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Processo nº 499/07
 
 1ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria João Antunes
 
  
 Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
 
  
 I. Relatório
 
 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é 
 reclamante A. e em que são reclamados B. e outros, vem o primeiro reclamar, ao 
 abrigo do disposto no artigo 76º, nº 4, da Lei da Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional (LTC), de despacho proferido naquele 
 Tribunal, em 7 de Fevereiro de 2007, pelo qual se decidiu não admitir recurso 
 interposto para o Tribunal Constitucional.
 
  
 
 2. Por acórdão de 16 de Novembro de 2006, o Tribunal da Relação de Lisboa 
 decidiu não tomar conhecimento de recurso que o arguido e ora recorrente havia 
 interposto para aquele tribunal apenas por si assinado na qualidade de advogado 
 em causa própria.  
 Notificado desta decisão, o arguido interpôs dois recursos, entrados em juízo na 
 mesma data (29 de Novembro de 2006): um para o Supremo Tribunal de Justiça (fl. 
 
 30 e ss.) e outro para o Tribunal Constitucional. É o seguinte o teor deste 
 requerimento:
 
  
 
 «Tendo sido notificado, por carta registada de 17.11.06, do ACÓRDÃO proferido em 
 
 16.11.06, a fls – que não tomou conhecimento do recurso que o recorrente 
 interpôs apenas por si assinado, na qualidade de Advogado em causa própria,
 Mas, não se conformando, de todo em todo, com o referido ARESTO, porque o Pacto 
 Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos prevê que “qualquer pessoa 
 acusada de uma infracção penal terá direito a estar processo e a defender-se a 
 si própria ou por Advogado constituído e sustenta que “um acusado que seja 
 forçado a aceitar um Advogado que não queira e no qual não tenha confiança não 
 terá capacidade para defender-se eficazmente; e
 Por isso o Governo Português deve corrigir a lei processual, que, neste âmbito 
 não podem sobrepor-se ao direito internacional.
 Vem do referido ACÓRDÃO recorrer para o Venerando Tribunal Constitucional.
 
 1. O recurso é interposto com base na alíneas b e i do n.º 1 do art.º 70.º da 
 LTC quanto ao ACÓRDÃO de 16.11.06, de fls –,
 
 2. O ACÓRDÃO em crise interpreta de forma inconstitucional as normas constantes 
 dos arts. 61.º a 64.º do CPP quando interpretadas no sentido de vedarem a um 
 arguido constituir-se como Advogado em causa própria, a fim de se defender em 
 processo crime, contra si instaurado, por violação do art.º 32.º da Constituição 
 e do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.
 
 3. Foram violados os direitos de cidadania, do núcleo essencial garantístico da 
 defesa, da intervenção processual livre e sem peias puritanas e moralistas do 
 arguido e da estrutura acusatória do processo consagrados nas normas do art.º 
 
 32.º/7/ da Constituição, nos arts. 164.º do EOA, 19.º do EMJ e 93.º do EMP, que 
 concedem a possibilidade de os Advogados, bem como os Magistrados Judiciais e do 
 MP poderem Advogar em causa própria, inclusivé e por maioria de razão, no 
 processo penal, onde a autenticidade processual e o agir apaixonado, 
 interessado, verdadeiro e sério devem sobrepôr-se como coroa de glória e 
 valoração enriquecedora constitucionalmente louvável das garantias que o 
 processo criminal deve assegurar à hipocrisia processual reinante nos Tribunais 
 Portugueses.
 Efectivamente a autenticidade, a pessoalidade é a maior das virtudes da defesa 
 séria e eficaz, maxime quando os Tribunais estão a dar a maior das relevâncias à 
 Psicologia Judiciária: a nossa opção vai para a auto-representação sem sofismas 
 pseudomoralistas/puritanos/fundamentalistas.
 As inconstitucionalidades/ilegalidades foram suscitadas e ajuizadas nas 
 seguintes peças:
 a.                                    A arguição de nulidade deduzida em 
 
 15.9.05, a fls –
 b.                                    O Despacho de 30.1.06, de fls –, 
 c.                                    Alegações recursivas de 20.2.06, de fls –, 
 designadamente o Pontos 4. e as Conclusões Quarta, Quinta, Sexta e Pedido final.
 d.                                    A reclamação de 23.3.06, de fls –, Pontos 
 
 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. e Pedido Final; e
 e.                                    Acórdão de 16.11.06, Ponto II/Questão 
 Prévia.
 Requer a admissão do referido recurso.
 Pede deferimento».
 
  
 
 3. Pelo despacho agora reclamado, o recurso para o Tribunal Constitucional não 
 foi admitido, com os seguintes fundamentos:
 
  
 
 «Atento o disposto nos art.°s 69° da Lei 28/82, de 15.11 (Lei da Organização, 
 Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional), 32° n.º 1 al. c) do CPC e 
 
 64° n.º 1 al. d) do CPP, não admito, porque não subscrito por defensor do 
 arguido, o recurso interposto, a fls. em referência, pelo arguido A. para o 
 Tribunal Constitucional».
 
  
 
 4. Tão-pouco foi admitido o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, face ao 
 que o arguido dirigiu reclamação ao Juiz Conselheiro Presidente do Supremo 
 Tribunal de Justiça (fl. 46), pendente à data da remessa dos presentes autos a 
 este Tribunal (fls. 19, 20 e 47 dos autos).
 
  
 
 5. Do despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade reclama agora o 
 recorrente nestes termos:
 
  
 
 «(…) As normas do art.º 32.º/7/da Constituição e dos Arts. 164.º do E.O.A., 19.º 
 do EMJ, bem como do 93.º do EMP concedem a possibilidade de os Advogados e os 
 Magistrados Judiciais e do MP advogarem em causa própria, inclusivé e por 
 maioria de razão de autenticidade, no processo penal.
 Aliás, esse direito de autorepresentação está imperativamente consagrado no 
 Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e Políticos e o signatário 
 apresentou QUEIXA no Tribunal Europeu.
 
 3. Mantém-se o recurso já interposto em 29/11/06, a fls. 153.
 A interpretação dada à norma dos Artos 61.º a 64.º do CPP é inconstitucional por 
 vedarem a autorepresentação por Advogados e Magistrados Judiciais e do MP.
 
 4. Donde, requer a admissão do referido recurso, porque assim o impõem as normas 
 citadas no precedente Ponto II e no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis 
 e Políticos, que serviram de base à Queixa apresentada no Tribunal Europeu.
 PEDIDO
 a. É competente para apreciar a reclamação o TRLisboa, de harmonia com o 
 preceituado no artº 688º/3 do CPC, a incidir sobre o indeferimento;
 b. Mas, compete ao Tribunal Constitucional, em Secção, o julgamento de 
 rec1amação do despacho que indefira o requerimento de recurso (arts. 76º e 77º/1 
 da Lei 28/82, de 15 de Novembro).
 NESTES TERMOS requer a V. Exa. – Exmo. Senhor Doutor Juiz DESEMBARGADOR que seja 
 alterado o Despacho reclamado, mandando admitir o recurso em causa, seguindo 
 imediatamente o recurso para o Tribunal Constitucional, nos próprios autos, com 
 efeito suspensivo, ex vi do preceituado nos arts. 69° e ss. da Lei 28/82 , de 15 
 de Novembro, incorporando-se o presente apenso no processo principal (primeira 
 parte do nº 4 do artº 688º do Cód. Proc. Civil).
 E requer a VV. Exas. - Exmos. Juizes Conselheiros do Tribunal Constitucional, em 
 Secção - -, de harmonia com o arts. 76º e 77º/1/ da Lei 28/82, de 15 de 
 Novembro, que julguem procedente por provada a presente reclamação.
 CERTIDÃO
 PARA TANTO e nos termos do art 688º/3/ do Cód. Proc. Civil, aplicável “ex vi” do 
 artº 69º da Lei 28/82, vem dizer que pretende que avance todo o processo 
 original para o TC».
 
  
 
 6. Neste Tribunal os autos foram com vista ao Ministério Público, que se 
 pronunciou pela forma seguinte:
 
  
 
 «A presente reclamação é manifestamente improcedente.
 Na verdade, é evidente a inverificação dos pressupostos do recurso tipificado na 
 alínea i) do n.º 1 do art. 70.º da Lei n.º 28/82, por nenhuma das situações aí 
 previstas se verificar, face ao teor da decisão recorrida.
 Quanto ao recurso fundado na alínea b) de tal preceito legal, não se mostram 
 esgotados os recursos ordinários possíveis, atenta a pendência de reclamação, 
 interposta para o Presidente do STJ (cf. fls. 19 e 20 dos autos)».
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 II. Fundamentação
 O despacho que é objecto da presente reclamação decidiu não admitir o recurso 
 interposto para o Tribunal Constitucional, com fundamento na circunstância de o 
 requerimento respectivo não estar subscrito por defensor do arguido.
 Importa, porém, começar por verificar se o requerimento de interposição de 
 recurso satisfaz os requisitos do artigo 75º-A da LTC e se estão reunidos os 
 pressupostos do recurso, interposto ao abrigo das alíneas b) e i) do nº 1 do 
 artigo 70º desta lei. Face ao disposto no nº 4 do artigo 77º da LTC, tem-se 
 entendido, de forma reiterada (cf., entre outros, Acórdão nº 480/2006, 
 disponível em www.tribunalconstitucional.pt), que cabe a este Tribunal verificar 
 os requisitos do artigo 75º-A da LTC e os pressupostos do recurso de 
 constitucionalidade interposto, ainda que a reclamação tenha exclusivamente como 
 objecto os concretos fundamentos da não admissão do recurso. 
 
  
 
 1. Conforme jurisprudência reiterada e uniforme do Tribunal Constitucional, 
 
 “constituem requisitos do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) 
 do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional: a aplicação pelo 
 tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja constitucionalidade é 
 questionada pela recorrente; a suscitação da inconstitucionalidade normativa 
 durante o processo; e o esgotamento de todos os recursos ordinários que no caso 
 cabiam” (cf. Acórdão nº497/99, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). 
 Conforme resulta do Relatório que antecede, foram interpostos dois recursos do 
 acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 16 de Novembro de 2006 – um para 
 este Tribunal e outro para o Supremo Tribunal de Justiça, relativamente ao qual 
 ainda se encontra pendente reclamação do despacho que não o admitiu –, o que 
 obsta a que se dê como verificado o requisito do esgotamento de todos os 
 recursos ordinários que no caso cabiam (artigo 70º, nº 2, da LTC). Ou seja, no 
 caso não foi respeitado o princípio da exaustão de recursos, com o qual se “visa 
 delimitar o acesso ao TC depois de a questão da constitucionalidade ter sido 
 analisada dentro da hierarquia judicial” (Gomes Canotilho, Direito 
 Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª ed., Coimbra Editora, p. 996).
 Como é de concluir que não foi interposto recurso de decisão definitiva na ordem 
 dos tribunais comuns, tal obstaria sempre ao conhecimento do objecto do recurso 
 interposto e, consequentemente, ao deferimento da presente reclamação.
 
  
 
 2. No que se refere à alínea i) do nº 1 do artigo 70º da LTC – que permite 
 recurso de decisões dos tribunais que recusem a aplicação de norma constante de 
 acto legislativo, com fundamento na sua contrariedade com uma convenção 
 internacional, ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente decidido 
 sobre a questão pelo Tribunal Constitucional – verifica-se, por um lado, que o 
 requerimento de interposição de recurso é omisso quer quanto à norma constante 
 de acto legislativo cuja aplicação foi recusada, com fundamento na sua 
 contrariedade com uma convenção internacional, quer quanto à norma constante de 
 acto legislativo aplicada pela decisão recorrida, em desconformidade com o 
 anteriormente decidido, pelo Tribunal Constitucional, sobre a questão da 
 contrariedade desta norma com uma convenção internacional (parte final do nº 1 
 do artigo 75º-A da LTC); e, por outro, que não identifica a decisão do Tribunal 
 Constitucional que anteriormente decidiu sobre esta questão (nºs 3 e 4 do artigo 
 
 75º-A da LTC).
 Como o reclamante não supriu na presente reclamação estas deficiências do 
 requerimento de interposição de recurso (no sentido de elas ainda poderem ser 
 supridas neste momento processual, cf. Acórdão do Tribunal Constitucional nº 
 
 450/04, disponível em www.tribunalconstitucional.pt), tal obstaria sempre ao 
 conhecimento do objecto do recurso interposto e, consequentemente, também nesta 
 parte, ao deferimento da presente reclamação.
 
  
 III. Decisão
 Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
 Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 
  
 Lisboa, 29 de Maio de 2007
 Maria João Antunes
 Carlos Pamplona de Oliveira
 Gil Galvão