 
 prevista na norma do n.º 3 do art. 32º do Decreto-Lei n.º 440/99 entre os cargos 
 de contador-geral e contador-chefe e director de serviços e chefe de divisão, 
 respectivamente;
 
  
 
 13ª O arbítrio da distinção efectuada é tanto ou mais evidente quando se 
 constata que a criação de cargos dirigentes com a denominação específica de 
 contador-geral e contador-chefe na DGTC tem a sua origem na história do próprio 
 Tribunal e dos seus serviços de apoio, tendo-se tentado, ao longo dos anos, que 
 estes cargos fossem equiparados a director de serviços e chefe de divisão;
 
  
 
 14ª Deste modo, a norma do art. 32º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 440/99 é 
 inconstitucional por violação do princípio da igualdade, previsto no art. 13º da 
 Constituição.
 
  
 Nestes termos, e nos demais de Direito aplicáveis e com o douto suprimento de V. 
 Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso de constitucionalidade 
 e revogar-se o acórdão recorrido, com a todas as legais consequências».
 
  
 
    
 
  
 
    4 – Por seu lado, a autoridade recorrida contra-alegou defendendo o juízo de 
 não inconstitucionalidade, feito pelo acórdão recorrido, e concluindo do 
 seguinte modo:
 
  
 
 «1ª -       Os nºs 1, 2, 3, 4 e 6 do DL n.º 440/99, aprovam o critério de 
 transição para as carreiras do corpo especial de fiscalização e controlo da 
 DGTC, ou seja, as carreiras de auditor, consultor e de técnico verificador 
 superior.
 
 2ª -         A normação contida naquele preceito legal respeita à transição para 
 as aludidas carreiras dos técnicos superiores.
 
 3ª -         O n.º 3 do mesmo normativo legal contém uma presunção legal, qual 
 seja a de que, do facto da titularidade dos cargos de contador-geral e 
 contador-chefe por técnicos superiores, deve retirar-se a ilação inilidível de 
 que estes exercem as funções das referidas carreiras do corpo especial de 
 fiscalização e controlo, previstas nos nºs 1 e 2 do artigo 32º daquele diploma 
 legal.
 
 4ª -         O recorrente A. esteve sempre ligado aos serviços de informática, a 
 recorrente B., aos serviços de biblioteca e arquivo e o recorrente C., aos 
 serviços de gestão de pessoal (cfr. Acórdão, al. G) da matéria de facto dada 
 como assente, pág. 16).
 
 5ª -         Estes recorrentes não exerciam, pois, funções de controlo, 
 auditoria da gestão financeira (referida al. G) da matéria de facto dada como 
 assente).
 
 6ª -         As funções dos cargos de contador-geral e contador-chefe integram 
 as áreas dos departamentos de apoio técnico operativo, diferentemente das 
 funções dos recorrentes, uma vez que estas se inscrevem nas áreas dos 
 departamentos de apoio instrumental (cfr. Art. 30º, n.º 2, als. A) a c) da Lei 
 n.º 98/97, de 26/8, e art. 5º, n.º 2, als. A) a e) do DL n.º 440/99).
 
 7ª -         A transição prevista no n.º 3 do art. 32º do DL n.º 440/99, 
 assenta, como igualmente assentam as previstas nos nºs 1 e 2 do mesmo preceito, 
 num “critério funcional” e não, como em erro pretendem os recorrentes, em 
 qualquer “critério orgânico” (artigos 30, nºs 2, als. A), b) e c) da Lei nº 
 
 98/97, e artigos 5º, nºs 2, 3 e 4 e 32º, nºs 1, 2, 3, 4 e 6 do DL n.º 440/99).
 
 8ª -         Face ao que antecede, o pressuposto material necessário da 
 transição para as carreiras do corpo especial de fiscalização e controlo da DGTC 
 
 é o exercício de funções de apoio técnico-operativo, por técnicos superiores, 
 presumindo-se que as exercem os técnicos superiores titulares dos cargos de 
 contador-geral e contador-chefe.
 
 9ª -         Os recorrentes pretendem discutir neste alto Tribunal, através das 
 conclusões 8ª e 9ª do seu recurso, matéria de facto que não foi firmada na 
 instancia competente para a apreciar, pelo que dela não pode conhecer-se nesta 
 sede restrita que é à matéria de direito, no domínio da constitucionalidade da 
 norma aplicada pelo acórdão recorrido.
 
 10ª -       O n.º 3 do artigo 32º DL n.º 440/99, mostra-se em conformidade com o 
 princípio da igualdade consagrado no artigo 13º, n.º 1, da CRP, tratando por 
 igual situações funcionais iguais e distintamente as desiguais, improcedendo, em 
 consequência, o vício de inconstitucionalidade que lhe foi assacada pelos 
 recorrentes.
 
  
 Termos em que deve ser negado provimento ao recurso».
 
  
 
  
 
    5 – Na parte útil à compreensão da questão de constitucionalidade, o acórdão 
 recorrido discreteou do seguinte modo:
 
  
 
    «Como resulta da alínea g) da matéria de facto fixada, os Recorrentes A. e B. 
 eram directores de serviços e o Recorrente C. era terceiro chefe de divisão, o 
 primeiro sempre ligado aos serviços de informática, a segunda aos serviços de 
 Biblioteca e Arquivo e o terceiro ao Serviço de Gestão do Pessoal, não exercendo 
 funções de controlo, auditoria ou gestão financeira.
 
    No que concerne a estes Recorrentes, o acto recorrido negou a sua transição 
 para a carreira de consultores do corpo especial de fiscalização e controlo, 
 como pretendem, por entender que não preenchiam o pressuposto da regra de 
 transição prevista no n.º 2 do art. 32º do Decreto-Lei n.º 440/99 de as funções 
 que exerciam serem consideradas “funções de consultadoria para apoio directo ao 
 Tribunal e às equipas de auditoria no âmbito dos demais serviços”.
 
    A primeira questão colocada por todos estes Recorrentes é a de que o 
 transcrito nº 3 do art. 32º é materialmente inconstitucional, por ofender o 
 princípio da igualdade, pelo que o acto recorrido, que o aplicou, enferma de 
 vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito.
 
    No art. 13º da C.R.P. estabelece-se o princípio da igualdade dos cidadãos 
 perante a lei.
 
    Este princípio, como limite à discricionariedade legislativa, não exige o 
 tratamento igual de todas as situações, mas, antes, implica que sejam tratados 
 igualmente os que se encontram em situações iguais e tratados desigualmente os 
 que se encontram em situações desiguais, de maneira a não serem criadas 
 discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque carecidas de fundamento 
 material bastante. O princípio da igualdade não proíbe se estabeleçam 
 distinções, mas sim, distinções desprovidas de justificação objectiva e 
 racional.  
 
    No caso em apreço, os Recorrentes defendem que o referido n.º 3 do art. 32º 
 tem carácter discriminatório por restringir os tipos de titulares de cargos 
 dirigentes que transitam para as carreiras de auditor e consultor, 
 designadamente limitando essa transição aos titulares de cargos de 
 contador-geral e de contador-chefe e não abrangendo os titulares de outros tipos 
 de cargos dirigentes, como é o caso dos cargos de director de serviço e de chefe 
 de divisão.
 
    As carreiras de auditor e consultor para que, nos termos do referido n.º 3 do 
 art. 32º, transitavam os técnicos superiores que desempenhassem, há mais de três 
 anos, funções de contador-geral e de contador-chefe, são «carreiras altamente 
 qualificadas» em que são executadas funções de controlo e consultadoria de alto 
 nível [art. 30º, nº 2, alínea a), b) e c), da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto, 
 que o Decreto-Lei n.º 440/99 desenvolveu].
 
    Sendo assim, justificava-se que para a transição para aquelas carreiras fosse 
 exigida uma prévia experiência profissional em funções de controlo e 
 consultadoria, pois ela era, presumivelmente, uma garantia da aptidão 
 profissional necessária para o exercício dessas exigentes funções.
 
    E, consequentemente, terá justificação bastante a distinção entre os 
 funcionários que exerciam e não exerciam, antes da reestruturação dos serviços 
 de apoio do Tribunal de Contas operada pelo Decreto-Lei nº 440/99, funções nas 
 
 áreas de controlo e consultadoria.
 
  
 
    4 – Assim, a questão de saber se ocorre violação do princípio constitucional 
 da igualdade reconduz-se a apurar se existia ou não no conteúdo funcional dos 
 cargos de contador-geral e contador-chefe actividade naquelas áreas de controlo 
 e consultadoria que não existisse nos outros cargos de dirigentes, 
 designadamente os de director de serviços e chefe de divisão.
 
    Nos termos dos arts. 26.º e 29.º do Decreto-Lei n.º 478/80, de 15 de Outubro, 
 que reestruturou o quadro de pessoal da Direcção-Geral do Tribunal de Contas, 
 aos contadores-gerais competia dirigir, coordenar e orientar as actividades das 
 contadorias-gerais como unidades orgânicas de apoio técnico ao Tribunal de 
 Contas e aos contadores-chefes competia a direcção da contadoria que lhe estiver 
 confiada, em articulação com as outras contadorias, segundo a orientação 
 definida pelo respectivo contador-geral.
 No acórdão recorrido, entendeu-se, que 
 
    –          na sequência da entrada em vigor da Lei nº 86/89, de 8/9, que 
 aprovou a reforma do Tribunal de Contas, foi proferido o Despacho DP n.º 217/91, 
 de 30/9, do respectivo Presidente, no qual se definem as atribuições das 
 Contadorias de Contas, da Contadoria-Geral do Visto e do Gabinete de Estudos 
 donde ressalta a função de auxiliar de forma directa o Tribunal de Contas no 
 exercício das suas funções de controlo financeiro (arts. 1º a 3º do Anexo II do 
 referido Despacho)»;
 
    –          as funções dos directores de serviços e chefes de divisão do 
 quadro da Direcção-Geral do Tribunal de Contas não se inscrevem na área da 
 competência fiscalizadora e de controle financeiro do Tribunal. São antes, 
 funções de natureza instrumental não directamente ligada àquelas áreas, as quais 
 constituem o núcleo da competência material do Tribunal de Contas;
 
    –          que o Recorrente A. esteve sempre ligado aos sucessivos organismos 
 que, dentro do Tribunal, asseguram a organização e gestão informática dos 
 respectivos serviços, exercendo funções completamente diferentes das do 
 contador-geral;
 
    –          que a Recorrente B. directora de serviços do Serviço da 
 Biblioteca, Documentação e Arquivo Histórico da Direcção-Geral do Tribunal de 
 Contas e antes chefe de divisão do Arquivo-Geral e Biblioteca da DGTC, e que o 
 respectivo conteúdo funcional é muito diverso das categorias de contador-geral 
 ou de contador-chefe;
 
    –          que o Recorrente C. era chefe de divisão da Divisão de Formação e 
 do anterior Serviço de Gestão de Pessoal, funções meramente instrumentais que 
 não têm a ver essencialmente com a área de fiscalização e controle.
 
  
 
    Isto é, entendeu-se no acórdão recorrido que os cargos de contador-geral e 
 contador-chefe tinham, efectivamente, na estrutura funcional da Direcção-Geral 
 do Tribunal de Contas, conteúdos funcionais distintos dos cargos de director de 
 serviços e chefe de divisão.
 
    Trata-se, aqui, de juízos formulados no acórdão recorrido sobre o conteúdo 
 funcional efectivo dos cargos referidos, não formulados com base na 
 interpretação de normas legais e, por isso, a sua correcção não pode ser 
 controlada por este Pleno, que, no presente recurso jurisdicional tem poderes de 
 cognição limitados a matéria de direito. Pela mesma limitação dos poderes de 
 cognição desta formação, não tendo sido dados como provados os factos que os 
 Recorrentes afirmam (nas conclusões 6.ª e 7.ª das suas alegações), não podem 
 eles ser tidos em conta na apreciação dos recursos.
 
    A equiparação entre os cargos de contador-geral e contador-chefe para efeitos 
 de vencimentos, não significa uma identidade de conteúdo funcional nem impõe uma 
 igualdade de tratamento para efeitos de transição de carreiras em que o que 
 releva é a adequação da experiência funcional anterior ao conteúdo funcional das 
 novas carreiras.
 
    Por outro lado, o facto de a alínea m) do n.º 2 do art. 30º da Lei n.º 98/97 
 estabelecer que o pessoal dirigente da Direcção-Geral e dos serviços de apoio 
 das secções regionais integra o corpo especial de fiscalização e controlo 
 previsto na alínea a), não impõe que todos o pessoal dirigente transite para as 
 carreiras de auditor ou consultor, pois naquele corpo especial inclui-se também 
 a carreira de técnico verificador, como se refere na alínea a) do mesmo número.
 
    Sendo assim, em face dos juízos de facto formulados pela Secção no acórdão 
 recorrido, tem de se considerar assente que existia, efectivamente, uma 
 diferença de conteúdo funcional, a nível de apoio directo às funções de controlo 
 levadas a cabo pelo Tribunal de Contas, entre os cargos de contador-geral e 
 contador-chefe, por um lado, e as dos cargos de directores de serviços e de 
 chefes de divisão, por outro, pelo que não se pode afirmar que a distinção entre 
 esses cargos, para efeitos de transição, consubstanciada no art. 32º do 
 Decreto-Lei n.º 440/99, careça de justificação objectiva e racional, pois é 
 compreensível que, na determinação dos termos em que se deverá efectuar a 
 transição de funcionários para novas carreiras, se atenda à realidade da sua 
 anterior actividade funcional e à preparação que ela presumivelmente proporciona 
 para o exercício das funções próprias dessas novas carreiras, 
 
    Assim, não pode considerar-se materialmente inconstitucional o referido n.º 3 
 do art. 32º, pelo que o acto recorrido não enferma do vício de violação de lei 
 que os Recorrentes jurisdicionais lhe imputam.
 
    […]».
 
  
 
    
 
    Cumpre conhecer do recurso.
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
    6 – Como resulta do relatado, os recorrentes impugnam constitucionalmente a 
 norma constante do art. 32º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 440/99, de 2 de Novembro 
 
 (diploma que aprovou o estatuto dos serviços de apoio do Tribunal de Contas), na 
 medida em que tal preceito distingue, dentre os titulares de cargos dirigentes 
 da Direcção-Geral do Tribunal de Contas – entre os quais se contam os cargos de 
 directores de serviço e de chefes de divisão, exercidos pelos recorrentes –, e 
 para efeitos de transição automática para as carreiras de auditor ou consultor, 
 os actuais técnicos superiores que sejam titulares, há mais de três anos, do 
 cargo de contador-geral ou de contador-chefe.
 
    Entendem os recorrentes que o preceito em causa excluiu “sem fundamento 
 material razoável, objectivo e racional” da regra automática de transição para 
 as carreiras do corpo especial de auditor e consultor dos serviços de apoio do 
 Tribunal de Contas os titulares de cargos de director de serviços (exercidos 
 pelos primeiros dois recorrentes) e de chefe de divisão (exercido pelo último 
 recorrente) que tal como os titulares do cargo de contador-geral e de 
 contador-chefe pertenciam à categoria de técnicos superiores e detinham essa 
 qualidade há mais de três anos (desde 1995) e que tal exclusão afronta o 
 princípio da igualdade, consagrado no art. 13º da Constituição.
 
  
 
    O artigo 32º do Decreto-Lei n.º 440/99, em que se integra a norma 
 constitucionalmente sindicada, dispõe do seguinte jeito (transcreve-se a 
 totalidade do artigo para melhor apreensão do sentido da norma questionada, dado 
 a mesma se apresentar como uma adição normativa relativamente às situações 
 reguladas nos números anteriores para a transição automática para as carreiras 
 de auditor e consultor):
 
  
 
    «Artigo 32.º
 Transição do pessoal técnico superior
 
 1 –          Os actuais assessores principais, assessores e técnicos superiores 
 principais, todos com nove ou mais anos de serviço na carreira técnica superior, 
 com a classificação de Muito bom, que exerçam funções no âmbito dos serviços 
 operativos de fiscalização prévia e de fiscalização sucessiva transitam para a 
 carreira de auditor para escalão correspondente ao tempo de serviço detido na 
 carreira que exceda nove anos.
 
 2 –          Os actuais assessores principais, assessores e técnicos superiores 
 principais, todos com nove ou mais anos de serviço na carreira técnica superior, 
 com classificação de Muito Bom, que exerçam funções de consultadoria para apoio 
 directo ao Tribunal e às equipas de auditoria no âmbito dos demais serviços 
 transitam para a carreira de consultor para escalão correspondente ao tempo de 
 serviço detido na carreira que exceda nove anos.
 
 3 –          Transitam ainda para as carreiras de auditor ou consultor os 
 actuais técnicos superiores que sejam titulares, há mais de três anos, do cargo 
 de contador-geral ou de contador-chefe.
 
 4 –          Os técnicos superiores não abrangidos nos números anteriores que 
 realizem auditorias e outras acções de controlo ou que desenvolvam funções de 
 consultadoria para apoio ao Tribunal e às equipas de auditoria transitam para a 
 carreira de técnico verificador superior de acordo com a tabela de transição 
 constante do mapa anexo ao presente diploma».
 
  
 
  
 
           Reflectindo sobre o estado actual da substancialidade do problema da 
 igualdade, e com ponderação da doutrina e jurisprudência nacionais e 
 estrangeiras, afirmou-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 232/2003 
 
 (publicado no Diário da República I Série-A, de 17 de Junho de 2003), 
 recuperando, em diversos passos do seu discurso, abundante argumentação de 
 jurisprudência anterior:
 
                    
 
    “[…] 
 
    Princípio estruturante do Estado de Direito democrático e do sistema 
 constitucional global (cfr., neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, 
 Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., Coimbra, 1993, pág. 125), 
 o princípio da igualdade vincula directamente os poderes públicos, tenham eles 
 competência legislativa, administrativa ou jurisdicional (cfr. Ob. Cit., pág. 
 
 129) o que resulta, por um lado, da sua consagração como direito fundamental dos 
 cidadãos e, por outro lado, da “atribuição aos preceitos constitucionais 
 respeitantes aos direitos, liberdades e garantias de uma força jurídica própria, 
 traduzida na sua aplicabilidade directa, sem necessidade de qualquer lei 
 regulamentadora, e da sua vinculatividade imediata para todas as entidades 
 públicas, tenham elas competência legislativa, administrativa ou jurisdicional 
 
 (artigo 18º, nº 1, da Constituição)”(cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional nº 
 
 186/90, publicado no Diário da República II Série, de 12 de Setembro de 1990).
 
  
 
    […] 
 
  
 
 1.2.-     O princípio não impede que, tendo em conta a liberdade de conformação 
 do legislador, se possam (se devam) estabelecer diferenciações de tratamento, 
 
 “razoável, racional e objectivamente fundadas”, sob pena de, assim não 
 sucedendo, “estar o legislador a incorrer em arbítrio, por preterição do 
 acatamento de soluções objectivamente justificadas por valores 
 constitucionalmente relevantes”, no ponderar do citado Acórdão nº 335/94.  Ponto 
 
 é que haja fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a 
 discriminação infundada (o que importa é que não se discrimine para discriminar, 
 diz-nos j.c.vieira de andrade – Os Direitos Fundamentais na Constituição 
 Portuguesa de 1976, Coimbra, 1987, pág. 299).
 
  
 
    Perfila-se, deste modo, o princípio da igualdade como “princípio negativo de 
 controlo” ao limite externo de conformação da iniciativa do legislador  -  cfr. 
 Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. Cit., pág. 127 e, por exemplo, os Acórdãos 
 nºs. 157/88, publicado no Diário da República, I Série, de 26 de Julho de 1988, 
 e os já citados nºs. 330/93 e 335/94  -  sem que lhe retire, no entanto, a 
 plasticidade necessária para, em confronto com dois (ou mais) grupos de 
 destinatários da norma, avalizar diferenças justificativas de tratamento 
 jurídico diverso, na comparação das concretas situações fácticas e jurídicas 
 postadas face a um determinado referencial (“tertium comparationis”).  A 
 diferença pode, na verdade, justificar o tratamento desigual, eliminado o 
 arbítrio (cfr., a este propósito, gomes canotilho, in Revista de Legislação e de 
 Jurisprudência, ano 124, pág. 327;  alves correia, O Plano Urbanístico e o 
 Princípio da Igualdade, Coimbra, 1989, pág. 425;  Acórdão nº 330/93).
 
  
 
    Ora, o princípio da igualdade não funciona apenas na vertente formal e 
 redutora da igualdade perante a lei;  implica, do mesmo passo, a aplicação igual 
 de direito igual (cfr. gomes canotilho, Constituição Dirigente e Vinculação do 
 Legislador, Coimbra, 1982, pág. 381;  alves correia, ob. Cit., pág. 402) o que 
 pressupõe averiguação e valoração casuísticas da “diferença”” de modo a que 
 recebam tratamento semelhante os que se encontrem em situações semelhantes e 
 diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação.
 
  
 
                           […]
 
  
 
    “[…] O Tribunal Constitucional tem considerado que o princípio da igualdade 
 impõe que situações da mesma categoria essencial sejam tratadas da mesma maneira 
 e que situações pertencentes a categorias essencialmente diferentes tenham 
 tratamento também diferente. Admitem-se, por conseguinte, diferenciações de 
 tratamento, desde que fundamentadas à luz dos próprios critérios axiológicos 
 constitucionais. A igualdade só proíbe discriminações quando estas se afiguram 
 destituídas de fundamento racional [cf., nomeadamente, os Acórdãos nºs 39/88, 
 
 186/90, 187/90 e 188/90, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º vol. (1988), 
 p. 233 e ss., e 16º vol. (1990), pp. 383 e ss., 395 e ss. E 411 e ss., 
 respectivamente; cf., igualmente, na doutrina, jorge miranda, Manual de Direito 
 Constitucional, tomo IV, 2ª ed., 1993, p. 213 e ss., gomes canotilho, Direito 
 Constitucional, 6ª ed., 1993, pp. 564-5, e gomes canotilho e vital moreira, 
 Constituição da República Portuguesa anotada, 1993, p.125 e ss.]”.
 
  
 
    […] 
 
  
 
    Assente a possibilidade de estabelecimento de diferenciações, tornar-se-á 
 depois necessário proceder ao controlo das normas sub judicio, feito a partir do 
 fim que visam alcançar, à luz do princípio da proibição do arbítrio 
 
 (Willkürverbot) e, bem assim, de um critério de razoabilidade.    
 
  
 
    Com efeito, é a partir da descoberta da ratio da disposição em causa que se 
 poderá avaliar se a mesma possui uma “fundamentação razoável” (vernünftiger 
 Grund), tal como sustentou o “inventor” do princípio da proibição do arbítrio, 
 Gerhard Leibholz (cf. f. alves correia, O plano urbanístico e o princípio da 
 igualdade, Coimbra, 1989, pp. 419ss). Essa ideia é reiterada entre nós por maria 
 da glória ferreira pinto: “[E]stando em causa (…) um determinado tratamento 
 jurídico de situações, o critério que irá presidir à qualificação de tais 
 situações como iguais ou desiguais é determinado directamente pela ‘ratio’ do 
 tratamento jurídico que se lhes pretende dar, isto é, é funcionalizado pelo fim 
 a atingir com o referido tratamento jurídico. A ‘ratio’ do tratamento jurídico 
 
 é, pois, o ponto de referência último da valoração e da escolha do critério” 
 
 (cf. Princípio da igualdade: fórmula vazia ou fórmula ‘carregada’ de sentido?, 
 sep. Do Boletim do Ministério da Justiça, nº 358, Lisboa, 1987, p. 27). E, mais 
 adiante, opina a mesma Autora: “[O] critério valorativo que permite o juízo de 
 qualificação da igualdade está, assim, por força da estrutura do princípio da 
 igualdade, indissoluvelmente ligado à ‘ratio’ do tratamento jurídico que o 
 determinou. Isto não quer, contudo, dizer que a ‘ratio’ do tratamento jurídico 
 exija que seja este critério, o critério concreto a adoptar, e não aquele outro, 
 para efeitos de qualificação da igualdade. O que, no fundo, exige é uma conexão 
 entre o critério adoptado e a ‘ratio’ do tratamento jurídico. Assim, se se 
 pretender criar uma isenção ao imposto profissional, haverá obediência ao 
 princípio da igualdade se o critério de determinação das situações que vão ficar 
 isentas consistir na escolha de um conjunto de profissionais que se encontram 
 menosprezados no contexto social, bem como haverá obediência ao princípio se o 
 critério consistir na escolha de um rendimento mínimo, considerado indispensável 
 
 à subsistência familiar numa determinada sociedade” (ob. Cit., pp. 31-32).
 
  
 
    […]».
 
  
 
    As normas constitucionalmente impugnadas fazem parte das regras definidas 
 pelo Decreto-Lei n.º 440/99, de 2 de Novembro, para a transição do pessoal 
 técnico superior para o quadro da nova organização e estrutura da Direcção-Geral 
 do Tribunal de Contas, cuja conformação foi levada a cabo pelo diploma, e 
 segundo o aí invocado, “no desenvolvimento dos princípios e regras estabelecidos 
 nos nºs 2, 3 e 4 do artigo 30º da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto”.
 
    Ora, de acordo com o estipulado no n.º 2 deste artigo – e cingindo-nos à 
 parte útil ao conhecimento da questão de constitucionalidade –, tais nova 
 organização e estrutura deviam observar os seguintes princípios e regras:
 
  
 
    “a) Constituição de um corpo especial de fiscalização e controlo, integrando 
 carreiras altamente qualificadas de auditor, consultor e técnico verificador, a 
 exercer, em princípio, em regime de exclusividade;
 
    b) O auditor executa funções de controlo de alto nível, nomeadamente a 
 realização de auditorias e outras acções de controlo nas diversas áreas da 
 competência do Tribunal;
 
    c) O consultor executa funções de consultadoria de alto nível, nomeadamente 
 de estudo e investigação técnico-científica para apoio ao Tribunal e às equipas 
 de auditoria;
 
    d) O técnico verificador executa funções de estudo e aplicação de métodos e 
 processos científico-técnicos, nomeadamente no âmbito da instrução de processos 
 de fiscalização prévia e sucessiva;
 
    …
 
    …
 
    n) […]”.
 
  
 
    Resulta, pois, destes preceitos – e o acórdão recorrido não deixou de o 
 acentuar – que as carreiras de auditor e consultor, da nova estrutura da 
 Direcção-Geral do Tribunal de Contas, para as quais os recorrentes pretendem 
 transitar, “são carreiras ‘altamente qualificadas’ em que são executadas funções 
 de controlo e consultadoria de alto nível”.
 
    Por outro lado, distrai-se, também, dos nºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 440/99 
 que o legislador subordinou a transição para as categorias de auditor e 
 consultor por banda do pessoal enquadrado nas categorias aí referidas (actuais 
 assessores principais, assessores e técnicos superiores principais) 
 cumulativamente às seguintes condições: i) nove ou mais anos de serviço na 
 carreira técnica superior; ii) com a classificação de Muito bom; exercício, em 
 tais categorias de origem, de funções “no âmbito dos serviços operativos de 
 fiscalização prévia e de fiscalização sucessiva” ou “de consultadoria para apoio 
 directo ao Tribunal e às equipas de auditoria no âmbito dos demais serviços”.
 
    Mas, como decorre do preceito cuja norma se impugna, ao usar a expressão 
 verbal “transitam ainda […]”, tal justificação foi igualmente, assumida pela 
 norma constitucionalmente sindicada, tendo, aí, o legislador considerado, ainda, 
 como satisfazendo, igualmente, essas mesmas exigências indiciadoras de aptidão 
 para o exercício das funções altamente qualificadas de auditor (relembre-se: 
 funções de controlo de alto nível, nomeadamente a realização de auditorias e 
 outras acções de controlo nas diversas áreas da competência do Tribunal de 
 Contas – e de consultor (repita-se: funções de consultadoria de alto nível, 
 nomeadamente de estudo e investigação técnico-científica para apoio ao Tribunal 
 e às equipas de auditoria) “os actuais técnicos superiores que sejam titulares, 
 há mais de três anos, do cargo de contador-geral ou de contrador-chefe” (norma 
 impugnada).
 
    Ora, o primeiro aspecto que, a este respeito, importa acentuar é que não cabe 
 nos poderes do Tribunal Constitucional exercer qualquer censura acerca da 
 eleição feita pelo legislador sobre os requisitos que, segundo a sua óptica, 
 constituirão garantia da existência de aptidão profissional para o exercício das 
 funções altamente qualificadas, atribuídas às categorias de auditor e consultor. 
 
 
 
    Trata-se de matéria abrangida pela sua discricionariedade 
 normativo-constitutiva, que apenas é passível de um controlo “feito a partir do 
 fim que [tais normas] visam alcançar, à luz do princípio da proibição do 
 arbítrio (Willkürverbot) e, bem assim, de um critério de razoabilidade”, nos 
 termos acima enunciados.
 
    Nesta perspectiva, o que importa agora apurar é saber se os técnicos 
 superiores que exerceram funções de directores de serviço (que tal era a 
 categoria dos recorrentes A. e B.), de chefe de divisão, de contador-geral ou de 
 contador-chefe – admitido o exercício de funções nessas categorias pelo mesmo 
 período (de três anos), como é o caso – satisfazem as mesmas exigências 
 pressupostas como índices desveladores da aptidão para o exercício do cargo nas 
 novas categorias de auditor e de consultor.
 
    A realização de uma tal comparação, tendo por base o referente normativo de 
 comparação ou o tertium comparationis, pressupõe, necessariamente, a indagação 
 de qual seja, normativamente, o conteúdo e o seu nível das funções que cabia a 
 cada uma dessas categorias de funcionários.
 
    Quanto a esta matéria, todavia, o Tribunal Constitucional encontra-se 
 vinculado à determinação a que, em face do direito infraconstitucional, o 
 acórdão recorrido aportou, constituindo o resultado da fixação a que chegou, 
 seja por via da sua actividade de interpretação da lei infraconstitucional, seja 
 por mor do julgamento de facto efectuado sobre a materialidade das concretas 
 funções exercidas, um dado normativo ou um pressuposto jurídico para o órgão 
 concentrado de fiscalização de constitucionalidade. 
 
    Nesta senda de raciocínio, não tem o Tribunal Constitucional competência para 
 emitir qualquer pronúncia sobre a veracidade da existência das situações de 
 facto, de que os recorrente dão notícia nas conclusões 8ª e 9ª das suas 
 alegações, e sobre a sua hipotética relevância para, no plano do direito 
 infraconstitucional, apontar no sentido de haver contadores-gerais e contadores 
 chefes que exerciam, tal como os recorrentes, funções instrumentais.
 
  
 
    Ora, concernentemente àquele juízo normativo, o acórdão recorrido considerou, 
 quer por via de um juízo próprio, quer por via da aceitação do julgado na 
 decisão então sob recurso, que:
 
    - os directores de serviços e de chefes de divisão, conquanto integrados na 
 carreira dos técnicos superiores, “não exerciam [exercendo] funções de controlo, 
 auditoria ou gestão financeira”; 
 
    - “na sequência da entrada em vigor da Lei nº 86/89, de 8/9, que aprovou a 
 reforma do Tribunal de Contas, foi proferido o Despacho DP nº 217/91, de 30/9, 
 do respectivo Presidente, no qual se definem as atribuições das Contadorias de 
 Contas, da Contadoria-Geral do Visto e do Gabinete de Estudos donde ressalta a 
 função de auxiliar de forma directa o Tribunal de Contas no exercício das suas 
 funções de controlo financeiro (arts. 1º a 3º do Anexo II do referido 
 Despacho)”;
 
    – “as funções dos directores de serviços e chefes de divisão do quadro da 
 Direcção-Geral do Tribunal de Contas não se inscrevem na área da competência 
 fiscalizadora e de controle financeiro do Tribunal. São antes, funções de 
 natureza instrumental não directamente ligada àquelas áreas, as quais constituem 
 o núcleo da competência material do Tribunal de Contas”;
 
    – “o Recorrente A. esteve sempre ligado aos sucessivos organismos que, dentro 
 do Tribunal, asseguram a organização e gestão informática dos respectivos 
 serviços, exercendo funções completamente diferentes das do contador-geral”;
 
    – “a Recorrente B. directora de serviços do Serviço da Biblioteca, 
 Documentação e Arquivo Histórico da Direcção-Geral do Tribunal de Contas e antes 
 chefe de divisão do Arquivo-Geral e Biblioteca da DGTC, e que o respectivo 
 conteúdo funcional é muito diverso das categorias de contador-geral ou de 
 contador-chefe”;
 
    – “o Recorrente C. era chefe de divisão da Divisão de Formação e do anterior 
 Serviço de Gestão de Pessoal, funções meramente instrumentais que não têm a ver 
 essencialmente com a área de fiscalização e controle”.
 
  
 
    Em contraponto, relativamente aos contadores gerais e contadores-chefes, a 
 decisão agora recorrida ajuizou que:
 
    - “[N]nos termos dos arts. 26.º e 29.º do Decreto-Lei n.º 478/80, de 15 de 
 Outubro, que reestruturou o quadro de pessoal da Direcção-Geral do Tribunal de 
 Contas, aos contadores-gerais competia dirigir, coordenar e orientar as 
 actividades das contadorias-gerais como unidades orgânicas de apoio técnico ao 
 Tribunal de Contas e aos contadores-chefes competia a direcção da contadoria que 
 lhe estiver confiada, em articulação com as outras contadorias, segundo a 
 orientação definida pelo respectivo contador-geral”, correspondendo essas 
 funções a “conteúdos funcionais distintos dos cargos de directores de serviço e 
 de chefe de divisão”; 
 
    - a “equiparação entre os cargos de contador-geral e contador-chefe para 
 efeitos de vencimentos, não significa uma identidade de conteúdo funcional nem 
 impõe uma igualdade de tratamento para efeitos de transição de carreiras em que 
 o que releva é a adequação da experiência funcional anterior ao conteúdo 
 funcional das novas carreiras”;
 
    - […] “o facto de a alínea m) do n.º 2 do art. 30º da Lei n.º 98/97 
 estabelecer que o pessoal dirigente da Direcção-Geral e dos serviços de apoio 
 das secções regionais integra o corpo especial de fiscalização e controlo 
 previsto na alínea a), não impõe que todo o pessoal dirigente transite para as 
 carreiras de auditor ou consultor, pois naquele corpo especial inclui-se também 
 a carreira de técnico verificador, como se refere na alínea a) do mesmo número”.
 
  
 
    Contrastados os conteúdos funcionais de uma e outra das categorias em 
 presença (contador geral e contador-chefe, por um lado, e director de serviço e 
 chefe de divisão, por outro) com o tertium comparationis acima caracterizado, 
 corporizador da “ratio do tratamento jurídico que se lhes pretende dar”, havemos 
 de chegar à conclusão que a exclusão da regra de transição automática, 
 consagrada no n.º 3 do art. 32º do Decreto-Lei n.º 440/99, dos directores de 
 serviço e dos chefes de divisão se não revela material e 
 axiológico-funcionalmente infundada.
 
    Na verdade, como se diz no acórdão recorrido, enquanto aos primeiros competia 
 
 “dirigir, coordenar e orientar as actividades das contadorias-gerais como 
 unidades orgânicas de apoio técnico ao Tribunal de Contas” e “a direcção da 
 contadoria que lhe estava [estiver] confiada, em articulação com as outras 
 contadorias, segundo a orientação definida pelo respectivo contador-geral”, e 
 tais funções são de considerar, dentro da conformação da referida regra de 
 transição, como indiciadoras de aptidão para o exercício das funções altamente 
 qualificadas de auditor e de consultor, por situadas nas áreas de controlo e 
 consultadoria, já o mesmo não se poderá dizer relativamente aos segundos cujo 
 conteúdo funcional é estranho à qualquer experiência nessas áreas.
 
    Temos, portanto, de concluir que a norma impugnada não viola o princípio 
 constitucional da igualdade e que o recurso deve improceder.
 
  
 C – Decisão
 
  
 
    7 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide não 
 julgar inconstitucional a norma constante do n.º 3 do artigo 32º do Decreto-Lei 
 n.º 440/99, de 2 de Novembro, e, consequentemente, negar provimento ao recurso.
 
    Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 20 Ucs.
 Lisboa, 8 de Março de 2006
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos