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Processo n.º 746/08
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Mário Torres
 
  
 
     Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
 
  
 
  
 
                         1. A., L.da, apresentou reclamação para a conferência, 
 ao abrigo do n.º 3 do artigo 78.º‑A da Lei de Organização, Funcionamento e 
 Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de 
 Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro 
 
 (LTC), contra a decisão sumária do relator, de 6 de Outubro de 2008, que 
 decidiu, no uso da faculdade conferida pelo n.º 1 desse preceito, não 
 conhecer do objecto do recurso de constitucionalidade por ela interposto.
 
  
 
                         1.1. A referida decisão sumária tem a seguinte 
 fundamentação:
 
  
 
             “1. A., L.da, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao 
 abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da [LTC], contra o despacho do 
 Desembargador Relator do Tribunal da Relação de Coimbra (TRC), de 5 de Agosto de 
 
 2008, que não admitiu «reclamação para a conferência» deduzida através de fax 
 constante de fls. 429 a 450 (o original consta de fls. 452 a 462), em que a ora 
 recorrente peticionou a condenação como litigantes de má fé dos requeridos no 
 arresto por ela proposto (recorrentes no agravo da decisão que julgou 
 improcedentes as oposições por eles deduzidas contra o arresto) e arguiu 
 nulidades e pediu a reforma do acórdão da mesma Relação, de 21 de Abril de 2008, 
 que concedera provimento aos agravos e, em consequência, indeferira o arresto 
 em relação a todos os requeridos.
 
             De acordo com o requerimento de interposição de recurso, a 
 recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a questão da 
 inconstitucionalidade – «por violação dos princípios do Estado de direito, da 
 decisão equitativa, da tutela jurisdicional efectiva e da fundamentação das 
 decisões, previstos nos artigos 2.º, 20.º, n.ºs 4 e 5, e 205.º, n.º 1, da 
 Constituição da República Portuguesa» – dos «artigos 668.º, 669.º, 700.º, n.º 3, 
 
 716.º e 749.º, todos do Código de Processo Civil, na redacção em vigor nos 
 presentes autos, na interpretação que lhes foi dada pelo Tribunal a quo, no 
 sentido que as reclamações como a dos autos constituem reclamações para a 
 conferência nos termos do disposto no mencionado artigo 700.º, n.º 3, que são 
 segundas aclarações de uma primeira aclaração, e que o poder jurisdicional do 
 Tribunal da Relação de Lisboa se encontra esgotado para conhecer de todas as 
 matérias ali suscitadas, e não apenas daquelas que digam respeito às 
 inconstitucionalidades então invocadas, e consequentemente não admitindo a 
 reclamação deduzida sem conhecer dos seus fundamentos», mais aduzindo que as 
 inconstitucionalidades invocadas foram perpetradas pelo despacho ora 
 recorrido, razão pela qual não teve oportunidade de suscitar as questões de 
 inconstitucionalidade antes da prolação dessa decisão.
 
             O recurso foi admitido pelo Desembargador Relator do TRC, decisão 
 que, como é sabido, não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, 
 da LTC) e, de facto, entende‑se que o recurso em causa é inadmissível, o que 
 possibilita a prolação de decisão sumária de não conhecimento, ao abrigo do 
 disposto no n.º 1 do artigo 78.º‑A da LTC.
 
  
 
             2.1. No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a 
 competência atribuída ao Tribunal Constitucional cinge‑se ao controlo da 
 inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade 
 constitucional imputada a normas jurídicas, e já não das questões de 
 inconstitucionalidade imputadas directamente a decisões judiciais, em si 
 mesmas consideradas. A distinção entre os casos em que a 
 inconstitucionalidade é imputada a interpretação normativa daqueles em que é 
 imputada directamente a decisão judicial radica em que na primeira hipótese é 
 discernível na decisão recorrida a adopção de um critério normativo (ao qual 
 depois se subsume o caso concreto em apreço), com carácter de generalidade, e, 
 por isso, susceptível de aplicação a outras situações, enquanto na segunda 
 hipótese está em causa a aplicação dos critérios normativos tidos por 
 relevantes às particularidades do caso concreto.
 
             Acresce que, quando o recorrente questiona a conformidade 
 constitucional de uma interpretação normativa, deve identificar essa 
 interpretação com o mínimo de precisão, não sendo idóneo, para esse efeito, o 
 uso de fórmulas como «na interpretação dada pela decisão recorrida» ou 
 similares. Com efeito, constitui orientação pacífica deste Tribunal a de que 
 
 (utilizando a formulação do Acórdão n.º 367/94) «ao suscitar‑se a questão de 
 inconstitucionalidade, pode questionar‑se todo um preceito legal, apenas parte 
 dele ou tão‑só uma interpretação que do mesmo se faça. (...) [E]sse sentido 
 
 (essa dimensão normativa) do preceito há‑de ser enunciado de forma que, no caso 
 de vir a ser julgado inconstitucional, o Tribunal o possa apresentar na sua 
 decisão em termos de, tanto os destinatários desta, como, em geral, os 
 operadores do direito ficarem a saber, sem margem para dúvidas, qual o sentido 
 com que o preceito em causa não deve ser aplicado, por, deste modo, violar a 
 Constituição.»
 
             Por outro lado, tratando‑se de recurso interposto ao abrigo da 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – como ocorre no presente caso –, a sua 
 admissibilidade depende da prévia exaustão dos recursos ordinários no caso 
 cabíveis, sendo equiparados a recursos ordinários as reclamações dos juízes 
 relatores dos tribunais superiores para a conferência (n.ºs 2 e 3 do artigo 70.º 
 da LTC).
 
  
 
             2.2. No presente caso, a questão que a recorrente pretende que este 
 Tribunal aprecie carece de natureza normativa, pois ela recorrente não imputa 
 aos preceitos dos artigos 668.º, 669.º, 700.º, n.º 3, 716.º e 749.º do Código 
 de Processo Civil (CPC), no seu teor literal, nem a qualquer interpretação 
 normativa deles extraída, definida com o mínimo de precisão e dotada de 
 generalidade e abstracção, a violação de normas ou princípios constitucionais, 
 antes imputa esta violação directamente à decisão judicial recorrida, em si 
 mesma considerada, tendo em conta as especificidades próprias do caso concreto.
 
             Por outro lado, a decisão recorrida – o despacho do Desembargador 
 Relator de 5 de Agosto de 2008 – era, ele próprio, ainda susceptível de (agora, 
 sim, verdadeira) reclamação para a conferência, ao abrigo do artigo 700.º, n.º 
 
 3, do CPC [a crítica que a recorrente faz a esse despacho por ter considerado o 
 requerimento de fls. 429 a 450 como uma «reclamação para a conferência» prevista 
 no artigo 700.º, n.º 3, quando se tratava de arguição de nulidade e pedido de 
 reforma do anterior acórdão, previstos nos artigos 668.º e 669.º, todos do CPC, 
 para além de pedido de condenação da contraparte por litigância de má fé, é, em 
 parte, imputável à própria recorrente, que, no cabeçalho desse requerimento, 
 expressamente refere vir «reclamar para a conferência»]. Ora, cabendo do 
 despacho recorrido reclamação para a conferência, que é equiparada a recurso 
 ordinário, para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 70.º da LTC, o presente 
 recurso também é inadmissível por este segundo fundamento: falta de exaustão dos 
 recursos ordinários.”
 
  
 
                         1.2. A reclamação da recorrente assenta nos seguintes 
 fundamentos:
 
  
 
             “1.º Vem o Ex.mo Senhor Relator fundar a inadmissibilidade do 
 recurso em dois factos que considerou determinantes, a saber:
 
             a) O facto de a recorrente não ter questionado a adopção, pelo 
 tribunal a quo, de um critério normativo com carácter de generalidade ou, pelo 
 menos, não o ter feito com um mínimo de precisão, tendo questionado, isso sim, a 
 decisão judicial em si considerada;
 
             b) O facto de o despacho recorrido não ser ainda irrecorrível, 
 aquando da interposição do presente recurso, por ainda ser passível de 
 reclamação para a conferência no Tribunal da Relação;
 
             Ora,
 
             2.º Quanto à primeira das questões enunciadas em 1.º (alínea a)), 
 cumpre dizer o seguinte:
 
             No requerimento de interposição de recurso veio a recorrente alegar, 
 a esse respeito, que:
 
             
 
             «Os artigos 668.º, 669.º, 700.º, n.º 3, 716.º e 749.º, todos do 
 Código de Processo Civil, na redacção em vigor nos presentes autos, na 
 interpretação que lhes foi dada pelo Tribunal a quo, no sentido que reclamações 
 como a dos autos constituem reclamações para a conferência nos termos do 
 disposto no mencionado artigo 700.º, n.º 3, que são segundas aclarações de uma 
 primeira aclaração, e que o poder jurisdicional do Tribunal da Relação de 
 Coimbra se encontra esgotado para conhecer de todas as matérias ali suscitadas, 
 e não apenas daquelas que digam respeito às inconstitucionalidades então 
 invocadas, e consequentemente não admitindo a reclamação deduzida sem conhecer 
 dos seus fundamentos, são inconstitucionais por violação dos princípios do 
 Estado de direito, da decisão equitativa, da tutela jurisdicional efectiva e da 
 fundamentação das decisões, previstos nos artigos 2.º, 20.º, n.ºs 4 e 5, e 
 
 205.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa.»
 
  
 
             3.º É evidente que o despacho de que se recorre nos presentes autos 
 parece, muito simplesmente, resultar da confusão entre a reclamação para a 
 conferência de decisão singular do relator – prevista no artigo 700.º, n.º 3, do 
 CPC e a reclamação prevista nos artigos 668.º e 669.º do mesmo diploma.
 
             4.º Tal erro, a existir, terá decorrido de um erro terminológico e 
 de referências legais, cometido, desta feita pela recorrente, em ambas as 
 reclamações que fez.
 
             5.º Facto é que ambas as reclamações são permitidas.
 
             Efectivamente, a reclamação objecto do presente recurso constitui a 
 reclamação de decisões ou acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação em sede 
 de recurso de agravo, por força do que vai disposto nos artigos 716.º, 749.º e 
 
 752.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, que se reporta aos vícios da decisão 
 de que se possa conhecer, nos termos do disposto nos artigos 668.º e 669.º 
 referidos, e distingue‑se da reclamação para a conferência a que se reporta o 
 artigo 700.º, n.º 3, do CPC, que tem em vista o exercício de um direito 
 potestativo, em concreto o de que sobre a decisão singular recaia acórdão, 
 designadamente por não aceitar a simplicidade da causa a que alude o artigo 
 
 705.º do CPC.
 
             6.º Porém, independentemente do erro referenciado, ou até 
 possivelmente por causa dele, há três interpretações normativas abstractas, 
 feitas no despacho recorrido, que são censuráveis em termos de positivo 
 constitucional, e que se consubstanciam no seguinte:
 
             I – Se, em agravo de primeira instância, for feita uma reclamação 
 para a conferência, nos termos do n.º 3 do artigo 700.º do CPC, de uma decisão 
 singular do relator, elaborada nos termos do n.º 1, alínea g), do mesmo artigo 
 
 700.º, bem como do artigo 705.º do mesmo diploma, então já se não poderá, 
 contemporânea ou posteriormente, apresentar uma reclamação nos termos e para os 
 efeitos do disposto nos artigos 668.º e 669.º do mesmo diploma, designadamente 
 por ambas cumprirem os mesmos desígnios e acautelarem o mesmo tipo de 
 interesses;
 
             II – Que, independentemente de ser, ou não, apresentada essa 
 reclamação de decisão singular, não existe possibilidade de reclamar, de 
 decisão singular ou de acórdão, nos termos e para os efeitos dos referidos 
 artigos 668.º e 669.º, ficando desde logo esgotado o poder jurisdicional do 
 Tribunal da Relação;
 
             III – Que, como consequência disso, o Tribunal da Relação se 
 encontra desonerado de se pronunciar sobre a matéria dessa reclamação e, em 
 consequência, de fundamentar cabalmente as suas decisões.
 
             7.º Essas interpretações normativas abstractas parecem decorrer duma 
 interpretação que dá um alcance excessivo à reclamação prevista no artigo 700.º, 
 n.º 3, do Código de Processo Civil, inserindo no seu âmbito de conhecimento as 
 situações previstas, quer nos artigos 668.º e 669.º do CPC, quer a extensão de 
 atribuições fixadas pelas normas constantes dos artigos 716.º, 749.º e 752.º, 
 n.º 3, do mesmo Diploma, excluindo nova reclamação, o que, no entender da 
 recorrente, viola claramente os preceitos constitucionais constantes dos artigos 
 
 2.º, 20.º, n.º s 4 e 5, e 205.º da CRP.
 
             8.º Embora de uma forma que se admite imperfeita, foram essas 
 interpretações normativas abstractas que foram atacadas no recurso de 
 inconstitucionalidade interposto e, sempre salvo o devido respeito e melhor 
 opinião em contrário, que ali se encontram efectivamente vertidas, sendo 
 possível ao tribunal extraí‑as do seu texto por forma a ser dado cumprimento ao 
 corpo de requisitos que tão bem explanado vem no douto Acórdão do Tribunal 
 Constitucional n.º 367/94, referenciado no douto despacho de que ora se 
 reclama.
 
             9.º Mas, ainda que assim não fosse, sempre o Ex.mo Senhor Relator 
 poderia ter usado da faculdade prevista nos n.ºs 5 e 6 do artigo 75.º‑A da Lei 
 do Tribunal Constitucional, o que sempre constitui um poder que não é 
 discricionário, mas sim um poder‑dever, ou um poder vinculado, como alguma 
 doutrina o apoda.
 
             10.º Assim, ainda e sempre salvo o devido respeito, que é muito, não 
 deveria o recurso ter sido considerado inadmissível por força do primeiro dos 
 fundamentos sintetizados no anterior artigo 1.º. Tem, porém, a recorrente a 
 certeza que, ao contrário do que actualmente constitui vox populi, o Venerando 
 Tribunal Constitucional valoriza a prossecução da justiça na eterna tensão 
 dialéctica entre os valores da justiça e da segurança, por forma a 
 secundarizar, no presente caso, as exigências de forma que, ainda que 
 necessárias, se podem tornar elemento esclerosante do sistema, e da confiança 
 que nele depositam os destinatários da justiça, quando levadas para além dos 
 limites do razoável.
 
             11.º Quanto ao segundo dos factos sintetizados no anterior artigo 
 
 1.º (alínea b)), o de não ter sido, o presente recurso, considerado admissível 
 por o despacho recorrido não ser ainda irrecorrível, aquando da sua 
 interposição, uma vez que ainda passível de reclamação para a conferência no 
 Tribunal da Relação, cumpre referir o seguinte:
 
             12.º Mais uma vez sempre salvo o devido respeito, que é muito, e 
 melhor opinião em contrário, entende a recorrente que o disposto no artigo 
 
 700.º, n.º 3, apenas se reporta a despachos proferidos antes da prolação de 
 acórdão. Efectivamente, o próprio n.º 4 do mesmo artigo profere expressamente 
 que a reclamação deduzida é em regra decidida no acórdão que julga o recurso, 
 excepto se se impuser decisão imediata.
 
             13.º O sentido do artigo 700.º, n.ºs 3 e 4, parece reportar‑se, 
 inequivocamente, ao período processual anterior à prolação de acórdão.
 
             14.º Ora, parece evidente que, sobre a reclamação final apresentada 
 pela recorrente, que já o é do próprio acórdão final, não poderá recair um novo 
 acórdão. Interpretar a lei da forma que foi feita no douto despacho agora 
 reclamado exigiria que a ora recorrente reclamasse, para a conferência, do 
 despacho proferido em 6 de Agosto de 2008, que já de si incide sobre uma 
 reclamação de um acórdão que foi proferido após reclamação de decisão singular 
 para a conferência.
 
             15.º Caso a tese de que se reclama vingue, será possível criar uma 
 sucessão infinita de reclamações para a conferência, acórdãos e reclamações de 
 acórdãos, que dariam lugar a decisões singulares que imporiam reclamação para a 
 conferência, e assim sucessivamente num ciclo vicioso imparável.
 
             16.º Não parece ter sido essa a intenção do legislador ordinário 
 nem, tampouco, do legislador constituinte, daí advindo a restrição decorrente 
 do n.º 4 do artigo 700.º
 
             17.º No fundo, o que está em causa é, ainda e sempre, a recusa, 
 sempre reiterada, em ter que justificar uma decisão singular sobre o fundo da 
 questão, que é, em si, injustificável, e que apenas beneficiou do facto de não 
 ser possível dela interpor recurso ordinário, e que também foi objecto de outro 
 
 (anterior e ainda não decidido) recurso constitucional.
 
             18.º O que, em última análise, torna a posição daquele específico 
 colectivo decidente do Venerando Tribunal da Relação revoltante é o facto de, 
 pelo menos aparentemente, denotar que se está a esquivar a ter, ou que dar, 
 fundamentadamente, a cara na defesa de uma decisão indefensável proferida 
 singularmente por um dos seus pares e apenas por eles chancelada ou, pelo 
 contrário, dar razão à recorrente revogando essa mesma decisão que chancelaram.
 
             19.º Para isso, escudam‑se num pretexto formal (e, como se referiu, 
 ilegal e inconstitucionalmente encontrado) para se não ver obrigados a tomar 
 tal posição.
 
             20.º E é precisamente por isso que a recorrente apela ao mais alto 
 sentido de justiça dos Ex.mos Senhores Conselheiros. Para que a bem do Estado 
 de Direito Democrático e da confiança no Sistema Judiciário, os Senhores 
 Desembargadores que criaram esta situação sejam obrigados a desempenhar a sua 
 função, isto é, a assumir a responsabilidade de tomar posição fundamentada 
 sobre uma decisão que tomaram e que terá, possivelmente, como consequência, a 
 perda definitiva da única garantia possível de ressarcimento dos prejuízos que a 
 recorrente sofreu, prejuízos esses causados pelos arrestados.
 
             Termos em que se requer a V.as Ex.as se dignem admitir o presente 
 recurso, autuando‑o e seguindo-se os demais termos até final,
 
             Assim fazendo JUSTIÇA!”
 
  
 
                         1.3. Os recorridos responderam, propugnando o 
 indeferimento da reclamação e sustentando o recorrido B. a condenação da 
 reclamante como litigante de má fé.
 
                         Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
                         2. O presente recurso emerge de agravo deduzido por C. e 
 mulher D. e por B. contra a decisão que julgou improcedentes as oposições por 
 eles deduzidas contra o decretamento de arresto requerido pela ora recorrente 
 A., L.da, agravo a que foi concedido provimento pelo acórdão do Tribunal da 
 Relação de Coimbra, de 22 de Abril de 2008, com consequente indeferimento do 
 arresto em relação a todos os requeridos.
 
                         Notificada deste acórdão, a ora recorrente requereu a 
 sua aclaração, o que foi indeferido por acórdão de 24 de Junho de 2008.
 
                         Notificada deste segundo acórdão, a mesma recorrente 
 veio, em 18 de Julho de 2008:
 
                         − “nos termos e para os efeitos do disposto, 
 conjuntamente, nos artigos 266.º‑A, 752.º, n.º 3, 716.º, 670.º, n.º 3, 66.º e 
 
 669.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil, na redacção que se encontra em 
 vigor para o presente processo, reclamar para a conferência, quer pedindo a 
 condenação dos requeridos como litigantes de má fé, quer deduzindo nulidades, 
 quer, ainda, pedindo a reforma do douto acórdão proferido nos autos, que 
 conheceu da matéria do recurso” (fls. 452‑462); e
 
                         − interpor recurso para o Tribunal Constitucional contra 
 o “acórdão de provimento do recurso de agravo intentado nos autos” (fls. 
 
 507‑509).
 
                         Por despacho do Desembargador Relator, de 5 de Agosto de 
 
 2008 (fls. 628), foi admitido o recurso interposto para o Tribunal 
 Constitucional contra o acórdão de 22 de Abril de 2008, e, relativamente ao 
 requerimento de fls. 452‑462, consignou‑se o seguinte:
 
  
 
             “(...) a recorrida A. ... vem agora deduzir nova reclamação para a 
 conferência, pedindo a condenação dos recorrentes como litigantes de má fé e 
 nova reforma do acórdão.
 
             Ora, para além de não haver aclaração de acórdão que denega 
 aclaração, o poder jurisdicional da Relação está esgotado.
 
             Assim, não admito a reclamação.”
 
  
 
                         Foi deste último despacho que a recorrente interpôs o 
 presente recurso para o Tribunal Constitucional (distinto do recurso 
 anteriormente interposto, e admitido, contra o acórdão de 22 de Abril de 2008), 
 tendo, no requerimento de interposição de recurso, definido como seu objecto a 
 questão da inconstitucionalidade, “por violação dos princípios do Estado de 
 direito, da decisão equitativa, da tutela jurisdicional efectiva e da 
 fundamentação das decisões, previstos nos artigos 2.º, 20.º, n.ºs 4 e 5, e 
 
 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa”, dos “artigos 668.º, 
 
 669.º, 700.º, n.º 3, 716.º e 749.º, todos do Código de Processo Civil, na 
 redacção em vigor nos presentes autos, na interpretação que lhes foi dada pelo 
 Tribunal a quo, no sentido que as reclamações como a dos autos constituem 
 reclamações para a conferência nos termos do disposto no mencionado artigo 
 
 700.º, n.º 3, que são segundas aclarações de uma primeira aclaração, e que o 
 poder jurisdicional do Tribunal da Relação de Lisboa se encontra esgotado para 
 conhecer de todas as matérias ali suscitadas, e não apenas daquelas que digam 
 respeito às inconstitucionalidades então invocadas, e consequentemente não 
 admitindo a reclamação deduzida sem conhecer dos seus fundamentos”.
 
                         Como se sublinhou na decisão sumária ora reclamada, a 
 questão que a recorrente pretende que este Tribunal aprecie carece de natureza 
 normativa, pois ela não imputa aos preceitos dos artigos 668.º, 669.º, 700.º, 
 n.º 3, 716.º e 749.º do CPC, no seu teor literal, nem a qualquer interpretação 
 normativa deles extraída, definida com o mínimo de precisão e dotada de 
 generalidade e abstracção, a violação de normas ou princípios constitucionais, 
 antes imputa esta violação directamente à decisão judicial recorrida, em si 
 mesma considerada, tendo em conta as especificidades próprias do caso concreto. 
 Trata‑se de deficiência que afecta irremediavelmente a admissibilidade do 
 recurso, já que se prende à intrínseca inidoneidade do objecto do recurso para 
 poder ser apreciado pelo Tribunal Constitucional, ao qual apenas compete 
 sindicar questões de inconstitucionalidade normativa. Por isso, não se tratando 
 de falta ou irregularidade no cumprimento das menções que o artigo 75.º‑A da LTC 
 exige que constem do requerimento de interposição de recurso, não se justificava 
 a formulação do convite previsto no n.º 6 do mesmo preceito.
 
                         No sentido da inadmissibilidade do recurso vale também a 
 segunda razão apontada na decisão sumária ora reclamada: a falta de exaustão 
 dos recursos ordinários cabíveis, a que são equiparadas as reclamações para a 
 conferência dos despachos dos relatores nos tribunais superiores. 
 Contrariamente ao que a reclamante ora defende, o sentido do aditamento, na 
 reforma processual civil de 1995/1996, do n.º 4 do artigo 700.º do CPC, foi o de 
 evitar que, na generalidade dos casos, a reclamação contra despachos 
 interlocutórios do relator, na sua função de preparar o recurso para 
 julgamento, implicasse a imediata intervenção da conferência; estabeleceu‑se, 
 assim, a regra de que nesses casos – que são os mais numerosos – a reclamação é 
 decidida no acórdão que julga o recurso, excepto se a natureza da questão 
 suscitada impuser decisão imediata. Mas daqui não deriva que os despachos do 
 relator posteriores ao acórdão que julga o recurso passem a ser irreclamáveis, o 
 que seria de todo incompatível com a natureza colegial dos tribunais superiores. 
 Aos relatores incumbe deferir “todos os termos do recurso até final” (n.º 1 do 
 artigo 700.º do CPC), incluindo o processado posterior ao acórdão que julga o 
 recurso; os despachos que então profira, salvo o que não admita recurso desse 
 acórdão para tribunal superior, que é reclamável nos termos do artigo 688.º, são 
 reclamáveis ao abrigo do n.º 3 do artigo 700.º e sujeitos a imediata decisão da 
 conferência. Assim, também por este motivo o recurso interposto era 
 inadmissível.
 
                         Não se evidenciam, por ora, razões que justifiquem a 
 condenação da reclamante por litigância de má fé.
 
  
 
  
 
                         3. Termos em que acordam em indeferir a presente 
 reclamação, confirmando a decisão sumária reclamada.
 
                         Custas pela recorrente, fixando‑se a taxa de justiça em 
 
 20 (vinte) unidades de conta.
 Lisboa, 25 de Novembro de 2008.
 Mário José de Araújo Torres
 João Cura Mariano
 Rui Manuel Moura Ramos