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Processo n.º 413/07
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
 
  
 
  
 Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 I – RELATÓRIO
 
  
 
  
 
 1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos 
 do Tribunal da Relação de Lisboa, em que figuram como recorrentes A. e B., LDA. 
 e como recorrido o MINISTÉRIO PÚBLICO, foi proferida a seguinte Decisão Sumária:
 
  
 
  
 
 «I – RELATÓRIO
 
  
 
 1. Nos presentes autos, em que figuram como recorrentes A. e B., Ldª e como 
 recorrido o Ministério Público, os primeiros, “tendo sido notificados do 
 despacho exarado pela M.ma Desembargadora Vice-Presidente do Tribunal da Relação 
 de Lisboa, na reclamação que apresentaram perante o M.mo Desembargador do 
 assinalado Tribunal, que confirmou o regime de subida do recurso atribuído pelo 
 M.mo Presidente em 1ª instância”, inconformados, vêm interpor recurso para o 
 Tribunal Constitucional, “ao abrigo dos comandos dos artigos 69º ss – e, em 
 especial, da alínea b) do nº 1 do artigo 70º - da Lei do Tribunal 
 Constitucional” (cfr. Requerimento de fls. 365 do processo).   
 
  
 
  
 II – DA INADMISSIBILIDADE DO RECURSO 
 
  
 
 2. Apesar de o n.º 1 do artigo 76º da LTC conferir ao tribunal recorrido – in 
 casu, o Tribunal da Relação de Lisboa – o poder de apreciação da admissão de 
 recurso, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do 
 n.º 3 do mesmo preceito legal, pelo que, antes de mais, cumpre apreciar se estão 
 preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos 
 artigos 75º-A e 76º, nº 2, da LTC.
 
  
 
 3. Tendo o recurso sido interposto ao abrigo do artigo 70º, nº 2, alínea b), da 
 LTC, constitui seu pressuposto processual, de acordo com o artigo 75º, nº 1, da 
 LTC, a indicação pelo recorrente da norma cuja inconstitucionalidade pretende 
 que o Tribunal aprecie, devendo tal questão, segundo o artigo 72º, nº 2, da LTC, 
 ter sido suscitada de modo processualmente adequado perante o tribunal 
 recorrido, em termos de este estar obrigado a dela conhecer. 
 
  
 Ora, no caso em apreço, o recorrente não só não suscitou adequadamente a questão 
 da inconstitucionalidade de uma norma – in casu, o n.º 2 do artigo 407º, nº 2, 
 do CPP – como não o fez de forma clara, inequívoca e que vinculasse o tribunal 
 recorrido a pronunciar-se sobre ela.
 
  
 Cumpre apreciar.
 
  
 A) Do objecto do recurso
 
  
 
 4. Em primeiro lugar, deve notar-se que o objecto da fiscalização da 
 constitucionalidade, conforme resulta evidente do n.º 1 do artigo 277º da CRP, 
 se restringe a normas jurídicas, tendo este Tribunal vindo a entender, em 
 jurisprudência constante, que o mesmo também abrange a interpretação ou o 
 sentido em que a norma foi aplicada no caso concreto, ou seja, as interpretações 
 normativas (cfr., entre muitos outros, acórdão nº 117/01). Isto é, as decisões 
 judiciais estão, pois excluídas do objecto da fiscalização da 
 constitucionalidade, em geral e da fiscalização concreta, em particular (Cfr. 
 JORGE MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, 2ª ed., Tomo VI, Coimbra, 
 Coimbra Editora, 2005, p. 217). 
 
  
 Ora, analisando o caso em apreço, o recorrente, em sede de reclamação da decisão 
 que fixou a subida diferida do recurso, apenas ataca processualmente a decisão 
 judicial do tribunal de 1ª instância, não colocando qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa, como resulta claro do seguinte excerto: 
 
  
 
 “Por conseguinte, uma decisão que não reconhecendo o que vem de assinalar-se, 
 como aquela de que se reclama, viola os artigos 407º, n.º 2 do CPP, 20º, n.ºs 4 
 e 5, da CRP, além do n.º 3 do artigo 14º do Pacto Internacional sobre Direitos 
 Civis e Políticos, do art. 6º, n.º 1, da Convenção Europeia, da segunda parte do 
 art. 47º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e alínea c) do n.º 
 
 1 do art. 67º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, destarte se 
 tornando materialmente inconstitucional” (cfr. fls. 14), com sublinhado e 
 negrito nosso). 
 
  
 Como tal, na medida em que o recorrente apenas suscita uma pretensa 
 inconstitucionalidade da decisão recorrida e não a inconstitucionalidade de 
 qualquer preceito normativo, é forçoso concluir pela ausência de prévia 
 invocação adequada da inconstitucionalidade de uma norma, no caso, o n.º 2 do 
 artigo 407º do CPP.
 
  
 
 5. É certo que a conclusão B.3 das alegações de recurso (cfr. fls. 19969) 
 procura fixar – ainda que imprecisa e imperfeitamente – o objecto de um 
 incidente de inconstitucionalidade na própria norma vertida no n.º 2 do artigo 
 
 407º do CPP. Porém, o recorrente não retoma aquela alegação na reclamação da 
 decisão que admitiu o recurso e lhe fixou subida diferida, pelo que não pode 
 deixar de se entender que o recorrente renunciou tacitamente à invocação daquela 
 inconstitucionalidade normativa. 
 
  
 Neste sentido, se pronuncia a mais recente doutrina jus-constitucionalista:
 
  
 
 “Se bem que um sujeito processual interessado não seja constrangido a suscitar a 
 inconstitucionalidade de uma norma desde o momento em que a mesma foi aplicada 
 em julgamento processado em primeira instância, podendo fazê-lo em momentos 
 processuais subsequentes até ao trânsito em julgado [alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70º da LTC), o facto é que, desde que proceda à arguição da mesma, terá o 
 
 ónus de a manter e reiterar nas fases subsequentes do processo”. (cfr. CARLOS 
 BLANCO DE MORAIS, Justiça Constitucional, Tomo II, Coimbra Editora, Coimbra, 
 
 2005, p. 707).
 
  
 In casu, é notório o abandono da questão de constitucionalidade normativa em 
 sede de reclamação, na medida em que apenas se imputa de inconstitucional a 
 decisão judicial e não já a norma aplicada. 
 
  
 
 6. Acresce ainda que, em sede de requerimento de interposição de recurso, o 
 recorrente veio declarar pretender ver apreciada e “declarada a 
 inconstitucionalidade material do n.º 2 do artigo 407º do CPP, quando 
 interpretada esta norma como o foi no decurso dos autos, ou seja, no sentido de 
 que a «absoluta inutilidade» só se verificaria se o recurso perdesse todo e 
 qualquer interesse ou, como referiu a M.ma Juíza Desembargadora Vice-Presidente 
 
 (fls. 2 do seu despacho), «…, um recurso é absolutamente inútil quando da sua 
 eventual procedência o recorrente já não puder vir a obter qualquer efeito útil 
 do mesmo»”. 
 
  
 Ora, tal questão foi colocada pela primeira vez – naqueles precisos termos – 
 perante este Tribunal Constitucional, nunca tendo sido previamente colocada em 
 termos tais que obrigasse o tribunal recorrido a pronunciar-se. Como se comprova 
 pela decisão recorrida (cfr. fls. 359 a 362), o tribunal recorrido apenas se 
 pronunciou sobre a interpretação a conceder ao n.º 2 do artigo 407º, de um ponto 
 de vista estrito do sistema de recursos em processo penal. Para tal, a decisão 
 recorrida teve em conta a necessidade de interpretação conforme daquela norma 
 face ao parâmetro de validade constitucional, mas nunca apreciou – de modo 
 concreto, porque a tal não estava obrigada – qualquer questão de 
 inconstitucionalidade normativa previamente colocada pelo recorrente.
 
  
 
 7. É certo que, em sede de alegações de recurso para o Tribunal da Relação de 
 Lisboa (cfr. fls. 19960 e 19961), o recorrente afirma – em sentido amplamente 
 genérico – que o “processo penal hodierno (…) não pode mais continuar a ser 
 compreendido da aludida maneira, mas na base de uma compreensão dele 
 constitucionalmente pontilhada”. Porém, logo de seguida, o recorrente procede a 
 uma análise – mais uma vez genérica e descritiva – sobre o âmbito de protecção 
 do direito fundamental de obtenção em prazo razoável, sem que extraia conclusões 
 relativas à concreta violação daquele por força da aplicação do n.º 2 do artigo 
 
 407º do CPP à concreta situação descrita nos autos.
 
  
 Note-se, aliás que, através dessas mesmas alegações, optou o recorrente por 
 seguir afirmando que, caso o n.º 2 fosse interpretado de modo conforme ao n.º 5 
 do artigo 20º da CRP, a subida diferida do recurso da decisão instrutória 
 implicaria a sua absoluta inutilidade, mas nunca alegou qualquer fundamento que, 
 no caso concreto, permitisse formular um juízo reprovador da constitucionalidade 
 da norma em causa.
 
  
 B) Da ilegitimidade do recorrente 
 
  
 
 8. Em suma: i) nas motivações e conclusões de recurso, o recorrente invocou a 
 inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 407º do CPC, sem a fazer depender 
 expressamente de qualquer interpretação concreta a formular pelo tribunal 
 recorrido; ii) na reclamação, o recorrente invocou a inconstitucionalidade da 
 própria decisão reclamada; iii) no requerimento de interposição de recurso, o 
 recorrente invocou a inconstitucionalidade da norma vertida no n.º 2 do artigo 
 
 407º do CPC, quando interpretada no sentido de “absolutamente inútil” consistir 
 na privação de efeito útil de eventual procedência do recurso. 
 
  
 Daqui decorre que o recorrente não invocou previamente a inconstitucionalmente 
 de modo processualmente adequado, conforme imposto pelo n.º 2 do artigo 72º da 
 LTC.
 
  
 
 7. Pelo exposto, conclui-se, sem necessidade de aferir dos restantes 
 pressupostos processuais, que o recorrente é parte ilegítima, pelo que o 
 tribunal recorrido deveria ter recusado a admissão do recurso de 
 inconstitucionalidade. Não o tendo feito, compete a este Tribunal, nos termos do 
 n.º 2 do artigo 76º da LTC, indeferir o requerimento.
 
  
 
  
 III. DECISÃO
 
  
 Nestes termos, e ao abrigo do disposto no do n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 
 
 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 
 
 26 de Fevereiro, e pelos fundamentos expostos, decide-se não conhecer do objecto 
 do recurso.»
 
  
 
 2. Inconformado com a decisão sumária proferida, o recorrente A. vem agora 
 reclamar para a conferência, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, da LTC, com os 
 seguintes fundamentos [cfr. fls. 386 e ss]: 
 
  
 
 «Na verdade, salvo o devido respeito, o reclamante não pode concordar com o 
 referido a fls. 2 do despacho de que reclama, em concreto com a parte final do 
 ponto 3 onde se refere: 
 
  
 
 “Ora, no caso em apreço, o recorrente não só não suscitou adequadamente a 
 questão da inconstitucionalidade de uma norma —in casu, o nº 2 do artigo 407º, 
 nº 2, do CPP —como não o fez de forma clara, inequívoca e que vinculasse o 
 tribunal recorrido a pronunciar-se sobre ela”. 
 
  
 Vejamos se assim terá acontecido: quanto à primeira das referidas questões 
 suscitadas no transcrito inciso, a mera leitura atenta dos autos permite 
 concluir, indubiamente, que na motivação do recurso apresentada na 3ª Secção da 
 
 4° Vara Criminal do Círculo Judicial de Lisboa, fls. 4 e 5, o recorrente deixou 
 escrito: 
 
  
 
 “Ora, por toda esta gama de razões, preconiza-se, sem a menor hesitação — e sem 
 necessidade de entrar em conta com outra mais desenvolvida e polifacetada 
 argumentação, ainda que meramente baseada na comparação dos regimes decorrentes 
 dos nºs 1 e 2 do artigo 407º do CPP — que, para efeitos 
 jurídico-processuais-penais [e o mesmo, contra o que julgam pensar os mais 
 contumazes adeptos do imobilismo, ainda no campo do processo civil e aí do 
 recurso de agravo e do respectivo momento de subida], sub specie, a retenção do 
 recurso o tornaria absolutamente inútil, desde que perspectivado este nomen 
 iuris face ao acima encarecido nº 5 do artigo 20º da Constituição da República. 
 
  
 Com efeito — já o dizia João Crisóstomo Filipino — não há força nenhuma no mundo 
 capaz de fazer mudar a natureza das coisas. E a “natureza das coisas”, naquilo 
 que agora se tem em vista, reside, justamente, na relativização ou plasticização 
 do aparente teor preceptivo do disposto no nº 2 do artigo 407º, permitindo que o 
 mesmo tenha efectividade, nos casos credores dela. Que, se os recorrentes não 
 erram, constituem, no processo penal, a regra e não a excepção, como só uma 
 análise perfunctória e rotineira permite continuar a afirmar. Mas estas já serão 
 contas de outro rosário. 
 
  
 Por conseguinte, uma decisão que não reconhecendo o que vem de assinalar-se, 
 violaria o artigo 407º, nº 2, do CPP, 20º, nºs 4 e 5, da CRP, além do nº 3 do 
 artigo 14º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, do art. 6º, 
 nº 1, da Convenção Europeia, da segunda parte do art. 47º da Carta dos Direitos 
 Fundamentais da União Europeia e alínea c) do nº 1 do art. 67º do Estatuto de 
 Roma do Tribunal Penal Internacional, destarte se tornando materialmente 
 inconstitucional”. 
 
  
 E mais: nas conclusões do dito recurso (fls. 10), foram precipitadas as 
 seguintes: 
 
  
 
 “B: Conclusões: 
 
  
 B1: O presente recurso deve ser admitido a subir imediatamente e em separado, 
 nos termos dos artigos 406º e 407º, n° 2 do Código de Processo Penal 
 
  
 B2: quando interpretado este comando iuxta modum, isto é, à luz do disposto nos 
 números 4 e 5 do artigo 20º da Constituição da República. Com efeito, 
 
  
 B3: a não se entender assim, o referido artigo 407º, nº 2 ficará inquinado de 
 inconstitucionalidade material, por violação dos acima referidos normativos 
 constitucionais e ainda do nº 3 do artigo 14º do Pacto Internacional sobre 
 Direitos Civis e Políticos, do 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do 
 Homem, da segunda frase do artigo 47º da Carta dos Direitos Fundamentais da 
 União Europeia e da alínea c) do artigo 67º do Estatuto de Roma do Tribunal 
 Penal Internacional”. 
 
  
 De notar que a referida alegação foi premonitória, uma vez que feita em primeira 
 instância e num momento em que o M.mo Juiz ainda não tinha proferido despacho 
 sobre o momento da subida do recurso. Daí a formulação do discurso no modo 
 condicional. 
 
  
 Como quer que seja: o M.mo Juiz não aderiu à ordem de considerações aduzida e 
 recebeu o recurso, embora com dúvidas que não escondeu, a subir a final. 
 
  
 Perante isto e logo que notificado de tal despacho do Ex.mo Presidente, o 
 reclamante reclamou para o Ex.mo Juiz Desembargador Presidente do Tribunal da 
 Relação de Lisboa, terminando a respectiva récita (fls. 6): 
 
  
 
 “Por conseguinte, uma decisão que não reconhecendo o que vem de assinalar-se, 
 como aquela de que se reclama, viola os artigos 407º, nº 2, do CPP, 20º, nºs 4 e 
 
 5, da CRP, além do nº 3 do artigo 14º do Pacto Internacional sobre Direitos 
 Civis e Políticos, do art. 6º, nº 1, da Convenção Europeia, da segunda parte do 
 art. 47º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e alínea c) do nº 
 
 1 do art. 67º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, destarte se 
 tornando materialmente inconstitucional. 
 
  
 Reconhecendo corajosamente o que vem de dizer-se, deverá V.a Ex.a, M.mo Juiz 
 Desembargador Presidente, determinar a correcção do momento da subida do 
 recurso, tal como fixada pelo M.mo Juiz a quo e, na consequência determinando 
 que o mesmo deve ser admitido ou recebido, como foi, mas com subida imediata e 
 em separado”. 
 
  
 Ora, se é certo que o reclamante não formulou conclusões nesta via 
 administrativa a que os antigos chamavam de “recurso de queixa”, a verdade é 
 que, tendo em conta a específica teleologia da reclamação, não é obrigado a 
 fazê-lo, sendo certo que a M.ma Juíza Desembargadora Vice-Presidente compreendeu 
 perfeitamente a questão que lhe foi submetida. 
 
  
 Como tal, só quem entenda, sem lei, que a reclamação também deve ser acompanhada 
 de “conclusões” poderá subscrever o entendimento perfilhado pela “decisão 
 sumária”. Na verdade, o que estava em questão era, justamente a 
 inconstitucionalidade da decisão do M.mo Juiz, por violadora dos normativos que 
 claramente se indicam. 
 
  
 O entendimento segundo o qual houve “abandono” de determinada linha 
 argumentativa, afigura-se, salvo o devido respeito, claramente abusivo. Se não, 
 vejamos: 
 
  
 O recorrente reagiu pela via adequada contra o entendimento ou interpretação 
 
 (decisão) perfilhada pelo M.mo Presidente, acerca do disposto no nº 2 do art. 
 
 407º do CPP. E ao referir que esse entendimento viola determinadas normas, 
 
 “destarte se tornando materialmente inconstitucional”, não se vê o que mais ou 
 diferente haveria de referir. A menos que o Tribunal Constitucional, para evitar 
 jogos de palavras, se decida a editar um “formulário autêntico” sobre a forma de 
 interpor recursos para essa alta instância, o que, convenhamos, seria, esse sim, 
 trabalho meritório.» 
 
  
 
  
 
 3. O Ministério Público emitiu o seguinte parecer [cfr. fls. 385 e 386]:
 
  
 
 «A presente reclamação é, a nosso ver, manifestamente improcedente, já que os 
 reclamantes não suscitaram, durante o processo e em termos processualmente 
 adequados, a questão de inconstitucionalidade normativa a que vem reportado o 
 recurso interposto para este Tribunal.
 Na verdade, a linha argumentativa delineada no requerimento de reclamação 
 limita-se a imputar a invocada inconstitucionalidade à decisão que reteve o 
 recurso, pugnando pela simultânea violação do preceituado no art. 407º, nº 2, do 
 CPP e em disposição da Lei Fundamental – o que constitui indício seguro de que 
 se está a pôr em causa, não propriamente a norma, mas a concreta decisão que a 
 interpretou e aplicou. E era este obviamente o momento processual adequado para 
 a parte confrontar com a invocada inconstitucionalidade o autor da decisão 
 recorrida, não relevando naturalmente o teor de outras e anteriores peças 
 processuais, não reeditado na dita reclamação.
 Tal insuficiência argumentativa conduziu aliás, a que, na decisão recorrida se 
 não tivesse abordado qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, o que 
 naturalmente determina a inverificação do pressuposto do recurso de fiscalização 
 concreta interposto.».
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II – FUNDAMENTAÇÃO
 
  
 
  
 
 4. O reclamante afirma que suscitou a questão da inconstitucionalidade de uma 
 norma – artigo 407º, nº 2, do CPP – e que o fez de modo processualmente 
 adequado. No entanto, não procede à demonstração de tal afirmação. 
 
  
 Pelo contrário, na presente reclamação, reproduz, aliás, por duas vezes, a linha 
 argumentativa anteriormente utilizada, na qual está bem patente que é da decisão 
 judicial que está a reclamar e não de qualquer interpretação normativa: «“Por 
 conseguinte, uma decisão que não reconhecendo o que vem de assinalar-se, como 
 aquela de que se reclama, viola os artigos 407º, nº 2, do CPP, 20º, nºs 4 e 5, 
 da CRP, além do nº 3 do artigo 14º do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e 
 Políticos, do art. 6º, nº 1, da Convenção Europeia, da segunda parte do art. 47º 
 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e alínea c) do nº 1 do art. 
 
 67º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, destarte se tornando 
 materialmente inconstitucional” (…) ». [Cfr. fls. 382 e 383, com sublinhado 
 nosso]. 
 
  
 E se dúvidas houvesse, o reclamante dissipa-as completamente mais adiante, 
 afirmando que o que pretendeu – e o que continua a pretender – é invocar a 
 inconstitucionalidade de uma decisão judicial: «Na verdade, o que estava em 
 questão era, justamente a inconstitucionalidade da decisão do M.mo Juiz, por 
 violadora dos normativos que claramente se indicam.» [Cfr. fls. 382 e 383, com 
 sublinhado nosso].
 
  
 Ora, nos termos da Constituição da República Portuguesa e da Lei de Organização 
 e Funcionamento do Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização concreta da 
 constitucionalidade, o Tribunal não dispõe de poderes para apreciar a 
 inconstitucionalidade de decisões judiciais, mas tão somente a 
 inconstitucionalidade de normas ou de interpretações de normas jurídicas 
 
 “stricto sensu”.
 
  
 
 5. Acresce ainda que o processo de fiscalização concreta da constitucionalidade 
 visa aferir de uma questão prejudicial de invalidade normativa inserida no 
 
 âmbito de um outro processo jurisdicional principal (CARLOS BLANCO DE MORAIS, “A 
 Justiça Constitucional”, Tomo II, 2006, Coimbra, pp. 561 a 567). Significa isto 
 que o Tribunal Constitucional apenas intervém após esgotados todos os meios 
 processuais legalmente previstos para, junto do tribunal “a quo”, impugnar a 
 inconstitucionalidade de norma efectivamente aplicada.
 
  
 Quando um sujeito processual invoca a inconstitucionalidade de determinado 
 preceito normativo numa das instâncias do processo principal, deve manter tal 
 invocação perante o tribunal que vier a proferir “decisão final”, se pretender 
 ter uma via aberta para questionar perante o Tribunal Constitucional a 
 constitucionalidade de tal norma. É que, por força do n.º 2 do artigo 70º da 
 LTC, apenas as decisões que já não se encontram sujeitas a recurso ordinário são 
 passíveis de recurso para este Tribunal.
 
  
 Assim, o último momento processual em que o tribunal “a quo” se pôde pronunciar 
 constitui o momento adequado para “cristalizar” o objecto do pedido de 
 inconstitucionalidade. O Tribunal Constitucional limita-se a aferir se, mediante 
 a invocação de uma questão prejudicial de invalidade normativa, a decisão 
 recorrida formulou um juízo adequado sobre a compatibilidade de determinada 
 norma infra-constitucional com as normas e os princípios contidos ou acolhidos 
 na Lei Fundamental. Mas, para tal, torna-se necessário que o recorrente haja 
 mantido, em sede da última peça processual a que possa lançar mão, as eventuais 
 alegações de inconstitucionalidade que formulara nos demais articulados e 
 requerimentos e que pretende que este Tribunal aprecie.
 
  
 Assim é porque, por força do princípio processual do pedido, o Tribunal 
 Constitucional não pode – nem deve – ajuizar das razões pelas quais os 
 recorrentes optam por não suscitar questões de inconstitucionalidade perante a 
 
 última instância que delas pode conhecer, quando as invocaram perante os 
 tribunais cujas decisões ainda eram passíveis de recurso ordinário.
 
  
 Ora, no caso em apreço, tal como se notou na Decisão Sumária, foi notório o 
 abandono da questão de constitucionalidade normativa em sede de reclamação. Este 
 
 é também o entendimento do Ministério Público junto deste Tribunal. 
 
  
 A presente reclamação é, portanto, manifestamente improcedente.
 
  
 
  
 III. DA DECISÃO
 
  
 
  
 Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação, 
 confirmando, consequentemente, a Decisão Sumária reclamada.
 
  
 Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC’s.
 
  
 Lisboa, 23 de Maio de 2007
 Ana Maria Guerra Martins
 Vitor Gomes
 Gil Galvão